Quem foi "Jaques (Jacob) Pires (Peters)"? De Pernambuco do Século XVII

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Quem foi "Jaques (Jacob) Pires (Peters)"? De Pernambuco do Século XVII

#326332 | PedroPires95 | 28 Mär 2013 18:11

Olá, nas minhas investigações tenho encontrado em minha arvore, Jacob Peters, Dono De engenho, casado com Cataria Alvares, e chamado por Borges da Fonseca de Jaques Pires (Ou Peres).

Era Alemão, cujo sua origem não sabemos, Mas deve ter nascido em meados do final do Séc. XVI,

Se casou com Catarina Alvares e teve uma ancestral minha Catarina Peres, que com o nome de casada ficou Catarina Melo, Ela era casada com André Albuquerque Melo,

Gostaria de saber mais informações sobre ele, Porque ele mudou o seu nome para Jaques Pires?

Até mais, Pedro..

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RE: Quem foi "Jaques (Jacob) Pires (Peters)"? De Pernambuco do Século XVII

#326370 | NISGM | 29 Mär 2013 10:47 | In reply to: #326332

Caro pedro Pires,

Só alguma luz sobre a mudança de nome que não é exactamente uma mudança de nome, mas antes uma tradução do nome. Basicamente usaram-se equivalentes portugueses para um nome de fora, o que à época se fazia muito.

Passo a explicar longamente.

Tipicamente, os apelidos (no Brasil usa-se o equivalente sobrenomes) são de origem patronímica, toponímica ou alcunhas. Existem também outros ligados à piedade religiosa, que era usados tipicamente como nomes próprios e mais tarde passaram a ser usados como apelido: Santos (por exemplo, usado por alguém nascido no dia de Todos os Santos), Reis (para nascidos no dia de Reis), Quaresma (adequado por estes dias), Baptista (por devoção ao santo), Ramos, etc.

Alcunhas destacam características da pessoa: Bravo, Valente, Narigão, Louro, Manso, Crespo, etc., etc., etc.

Toponímicos, ligados a nomes de terras onde os antepassados vivessem - explica a quantidade de Guimarães e Bragas que existem pelo Brasil. Podiam nem usar esses apelidos nas suas terras de origem, mas como vinham dessa zona e estavam num país novo adoptavam algo que de alguma forma lhes guardasse referências.

Toponímicos portugueses são por exemplo Moreira, Magalhães, Teixeira, Sousa, Silva, Lemos, Lima, Andrade, Araújo, Maia, Albuquerque, Melo e por aí fora. Vêm originalmente precedidos da partícula "de" ou "da", que em muitos casos caiu com o tempo até porque ocupava espaço a escrever e a dizer. Veja-se o caso de ex-presidentes e presidente: No Brasil, Lula "da Silva", em Portugal, Cavaco "Silva". O mesmo apelido, com e sem partícula.

Depois há o caso curioso dos patronímicos, que curiosamente os alemães nem terão usado muito. Na origem, o patronímico mais não era que um segundo nome que indicava a filiação (daí patronímico ser uma palavra derivado do latim "pater", que quer dizer pai) do indivíduo. Com o tempo, acabou por passar a ser usado como apelido.

Uma boa introdução aos patronímicos é o primeiro rei Português, Afonso Heriques. Porquês Henrique? Por ser filho de um Henrique. Para se indicar de quem era filho este Afonso, usava-se um segundo nome com a terminação "es" (em Espanha, usam a terminação "ez"). Não tem nada de especial o surgimento deste "es". No fundo o "es" deriva das declinações do latim, e é um caso que indica um sentido de posse quando acrescentado a um nome.

São exemplos de patronímicos,
Álvares ou Alves (filho de Álvaro)
Peres ou Pires (filho de Pero ou de Pedro, que são exactamente o mesmo nome em versão corrente e erudita)
Fernandes (filho de Fernão ou Fernando, que são exactamente o mesmo nome em versão corrente e erudita)
Antunes (filho de Antão ou António, que são exactamente o mesmo nome em versão corrente e erudita)
Gonçalves (Gonçalo)
Lopes (Lopo)
Sanches (Sancho)
Soares (Soeiro)
Martins (Martim ou Martinho, que são exactamente o mesmo nome em versão corrente e erudita)
Rodrigues (Rui ou Rodrigo, que são exactamente o mesmo nome em versão corrente e erudita)


e por aí fora. Nalguns casos, o patronímico ficava igual ao nome próprio do pai (Gomes, Afonso, Godinho) e há quem os tenha transmitido assim mais modernamente: Duarte, André, Julião, António são nomes próprios que passaram a ser usados como apelidos e que em muitos casos eram os nomes de um antepassado. Sobre este assunto tem interessantes artigos científicos como este http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/3190.pdf ou este www.revistasignum.com/signum/index.php/revistasignumn11/article/view/56/61

Esta solução dos patronímicos (e também matronímicos) foi usados um pouco por toda a Europa. Os ingleses e nórdicos usaram tipicamente a terminação "son": Johnson (filho de John), Gustafsson (Gustaff), etc. Os eslavos, o "ich" ("ova" nas sennhoras") ou o "ov" como em Pavlov (filho de Pavel, que se traduz como Paulo) ou em Ilyich (filho de Ilya, leia-se Elias). Há outras soluções, mas como é óbvio, há sempre uns confrades comentadores preciosistas, há muitas outras opções e soluções

Curiosamente, os alemães não foram de usar muito os patronímicos. Parece que no norte era mais típico, mas isso também pode não querer dizer nada. Muito do que se diz sobre nomes tem uma forte carga empírica. Não sei como são as terminações nesses casos o que dificulta ligeiramente a apreciação do Peters. A terminação apenas em "s" talvez possa ajudar a precisar melhor a origem, mas para isso precisa de um especialista

Sem concretizar a forma exacta dessa transformação, Peters é obviamente derivado do nome próprio Peter, que quer dizer Pedro. E, nesse, caso Peters seria um patronímico, até pela forma como foi traduzido para o português Pires. Esse Jacob seria descendente de um Peter e por isso se chamava Peters. Em Português, o equivalente traduzido seria Pires ou Peres. Ficou Pires. O Jacob é toda uma outra questão, pois é possivelmente um dos nomes próprios que mais divergiu nas línguas de destino.

O nome Jacob é do Médio Oriente e há-os na Bíblia. No hebreu original, seria algo aproximadamente lido como Yakov, que os gregos traduziram (em alfabeto grego, claro) como Iakob e os árabes como yaqub.

Ora, se o nome é bíblico, obviamente transmitiu-se aos países cristãos. Na Península Ibérica como Iago (mas não só, na Galiza usa-se o Jacobeo referente a Sant'Iago de Compostela), em França como Jacques (que por qualquer motivo também se aceitou em Portugal, embora de importação), em Inglaterra como James, em Itália como Giacomo (em Portugal, usa-se uma variante Jácome). Nas traduções feitas do latim o som da letra "i" ficou muitas vezes com o som da letra "J".

Basicamente em todas estas formas/traduções de Jacob está presente o som "jako" ou "iako": No Francês IACQues, no inglês menos notório JAmes, no italiano gIACOmo, na variante "JÁCOme".

Ora, na Penísula Ibérica, o nome Iago acabou por sofrer mutações. Poderá ter passado a Iego, dando Diego, hoje em dia um nome próprio espanhol. Terá também passado a Iogo, dando o nome próprio português Diogo.

E depois há o apóstolo Santo Iago, no original bíblico seria Jacob, cujo corpo estaria na Península Ibérica (leia-se outro artigo científico em http://libro.uca.edu/sjc/sjc10.pdf).

Começou a usar-se e pronunciar-se Sant'Iago em lugar de Santo Iago. Em breve se escrevia Santiago e de repente passou-se em Portugal ao San Tiago e logo a São Tiago, podendo usar-se um novo nome Tiago.

Ainda como curiosidade, conto que existe um realizador de cinema português chamado Manoel de Oliveira que em 1995 anos filmou O Convento, com Caherine Deneuve e John Malkovitch. Um investigador vem a Portugal, à serra da Arrábida, procura num arquivo a prova de que Shakespeare era português. O pretexto ficcional era que Shakes Pear seria o inglesamento do nome de um português chamado Jacques Pires.

Assim de repente é o que me ocorre a partir da sua questão sobre Jaques Pires.

Atentamente, nuno de m.

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