Do uso de brasão, "rectius", escudo de armas
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Do uso de brasão, "rectius", escudo de armas
Caros Amigos e “Confrades”,
No âmbito do uso de armas, hoje, aqui vos trago algumas normas cujo conteúdo, revelador de uma certa prática e sua evolução, passo a referir.
Assim:
Das Ordenações Manuelinas, (1514-1521) do Livro II, título XXXVII,
« Esguardando Nós, quanto com razam he / e deve seer estimada a nobreza, e fidalguia das pes- / soas, e quanto os homens fazem, e sam obriguados / fazer por a alcançar, e sustentar, e assi como as armas / do Nobres e Fidalguos de Nossos Reynos devem na- / dar em toda certidam, por serem sinaes de sua no- / breza e linhagem, e merecimentos, e porque cada / huû saiba o modo, e maneira em que pode e deve / trazer as armas, que por Direito lhe pertencem, o / Declaramos por esta Ordenaçam.
1. Item o chefe da linhagem será obriguado tra- / zer as armas dereitas, sem diferença, nem mestura / d’outras ninhûas armas. E sendo chefe de mais de hûa / linhagen será obriguado trazer as armas de todas / aquellas de que for chefe dereitas, e sem mestura em / seus quateis, segundo por Portugal Rey d’Armas / lhe será ordenado. /
2. Item os outros irmãos, e assi todos os outros da / linhagem, as ham de trazer com a deferença ordena- / da no nobre Officio da Armaria; e asi poderam tra- / zer atee quatro armas, se quiserem, e mais nam; e se qui- / serem // serem tomar soomente estremas as armas de parte de / suas mâys pode-lo-ham fazer.
3. Item os Bastardos ham d’trazer as armas com / sua quebra da bastardia, segundo Ordenação d’Armaria.
4. Item nom poderá pessoa algûa trazer armas / do Reyno dereitas, postoque sejam mesturadas com / outras armas, mas ham de seer trazidas no quartel, / em que as trouxerem, que ha de seer o dereito, com / deferença, assi como a cada huû pertençe as trazer; convem a saber, as que vem por bastardia com a / quebra da bastardia, e as outras com a deferença or- / denada d’Armaria; porque pois o Principe herdei- /ro as nom pode trazer sem deferença, muito menos / ninhûa pessoa. /
5. E porque isto assi inteiramente se guarde, co- / mo he muita razam que seja, Ordenamos, e Man- / damos, que qualquer pessoa de qualquer qualidade, / e condiçam que seja, que novamente tomar armas, / que de Dereito lhe nom pertençam, perca sua Fa- / zenda, ametade pera quem o acusar, e a outra me- / tade pera os activos, e mais perderá toda sua honra, / e privilegio de fidalguia, e linhagem, e pessoa que / tever, e seja avido por plebeu assi nas penas, como / tributos, e peitas, sem nunca poder guozar de ni- /nhuû privilegio, nem honra, que por razam de sua / linhagem, ou pessoa, ou de Dereito lhe pertencesse.
6. E quemquer que tever armas suas, e as lei- / xar em todo, tomando assi novamente outras, que / lhe // lhe nom pertençam, averá as mesmas penas, na / maneira que dito he; e pelo mesmo caso perca as / suas armas proprias, sem as mais poder teer, nem / dellas Usar.
7. E qualquer que acrecentar nas suas armas / algûa cousa, que por Dereito nellas nom possa acre- / centar, ou dellas tirar alhûa Cousa, que por Derei- / to nom podia tirar, encorrerá em pena de dous an- / nos de degredo pera cada huû dos Luguares d’Alem, / e mais paguará cincoenta cruzados d’ouro pera o Rey / d’Armas, ou outro Official d’Armas que o acusar, / e nom usará d’outras armas, salvo d’aquelas que / proprias e dereitamente forem suas. /
8. E alem das penas sobreditas em cada huû / dos ditos casos, Mandamos, que aquelles que de / novo tomarem armas, nom lhe pertencendo, ou / acrecentarem, ou tirarem nas que teverem como / dito he, ajam mais por pena, que em quaesquer / demandas que trouxerem, ora nellas sejam Autores, / ou Reos, ou Assistentes, ou Opoentes, postoque ven- / cidos ou vencedores sejam no principal, sejam sem- / pre condenados nas custas pera a parte contraria em / tresdobro, assi nas do processo, como pessoaes; e / qualquer parte que contra elles litiguar, poderá / opoer no feito ( depois da sentença dada ) cada hûa / das sobreditas cousas, e lhe será a dita parte con- / denada nas custas em tresdobro, provando cad hûa / das sobreditas cousas, como fito he.
9. Item todas as sobreditas penas averá o que / te- // tever tomadas as ditas armas novamente, e as nom / leixar, ou aquele que as tever acrecentadas, ou / dellas tever tirado, e as nom tornar a poer como de / Dereito lhe pertencem, da pubricaçam desta Orde- / naçam a tres meses. / »
A continuar nas Ordenações Filipinas, Quinto Livro, Titulo XCII.
Com os meus melhores cunprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Do uso de brasão, "rectius", escudo de armas
Caros Confrades
É sempre muito agradável e proveitoso para mim ler as doutas opiniões e informação que nos dá o Senhor Doutor Eduardo Albuquerque.Os meus respeitosos cumprimentos.
Assim,gostaria de trazer à colação um assunto relacionado com este tópico.
Como não temos-uma Monarquia-e muito menos estamos no reinado do "Venturoso"que Deus haja;há quem use:armas assumidas e ex-libris heráldicos que,na minha opinião,são também armas assumidas,o que seria impensável(?!) se estivessem em vigor as Ordenações Filipinas.
Mas,tenho uma dúvida que me tem perseguido:em direito nobiliárquico puro e absoluto,ou melhor-"direitos heráldicos"actuais;alguém que use,hoje,armas assumidas,ou ex-libris heráldicos,baseados em apelidos de família que viveu"À Lei da Nobreza"e que pode provar;não estará,em última análise,a "usar"de um livre arbítrio indevido?
Usar-se de símbolos heráldicos(brasão) com armas próprias devidamente ordenadas e iluminadas respeitando,embora,todas as leis da heráldica,não será um pouco"abusivo",fazer-se tal uso?Digo isto,porque o faço e continuarei(v/-O.R.G.Carvalho-em EX-LIBRIS PORTUGUESES HERÁLDICOS-por Sérgio Avelar Duarte).
Mas há quem pense que tal uso só se justificaria a quem possa apresentar uma carta de brasão de seus antepassados(e quantas delas...)ou que faça prova documental que sua família já vinha armigerada nos Livros Oficiais:Armeiro Mor ou o da Perfeiçao das Armas-de A.Godinho.
Contudo,muitas outras pessoas,como eu,de facto o fazem,sem pruridos nobiliárquicos,ou com eles também-é o meu caso;tão só e simplesmente,para simbolizarem,de forma nobre, um passado familiar que respeitam e querem continuar.
E o assunto já foi tratado no tópico-Armas assumidas",mas,tenho para mim que nunca é demais sabermos de outras opiniões de personalidades com conhecimentos de direito heráldico adaptado à nossa época,e de heraldistas.
Não é para levantar polémica,que não alimentarei;apenas o desejo de saber mais sobre o assunto,que certamente virá ao encontro de outros nossos confrades.
Com os meus melhores cumprimentos creiam-me com elevada consideração.
Rafael Carvalho
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RE: Corrigenda
Caros Amigos e “Confrades”,
O computador prega-nos, por vezes, algumas partidas como as infra referidas. Pelo facto as nossas desculpas.
Corrigenda à precedente mensagem:
1 §, onde se lê na- / dar, deverá ler-se an- / dar;
n.º. 5, onde está activos, deverá estar cativos;
fecho, em cunprimentos, deverá registar-se cumprimentos,
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Tutela jurídica do brasão
Meu Caro Rafael Carvalho,
É com muito gosto que recebo e agradeço a sua precedente mensagem, a que me irei reportar para deixar umas breves notas.
A primeira, é o renovar de um anterior apelo no sentido de me tratar pela minha simples “graça”, sem mais...
A segunda, tem a ver com a questão complexa que levantou, já que a mesma tem projecção no âmbito do direito Constitucional, Civil e Criminal.
Sobre esta matéria, já deixamos algumas notas na mensagem:
http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=12607#lista
Neste contexto, subscrevo a tese de outros autores, nomeadamente de Adriano De Cupis, Professor que foi da Universidade de Perugia, e entendo o brasão, “rectius” o escudo de armas, como uma das facetas em que se revela o direito à identidade pessoal, como uma das suas manifestações.
A sua tutela concretizar-se-á, por analogia, como a do nome.
O brasão, como sinal figurativo capaz de individualizar a pessoa, teve origem militar, já que com ele se pretendia dar a conhecer, em torneios ou batalhas quem o usava.
E aqui, também, funcionou a tradição. O filho ao assumir o comando militar à morte do pai, assumia, de igual modo, o brasão.
Com o evoluir dos tempos, este sinal pessoal converter-se-ia em sinal familiar, passando a gozar da tutela supra referida.
Quer pelo seu significado, quer pela sua composição, o brasão constituiu-se como uma insígnia honorífica ao lado da sua função de identificação.
É, assim, o brasão um sinal figurativo que cumpre uma dupla função. Uma função de identificação e uma função honorífica.
E se a função honorífica se encontra “apagada”, função dos princípios consagrados pelo Estado Republicano, cujos fundamentos normativos já aqui, noutras mensagens, deixamos registados, a função de identificação mantêm-se.
Não obstante o Estado Republicano ter deixado de reconhecer a sua função honorífica, o seu valor jurídico permanece na exacta medida em que constitui uma insígnia familiar ou de pessoa jurídica.
Para remate destas breves “linhas”, refira-se que o brasão, embora revestindo normalmente carácter nobiliárquico, emergiu, noutras formas como « brasões de cidadania a famílias não nobres, mas de civilização superior » ( Cfr. Arnone, Diritto nobiliare italiano, 1935, pág.s 201-201, apud Adriano De Cupis, “ Os Direitos de Personalidade”, pág.s 305 a 307 )
Dito isto, e na exacta medida em que se atribui ao brasão a mesma tutela do nome, com algumas especificidades, fica, de algum modo, esclarecida a sua dúvida.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Nas Ordenações Filipinas
Caros Amigos e “Confrades”,
Continuando a nossa “peregrinação” normativa, peguemos nas Ordenações Filipinas, e vejamos o que elas nos dizem sobre o assunto em epígrafe.
Do Livro Quinto, Titulo XCII, transcrevo:
« Como os Blasões das armas e appelidos / que se dão áquelles, que per honrosos / feitos os ganharão, sejão certos sinaes e / prova de sua Nobreza e honra, e dos que / delles descendem, he justo que essas insi- / gnias e appellidos andem em tanta certeza, / que suas familias e nomes se não confun- / dão com as dos outros, que não tiverem / iguaes merecimentos.
E que assi como elles per serviços feitos / a seus Reys, ou Republicas se assinalarão / e aventajarão dos outros, assi sua preemi- / nencia e dignidade seja a todos notória.
Polo que ordenamos, que qualquer pes- / soa, de qualquer qualidade e condição que / seja, que novamente tomar armas, que de / Direito lhe não pertenção, perca sua fa- / zenda ametade para quem o accusar, e a / outra para os Captivos. /
E mais perderá toda sua honra e privi- / legio de Fidalguia e linhagem, e pessoa, que / tiver,
e seja havido por plebêo, assi nas / penas, como nos tributos e peitas, e sem / nunca poder gozar de privilegio algum, / nem honra, que por razão de sua linha-/ gem, ou pessoa, ou de Direito lhe pertença./
1. E o que tiver armas suas, e as deixar / em todo, tomando outras, que / lhe não pertenção, haverá as mesmas penas, / e polo mesmo caso perca as suas armas / proprias, sem as mais poder ter, nem dellas / usar.
2. E quem acrescentar nas suas armas / alguma cousa que per Direito não possa / nellas acrescentar, ou dellas tirar alguma / cousa, que per Direito não podia tirar, in- / correrá em pena de dous annos de degredo / para África, e pagará cincoenta cruzados / para o Rey de Armas Portugal, ou / outro Official de Armas, que o accusar,e / não usará de outras armas, se não das que / propria e direitamente forem suas. /
3. E além das penas acima ditas em cada // hum dos ditos casos, queremos que os / que de novo tomarem armas, não lhes per- / tencendo, ou acrescentarem, ou tirarem ás / que tiverem, hajão mais por pena, que em / quaesquer demandas, que trouxerem, ora / sejão autores, réos, assistentes, ou oppoen- / tes, postoque no principal sejão vencidos, ou / vencedores, sejão sempre condenados nas / custas para a parte contraria em tresdobro, / assi nas do processo, como pessoaes. /
4. E para que cada hum saiba a ordem, / per que deve trazer as armas, que per Di- / reito lhe pertencem, declaramos que o / Chefe de Linhagem será obrigado trazer as / armas direitas, sem differença, nem mis- / tura de outras algumas armas. /
E sendo Chefe de mais que huma Li- / nhagem, será obrigado trazer as armas / direitas de todas aquellas Linhagens, de / que fôr Chefe, e sem mistura em seus / quarteis, segundo lhe será ordenado per / Portugal Rey de Armas.
E os outros irmãos, e todos os outros da / da Linhagem as hão de trazer com a diffe- / rença ordenada no nobre Officio da Ar- / maria.
E assi poderão trazer até quatro armas, / se quizerem, daquelles, de quem descen- / derem, esquarteladas, e mais não.
E se quizerem tomar sómente estremes / as armas da parte de suas mães, podel-o-hão / fazer. /
E os bastardos hão de trazer as armas com / sua quebra da bastardia, segundo ordem / da Armaria. /
5. E não poderá pessoa alguma trazer as / armas do reino direitas, postoque sejão / misturadas com outras armas, mas hão de / ser trazidas no quartel direito com diffe- / rença, assi como a cada hum pertence / trazel-as, convém a saber, as que vem per / bastardia, com a quebra da bastardia, e / as outras com a differença ordenada pelo / Rey de Armas. /
A continuar.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Tutela jurídica do brasão
Meu Caro Eduardo Albuquerque
Os meus agradecimentos pelas suas valiosas informações.
De facto,o Forum também deve ter uma função"didáctica".Felizmente,aparecem intervenções,como as deste tópico e de outros,onde tenho aprendido muito.
Com os meus melhores cumprimentos,
Rafael Carvalho
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RE: Direito Subsidiário - lacunas da lei
Caros Confrades,
Na sequência das minhas precedentes mensagens, cumpre acrescer que ao corpo legislativo apresentado, e no quadro normativo-jurídico, haverá que ter em mente o que era a lei e a que outras fontes de direito recorriam os juristas coevos.
Ora lei era toda a manifestação de vontade do soberano que visava conformar o ordenamento jurídico concreto.
É paradigmática a expressão contida nas Ordenações Manuelinas, livro III, título LX, § 1º, já por mim referida em outra mensagem, mas que por clareza aqui reproduzo:
« EL REY HE LEI ANIMADA NA TERRA, & PODE FAZER & DESFAZER LEIS »
Com a lei caminhava o costume em igual pé e dignidade, quer fosse praeter-legem, quer fosse contra-legem, como vontade tácita do monarca.
Por isso, os juristas da época, para além das normas corporizadas em texto, tinham de o considerar.
Mas para que o costume tivesse aquele valor era necessário:
que tivesse sido observado pela maioria dos destinatários;
que tivesse sido acatado durante um certo espaço de tempo, dez anos para o praeter-legem e quarenta para o contra-legem;
ter por fim o bem comum.
Acrescia a tudo isto a necessidade de cobrir os casos omissos da lei, as ditas lacunas.
Ora na ausência de lei explicita, os juristas recorriam ao direito subsidiário, cujas fontes se encontram já nas Ordenações Afonsinas, livro II, título IX que passo a transcrever:
« Estabelecemos, e poemos por Ley, que quando alguû caso for trazido em pratica, que seja determinado per algûa Ley do Regno, ou estillo da nossa Corte, ou custume dos nossos Regnos antigamente usado, seja por elles julgado, e desembargado finalmente, nom embargante que as Leyx Imperiaes acerca do dito caso ajam desposto em outra guisa, porque
ONDE A LEY DO REGNO DISPOEM, CESSAM TODALAS OUTRAS LEYS, E DIREITOS;
e quando o caso, de que se trauta, nom for determinado per ley do Regno, mandamos que seja julgado, e findo pelas LEYX IMPERIAAES, E PELOS SANTOS CANONES.
1. E acontecendo, que acerca de tal caso as Leyx Imperiaes sejam contrairas aos Canones, mandamos que assy nas cousas temporaes, como espirituaaes, se guardem os Canones, se o caso tal for, que guardando as Leyx Imperiaaes, traga pecado;
pode-se poer enxemplo no possuidor de maa fe, que segundo as Leyx Imperiaaes per trinta annos possoindo sem título, prescreve a cousa alhea, e segundo Direito Canonico, o possuidor de maa fé nom pode prescrepver per nenhûu tempo:
se em tal caso se guardassem as Leyx Imperiaaes, guardando-as, necessariamente trazeria pecado ao possuidor, o que nom devemos a consentir, maiormente que em tal caso devemos necessariamente obediencia ao Padre Santo, e aa Santa Igreja, de que os Canones procedem, a qual nô devemos em nenhuû caso aos Emperadores, de que as Leyx Imperiaaes procedem;
e por tanto convem que em tal caso, e em outros semelhantes se guarde o Direito Canonico, e nom o Direito Imperial:
e no caso temporal, que a guarda das Leyx Imperiaaes nom traga pecado, ellas devem seer guardadas, nom embargante que os Canones sejam em contraira desposiçom.
2. E se caso, de que se trauta em pratica, nom fosse determinado per Ley do Regno, ou estillo, ou custume suso dito, ou Leyx Imperiaaes, ou Santos Canones,
entom mandamos que se guardem AS GROSAS D’ACURSIO encorporadas nas ditas Leyx.
E quando pelas ditas grosas o caso nom for determinado, mandamos, que se guarde a OPINIOM DE BARTHOLO, nô embargante, que os outros Doutores diguam o contrairo;
porque fomos bem certos, que assy foi sempre usado, e praticado em tempo dos Reyx meu Avoo, e Padre da gloriosa memoria;
e ainda nos parece, polo que já algûas vezes vimos, e ouvimos a muitos Leterados, que sus opiniom comunalmente he mais conforme as razom, que a de nenhuû outro Doutor;
e em outra guisa seguir-sai grande confusom aos Desembargadores, segundo se mostra per clara esperiencia.
E acontecendo caso, ao qual per nenhuû dos ditos modos nom fosse previsto, mandamos que o NOTEFIQUEM A NOS PERA O DETERMINARMOS;
porque nom tamsomente taaes determinações som desembargo daquelle feito, que se trauta, mais som Ley pera desembargarem outro semelhante.
3. Item. Despois desto achamos outra duvida.
Se acontecesse caso, em o qual nô fosse materia de pecado, o qual nom fosse determinado per Ley do Regno, nem per estillo da nossa Corte, nem per custume dos nossos Regnos, nem per Ley Imperial, e fosse determinado per Canones per huû modo, e pelas grosas, e Doutores das Leyx per outro modo, se se guardará em tal caso o texto dos Canones, ou as grosas dos Doutores das Leyx Imperiaaes;
e a causa desta duvida he, porque as grosas, e Doutores do Direito Civil se fundam per Leyx Imperiaaes, as quaaes allegam a provar sua teençom:
em tal caso SEJA REMETIDO AA NOSSA CORTE, E GUARDE-SE SOBRE ELLO A NOSSA DETERMINAÇOM.»
A este propósito ver também as Ordenações Manuelinas, livro II, título V e Filipinas, livro III, título LXIV
Por isso, em matéria do uso de armas, caso a questão fosse omissa, em última análise seria o Rei que a decidiria.
Também convirá não esquecer que a ignorância da lei era reinante, poucos a conheceriam, desde logo porque a maioria era analfabeta, e mesmo que a conhecessem não seria muito provável que familiares viessem acusar outros seus familiares pelo uso indevido ou anómalo de armas.
No fundo era o nome da família que estava em “jogo”.
E sem denúncia, como já foi dito noutra mensagem, difícil seria o procedimento.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Confirmação de mercês, chancelaria, selo
Caros Confrades,
Em aditamento às minhas mensagens anteriores, e no contexto da transmissão de direitos, e da necessidade da sua CONFIRMAÇÃO, aqui fica o respectivo texto legal.
Ordenações Filipinas, Livro II, título XXXVIII, § 1, com fonte nas Manuelinas Livro II, título XVIII, § 1.
« E porque algumas pessoas tem de Nós algumas DOAÇÕES e MERCÊS em suas vidas, e para seus filhos, ou de juro e herdade,
( Mercê de juro e herdade, i.é., mercês cujo titulo passa aos herdeiros daquelle a quem se deu, sem depencia de nova mercê, exigindo-se tão somente confirmação. Senhor de juro, o que não he de mercê, em vida do doado )
e per seus fallecimentos os ditos seus filhos, segundo nossa Ordenança, hão de tirar CARTA DE CONFIRMAÇÃO per sucessão dos ditos seus pais, e algumas vezes por starem em posse de terras, rendas e cousas, que tem por doação, o não querem fazer,
mandamos que as taes pessoas sejam OBRIGADAS A REQUERER CONFIRMAÇÃO, e a tirarem e passarem pela Chancellaria do dia, que seus pais fallecerem, até seis mezes primeiros seguintes.
E não o fazendo assi, queremos que per esse mesmo caso incorram em pena de, alem de PAGAREM A CHANCELLARIA, que conforme ao Regimento devem, pagarem mais para Nós, ou para os Rendeiros daquelle anno, em que seus pais falleceram, outro tanto, quanto montar na metade da dita Chancellaria:
e os Officiais della haverão todos seus Direitos, e mais a metade do que nelles montar, se passados os ditos seis mezes, dentro de outros seis os vierem tirar da Chancellaria.
E NÃO OS TIRANDO DENTRO DE HUM ANNO QUEREMOS, QUE EM SUA VIDA SEJA A MERCÊ NENHUMA. »
E acrescenta a dita disposição:
§ 3
« E para que a todo o tempo se possa saber, e ver se as ditas Cartas passaram na Ordenança sobredita, mandamos ao Scrivão da nossa Chancellaria, que ponha nas costas dellas, com o sinal da paga, os dias do mez, e o anno, em que forem despachadas na dicta Chancellaria. »
Os fundamentos para que as Cartas e Alvarás passassem pela Chancelaria encontram-se consagrados no respectivo princípio que passo a transcrever:
« Muitas vezes algumas pessoas, a que per Nós são feitas mercês e doações, ou concedidos privilegios e graças, ou dados Officios e outras cousas, assi per Alvarás, como per Cartas, depois de as terem assinadas, as levam sem pagarem nella os Direitos, que são obrigados pagar;
( Estes direitos equivalião a um sello, por isso chamavão-se – SELLO DAS MERCÊS, e neste sentido já erão contemplados nas Ordenações da Fazenda de 17 de Outubro de 1516 cap. 241 § 4, e aos mesmos referia-se a Ord. Manuelina do liv. 2 t.18 pr.
Reinando Philippe I promulgou-se para a Chancellaria um novo Regimento com data de 16 de Janeiro de 1589, creando-se os DIREITOS, que ao diante forão denominados velhos, para se distinguirem dos novos creados em 1643 e 1661.
No reinado de Philippe III creou-se a contribuição das MEIAS ANNATAS por Al. De 12 de Setembro de 1631, que se addicionarão às do Regimento de 1589.
Depois da restauração, promulgou-se o Al. de 29 de Janeiro de 1643, em que alterou-se a anterior Legislação sobre esta matéria, creando-se tão sómente por trez annos o imposto dos NOVOS DIREITOS, que ainda hoje durão, bem accrescentados;
mas esse mesmo Alvará foi de novo reformado, alargando-se mais o horizonte do Fisco com o Regimento de 11 de Abril de 1661: ... )
sendo defeso per nossas Ordenações, os Officiaes lhas guardam e cumprem por negligencia, ou favor, de que se segue perda e dano às partes, e prejuizo a nosso serviço, por não serem vistas pelo Chanceller Mór e Officiaes da nossa Chancellaria, onde devem ser examinadas e emendadas, as que com justiça não devem passar, para se escusarem duvidas e demandas, que sobre isso recrescem.
Mandamos que as pessoas, a que fizermos doações e mercês de algumas Villas, Castellos, Terras, Jurisdições, Rendas, Direitos, Reguengos, Tenças, Padroados de Igrejas, ou quaesquer outras cousas, que concedermos per nossas Cartas ou Alvarás, sejam obrigadas de as passar e tirar de nossa Chancellaria do dia, que as Cartas ou Alvarás forem feitos, até quatro mezes primeiros seguintes.
( O praso para a execução das Leis era de oito dias na Côrte, e de tres mezes nas Comarcas do Reino – Ord. Do liv. 1 t. 2 §10...
Pegas no respectivo com. diz que o prazo de quatro meses fixado nesta Ord. tinha sómente execução no Reino de Portugal e lugares de Africa, mas que quanto ao Brazil, Guiné e Ilhas o prazo estendia-se a um anno; e para as partes da India o espaço era de dous annos, de conformidade com o Al. De 23 de Maio de 1599; o qual não obstante ser anterior a publicação das Ordenações, era observado...)
E passando o dito tempo, não o cumprindo assi, mandamos ao Chanceller Mór e Officiaes da Chancellaria, que lhes não recebam taes Cartas ou Alvarás, nen os sellem, nem passem pella Chancellaria:
e as mercês que per elles tivermos feitas, sejam nemhumas. »
Acrescenta esta Ordenação:
« 2. E se Nós houvermos por bem, que sem embargo do dito tempo de quatro mezes, ou do anno acima declarado, toda via passem as Cartas e Alvarás, e se sellem, por fazermos nisso mercê a algumas pessoas, pagarão a Chancellaria dellas pela sobredita maneira.
E será a dita Chancellaria do anno, em que a Carta, ou Alvará for feito, e os Officiaes haverão dellas todos seus Direitos, e mais a metade da somma, que se nos Direitos montar, como acima dito he. »
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Nota ao §4º Tít. XCII, Livro V das O.Filipinas
Caros Confrades,
Não tendo sido transcritas as notas ao § 4º, Título XCII, do Livro V das Ordenações Filipinas, aqui fica o traslado:
« Chefe de linhagem
i.e. Fidalgo que descende por sua familia, em linha recta, que gosa por sua ascendencia dos fóros de Nobreza, e he o primeiro na sua família
Quartel
uma divisão do escudo em quatro, e extensivamente qualquer divisão, ainda que este se divida em mais porções ou quarteirões
Rey d’ Armas
he o official publico, que tem a seu cargo escrever as genealogias dos Nobres, e suas allianças; explicar o que toca aos brasões dellas; dar cartas de brasão, etc.
Em heraldica, chama-se armas, as insignias de que usão as famílias nobres nos seus escudos para se distinguirem umas das outras.
Da mesma sorte se nomeão as dos Reys, Reinos, Cidades, Ordens Religiosas, etc.
Também se dá este nome aos signaes que se pintão no escudo, ou se abrem sendo de materia tal, como pedra, metal, etc.
Provavelmente se chamou - Portugal, porque taes Funccionarios em outros paizes tinhão os respectivos nomes.
Esquarteladas,
i.e. feito em esquaques.
Em heraldica, esquaques significa xadrez de côres alternadas.
Estremes
Em heraldica armas estremes no brazão, significa sem mistura das de outra família
Quebra de bastardia
Em heraldica, no brazão a quebra significa a differença que nelle traz quem não he chefe da família, a qual he uma cotica, que atravessa o escudo em banda:
Ha tambem quebra de bastardia, que os bastardos devem trazer nos escudos.
A cotica he uma peça como a banda, porém menos larga: lança-se ao través do escudo. »
Melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Do uso de brasão, "rectius", escudo de armas
Estimado confrade Eduardo Albuquerque,
Permita-me que lhe peça ajuda na exegese do diploma legal que teve a amabilidade de transcrever.
Em inúmeras referências bibliográficas é dito que em Portugal o uso de armas heráldicas estava reservado à fidalguia. No entanto, lendo este artigo:
"5. E porque isto assi inteiramente se guarde, co- / mo he muita razam que seja, Ordenamos, e Man- / damos, que qualquer pessoa de qualquer qualidade, / e condiçam que seja, que novamente tomar armas, / que de Dereito lhe nom pertençam (...)"
E outros de igual índole parece-me mais apropriado concluir que não era vedado o uso de armas à plebe; o que estava interdito era a apropriação de armas alheias.
Existe algum artigo das antigas Ordenações, sejam elas manuelinas ou filipinas, que explicitamente reserve os brasões para o estamento nobiliário?
Antecipadamente grato pela sua atenção,
Francisco Cercal
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