Vasco da Gama, lado materno
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Vasco da Gama, lado materno
Caros Confrades
Venho dar-vos acesso ao meu estudo:
Ligações familiares de Vasco da Gama pelo lado materno
por
Sérgio Sodré de Castro
Ao estudar as ligações familiares do grande navegador Vasco da Gama pelo lado materno é obviamente imperioso começar por determinar quem foi a sua mãe e afinal ele próprio. Embora assim pareça, à partida, a questão não é absolutamente absurda, porque é um facto comprovado que, ainda solteiro, seu pai teve um primeiro filho bastardo, anterior ao casamento com Isabel Sodré, a quem deu o mesmo nome e do qual nada transpirou para a História excepto ter existido e na juventude ter tomado a primeira tonsura no mesmo dia que seus meios-irmãos, conforme mais à frente pormenorizarei.
O problema está resolvido nos escritos dos grandes cronistas coevos no sentido do 2º Vice-Rei da Índia pertencer à família Sodré pelo lado materno. Efectivamente, João de Barros e Diogo do Couto afirmam que Vicente Sodré era tio de Vasco da Gama e irmão de sua mãe; Damião de Góis dá Vicente Sodré como tio de Vasco da Gama; Fernão Lopes de Castanheda e Gaspar Correia escrevem que Vicente Sodré era seu parente; Gaspar Correia, que esteve na índia com Vasco da Gama já Vice-Rei, e Diogo do Couto, em tratado sobre os Gamas, asseveram que este era irmão mais novo de Paulo da Gama. Também o registado, neste contexto, nas relações das naus e armadas da Índia é coerente com os principais cronistas.
Ora se o descobridor tivesse sido o Vasco da Gama bastardo, então não era sobrinho de Vicente Sodré, nem seu parente, nem irmão mais novo de Paulo da Gama. Além de que, a ser verdade, a bastardia jamais deixaria de ser lembrada e apontada pelos seus inúmeros inimigos ao longo dos tempos, o que não aconteceu…
Outrossim, na época, não faz qualquer nexo que o chefe da família, Paulo da Gama, aceitasse a desonra de ser subalterno de um meio-irmão bastardo. Ao invés, note-se que a forte ligação fraterna do Vasco da Gama histórico ao seu irmão mais velho Paulo Gama o levou a quedar-se na cidade de Angra, na Ilha Terceira, até à consumação da morte deste, adiando o regresso a Lisboa, onde o D. Manuel o aguardava, enquanto manda Nicolau Coelho e João de Sá prosseguirem viagem. Nicolau chega em Julho de 1499, Gama só dois meses mais tarde! Enfim, julgo que a questão é líquida e não merece mais atenção.
A dúvida vai ser outra, é que durante séculos, e ainda hoje, os genealogistas, copiando-se uns aos outros, induziram em erro os melhores e mais modernos autores que versaram a figura do Conde-Almirante Dom Vasco da Gama, descobridor do caminho marítimo para a Índia, quanto aos seus avós maternos, ao propalarem que sua mãe, Isabel Sodré (mulher de seu pai, Estevão da Gama, Alcaide-mor de Sines), era filha de Maria Sodré e de João de Resende, Provedor das valas de Santarém.
Tanto quanto me apercebi, apenas Cristovão Alão de Morais, na Pedatura Lusitana, aponta João Sodré como o pai de Isabel Sodré, mas mantém o erro de apresentar Maria Sodré como a mãe. Na geração antecedente, Maria Sodré é referida com filha de um tal Fradique Sodré, figura de que não encontro documentação indiscutível, pelo que aqui pararia a investigação genealógica.
Obras bem recentes mantêm este erro, porém já nada o justifica depois da Academia Portuguesa de História haver publicado, em 1990, a matrícula de ordens da diocese de Évora (1480-1483), pela qual Isaías da Rosa Pereira prova que Vicente Sodré (irmão mais novo de Isabel Sodré) é filho de João Sodré e de Isabel Serrã. (feminino de Serrão). Assim, é este casal que deve ser considerado sendo o dos avós maternos de Vasco da Gama, o qual recebeu a primeira tonsura juntamente com o seu tio Vicente, em Sines, a 5 de Novembro de 1480, seu meio-irmão Vasco, e irmãos inteiros Paulo, João e Pedro.
A matrícula mencionada demonstra cabalmente que Vasco da Gama era filho terceiro do casal Estêvão Gama e Isabel Sodré e que foram seus irmãos mais velhos outro do mesmo nome (meio-irmão, filho ilegítimo de mãe solteira de nome desconhecido, quando Estêvão ainda era solteiro), Paulo da Gama e João Sodré (espelhando a tradição de dar a um filho o nome do avô materno) e irmão mais novo Pedro da Gama. Embora não referidos na matrícula de ordens, também foram seus irmãos mais novos Aires da Gama e Teresa da Gama.
Esta descoberta é prenhe de consequências genealógicas, e é este filão que me proponho explorar, ligando o Conde-Almirante aos Sodrés do século XV e primeira metade do século XVI, e estes entre si, sem recorrer a genealogias manuscritas, excepto quanto estas mencionam e permitem alcançar documentação histórica válida.
João Sodré, avô materno de Vasco da Gama, era Almoxarife do Armazém de Lisboa, Escudeiro e Criado da Casa Real, em 1447. D. Afonso V fez-lhe doação de uma quinta no Porto, a 25 de Março de 1455, e de bens confiscados a partidários do infante D. Pedro, a 10 de Julho de 1449. Sua mulher, Isabel Serrã, era donzela da Infanta D. Beatriz e filha de Afonso Lopes e de Teresa Eanes, amos da Rainha de Castela, D. Isabel (filha do Infante D. João, Condestável do Reino e Administrador da Ordem de Santiago).
Teresa Eanes, casara, em segundas núpcias, com Fernão Sodré, pai de João Sodré. Assim, Fernão Sodré e Teresa Eanes promoveram o casamento entre dois dos seus filhos de anteriores casamentos e, a 9 de Junho de 1447, fazem-lhes doação de todos os seus bens sitos em Montemor-o-Novo, Alcácer, Almada, Lisboa e Mafra. Também os irmãos de Isabel Serrã (João Serrão e Inês Serrã) abdicaram das respectivas heranças a favor do casal.
Deste modo, descobre-se que Fernão Sodré é o bisavô materno de Vasco da Gama. Criado e Escudeiro de D. João I, era Escrivão da alfândega de Lisboa quando, a 27 de Agosto de 1437, lhe foram confiscados diversos bens na sequência do desmantelamento de toda a equipa alfandegária por apropriação ilícita de mercadorias. Terá acabado como Reposteiro-mor de D. Isabel, Rainha de Castela (segundo nota de D. Flamínio de Sousa). Julgo muito provável que tenha posto a seu filho o nome de seu pai, pelo que Fernão Sodré seria filho de João Sodré, que a Crónica de D. Pedro de Meneses regista como Cavaleiro em Ceuta entre 1415 e 1418, pois é referido logo antes do cerco da praça pelo Rei de Fez, de 1418-19, devendo ter estado entre os cerca de 19.000 combatentes que conquistaram a cidade, a 21 de Agosto de 1415.
Deste modo, é de crer que este João Sodré foi o trisavô materno de Vasco da Gama, representando a primeira geração de Sodrés portugueses (a despeito de haver quem fale de um João Sodré pai de João Sodré). O seu pai terá entrado em Portugal no contexto das contingências da aliança com Inglaterra e, em conformidade com diversa documentação que consultei e publiquei (o “Brasão do Sodré-Chefe”, entre outros), descenderia do casal inglês formado por Joane Sudley e William Boteler, casados cerca de 1341.
Os Sodrés portugueses terão conservado o sobrenome feminino (aportuguesado) e o brasão do lado masculino. Esta persiste como a única explicação documentada para a origem do nome e armas, outras hipóteses nem chegam a sê-lo por carecerem em absoluto, até ao momento, de base documental publicável. A cronologia também demonstra uma continuidade no uso das armas e no estatuto social que arreda qualquer hipotética enfabulação.
Duarte Sodré é a figura cimeira da família Sodré durante o século XV, conforme ajuízo da documentação que consultei. Terá nascido em Santarém, pois aí era a casa de seus pais. Em 1465, era escudeiro da Casa do Infante D. Pedro (ex-Condestável do Reino e efémero Rei da Catalunha). Cavaleiro da Ordem de Cristo e Comendador de Santa Ovaya do Juncal, na mesma Ordem, antes de 1475. Vedor da Casa do Duque de Viseu, D. Diogo II e, mais tarde, Vedor da Casa do Duque de Beja, futuro Rei D. Manuel.
É autorizado a instituir um morgado nos reguengos de Tojoza e Alviela (termo de Santarém) com a obrigação dos sucessores seguirem o apelido Sodré, por carta de 03 de Agosto de 1486 registada na Chancelaria do Rei D. João II, na qual é designado como Cavaleiro da Casa Real. Também recebeu do Rei D. João II, em Novembro de 1492, certos bens e herança no lugar de Romão, no almoxarifado da Guarda, tomados a três moradores locais.
Pelo menos desde 1494, foi Alcaide-mor de Seia. A 26 de Janeiro de 1493, já era Comendador e Alcaide-mor de Tomar (ou seja, era comendador da vila e governador militar do castelo, desempenhando diversas funções e exercendo determinados direitos e respectiva cobrança) e Provedor das capelas do Infante D. Henrique (o Navegador) com 7 marcos de prata de ordenado, o que era inerente a esta alcaidaria. Tinha pois a responsabilidade do cumprimento e fiscalização dos sufrágios por alma do Infante.
Comendador da Cardiga (uma das principais comendas da Ordem de Cristo), em data posterior ao mesmo dia de 26 de Janeiro de 1493 (pois nesse dia o Comendador ainda era Heitor de Sousa). A 13 de Fevereiro de 1496 era Vedor da Casa Real.
Fez testamento em Montemor-o-Novo, em 1496. Documento de 07 de Agosto de 1500 refere-o como Fidalgo régio, Comendador e Alcaide-mor de Tomar. Assim, foi indubitavelmente uma das mais importantes personagens da Ordem de Cristo do seu tempo. Faleceu a 25 de Agosto de 1500. Teve geração legitimada de Catarina Nunes.
Está sepultado junto ao altar-mor da Igreja de Nossa Senhora do Monte, em Santarém, tendo a sua lápide, epitáfio, escudo de armas pleno de Sodré, ladeado de espada e lança-pendão.
Epitáfio: “Aqui jaz o muito honrado Duarte Sodré que foi veador da caza D’ El Rey D. Manuel e alcaide mor das vilas de Tomar e Sea e comendador da cardiga o qual descende e vem da linhagem da caza do Sodrea que he caza de grandes senhores do Reyno de Inglaterra e finou-se aos 25 dias de Agosto de mil e quinhentos.”
Destarte, depara-se-nos uma importante fonte epigráfica, elucidativa quanto à origem social e nacional da família Sodré (que responde a alguns recentes absurdos indocumentados onde se confunde o setecentista Cais do Sodré com alfândegas quatrocentistas…).
Segundo escreveu o seu filho Manuel, terá morrido pobre devido à sua generosidade e, enquanto viveu, era muito valido junto do Rei e conhecido no Reino. Entre os seus descendentes, aqueles que foram Senhores de Águas Belas (Ferreira do Zêzere) e usavam o apelido Sodré Pereira eram considerados os chefes do nome e armas de Sodré. Tanto mais que sucederam no morgado fundado por Duarte Sodré.
No seu testamento, lido por D. Francisco de Meneses, Cónego de Évora, Duarte Sodré indica como seus irmãos a Antão Sodré, seu testamenteiro, e Maria Sodré (esta é que terá desposado João de Resende) e nomeia seu filho Francisco Sodré para administrador do seu morgado, a que também deixou vinculadas algumas casas em Santarém herdadas de seus pais.
Teve filhos mais velhos nas pessoas de João Sodré (que renunciou à herança e se fez frade franciscano, falecendo antes de 1496) e Leonor Sodré, ambos legitimados em 1486. Esta e suas irmãs Isabel Sodré e Inês Resende foram freiras no Mosteiro de Santa Clara, em Santarém. Ainda foi pai de Catarina Sodré, casada em Santarém com Paulo Vaz Pimenta, e de Manuel Sodré (cuja intensa actividade na Índia é retratada na carta em anexo).
Francisco Sodré foi legitimado a 12 de Fevereiro de 1496. A 24 de Outubro de 1500, é nomeado Alcaide-mor de Seia. Cavaleiro-Fidalgo da Casa do Rei D. João III com 1700 reis de renda. Juntamente com o seu irmão Manuel, esteve na segunda conquista de Goa sob o comando do grande Afonso de Albuquerque. Morreu em serviço na Índia, entre 1539-1544. Casou com Violante Pereira, filha de João Pereira, 4º Senhor de Águas Belas (Ferreira do Zêzere), ficando este senhorio na posse da família Sodré Pereira até ao reinado de D. José.
A enorme dificuldade de detectar qual o pai de Duarte Sodré afinal deriva do facto de que ele teve este apelido pelo lado da mãe, pois é filho de Gil Pires de Resende, Provedor dos valados de Santarém, assinalado como Contador na comarca dos almoxarifados de Santarém e Abrantes em documento de chancelaria de 21 de Dezembro de 1447 (regência do Infante D. Pedro, Duque de Coimbra), bem referenciado em documentos da chancelaria do Rei D. Afonso V, e de sua mulher, Inês Sodré, provável irmã do Fernão Sodré acima assinalado como Escrivão da Alfândega de Lisboa, em 1437.
Desta sorte, Duarte Sodré foi neto do antedito João Sodré, Cavaleiro em Ceuta com o 1º Governador, D. Pedro de Meneses. Ademais, o facto de ter escolhido o nome de João para o filho mais velho indicia que esse seria o nome do avô.
A chave para estas ligações está na carta régia, de D. Afonso V, passada ao Escudeiro da Casa Real Antão Sodré (irmão de Duarte) em Tentúgal, a 2 de Setembro de 1464, fazendo-lhe mercê de Contador dos valados de Santarém e Abrantes, juntamente com seu pai Gil Pires de Resende (e não cunhado como já vi escrito). Antão Sodré subiria a Cavaleiro, e a documentação demonstra que, tal como seu pai, prosseguiu carreira em diferentes cargos de natureza administrativa, nomeadamente o de Corregedor de Entre Tejo e Guadiana em 1482.
Ora há razões para crer que este Gil Pires de Resende possa ter sido também o pai de Vasco Gil Sodré, Cavaleiro da Ordem de Cristo, o primeiro, ou um dos primeiros, povoador da Ilha Graciosa, entre 1465-1470. A utilização do nome Gil e o testemunho do seu filho Diogo Vaz Sodré (para obter a carta-de-armas dada a 23 de Março de 1503) de que sua avó era de origem inglesa apontam neste sentido, além de que a documentação relaciona Vasco Gil e Duarte Sodré com Montemor-o-Novo (por vezes erradamente trocado com Montemor-o-Velho). Outrossim, é de assinalar que, segundo depoimento do Capitão André Furtado que viu a certidão, Diogo Vaz Sodré requereu que lhe dessem as Armas de seus avós, que por direito lhe pertenciam, da Casa dos Sodrés de Inglaterra. Vasco Gil Sodré casou com D. Beatriz Gonçalves da Silva e terá tido oito filhos, como enumera Oriolando Silva.
Todavia, a personagem masculina da família Sodré mais unida a Vasco da Gama foi o seu tio Vicente Sodré, irmão mais novo de sua mãe Isabel Sodré, que fica na História como o primeiro Capitão-mor de uma esquadra europeia destacada a título permanente para a Índia (baseada em Cochim na costa do Malabar), incumbido de levar a cabo missões de domínio da navegação no Oceano Índico. Foi o primeiro Português a alcançar a Ilha de Socotorá e a explorar as costas do Sul da Península Arábica. Como Sota-Capitão levou o irmão Brás Sodré, antigo Cavaleiro da famosa Guarda de Ginetes de D. João II (na qual foi companheiro de Afonso de Albuquerque).
Vicente Sodré terá tido um papel de relevo na decisão de D. Manuel de substituir o indigitado Pedro Álvares Cabral por Vasco da Gama, na viagem para a Índia que partiu de Lisboa a 10 de Fevereiro de 1502, indo empossado de comando próprio de uma esquadra de cinco velas destinada a ficar no Índico e como Vice-Almirante do conjunto da armada, logo a seguir a seu sobrinho.
Com o regresso de Vasco da Gama a Portugal, Vicente Sodré ficou incumbido de duas tarefas estratégicas aparentemente inconciliáveis, porquanto tinha, por um lado, de garantir a protecção das feitorias portuguesas e dos Rajás de Cochim e de Cananor, nossos aliados, contra o poderoso Samorim de Calecute, e, por outro, de explorar e patrulhar as costas da Arábia e o Estreito do Bab el Mandeb, bloqueando as ligações marítimas entre o Cairo e os portos fornecedores das especiarias.
Só com cinco navios procurou fazer o possível, mas a inexperiência de navegação naqueles mares não lhe permitiu descortinar a aproximação de um furacão que causou a sua morte, por naufrágio, junto das ilhas de Curia Muria, em 30 de Abril ou 01 de Maio de 1503. Eliminado fisicamente, foi fácil a alguns denegrir a sua actividade, mas os diversos factores intervenientes merecem análise mais profunda, o que modestamente tentei realizar em estudo evocativo já concluído.
Em finais de 1500 ou no ano seguinte, Vicente Sodré torna-se Alcaide-mor de Tomar e Provedor da alma do Infante D. Henrique, cargos que pertenciam ao falecido Duarte Sodré e que não passaram para o filho deste Francisco (apenas herdou o de Alcaide-mor de Seia). Teve dois filhos, Fernão Sodré (nome do avô de Vicente) e João Sodré (nome do pai de Vicente). Fernão, legitimado por carta régia de 5 de Outubro de 1501, filho de Isabel Fernandes, foi Cavaleiro da Casa Real de D. João III e chegou a Alcaide-mor e Feitor de Ormuz, por carta régia de 4 de Fevereiro de 1528; João foi Escudeiro-Fidalgo. O irmão de Vicente Sodré, Brás Sodré, foi pai de Simão Sodré, figura assaz referenciada pelos cronistas, que serviu largos anos na Índia, sobretudo como comandante de navios.
Em 1524, o Vice-Rei, D. Vasco da Gama, nomeou Simão Sodré Capitão-mor de uma esquadra de quatro velas com que derrotou seis navios de piratas nas Maldivas. Este foi um verdadeiro homem do mar, realizando pelo menos três viagens de ida e volta entre Portugal e a Índia. A 09 de Abril de 1523, zarpou pela primeira vez como Capitão de um navio da armada de Diogo da Silveira. A 24 de Março de 1539, partiu de Lisboa como Capitão da nau Rainha da armada de Pêro Lopez de Sousa. A 25 de Março de 1543, voltou a ir para a Índia como Capitão da nau Conceição Galega da armada de Diogo da Silveira.
Cavaleiro-Fidalgo de El-Rei D. João III, ficou também memória da sua obstinação em, já muito idoso, partir do Reino com tropas para defender a praça de Mazagão cercada pelos mouros, em 1562. Exemplo do que de melhor havia nos antigos Portugueses, acabou, porém, por morrer solteiro e sem descendência.
Ficam, deste modo, desenhadas ligações genealógicas entre os Sodrés do século XV, e começos do seguinte, entre si e com Vasco da Gama, baseadas em documentação segura, que corrigem numerosos erros dos genealogistas. Um ponto interessante a investigar seria a hipótese do forte e constante envolvimento dos Sodrés na Ordem de Cristo haver facilitado o abandono, por parte de Vasco da Gama, da Ordem de Santiago e sua passagem para a de Cristo, algures na primeira metade do ano de 1507, em resposta à ofensa de ter sido coagido a abandonar definitivamente Sines, por acção do Mestre de Santiago, D. Jorge, a que o Rei D. Manuel deu cobertura por alvará de 21 de Março de 1507, favorável a este.
Anexo
O Secretário da Índia, Vicente Pegado, em carta de 1 de Janeiro de 1525, distingue Manuel Sodré como uma das “velhas figuras da Índia” que apoiaram Vasco da Gama no seu regresso à Índia como Vice-Rei, em 1524.
Manuel Severim de Faria apresenta alguma informação sobre aquele fidalgo e transcreve uma sua carta a El-Rei D. João III assaz curiosa, que apresento com comentários meus a fim de melhor situar e esclarecer o texto.
Na mesma Chancelaria (D. João III) acima de vinte e oito folha 74 (livro de ofícios e mercês de 1528) fazemos saber que havendo respeito aos serviços de Manuel Sodré, Fidalgo de Minha Casa, a El Rei meu Senhor e Padre e a mim tem feitos, etc. (....) faz-lhe mercê de Anadel-mor dos besteiros e espingardeiros nas partes da Índia em sua vida, aonde é morador, com ordenado de sessenta mil réis cada ano. Em Almeirim, a dezoito de Fevereiro de 1528.
No livro dos confessados do ano de 1539, 1540 e 1541, que está no armário segundo das mercês e moradias, (talvez perdido, porque não o encontrei na Torre do Tombo) (....) está uma verba debaixo do título de Cavaleiros-Fidalgos que diz assim, folha 16, Manuel Sodré, filho de Duarte Sodré, a dois mil por mês.
No maço vinte e cinco dos moradores da Casa da Rainha está uma carta de Manuel Sodré escrita a El Rei D. João III de Cananor, em dois de Janeiro de 1544, em que dá conta de seus serviços desde o tempo de Jorge de Aguiar, com quem foi à Índia com outro seu irmão que lá morreu em serviço (Francisco Sodré), e que foi a tal ida no ano de 1508, suas palavras são estas: em ser filho de Duarte Sodré, Alcaide-mor que foi de Tomar e Seia, Comendador da Cardiga, em tempo de El Rei que Deus haja (D. Manuel), seu Vedor e muito valido em sua Casa e conhecido no Reino, e por se esmerar em bem servir nos deixou pobres a meu irmão e a mim, não tendo outros filhos (refere-se a Francisco Sodré, porquanto o mais velho, João Sodré, terá falecido novo). Eu Senhor vim na armada de Jorge de Aguiar (morreu em naufrágio nocturno nas ilhas Tristão da Cunha) muito moço e comecei de servir com Duarte de Lemos na costa de Etiópia e Arábia e Ormuz, e ajudei a fazer a Fortaleza de Moçambique (seria a robusta torre que foi erigida em 1508), e depois Dom Afonso de Albuquerque todo o tempo que governou e com ele fui na tomada de Goa (trata-se da reconquista, a 25 de Novembro de 1510), onde quando foi para Malaca me deixou por Capitão da fortaleza e com a Capitania dos besteiros e espingardeiros com que me achei no cerco de Goa (pelo Idalcão de Bijapor, Ismael Adil Xá), quando os mouros entraram a ilha e mataram Rodrigo Rabelo o primeiro Capitão dela e eu ajudei a suster todo o tempo de cerco com muito trabalho e risco de minha pessoa sendo muitas vezes ferido até vir de Malaca Afonso de Albuquerque que a descercou e tomou Benastarim (em Novembro de 1512) outra fortaleza que os mouros tinham na ilha de Goa onde me então achei com ele. Fui ajudar a fazer a Fortaleza de Ormuz onde com uma galeota andei rondando e guardando a ilha que não entrasse gente da terra firme a ela, e assim servi todo o tempo de Lopo Soares (de Albergaria) com quem fui ao estreito a ver Judá (ou seja Jiddah, em 1517) e depois fui com ele ajudar a fazer a Fortaleza de Ceilão (Columbo, em 1517), e assim servi todo o tempo de Diogo Lopes de Sequeira com quem fui ao estreito de Meca (incursão no Mar Vermelho em 1520) e lhe ajudei a fazer a Fortaleza de Chaul e também servi em tempo de Dom Duarte de Meneses, andando sempre de armada e então por me ver pobre, e gastado, e esquecido, e mal provido de Vossa Alteza me casei para com o casamento que me deram me sustentar, o qual tornei a gastar em seu serviço. Começando a servir com o Vice-Rei Conde Almirante (Dom Vasco da Gama, em 1524), e com o Governador Dom Henrique de Meneses fui no descerco de Calecute, quando esteve cercada a fortaleza, com uma galé de que era Capitão, e também fui na destruição de Panané e de Coulete, onde se tomaram cem fustas com muita artilharia e se matou muita gente e assim servi no tempo de Lopo Vaz de Sampaio em começo de sua governança, me deixou na boca do Rio de Chale (um pouco a Sul de Calecute) na mesma galé e uma caravela guardando o rio, que não saíssem dele naus de mouros, que estavam carregadas de pimenta para Meca, e vendo-me assim o Samorim e mouros mandaram sobre mim cem fustas e navios de remos com muita gente e muita artilharia para me tirarem da boca do rio, com os quais navios pelejei um dia pela manhã até noite e com trabalho os lancei de mim, metendo alguns no fundo e matando-lhe muita gente com as espingardas, à vista do Samorim que estava na praia fazendo embarcar a gente de refresco em almadias (este combate terá ocorrido em 1526), e assim servi com Nuno da Cunha e fui sobre Diu (tentativa de conquista falhada, a 15 de Fevereiro de 1531), e assim no fazer da Fortaleza de Chale (em 1530) e na tomada de Baçaim (em 1533), e daí fui com Paulo da Gama para Malaca, e depois estive lá a mais do tempo com Estevão da Gama na guerra e na tomada de Anteritana (?) duas vezes e na derradeira me perdi com ele em uma fusta que se alagou com o tempo onde milagrosamente nos salvámos alguns, e assim também servi com o Vice-Rei Dom Garcia de Noronha e fui de Cananor onde ora vivo com quinze navios de remos, fustas e catures, para ir com ele aos rumes (em 1540), com a qual armada ele muito folgou e com a boa gente que lhe levava de Cananor, e também servi com o Governador Dom Estevão da Gama (filho segundo de Dom Vasco da Gama), e no seu tempo me proveu na Capitania de Cochim, após Dom Fernando de Eça, per e por vaga, em a qual estive quatro meses por vir provida por Vossa Alteza a Paio Rodrigues de Araújo, em a qual gastei mil cruzados, com dar de comer à gente, por ter más novas de que o Samorim queria passar a Cochim no Inverno com muita gente que para isso tinha junta, etc.
(....) Vai dizendo como tem filhos que vão servindo na guerra e que na idade em que se achava, se achou com Martim Afonso de Sousa na armada do pagode de Tremel, e no pagode de Coulão (Dezembro de 1537) onde foi ferido, e para todos estes serviços alega por testemunhas Dom João de Lima, António de Saldanha, Dom João de (....), Dom Aleixo de Meneses, Francisco Pereira de Berredo, Francisco de Sousa Tavares, António Ferrreira, Dom Gonçalo Coutinho, Rui de Brito Patalim, António de Miranda, e outros muitos que o muito bem conhecem. Pede-lhe (a D. João III) a Capitania de Cochim com as ilhas de Maldiva em sua vida, porque é já de sessenta anos, e que lhe tome seus filhos, e que um deles veio para o Reino em companhia de Dom Estevão da Gama, com o qual foi a Suez e ao Toro (no sopé do Monte Sinai, em Maio de 1541), onde o fizeram Cavaleiro (o Imperador Carlos V terá afirmado que invejava os que foram armados cavaleiros em tal feito).
Bibliografia Sumária
Boletim da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, nº 113, Setembro de 1963
Brocardo, Maria Teresa - Crónica do Conde D. Pedro de Meneses, Fundação Gulbenkian, 1997
Castro, Sérgio Sodré de – O Brasão do Sodré Chefe, Armas e Troféus, 1991
Idem – Raízes de Vasco Gil Sodré, primeiro povoador da Ilha Graciosa, Boletim da Academia Portuguesa de Ex-Líbris, 1994
Crónicas sobre a presença portuguesa na Índia (João de Barros, Gaspar Correia, Lopes de Castanheda, Diogo do Couto, Damião de Góis, etc.).
Faria, Manuel Severim de – Torre do Tombo, 1616, A.N.T.T. e Biblioteca Braamcamp Freire
Freire, Anselmo Braamcamp – Arquivo Histórico Português, vols V, VIII e X
Livros das Chancelarias Régias e do Registo Geral de Mercês, A.N.T.T.
Leitura Nova de D. Manuel, Livro da Beira, A.N.T.T.
Monterroyo, José Freire de – Nobiliário, 1743, B.N.L.
Monumenta Henricina, vols I, IV e XV
Pereira, Isaías da Rosa – Matrículas de Ordens da Diocese de Évora (1480-1483), Academia Portuguesa de História, Lisboa, 1990
Pimentel, Luís Conde – Acerca do Povoamento da Ilha Graciosa, Boletim do Museu Etnográfico da Ilha Graciosa, 1986
Monteiro, Saturnino – Batalhas e Combates da Marinha Portuguesa, Vol I, Lisboa, Livraria Sá da Costa, 1989, 331p.
Relação das Naus e Armadas da Índia, Coimbra, Biblioteca Geral da Universidade, 1985.
Silva, Isabel Morgado de Sousa e – A Ordem de Cristo (1417-1521), in Militarium Ordinum Analecta, n.º 6, 2002, Porto, Fundação Eng. António de Almeida, 503p.
Silva, Oriolando Correia da – Falando sobre a Graciosa, Boletim do Museu Etnográfico da Ilha Graciosa, 1986
Sousa, D. António Caetano de – Provas da História Genealógica da Casa Real, tomo II, II parte.
Subrahmanyam, Sanjay – A Carreira e a Lenda de Vasco da Gama, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 1998
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RE: Vasco da Gama, lado materno
Publicado na Revista Armas e Troféus 2002-03. Algumas pequenas gralhas e um erro foram agora corrigidos (a mulher de Gil Pires de Resende, pai de Duarte Sodré, foi Inês Sodré e não Maria Sodré).
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RE: Vasco da Gama, lado materno
Caro Sérgio Sodré de Castro,
As minhas saudações para si. Relembro o seguinte tópico: http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=55731&fview=e
Meus melhores cumprimentos,
Artur Camisão Soares
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RE: Vasco da Gama, lado materno
Caro Sérgio Sodré
Tem mais alguma informação sobre Teresa da Gama, a irmã de Vasco da Gama?
Com os meus cumprimentos e agradecimentos
Zé Maria
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RE: Vasco da Gama, lado materno
Prezados Confrades:
A propósito de Sodrés, estou a fazer um título de xxnn de Coimbra onde há uma linha des Sodrés com costela judia.
Se desejarem, envio.
Cumprimentos.
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RE: Vasco da Gama, lado materno
Prezado confrade
Só agora li a sua antiga mensagem, omo posso aceder ao seu estudo? De que época estamos a falar?
cumprimentos,
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