O mais antigo documento escrito em português

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O mais antigo documento escrito em português

#21808 | Mendia | 22 may 2002 17:16

Saiu hoje no Público uma notícia a dizer que foi descoberto o mais antigo documento escrito em português, anterior a 1175. O documento é um acordo entre 2 fidalgos, Gomes Pais e Ramiro Pais, de Braga, o investigador, um espanhol, que descobriu o contrato na Torre do Tombo não os conseguiu identificar genealogicamente.
Por curiosidade, gostaria de saber se alguém consegue identificar estes irmãos.

Junto segue parte do texto, “Investigador galego descobre o mais antigo texto em português”.

Cumprimentos,

FM
“Na segunda metade do século XII, em pleno reinado de D. Afonso Henriques, dois irmãos, Gomes Pais e Ramiro Pais, presumíveis fidalgos da região de Braga, assinaram entre eles um pacto de não agressão. Não seria nada de estranho, na época, entre parentes com propriedades contíguas, mas o documento que formaliza este acordo, conservado na Torre do Tombo, em Lisboa, apresenta uma característica invulgar: não está redigido em latim. José António Souto, professor de História da Língua na Universidade de Santiago de Compostela, acredita que se trata do mais antigo documento escrito em galego-português até hoje identificado”. (...) “Um dos motivos de interesse do documento redescoberto por Souto é a extensão do texto, no qual um dos irmãos assegura que não exercerá quaisquer pregorrativas nas propriedades do outro, e este último promete protegê-lo contra eventuais agressões de terceiros. Souto presume que os irmãos Pais seriam fidalgos bracarenses, uma vez que o manuscrito esteve conservado na Mitra de Braga antes de ser transferido para a Torre do Tombo. "Para garantir a conservação destes documentos", explica, "era habitual confiá-los às instituições religiosas". O investigador ainda tentou apanhar o rastro destas personagens noutra documentação da época, mas, embora tenha descoberto muitos Gomes Pais e outros tantos Ramiro Pais, não conseguiu encontrar nenhum documento que reunisse ambos”.

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RE: O mais antigo documento escrito em português

#21815 | cm | 22 may 2002 19:50 | In reply to: #21808

Caro FM,

Cuidado que o título da notícia pode induzir em erro. A notícia propriamente dita faz referência a um texto em "galego-português", i.e., galaico-português. O português aparece muito + tarde.
Mas o assunto principal é a genealogia...isto é apenas um à-parte.

M. Cump.
Conceição Mascarenhas

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RE: O mais antigo documento escrito em português

#21837 | S.João de Rei | 23 may 2002 07:40 | In reply to: #21808

Torres Vedras, 2002-05-23


Caro FM

No tópico “ Mendo Pais Bofinho”, relatado por Carlos M. Silva, e escrito por José Mattoso (Identificaçào de um pais, ensaio sobre as origens de Portugal) é transcrito o seguinte texto:

« Os dois irmàos Azevedos, Nuno Pais «Vida» e Mem Pais «Bofinho», orfàos de pai e màe em 1108, e que entào fizeram partilha:s aparecem varias vezes na corte portucalense. O primeiro, logo em 1097, corno alferes, cargo que deve ter conservado pouco tempo. Depois, volta a aparecer na corte varias vezes, sem ai alcançar relevo especial, entre 1109 e 1139. A regiào onde aparece mais vezes a confirmar documentos eclesiàsticos ou particulares é a de Braga, entre 1103 e 1134. Encontra-se uma vez em Coirnbra, em 1115 , e outra em Coimbra ou Lorvào, a confirmar uma doaçào de seu parente Pero Pais da Silva 0 «Escacha ». E dos poucos nobres do principio do século XII cujo patrimonio dominial se pode reconstituir corn alguma precisào, pois possuirnos o ja citado acto de partilhas entre ele e os irmàos. Sem ter tentado identificar todos os toponirnos, podem em todo o caso situar-se facilrnente 'l'randeiras (c. Braga), Besteiros (c. Amares) , Figueiredo (nas margens do Lima, em Ponte da Barca ou Arcos de Val de Vez), S. Salvador da Torre, o mosteiro que jà mencionàmos, e S. Vicente de Panoias. Fssem aquisiçoes posteriores ou nào, sabemos que mais tarde deu bens à Sé de Braga em Ferreiros, perto da cidade e em Forjàes, no conœlho de Esposende. Pareœ so ter tido uma filha que casou duas vezes, uma na familia de Portocarreiro, outra na dos Carpinteiros.
Apesar de mencionado em segundo lugar no acto de partilhas, quem pareœ ter herdado o so1ar da familla por inteiro, ou pelo
menos em lugar onde ele se veio a perpetuar, foi Mem Pais «Bofinho». Possui tambem dominios ern Trandeiras, Palmeira., Cabanas, em Entre Hornem e Càvado e mesmo a sul do Ave. Mais tarde deu, trocou ou vendeu terras suas perto de braga, no concelho de Barcelos e mesmo em Trandeiras, que como vimos tinha herdado dos pais. Aparece vàrias vezes na regiào de Braga a confirrnar documentos de diversa natureza entre 1108 e 1155. Viveu pelo menos até 1163, ano ern que vendeu os seus casais de Trandeiras à Sé de Braga.
Entretanto, ,tendo acompanhado a corte de D. Henrique e de D. Teresa desde 1109 e depois, desde a primeira hora da sua revolta, até 1139, a do infante D. Afonso, desempenhou algumas missoes de confiança, rnas nào de grande prestigio. Devia ser suficienternente influente junto de D. Teresa para surgir como intercessor junto dela para conœder a carta de couto à alberg8aria de Assilho, ern 1117. Exerceu certarnente um papel importanlte nas tentativas para atrair à orbita portuguesa dois magnates galegos. Um deles foi o poderoso Paio Curvo, rico-homern de Toronho., que casou com a sua filha Sancha Pais ; outro foi Rodrigo Forjaz, irmào do ainda mais poderoso Pedro Forjaz, conde de Trava, pois conseguiu casar seu filho Pero Mendes de Azevedo corn a filha dele, Velasquida Rodrigues. »
A tais missoes de confiança mas em grande prestigigio de Mendo Pais foram uma inquiriçào em Viseu (1127) e a delimitaçào da paroquia de Santa Cruz em Coimbra”

Ponho a hipótese de Gomes Pais e Ramiro Pais serem filhos de Nuno Pais ou de Mem Pais, as relações de Mem Pais com a Galícia como se pode ver foram importantes.
Gostaria de saber a opinião de Carlos Silva, de Vasco Jácome entre outros participantes.

Cumprimentos,

José de Azevedo Coutinho

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RE: O mais antigo documento escrito em português

#21857 | Jurema | 23 may 2002 17:42 | In reply to: #21815

Brasil- SP-

Cara CM.
Só por curiosidade, quem foram os primeiros a falar o português, ou já falava esta lingua em época remota? Uma vez que os árabes e mouros, tomaram conta da região, por vários séculos, e não instituiram sua lingua, naquela época?
Abraços
Jurema

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RE: O mais antigo documento escrito em português

#21862 | cm | 23 may 2002 19:50 | In reply to: #21857

Cara Jurema,

A notícia acima transcrita faz referência a um documento do sec. XII - reinado de D. Afonso Henriques - e salienta o facto de até então só serem conhecidos docs. em latim, sendo este o mais antigo que se conhece agora em galaico-português. O galaico-português deu mais tarde origem ao português, ou seja, o português aparece bastante depois da fundação da nacionalidade (1143 Tratado de Zamora).
O português de hoje tem ainda vestígios das línguas dos vários povos que habitaram a Península Ibérica.
Não sei se terei conseguido responder à sua dúvida...

Melhores cumprimentos
CM

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Genealogia da Língua Portuguesa, nossa Mãe

#21868 | Portuguez | 23 may 2002 21:45 | In reply to: #21857

Cara Jurema
Sobre este assunto, Óscar Lopes e António José Saraiva ensinam-nos na "História da Literatura Portuguesa" que a Língua enraiza no latim culto, modo oficial e literário polido sob influência do grego, que tentaram uniformizar em todo o Império Romano, e deu origem a uma versão falada, o chamado latim vulgar, aonde as inflûencias lexicais e gramaticais das populações conquistadas emergem paulatina e progressivamente. Deste latim "evoluido e diversificado geográfica e socialmente provém, entre outras línguas, o Português".
Ao nascer a nossa linguagem deste latim vulgar, cada vez menos falado e portanto já esquecido, começou a haver dificuldade de escrever correctamente a antiga língua, eivada de barbarismos e inovações locais, e a isto chamou-se, a este latim bárbaro apenas escrito pelos clérigos e oficiais mas não falado pela população, de latim bárbaro.
Esta fase proto-histórica do Português falado e ainda não escrito só se pode depreender e estudar através da leitura desses documentos de latim bárbaro, ou seja este latim já só de estudiosos e portanto desactualizado e desajustado da lingua realmente falada no Ocidente Peninsular entre os sc. IX e XIII, data do 1º documento até agora considerado escrito na nova língua, data essa que esta descoberta referida aqui no tópico vem agora contestar, tentando recuá-la.
A primeira fase do Português arcaico demonstra grande pujança literária e poética oral, trovadoresca, incorporando mais tarde técnicas oriundas da língua provençal, sua prima, e expandindo-se como a língua de cultura e de literatura principal, preferencialmente utilizada nas cortes da Peninsula Hispânica, e mesmo entre a nobreza feudal além Pirinéus. A razão para esta preponderância e influência do galaico-português sobre outras línguas emergentes daquela época terá também que ver com a sua sonoridade e nasalação poética que lhe conferiam já uma doçura bem mais própria para a expressão lírica, tão prezada e praticada por cavaleiros, jograis e trovadores da Idade Média. Desta época de primeiro fulgor da língua nos ficaram as célebres Cantigas de Amor, e as de Amigo, e as de Escárnio e Maldizer, muitas delas compostas nem por portugueses nem por galegos. Cantigas se chamaram a estes poemas, porque na época toda a poesia era cantada, ou dita acompanhada por instrumento musical.
Podemos assim concluir que a Língua Portuguesa é filha de um pai, o latim vulgar adulterado do latim clássico romano do Império, e de uma Mãe, a forma fonética de o pronunciar e transformar acrescentando expressões e palavras, soltas e estruturadas, oriundas da expressão própria aos povos pré-históricos anteriores à conquista romana dos actuais territórios de Portugal e da Galiza. Sendo difícil estabelecer um marco para esta fusão linguística, sempre evolutiva, que deu o filho que chamamos de Português, aceitemos o que os Mestres nos dizem, até mais ver, e aceitemos como data mais recuada para a forma falada o sc. IX, e para a escrita, eu gostaria de ver o documento em causa, para tentar perceber se ainda é latim bárbaro, mais bárbaro talvez do que habitualmente, ou se será mesmo expressão rudimentar da língua oral do tempo do Condado Potucalense, e se tem latinidades inseridas no discurso.
Quanto a mim, e como minha favorita de sempre, guardo de cór a cantiga de João Roiz de Castelo Branco, cortesão do sc. XV, que já anuncia um século antes a lírica incomparável de Camões:

"Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.

Partem tão tristes os tristes,
tão fora d’esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém."

Veja, para mais informação, http://www.folhanet.com.br/portrasdasletras/humanismo.html, e ainda
http://www.instituto-camoes.pt/cvc/literatura/LIRISMO.HTM

Cumprimentos
Alexandre Tavares Festas

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RE: O mais antigo documento escrito em português

#21869 | Vasco Jácome | 23 may 2002 21:47 | In reply to: #21837

Caro José de Azevedo Coutinho

Não creio que nessa altura houvesse excepções à regra dos patronímicos. Esses Gomes Pais e Ramiro Pais eram certamente filhos de um Paio.
Além disso, só tenho visto que Mem Pais Bufinho só teve Pedro Mendes e Nuno Pais Vida duas filhas:

1-Gontinha Nunes de Azevedo c 1ª c Raimundo Garcia de Portocarreiro CG e a 2ª com Gomes Ramires Carpinteiro CG

2-Ouroana Nunes Vida cc Ramiro Gonçalves Carpinteiro CG

Cumprimentos,

Vasco Jácome

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RE: O mais antigo documento escrito em português

#21878 | Carlos Silva | 23 may 2002 23:25 | In reply to: #21869

Caros José de Azevedo Coutinho e Vasco Jacome,

Apesar de terem uma onomastica muito proxima da linhagem dos Ramiroes, com nomes tais como Ramiro Aires e seus filhos Gomes Ramires (genro de Nuno Pais « Vida ») e Paio Ramires(pai do Mestre dos Templarios Gualdim Pais (m. 1195)), os individuos assim chamados nào faltam naquela area e naquela época, como se depreende do proprio artigo.
Com efeito o investigador parece ter usado os recursos da prosopografia sem resultado.
Serà certamente artificial o facto de os tentar ligar sem mais pormenores a uma das linhagens conhecidas a priori.
Pode se tratar de qualquer pequena e desconhecida linhagem de fracos recursos e pouco exito.

Outros colegas mais competentes talvez consigam fazer propostas que ao nivel de simples propostas deveriam ficar.

Melhores cumprimentos

Carlos Silva

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