Braganças americanos
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Braganças americanos
Caros “colegas”,
Alguém sabe alguma coisa dos Braganças americanos actuais, chefiados, penso eu, por D. Miguel de Braganza?
E, já que falo do assunto, quais as razões concretas que levaram o Duque de Viseu a abdicar em seu meio - irmão mais novo, tendo em conta que o “pretexto” do casamento morganático parece inválido, segundo li num livro chamado “D. Miguel e o Seu tempo”?
Tratou-se de uma abdicação válida, uma vez que o Duque de Viseu não tinha direitos de facto à Coroa? A sede própria para tal decisão não deveriam ser as futuras cortes?
Descupem tanta pergunta, dum novato nestas andanças histório-genealógicas.
Obrigado antecipadamente!
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Artigo dos EUA
Envio, como anexo, um artigo do jornal luso americano sobre este assunto. Tirei-o da Internet.
"A Casa de Bragança nos EUA
No livro "Portugal na Costa Leste dos EUA, por estradas da América", Vasco
Calixto dá conta da existência de uma Casa de Bragança neste país e do seu
encontro, em Boston, com o trineto primogénito do rei D. Miguel I de
Portugal e que, se porventura a revolução republicana não se tivesse
intrometido, poderia reinar em Portugal como D. Miguel IV ou ostentar pelo
menos o título de Duque de Bragança e assumir-se como herdeiro directo do
trono, em vez de seu primo, D. Duarte Pio.Este Miguel de Bragança de Boston
e empresário e não fala português, mas podia intitular-se Duque de Bragança
e ser o herdeiro directo do trono, em vez de D. Duarte Pio, que se desloca
no próximo mês aos EUA, para contactos com apoiantes da chamada causa
monárquica residentes em New Jersey, mas não parece que os Braganças
portugueses e até mesmo os monárquicos de um modo geral tenham relações com
os Braganças americanos.
D. Miguel I faleceu no exílio, na Alemanha, em 1866 e teve apenas um filho
varão, também de nome Miguel (1853-1927) e a quem os monárquicos
legitimistas sempre chamaram D. Miguel II. Este, por sua vez, viu nascer os
dois primeiros filhos varões de um primeiro casamento, em 1878 e 1879. O
primogénito chamou-se igualmente Miguel e foi-lhe dado o título de Duque de
Viseu. O segundo foi o príncipe D. Francisco José. Um terceiro filho varão,
de segundo casamento, nasceu em 1907, chamou-se D. Duarte Nuno e foi o pai
do actual Duque de Bragança, D. Duarte Pio. O neto primogénito do rei D.
Miguel I, o igualmente D. Miguel Duque de Viseu, veio a casar em 1909 com
uma americana de origem escocesa, Anita Stewart e fixou-se na América, onde
renunciou em 1920, por si e seus descendentes, dos direitos ao trono
português.
Segundo Vasco Calixto, foi esta renúncia que transmitiu aqueles direitos
para D. Duarte Nuno, então com apenas 13 anos, uma vez que o segundo filho
varão de D. Miguel II, D. Francisco José, tinha falecido no ano anterior.
D. Miguel II faleceu em Londres, em 1932 e D. Duarte Nuno viria a ser
reconhecido como herdeiro do trono por todas as facções monárquicas
portuguesas. D. Miguel, Duarte de Viseu, faleceu em New York, em 21 de
Fevereiro de 1923, vitimado por uma pneumonia. Tinha apenas 45 anos e deixou
três filhos. Uma rapariga: D. Isabel Maria, nascida em Londres em 1910,
casou com um russo de apelido Nadaska e faleceu na capital deixando um
filho. E dois rapazes: o primeiro foi D. João, nascido em 1912, em
Inglaterra e que veio criança para os EUA, tendo falecido em Palm Beach,
Florida, a 12 de Março de 1991, com 78 anos; o segundo foi D. Miguel,
nascido em 1915, em Berlin e que veio também para os EUA. Foi piloto aviador
e comandante dos Clippers durante a II Guerra Mundial, fixou-se na Florida e
teve duas filhas. Não foi apenas o Duque de Viseu que veio para os EUA, uma
sua irmã mais nova, D. Maria Antónia de Bragança, filha do segundo casamento
de seu pai, casou em 1934 com o americano Ashley Chanler e fixou-se em New
York, onde faleceu já octogenária deixando uma filha residente em França, um
filho em New York e outro no Algarve. Em New York faleceu também, em 1942, a sexta filha do rei D. Miguel I, D. Maria Ana de Bragança, que foi grande
grã-duquesa do Luxemburgo pelo casamento e avó do actual grão-duque João.
Há umas largas dezenas de Braganças nos EUA e alguns identificados com as
origens da família."
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RE: Artigo dos EUA
Caro Venceslau:
Ao contrário do que se diz no artigo, os Braganças portugueses relacionam-se com os americanos; alguns destes, pelo menos, vieram diversas vezes a Portugal, passando, por exemplo, férias em casa da Tia, a falecida Infanta, S. A. R. a Senhora D. Filipa, em Ferragudo.
Quanto a direitos ao trono, independentemente das renúncias, uma vez que se tornaram todos estrangeiros, de acordo com as Leis de sucessão em vigor desde a Restauração, (em qualquer das versões, pré- e pós-liberal) não teriam nenhuns. É claro que futuras cortes ou qualquer futura decisão soberana do povo português poderia decidir o que entendesse, mas para que essa decisão estivesse de acordo com as leis de sucessão atrás referidas (caso tal se pretendesse) teriam de ser excluídas da sucessão as linhas estrangeiras.
Não sei qual a razão que levou o Duque de Viseu a renunciar aos seus direitos dinásticos, mas a questão tornou-se, no meu entender, irrelevante pelos motivos atrás expostos. Para os herdeiros da corôa portuguesa
não existia de facto obrigação legal de casarem em famílias "soberanas ou mediatizadas"
como acontecia em alguns estados germânicos, por exemplo, mas também nada poderia impedir o herdeiro de renunciar voluntariamente aos seus direitos, fosse por esse motivo ou por outro qualquer.
Com os melhores cumprimentos,
António Bivar
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RE: Artigo dos EUA
Caro António,
É curioso que o Infante D. Miguel, Duque de Viseu, tenha renunciado para si e seus descendentes a 21.7.1920, apenas três anos antes de morrer, quando os três filhos, D. Isabel, nascida em Londres em 1910, D. João, nascido também em Inglaterra em 1912 e D. Luis, nascido em Berlim em 1915 não receberam aparentemente tratamento especial quando nasceram como filhos do herdeiro, que teve o título de S.A.R.
Mas penso também como o António que a origem esteve nas nacionalidades estrangeiras dos filhos.
Quanto ao casamento com Anita Stewart, uma senhora escocesa, a quem o Imperador Francisco José conferiu o título de princesa, penso que essa não teria sido a razão, também pelas razões que aponta.
Há quem afirme ter sido uma posição tomada depois da Guerra de 14/18 e após prolongadas negociações políticas.
Um abraço
Zé
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RE: Artigo dos EUA
Caro António Bivar e JBdeS,
Estou inteiramente de acordo. Para a actualidade do movimento monárquico a questão é irrelevante. O meu interesse é meramente histórico e, como tal, confesso, que ainda não consegui perceber bem a verdadeira razão que levou à renúncia do Duque de Viseu.
Já por aqui li que se tratou de uma manobra dos partidários de D. Manuel com o objectivo de enfraquecer a causa legitimista. A hipótese é sedutora, mas parece-me rebuscada, tendo em conta que quem primeiro reconheceu o ramo miguelino foram os integralistas, após se separarem do antigo Rei, na sequência do comportamento do mesmo aquando da Monarquia do Norte.
Pelas parcas informações que há, parece que sobre este assunto se cerrou uma cortina de ferro. Um pouco à semelhança do que se passou com o episódio Ribeira Brava, como se pode ver numa verdadeira “caixa de pandora” em forma de tópico que aqui abri há semanas.
Se adicionarmos isto, às ficções Dover e Paris, teremos pano para mangas.
Válida seria apenas a expressa vontade do Duque de Viseu. Mas, pergunto, à luz do direito nacional poderia fazê-lo em nome dos seus filhos?
Há quem aponte o facto de os mesmos serem estrangeiros... Mas, Pai e Avô não o eram também, na realidade?
Rui
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RE: Artigo dos EUA
Caro Rui:
O Avô nasceu português e nunca deixou voluntariamente de ser. O Pai, de determinado ponto de vista, conseguiu sempre manter a nacionalidade portuguesa pelo privilégio de extra-territorialidade concedido pelo Imperador da Áustria ao respectivo local de nascimento; por este e outros actos simbólicos sempre manifestaram a vontade de manter essa nacionalidade. É claro que se pode invocar a Lei do banimento e, para quem aceite que essa Lei lhes retirou legitimamente a nacionalidade contra a própria vontade, não a poderiam obviamente ter (teriam de ser considerados apátridas uma vez que não adquiriram qualquer outra nacionalidade), mas é situação bem diferente do abandono voluntário (ou, por nascimento, por decisão paterna) da nacionalidade portuguesa. Em resumo: ou foram portugueses ou apátridas, mas, pelo menos, estrangeiros não foram nunca concerteza.
Um problema que se aponta é o facto de o Duque de Viseu ter feito parte do exército austríaco (antes da entrada de Portugal na 1ª Guerra), o que poderá explicar em parte a sua renúncia.
Não sei se todos os aspectos de eventual renúncia estavam previstos na Lei, mas julgo que poderá defender-se que os filhos de um renunciante (mesmo mantendo a nacionalidade portuguesa) não poderiam passar à frente dos Tios na sucessão ao trono, uma vez que para tal teriam de invocar o direito de representação (os tios seriam sempre parentes mais próximos do falecido Rei) e não vejo que tal direito se possa aplicar para representar quem já não tinha direitos por a eles ter renunciado... esta minha opinião fica à espera de melhor esclarecimento por um jurista que não sou!
Fora isso, renunciar pelos filhos já nascidos, julgo que só entendendo-se por delegação dos filhos (renúncia dos filhos através da declaração do Pai em seu nome e no deles...).
Com os melhores cumprimentos,
António Bivar
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RE: Artigo dos EUA
Caros Confrades.
Há tempos, discutiu-se o facto da renúncia de D.Miguel (II) e do duque de Viseu a favor de D.Duarte Nuno.
Quer D.Miguel quer os seus dois filhos mais velhos, residentes no Império Austro-Húngaro e cumulados com algumas benesses pelo Imperador Francisco José, serviam naturalmente no exército austríaco quando deflagrou a 1ª Grande Guerra.
Assim que Portugal entrou na guerra, em 1916, D.Miguel (II) requereu que fosse desvinculado da prestação de serviço activo, a pretexto que não admitia que pudesse vir a enfrentar um adversário de nacionalidade portuguesa, passsando a servir apenas no âmbito da causa hospitalar da Ordem de Malta.
Já D.Miguel (D.Viseu) e D.Francisco José continuaram a servir no exército austríaco, tendo mesmo D.Francisco José falecido na ilha de Ischia, em Itália, em 1919, depois de findas as hostilidades, onde se encontrava como prisioneiro de guerra.
Há dúvidas quanto às renúncias do duque de Viseu.
Alguns asseguram que teria renunciado aos seus direitos em 1909 quando casou com Anita Stewart, senhora americana de origem escocesa, à al, não obstante ter sido elevada ao título de Princesa pelo Imperador Francisco José de Áustria, faltavam os pergaminhos e os costados que seriam de esperar da esposa do herdeiro dos Reis de Portugal.
(Há quem defenda que esta elevação ao título de Princesa é apenas uma efabulação miguelista dado que, aparentemente, nas chancelarias austríacas nunca apareceu qualquer documento que o comprove, mas adiante...)
A situação do duque de Viseu seria assim semelhante à do seu primo D.Pedro de Orleães e Bragança, que, voluntariamente, renunciou aos seus direitos sucessórios por lhe parecer que os pergaminhos da esposa ( a filha do conde boémio Dobrzenczic ) não eram compatíveis com o que seria de esperar de um herdeiro de (outro)trono.
O que não há dúvida é que, em 21-7-1920, o duque de Viseu renunciou por si e pelos seus descendentes aos seus direitos à Coroa, e dez dias depois D.Miguel II renunciou igualmente, a favor de D.Duarte Nuno.
A razão da renúncia:
Em 1919 parte dos monárquicos portugueses entraram em ruptura com D.Manuel II a quem responsabilizaram pelo falhanço da Monarquia do Norte, pela falta de apoio que terá prestado aos revoltosos antes, durante e após aquele episódio.
Além disso, notavam que, seis anos depois do seu casamento, D.Manuel continuava sem descendência, e o ramo Saxe-Coburgo-Gotha se mostrava em vias de extinção.
Pouco depois (1920) morreria o Infante D.Afonso Henriques, também sem geração.
A estes Monárquicos só lhes restava apoiar a causa legitimista, na pessoa de D.Miguel II.
No entanto fizeram condicionar esse apoio à renúncia de D.Miguel e do duque de Viseu a pretexto de que o povo Português nunca aceitaria como Rei (numa futura Restauração) um Príncipe que tivesse lutado no campo oposto ao de Portugal, o dos Aliados.
Revelando o seu Patriotismo, os dois Príncipes aceitaram estas condições e abdicaram em D.Duarte Nuno, então uma criança de 12 anos.
Quanto à falta de relacionamento entre D.Duarte Pio e os Bragança americanos tal não corresponde à realidade; se é certo que os laços com os seus primos europeus e brasileiros poderão ser mais fortes, o certo é que os Braganza estiveram presentes no seu casamento com D.Isabel de Herédia.
Há alguma reportagem fotográfica destes Bragança na obra "The Braganza Story. A visit to the Royal Pantheon of Portugal" de Malcolm Howe.
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O segredo de Dover
Caros confrades
Com a devida vénia transcrevo um artigo de 2007, publicado na revista Pública (do jornal Publico), que mão amiga me fez chegar:
O segredo de Dover
Teria D. Manuel II, no exílio, passado a sucessão, ao primo, Duarte Nuno, pai do actual pretendente ao trono português? In Revista Pública de 25 de Fevereiro de 2007. Texto de José Manuel Ferreira
Cidade, ocasião e personagem eram das mais indiscretas para um escândalo. Dezenas de cabeças coroadas, milhares de estrangeiros, centenas de jornalis¬tas aguardavam em Londres a coração de Eduardo VII. O protagonista do caso é o segundo filho do príncipe Miguel (II) de Bragança, pre-tendente ao trono de Portugal, e da primeira mulher, Isabel de Thurn e Taxis. Afilhado do imperador da Áustria, Francisco José, de quem recebera o nome de baptismo, é também sobri¬nho da soberana do Luxemburgo; da mulher do pretende ao trono de Espanha, Afonso Carlos de Bourbon; e ainda primo-direito da mulher do príncipe herdeiro da Bélgica e da princesa real da Baviera.
O tablóide "Morning Leader" devorou o caso às dentadas: um membro das grandes famílias reinantes da Europa estava acusado de "pederastia". Tinha sido preso na noite anterior, em Southwark, um bairro mal afamado de Londres, Dnde estivera em "public houses". O juiz evacuara a sala, na manhã seguinte, antes da leitura da acusação, e proibira os jornalistas de escrever sobre o caso: "Podia afectar as relações da Ingla-:erra com o estrangeiro".
O "Star" prometeu aos leitores fazer subir o assunto ao Parlamento. As audiências dos casos de polícia, por lei, deviam ser públicas. Assim, a 4 de Julho, desse ano de 1902, em Lisboa, o "Século" deu a notícia em primeira-mão. "Lon¬dres 3-o herói do escândalo de que tanto se falou é o príncipe Francisco José de Bragança, oficial do exército austríaco. Surpreendido em grave delito de imoralidade foi preso mas posto em liberdade sob fiança". 0 escândalo, por esses dias foi "o repasto dos círculos aristocráticos".
A revista "Occidente", em Lisboa, dois anos antes, felicitara o príncipe em termos elogiosos. Completava a "formosíssima idade de 21 anos". Embora "a idade legal da emancipação de há muito que fora suprida, mercê da reflexão assi¬sada e do exemplar convívio da família e do ensinamento paterno". Manuel de Bettencourt e Galvão, em "Dom Miguel II e o seu Tempo" (1943) recorda o príncipe, sem aludir ao episódio: "A sua simpatia comunicativa e alegria esfuziantes faziam de S.A o mais estimado dos nossos príncipes pelos partidários de seu Pai que viam nele todas as qualidades e defeitos da nossa raça. Até o seu nome familiar - Chico - era bem português e popular".
Duas mil e quinhentas libras foi o montante da caução para Francisco José de Bragança aguar¬dar julgamento em liberdade, adianta o republi¬cano "0 Mundo". E observa: "mas os seus com-panheiros conservam-se detidos". 0 "Século", um mês depois, a 29 de Julho, relembra que o caso continua por julgar. A imprensa aplaudia a atitude independente dos magistrados. E só por¬que o réu estava em Londres, na ocasião, "como hóspede extraordinário" o tinham deixado em liberdade.
A acusação, na época, era grave. Uma verdadeira infâmia. Três anos antes, pelo mesmo "crime", e na mesma Londres, Óscar Wilde penara um calvário, dois anos de prisão, e (também) "De Profundis", a mais longa (para alguns a mais sincera) carta de amor da Literatura.
0 Partido Legitimista respirou de alívio, mês e meio passado sobre o caso. No seu órgão ofi¬cial, "A Nação", rejubila em primeira página, a 18 de Agosto. "Telegramas de Londres dão como tendo sido absolvido da acusação que se lhe imputara S.A.R, o Senhor Infante Dom Fran¬cisco José de Bragança". Foi ilibado em tribunal mas não pela imprensa. Para que escorra mais sangue azul, os jornais portugueses, sete anos depois, por ocasião do casamento do irmão mais velho, Miguel Maximiliano, voltam a pôr o dedo na ferida.
"O filho do pretendente D.Miguel vai casar com uma americana rica" - estampa em subtí¬tulo "O Mundo", a 14 de Agosto de 1909. "Dizem algumas línguas viperinas que o projectado casamento tem todo o ar de uma aventura escandalosa, e confundem o noivo com o irmão, o príncipe Francisco José, que há tempos deu que falar de si num caso muito ruidoso".
A noiva de Miguel Maximiliano de Bragança é Anita Stewart, uma jovem nova-iorquina, filha do multimilionário William Rhinelander Stewart e de Annie Armstrong, casal americano, protes¬tante e divorciado. A mãe herdara grande parte da fortuna do segundo marido, o multimilionário James H. Smith. À viúva, este deixou três milhões de dólares; à enteada, Anita, uma renda de meio milhão.
"Um possível filho de miss Anita futuro pre¬tendente à coroa de Portugal?" interroga-se o "Século" em título. Miguel de Bragança ajustara casamento como "uma dessas meninas ricas que, em vez de armoriar pergaminhos, possuem milhões e um belo-sangue plebeu". Era "uma mulher dessas" que se ia tornar princesa de Bragança, visto que fora pedida, em Londres, a «- sua mãe, mistress Smith, por D. Miguel (II) para o filho primogénito. "Assim desaparecem as tradições gloriosas do exílio".
"Os príncipes agora vendiam a coroa pelos milhões e a carne branca de uma americana ambiciosa, filha de um dos seus positivos colegas da América, que, em vez de serem reis de um povo, são reis do petróleo, do sabão, dos caminhos de ferro, e de outras 'porcarias' com que se fazem as grandes fortunas", fustiga "O Mundo". Fosse como fosse, miss Anita Stewart estava "entusiasmada". Casando com o filho do pretendente à coroa portuguesa, "para a consolar, basta-lhe o título de princesa, o papel de exilada e o direito de poder em público lamentar-se das circunstâncias que a afastam do trono..."
O casamento celebrou-se na pequena cidade escocesa de Dingwall, a 15 de Setembro desse ano. "Ao meio-dia chegou a Senhora Dona Anna Stweart, num automóvel, acompanhada de seu irmão que vestia o uniforme escocês". Ostentava "uma magnífica 'toillete' de musselina de seda branca, com cauda de corte, um riquíssimo colar de pérolas e brilhantes, presente de sua mãe, e um diadema de brilhantes e safiras, jóia da Família Real exilada". Sob o olhar do bispo de Aber-deen, o noivo recebeu-a no altar "com a farda da ordem de Malta e várias condecorações". À saída foi "indescritível o entusiasmo da multi¬dão", refere ainda o repórter da "Nação", órgão oficial dos legitimistas. "Os hurras espontâneos ouviam-se a cada instante, aclamando todos o Príncipe e a Princesa que, de automóvel, se dirigiram para o riquíssimo castelo de Tulloch".
O artigo confere um toque europeu e de nobreza a Anita, americana e plebeia de qua¬tro costados. "Os jornais lembraram um outro consórcio auspicioso que aproximou Portugal de Inglaterra e Escócia, o d'El Rei Dom João I com Dona Filipa de Lencastre". O bispo de Aberdeen, "numa eloquente prática" recordou a "coincidência do Príncipe Dom Miguel de Bragança ter desposado uma senhora de origem escocesa de apelido 'Stewart', o mesmo da última rainha da Escócia independente e livre".
O escândalo financeiro espreita os Bragança quando assistem ao casamento do primogénito com a milioná¬ria americana. Cinco meses depois "instituiu-se uma tutoria ao príncipe D. Miguel", titulava "O Século", em notícia reproduzida do francês "Matin" que a reproduz do austríaco "Viener Zeitung". A18 de Fevereiro de 1910, em segunda notícia, o jornal chama ao imbróglio: "Uma burla complicada".
"O cônsul inglês em Viena, um médico e um coronel do exército austríaco têm em seu poder letras assinadas pelo príncipe (no valor de cinco milhões de marcos) com a garantia de umas minas que não existem e endossadas ao banqueiro Fred Vanderbilt. O inquérito policial revelou que a assinatura daquele banqueiro é falsa". 0 príncipe "devia além disso 100.000 francos e mais os juros que ascendiam ao dobro da quantia". O caso "seria julgado brevemente".
Tratava-se do Miguel, pai, ou do Miguel, filho? interroga-se, trocista, "O Mundo": "O príncipe D. Miguel de Bragança que os jornais estrangeiros dizem ter sido dado como interdito é aquele que pretendeu ser rei de Portu¬gal e que depois esteve para ser conselheiro do sr. D. Manuel? É o mesmo?" A oito meses da monarquia tombar em Portugal, as dívidas do pretendente no exílio merecem do jornal apenas uma breve. É véspera de um comício republicano onde "os discursos notáveis, dos drs. Bernardino Machado e Afonso Costa", vão fazer a manchete do dia seguinte.
Fora o pai, segundo o "Diário de Notícias": "As Letras de D. Miguel de Bragança - o que diz a irmã do pretendente" (a duquesa de Parma). "Entrevistada por um jornal italiano acerca de estes... apuros económicos de seu irmão, D. Maria Antonieta declarou ontem que nas notas publicadas nos jornais há muitos exageros; que as dívidas de D. Miguel vão diminuindo nota¬velmente e com que com respeito às que ainda faltam para satisfazer, já se entabularam negociações com o fim de chegar a um acordo com os credores".
Essa "Carta de Itália", do correspondente em Roma do "Diário de Notícias", data de 27 de Fevereiro. Só é publicada um mês depois, a 16 de Março, ganhara o caso entretanto outras tinta junto aos leitores portugueses. Miguel Maximi¬liano de Bragança, recém-casado com Anita Stweart, fora apresentado como o protagonista do escândalo. "Foi dado como pródigo tendo assinado letras no valor de mil contos para receber não chega a duzentos", referira o "Primeiro cie janeiro", do Porto, a 22 de Fevereiro. A longa carta anónimo foi reproduzida pelo "Dia", em Lisboa, também em primeira página.
"Já quando ele por dinheiro casou com uma americana rica, assemelhando-se a esses fidal¬gos arruinados e viciosos que procuram uma esposa entre as filhas dos 'parvenus' a fim de dourarem os seus brasões e prosseguirem a sua vida de ociosos; já então percebi que esse príncipe era um deprimido moral", zurzia o anónimo suposto leitor. E o irmão não era melhor: "arrastou o nome, há anos, pelos tribunais de Londres, em um processo ignóbil e escandalo¬síssimo".
O órgão oficial dos legitimistas, "A Nação", a 10 de Março, aproveita a deixa. Lembra que "morta politicamente por qualquer razão a sere¬níssima descendência do primeiro consórcio do Senhor D. Miguel II" ainda restavam das segundas núpcias, seis filhas do príncipe. E Duarte Nuno, então com dois anos. A este, "estaria reservado cingir, pelas leis e pelo direito natu¬ral, a coroa lusitana."
"À pretendida intervenção dos milhões da Stewart" na compra de armamento para os monárquicos que combatiam, de Espanha, a jovem República Portuguesa, "um jornal ame¬ricano chamava com espírito 'uma sociedade comanditaria para a exploração de uma miragem", refere o monárquico Carlos Malheiro Dias, em "Zona de Tufões". O livro é publicado nesse mesmo ano, 1912, em que D. Manuel II, o rei exi¬lado, e D. Miguel (II), pretendente ao trono, se encontraram em Dover.
Miguel Maximiliano e Francisco José de Bra¬gança estiveram entre as hostes monárquicas estacionadas na Galiza. O jornal "A República", a 21 de Novembro de 1911, insurgira-se e insultara-os: "O mais velho casou-se com uma americana plebeia e rica, pertencente ao número enorme dessas 'snobinettes' dos Estados Unidos que procuram na Europa um marido rico e tarado. O outro arrastou o nome, há anos, num processo ignóbil e escandalosíssimo, pelos tribunais de Londres.
Eis aqui os representantes da realeza absoluta que vêm combater contra a República de Portugal." E rematava José de Alpoim, nesse crónica reproduzida do jornal "O Paiz" do Rio de Janeiro: "Note-se que eu não creio que eles se batam. Gostam de viver. Têm muito apego à vida...e ao 'bacarat' "
O encontro do ex-rei D. Manuel II com o primo, o pretendente, D. Miguel (II) de Bragança, decor-reu à porta fechada, a 30 de Janeiro de 1912, no "Lorde Warden Hotel" de Dover. "Das 4 às 6 da tarde", precisa o telegrama da agência Havas, "que fez o giro da imprensa" cita "A Nação". D. Manuel ao sair "parecia radiante". Recusou qualquer entrevista mas "um correspondente do 'Excelsior' conseguiu entrar no quarto onde vários papéis acabavam de arder, estando outros completamente rasgados e amarrotados. Num mata-borrão estava decalcada a assinatura de D. Manuel".
"A Nação" acolhe a história cepticamente: "0 que todos pasmam é a facilidade do repór¬ter do Excelsior, a indiscrição que revela a sua política... tanta porta aberta, tanta gente cega e papel queimado! É deveras uma coisa espantosa que merece consagração teatral à americana." Mas a 13 de Fevereiro, o órgão oficial dos miguelistas retira a notícia de quarentena. No encontro de Dover "estabeleceu-se de uma forma nítida e bem definida a união comum das duas Casas, esquecendo rivalidades, sem que nenhum dos régios personagens abdique dos seus direitos e tradições."
Teria D. Manuel II acordado a passagem de testemunho ao primo, pai do actual pretendente? No livro-entrevista, de Palmira Correia, "D. Duarte de Bragança" (2006), o actual pretendente considera a questão descabida: "Há uns indivíduos um bocado atrevidos que põem em causa a existência do pacto de Dover", cujo documento "deve ter desaparecido durante a guerra". A historiadora Maria Cândida Pro¬ença, na recente biografia "D. Manuel II" (2006) é categórica: "enquanto não surgir qualquer novo documento, nada nos permite afirmar que existiu um Pacto de Dover com o significado e a redacção do articulado que se lhe atribui."
Em "A Crise Monárquica: documentos para a história e liquidação de responsabilidades", publicado em 1934, Luiz de Magalhães, recorda que as duas facções (manuelistas e miguelistas) tinham negociado a exclusão sucessória de Miguel Maximiliano e Francisco José de Bragança. D. Manuel II e D. Miguel, em vez de subs¬creverem um único documento, trocariam car¬tas fechadas, dados os "melindres" e as "inter¬pretações menos lisonjeiras" para "os príncipes excluídos da sucessão à coroa". O documento humilhante, para estes, deixará de ter razão de existir, em 1920, por força dos factos.
Um dos Miguéis, o pai ou o filho, era oficial do exército prussiano", denunciou "O de Aveiro", em Junho de 1916, em crónica do jornalista Homem Cristo, «monárquico ferozmente anti-miguelista.
À luz dos dados mais recentes a acusação parece de má-fé. 0 príncipe e os dois filhos teriam abandonado o exército das Potências Centrais para servirem na Cruz Vermelha e não pegar em armas contra Portugal. Noticia-o o muito sério jornal britânico "Times", a 17 de Março desse ano, poucos dias após o ulti¬mato da Alemanha. A notícia foi exumada dos arquivos para uma breve nota de roda-pé pelo historiador americano Russel Benton na sua bio¬grafia: "The Downfall of a King, Dom Manuel II of Portugal" (1977).
A família de Bragança vive momentos difíceis finda a I guerra mundial. Implantada a república na Viena, outrora imperial, a Áustria é um país pequeno e derrotado. "O futuro parece-me tão escuro que quase se deve ter inveja daqueles que, com a Graça de Deus, já não o têm diante de si", escreve Miguel (II) ao amigo, João de Almeida, marquês do Lavradio.
"Há alguns dias recebi a tristíssima notícia da morte do meu querido filho Chico". Francisco José morrera em Itália, perto de Nápoles, sem descendência. Inúmeros textos monárquicos referem que faleceu num campo de prisioneiros de guerra
Portugal saíra vitorioso, entre os aliados, e profundamente ferido. No ano anterior, num só dia, na batalha do rio Lys, na Flandres, em algumas horas perdera 7425 dos seus filhos, sob o fogo da artilharia e aviação alemã. Uma delegação de monárquicos, integralistas e legitimistas, visita o príncipe de Bragança, em Bronnbach, a 18 de Julho de 1920. E dá-lhe um ultimato. A vitória das nações aliadas, contras as quais ele e os dois filhos mais velhos "tinham pegado em armas", ditava-lhes a renúncia a favor de Duarte Nuno, o benjamim, com 12 anos. 0 pedido foi aceite.
O primogénito, Miguel Maximiliano, entrega uma declaração dois dias depois: "Decido por minha livre e espontanea vontade renunciar de hoje em diante, para todo o sempre, por mim e meus descendentes, à sucessão à coroa portuguesa." Tinha então três crianças, Isabel, João e Miguel, com nove, sete e cinco anos. Nenhum dos seus descendentes refutou a legitimidade do avô em abdicar em nome dos filhos já nascidos.
Miguel (II) de Bragança morre em 1927, na Áustria; Miguel Maxmiliano, o filho mais velho, em 1923, em Nova Iorque; o ex-rei D. Manuel II, em Londres, sem descendência, em 1932, no exílio. Duarte Nuno de Bragança, aos 23 anos, reclama em vão aos Estado português, os bens do morgadio da Casa de Bragança, após reco¬nhecido pelas organizações monárquicas como sucessor à coroa. Alguns fiéis à memória de D. Manuel II mantinham-se contudo relutantes.
António Cabral publica "El-Rei Dom Duarte II - Rei Morto Rei posto". Elogioso para com o biografado, cita textualmente o suposto articulado do pacto. O ex-rei teria subscrito, no segundo artigo, que em caso de morte sem sucessão, "o direito ao trono de Portugal pertencerá a S.A, o infante D. Duarte, terceiro filho do Senhor D. Miguel". Mil vezes repetido, até hoje, o documento original nunca foi encontrado.
Interessante este artigo ?
Cumprimentos
Ricardo Charters d'Azevedo
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RE: Reflexo da preocupação com a sondagem Monarquia/República?
Caro Ricardo Charters,
Ficou mesmo preocupado com a sondagem Monarquia/República no sapo on line, não foi ?
http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=296689#lista
Cumprimentos amigos,
António Taveira
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Sobre as histórias que antecederam o pacto de Dover, se é que o houve...
Caro António Taveira
Eu? Preocupado ? Não, olhe que não...
Até porque nunca será no meu "tempo" de vida que eu verei iniciar-se qualquer processo que possa conduzir a uma eventual mudança para um regime monárquico.
E você, caro Taveira, não quererá assistir a essa mudança, pois sera triste ver quantos se colocarão em bicos de pés para receber "mercês, mesmo que as tenham de vir a pagar. Já hoje, é o que é...
Não terei razão ?
Sobre a história que apresentei em : http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=296998#lista, que repito, foi publicada na revista domingueira, a "Pública" do jornal "Publico", em 2007, tem interesse pois nunca vi, nem um desmentido, nem um outro artigo que desminta o que la se escreve, ou refira que a analise apresentada dos factos que foram recolhidos pelo jornalista não está correta.
Chamo a atenção que tal artigo não é um artigo contra o regime monárquico, que fique bem claro.Digo-o para o sossegar. Lembro-lhe que todos encontramos na história, histórias semelhantes passadas com reis, príncipes e outras altas figuras do Estado, que era monárquico. E sobre republicanos já se escreveu igualmente muito do mesmo género, e tal não significa que se ataca o regime republicano.
Mas de qualquer maneira é interessante registar neste forum a história que foi contada pelo Público.
Cumprimentos amigos
Ricardo Charters d'Azevedo
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