Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
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Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
In “Publico” de 14 Out. 2012 por Frederico Carvalho
Afinal quem chegou primeiro ao Brasil, Pedro Álvares Cabral ou Duarte Pacheco Pereira? Uma nova resposta é dada por Francisco Contente Domingues, da Universidade de Lisboa: Duarte Pacheco Pereira foi lá em 1498, mas não percebeu onde estava, por ter uma imagem errada do mundo
Duarte Pacheco Pereira, um dos grandes navegadores dos séculos XV-XVI e capitão de guerra na índia, primeiro grande herói da Expansão recebido em Lisboa com um desfile triunfal e a quem Camões chamou "Aquiles lusitano", deixou na obra Esmeraldo de Situ Orbis frases que têm sido tomadas como prova do descobrimento do Brasil antes de 1500, a data oficial. O debate mantém-se aceso desde que o escrito foi revelado em 1892. Francisco Contente Domingues, professor de História dos Descobrimentos na Universidade de Lisboa, propõe-se romper o círculo vicioso com uma interpretação inovadora, num livro lançado esta semana em Lisboa: A Travessia do Mar Oceano. A viagem ao Brasil de Duarte Pacheco Pereira em 1498 (ed. Tribuna da História).
- “Porquê voltar a debater hoje as incógnitas da exploração de Duarte Pacheco Pereira em 1498, depois de mais de um século de polémicas? “Porque é um problema que está mal resolvido.
- “Decidiu pôr perguntas novas à passagem do Esmeraldo de Situ Orbis onde é mencionada a travessia do Atlântico. Pode sintetizar a sua proposta?” Acho que nunca foi colocada a questão de se saber o resultado da viagem em função da visão do
mundo do próprio navegador. Os historiadores pensaram sempre em função da imagem do mundo que temos hoje. Assim sendo, discutiram resultados que não eram compatíveis com aquilo que o navegador encontrou. Depois, a visão do mundo que está plasmada no Esmeraldo tem uma expressão cartográfica. Há um mapa de 1519 que ilustra bem o que é a concepção de Duarte Pacheco Pereira - coisa que já foi notada desde Armando Cortesão, mas nunca tinha sido feita a articulação entre o texto e o mapa para chegar à conclusão devida sobre o alcance da viagem.
- “Ponto capital da sua interpretação: Pacheco Pereira passou para a outra margem e chegou a uma terra desconhecida que, para ele, não era continental nem insular. Era o quê, então?”
Uma das duas concepções do mundo dominantes na época pretendia que todo o mundo conhecido e todos os oceanos eram rodeados por terra. No texto de Pacheco Pereira, aquilo que ele está verdadeiramente a discutir quando fala desta viagem é qual a proporção entre terra e água. Ele conclui que a terra ocupa a maior parte do espaço e que a água se situa no centro. É, em termos gerais, a concepção ptolomaica do mundo [de Cláudio Ptolomeu, séc. II d.C.]. Duarte Pacheco pensa que chegou a essa terra que tudo envolve - como ele diz, "que vai em cercoito per toda a redondeza". A ideia de continente ou de ilha não se aplica a este conceito.
- “Mas concorda com Jorge Couto, que diz em A Construção do Brasil (ed. Cosmos, 1995) que o Esmeraldo mostra uma "observação directa" da orla marítima da região amazónica?” Concordo genericamente. Pacheco Pereira deve ter estado naquilo a que nós hoje chamamos Brasil, e a descrição que faz pode significar que andou também pelo mar das Caraíbas. Creio que foi uma viagem longa, ligada à necessidade de identificar os territórios que pertenciam a Portugal ou a Castela de acordo com o Tratado de Tordesilhas, de 1494.
- “Escreve no seu livro: "Discutir quem foi o primeiro a chegar a uma terra até então desconhecida podia fazer sentido há 50 anos, mas hoje não é assim". A maioria das pessoas que se interessam pelos Descobrimentos fora do mundo académico diria o contrário. Quer explicar? “Quando pensamos em descobrimentos em História, pensamos num universo cultural que detém um conhecimento geográfico e vê esse conhecimento ser acrescido. Saber quem foi o primeiro a chegar a um sítio é impossível. Quando muito, podemos saber quem foi o primeiro que deixou notícia de ter chegado. A segunda distinção tem a ver com o impacto dessa viagem. Uma viagem fortuita que não tem consequências não cabe na noção de descobrimento como nós a usamos. A questão não é ir pela primeira vez: é ir, dar conhecimento dessa nova realidade e haver capacidade para lá voltar sucessivamente, integrando esse território no conhecimento colectivo. Normalmente a forma como isso ocorre é através da representação cartográfica.
- “A questão da primazia perde então toda a relevância?” Pode ter alguma relevância quando há viagens praticamente simultâneas e se põem questões de natureza política quanto à ocupação de territórios.
- “Mas a viagem de Pacheco Pereira não foi fortuita. Eie diz que a fez a mando do rei”. Não foi fortuita, foi de certeza muito intencional. Mas julgo, porque certezas absolutas não há, que não foi feita com o objectivo de descobrir terras novas.
- “A carta de Pêro Vaz de Caminha a D. Manuel I, em 1500, deve assim continuar a ser considerada a "certidão de nascimento" do Brasil?” Sim, é um dos três documentos que elucidam uma viagem [a de Pedro Álvares Cabral] e pode ser considerada o primeiro testemunho real e duradouro da chegada dos portugueses ao Brasil, a par das cartas de Mestre João e do chamado Piloto Anónimo. A carta de Pêro Vaz é a mais importante das três.
- “Como explicar que Duarte Pacheco tenha mantido uma ideia próxima da Geografia de Ptolomeu, vendo o Atlântico como "uma muito grande alagoa metida dentro na concavidade da terra", sendo ele um perito da navegação, tendo participado nas negociações do Tratado de Tordesilhas e viajado até à índia duas vezes, e quando em Portugal já se produziam mapas como o Planisfério de Cantino, em 1502?”
Essa é a parte difícil de entender, apenas porque para nós hoje não é fácil compreender que haja duas maneiras radicalmente distintas e coexistentes de ver o mundo. A questão é essa: há. Na época, muita gente acreditava que o mundo era como disse Ptolomeu, enquanto outros acreditavam exactamente no contrário, que a água rodeia toda a terra. Isto tem a ver com o facto de a representação de Ptolomeu não ser conflituante com as viagens feitas até então. Por outro lado, joga-se em cima da mesa quer todo o prestígio da cultura clássica, quer o facto de a imagem de Ptolomeu ser aquela que mais se aproxima dos textos sagrados, e da Bíblia em primeiro lugar. Digamos que seria mais lógico as pessoas estarem de acordo com Ptolomeu do que com a perspectiva contrária.
- “Mas quando foi escrito o Esmeraldo as navegações não tinham já mostrado erros de Ptolomeu?”
O Esmeraldo terá sido escrito entre 1505 e 1508, e em 1507 saiu uma edição extremamente interessante da Geografia de Ptolomeu. Até então, as cartas acrescentadas a Ptolomeu mostravam que não havia ligação entre o Atlântico e o Índico. Na nova edição, as chamadas "tábuas novas" já mostram a ligação dos oceanos, mas ao mesmo tempo continuam a incluir-se as cartas antigas em que a ligação não existe. É a melhor prova de que esta é uma matéria conflitual.
- “O facto de o Esmeraldo se ter mantido impublicado pode explicar-se por ter sido contraditado pela circum-navegação de Magalhães e Elcano, em 1519-22?” Penso que a razão é exactamente essa. Tem havido discussão sobre isso, e alguns autores pretenderam que havia sobre a obra uma espécie de segredo devido à sua importância. Mas na verdade o Esmeraldo circulava em cópias manuscritas. Foi utilizado por João de Barros e foi levado para Espanha por um espião ao serviço de Filipe II chamado João Baptista Gésio.
- “Em que medida a exploração de Pacheco Pereira está ligada à terceira viagem de Colombo, que ia reconhecer a parte Sul das novas descobertas? Os reinos ibéricos, mesmo depois de Tordesilhas, estavam numa corrida de marcação de território?”
A demarcação interessava mais a Castela do que a Portugal, porque Portugal estava voltado para o Oriente. Mas julgo que havia interesse em tentar perceber o que havia ali, porque em 1498 ninguém tinha a certeza. Creio, por isso, não ser coincidência que Colombo tenha feito uma viagem para explorar parte da costa sul-americana ao mesmo tempo que Duarte Pacheco fala da sua viagem.
- “Vários autores dizem que D. Manuel não divulgou a viagem de Duarte Pacheco porque percebeu que boa parte do litoral percorrido estava na esfera castelhana. Concorda? “
É muito possível que ele tenha viajado por regiões que pertenceriam a Castela. Mas eu não tenho resposta para tudo, e ninguém tem.
- “Noutros escritos seus, refuta a ideia de que houve uma política de sigilo dos monarcas portugueses relativa às navegações. Então o silêncio sobre a exploração de Pacheco Pereira e a retenção durante um ano da informação da descoberta de Cabral são meramente circunstanciais? “Refuto a existência da política de sigilo no exacto seguimento do que foi escrito por Damião Peres há uns 80 anos: o sigilo é um contra-senso, porque na ausência de regulação político-diplomática, como a que decorre de tratados, o principal critério que permite reclamar a soberania de uma terra é dizer que se chegou lá primeiro. O que faz sentido é publicitar. Em relação ao que nós hoje chamamos Brasil, penso que era um destino secundário para as navegações portuguesas, que estavam completamente voltadas para o Oriente. No final do século XV e primeiras décadas do século XVI, o rei via a costa brasileira como ponto de apoio da rota da índia e não um destino em si mesma. A exploração do território não se tornou um projecto da Coroa de imediato.
- “Diz acreditar que Pacheco não foi estranho à elaboração do mapa-múndi de Lopo Homem, de 1519, mas só revelado no século XX. Esse mapa apresenta uma reconhecível costa brasileira, mas desenha-a como excrescência de uma terra que circunda os velhos três continentes e os oceanos, ao arrepio de quase toda a cartografia da época. Como crer que Pacheco Pereira tenha colaborado nessa visão depois, por exemplo, do famoso mapa de Waldseemiiller, em que surge o nome América, em 1507?”
A influência de Pacheco Pereira pode ter existido na construção de um mapa que reflecte exactamente aquilo que ele pensava, mas em rigor não é necessária; havia várias pessoas a pensar a mesma coisa. A coincidência no tempo e no espaço da redacção do Esmeraldo e da elaboração do mapa de Waldseemiiller também não deve espantar-nos: como já disse, visões do mundo opostas são perfeitamente coexistentes. Os europeus ainda não têm o quadro do conhecimento geográfico global. Compreender essa coexistência, insisto, é a dificuldade do historiador actual.
- “A frase mais citada do Esmeraldo é "a experiência, que é madre das cousas, nos desengana e de todas as dúvidas nos tira". Na sua análise mostra como o autor invoca a experiência para dar força à descrição errada do mundo. E distingue esta experiência prática da experimentação-base da revolução científica do séc. XVII, como construída por Galileu, Bacon ou Newton.” Está perfeitamente claro que a experiência de Pacheco Pereira é a experiência empírica e não a científica. O que é interessante é que a experiência é o terceiro argumento que ele invoca, por ordem de importância, para justificar a sua visão da forma do mundo, depois dos textos bíblicos e dos autores da Igreja medieval. A experiência dele certifica um erro.
- “Concluindo: afinal tanto Colombo, que morreu acreditando ter chegado perto da China ou da índia, como Pacheco Pereira, pelo que sabemos o primeiro a atingir a costa do Brasil, estavam os dois fundamentalmente errados?”
Penso que Colombo, no final da vida, sabia aonde tinha chegado. Era melhor navegador do que aquilo que a historiografia portuguesa gosta de admitir, e não tão excelente como muitos historiadores italianos e castelhanos gostam de dizer. O engano que cometeu na primeira viagem não era sustentável por muito tempo. Julgo que a persistência na afirmação de que chegara ao destino original tinha a ver com a necessidade de manter a sua posição perante os patronos, os Reis Católicos -mas ninguém podia adivinhar na época que existia aquele quarto continente. Quanto a Pacheco Pereira, haveria de perceber ainda em vida, com a circum-navegação de Fernão de Magalhães, que o mundo não era como ele pensava.
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Cumprimentos
Ricardo Charters d’Azevedo
Direct link:
RE: Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
Autor: chartri [responder para o fórum]
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In “Publico” de 14 Out. 2012 por Frederico Carvalho
Afinal quem chegou primeiro ao Brasil, Pedro Álvares Cabral ou Duarte Pacheco Pereira? Uma nova resposta é dada por Francisco Contente Domingues, da Universidade de Lisboa: Duarte Pacheco Pereira foi lá em 1498, mas não percebeu onde estava, por ter uma imagem errada do mundo
Duarte Pacheco Pereira, um dos grandes navegadores dos séculos XV-XVI e capitão de guerra na índia, primeiro grande herói da Expansão recebido em Lisboa com um desfile triunfal e a quem Camões chamou "Aquiles lusitano", deixou na obra Esmeraldo de Situ Orbis frases que têm sido tomadas como prova do descobrimento do Brasil antes de 1500, a data oficial. O debate mantém-se aceso desde que o escrito foi revelado em 1892. Francisco Contente Domingues, professor de História dos Descobrimentos na Universidade de Lisboa, propõe-se romper o círculo vicioso com uma interpretação inovadora, num livro lançado esta semana em Lisboa: A Travessia do Mar Oceano. A viagem ao Brasil de Duarte Pacheco Pereira em 1498 (ed. Tribuna da História).
- “Porquê voltar a debater hoje as incógnitas da exploração de Duarte Pacheco Pereira em 1498, depois de mais de um século de polémicas? “Porque é um problema que está mal resolvido.
- “Decidiu pôr perguntas novas à passagem do Esmeraldo de Situ Orbis onde é mencionada a travessia do Atlântico. Pode sintetizar a sua proposta?” Acho que nunca foi colocada a questão de se saber o resultado da viagem em função da visão do
mundo do próprio navegador. Os historiadores pensaram sempre em função da imagem do mundo que temos hoje. Assim sendo, discutiram resultados que não eram compatíveis com aquilo que o navegador encontrou. Depois, a visão do mundo que está plasmada no Esmeraldo tem uma expressão cartográfica. Há um mapa de 1519 que ilustra bem o que é a concepção de Duarte Pacheco Pereira - coisa que já foi notada desde Armando Cortesão, mas nunca tinha sido feita a articulação entre o texto e o mapa para chegar à conclusão devida sobre o alcance da viagem.
- “Ponto capital da sua interpretação: Pacheco Pereira passou para a outra margem e chegou a uma terra desconhecida que, para ele, não era continental nem insular. Era o quê, então?”
Uma das duas concepções do mundo dominantes na época pretendia que todo o mundo conhecido e todos os oceanos eram rodeados por terra. No texto de Pacheco Pereira, aquilo que ele está verdadeiramente a discutir quando fala desta viagem é qual a proporção entre terra e água. Ele conclui que a terra ocupa a maior parte do espaço e que a água se situa no centro. É, em termos gerais, a concepção ptolomaica do mundo [de Cláudio Ptolomeu, séc. II d.C.]. Duarte Pacheco pensa que chegou a essa terra que tudo envolve - como ele diz, "que vai em cercoito per toda a redondeza". A ideia de continente ou de ilha não se aplica a este conceito.
- “Mas concorda com Jorge Couto, que diz em A Construção do Brasil (ed. Cosmos, 1995) que o Esmeraldo mostra uma "observação directa" da orla marítima da região amazónica?” Concordo genericamente. Pacheco Pereira deve ter estado naquilo a que nós hoje chamamos Brasil, e a descrição que faz pode significar que andou também pelo mar das Caraíbas. Creio que foi uma viagem longa, ligada à necessidade de identificar os territórios que pertenciam a Portugal ou a Castela de acordo com o Tratado de Tordesilhas, de 1494.
- “Escreve no seu livro: "Discutir quem foi o primeiro a chegar a uma terra até então desconhecida podia fazer sentido há 50 anos, mas hoje não é assim". A maioria das pessoas que se interessam pelos Descobrimentos fora do mundo académico diria o contrário. Quer explicar? “Quando pensamos em descobrimentos em História, pensamos num universo cultural que detém um conhecimento geográfico e vê esse conhecimento ser acrescido. Saber quem foi o primeiro a chegar a um sítio é impossível. Quando muito, podemos saber quem foi o primeiro que deixou notícia de ter chegado. A segunda distinção tem a ver com o impacto dessa viagem. Uma viagem fortuita que não tem consequências não cabe na noção de descobrimento como nós a usamos. A questão não é ir pela primeira vez: é ir, dar conhecimento dessa nova realidade e haver capacidade para lá voltar sucessivamente, integrando esse território no conhecimento colectivo. Normalmente a forma como isso ocorre é através da representação cartográfica.
- “A questão da primazia perde então toda a relevância?” Pode ter alguma relevância quando há viagens praticamente simultâneas e se põem questões de natureza política quanto à ocupação de territórios.
- “Mas a viagem de Pacheco Pereira não foi fortuita. Eie diz que a fez a mando do rei”. Não foi fortuita, foi de certeza muito intencional. Mas julgo, porque certezas absolutas não há, que não foi feita com o objectivo de descobrir terras novas.
- “A carta de Pêro Vaz de Caminha a D. Manuel I, em 1500, deve assim continuar a ser considerada a "certidão de nascimento" do Brasil?” Sim, é um dos três documentos que elucidam uma viagem [a de Pedro Álvares Cabral] e pode ser considerada o primeiro testemunho real e duradouro da chegada dos portugueses ao Brasil, a par das cartas de Mestre João e do chamado Piloto Anónimo. A carta de Pêro Vaz é a mais importante das três.
- “Como explicar que Duarte Pacheco tenha mantido uma ideia próxima da Geografia de Ptolomeu, vendo o Atlântico como "uma muito grande alagoa metida dentro na concavidade da terra", sendo ele um perito da navegação, tendo participado nas negociações do Tratado de Tordesilhas e viajado até à índia duas vezes, e quando em Portugal já se produziam mapas como o Planisfério de Cantino, em 1502?”
Essa é a parte difícil de entender, apenas porque para nós hoje não é fácil compreender que haja duas maneiras radicalmente distintas e coexistentes de ver o mundo. A questão é essa: há. Na época, muita gente acreditava que o mundo era como disse Ptolomeu, enquanto outros acreditavam exactamente no contrário, que a água rodeia toda a terra. Isto tem a ver com o facto de a representação de Ptolomeu não ser conflituante com as viagens feitas até então. Por outro lado, joga-se em cima da mesa quer todo o prestígio da cultura clássica, quer o facto de a imagem de Ptolomeu ser aquela que mais se aproxima dos textos sagrados, e da Bíblia em primeiro lugar. Digamos que seria mais lógico as pessoas estarem de acordo com Ptolomeu do que com a perspectiva contrária.
- “Mas quando foi escrito o Esmeraldo as navegações não tinham já mostrado erros de Ptolomeu?”
O Esmeraldo terá sido escrito entre 1505 e 1508, e em 1507 saiu uma edição extremamente interessante da Geografia de Ptolomeu. Até então, as cartas acrescentadas a Ptolomeu mostravam que não havia ligação entre o Atlântico e o Índico. Na nova edição, as chamadas "tábuas novas" já mostram a ligação dos oceanos, mas ao mesmo tempo continuam a incluir-se as cartas antigas em que a ligação não existe. É a melhor prova de que esta é uma matéria conflitual.
- “O facto de o Esmeraldo se ter mantido impublicado pode explicar-se por ter sido contraditado pela circum-navegação de Magalhães e Elcano, em 1519-22?”
Penso que a razão é exactamente essa. Tem havido discussão sobre isso, e alguns autores pretenderam que havia sobre a obra uma espécie de segredo devido à sua importância. Mas na verdade o Esmeraldo circulava em cópias manuscritas. Foi utilizado por João de Barros e foi levado para Espanha por um espião ao serviço de Filipe II chamado João Baptista Gésio.
- “Em que medida a exploração de Pacheco Pereira está ligada à terceira viagem de Colombo, que ia reconhecer a parte Sul das novas descobertas? Os reinos ibéricos, mesmo depois de Tordesilhas, estavam numa corrida de marcação de território?”
A demarcação interessava mais a Castela do que a Portugal, porque Portugal estava voltado para o Oriente. Mas julgo que havia interesse em tentar perceber o que havia ali, porque em 1498 ninguém tinha a certeza. Creio, por isso, não ser coincidência que
Colombo tenha feito uma viagem para explorar parte da costa sul-americana ao mesmo tempo que Duarte Pacheco fala da sua viagem.
- “Vários autores dizem que D. Manuel não divulgou a viagem de Duarte Pacheco porque percebeu que boa parte do litoral percorrido estava na esfera castelhana. Concorda? “
É muito possível que ele tenha viajado por regiões que pertenceriam a Castela. Mas eu não tenho resposta para tudo, e ninguém tem.
- “Noutros escritos seus, refuta a ideia de que houve uma política de sigilo dos monarcas portugueses relativa às navegações. Então o silêncio sobre a exploração de Pacheco Pereira e a retenção durante um ano da informação da descoberta de Cabral são meramente circunstanciais? “
Refuto a existência da política de sigilo no exacto seguimento do que foi escrito por Damião Peres há uns 80 anos: o sigilo é um contra-senso, porque na ausência de regulação político-diplomática, como a que decorre de tratados, o principal critério que permite reclamar a soberania de uma terra é dizer que se chegou lá primeiro. O que faz sentido é publicitar. Em relação ao que nós hoje chamamos Brasil, penso que era um destino secundário para as navegações portuguesas, que estavam completamente voltadas para o Oriente. No final do século XV e primeiras décadas do século XVI, o rei via a costa brasileira como ponto de apoio da rota da índia e não um destino em si mesma. A exploração do território não se tornou um projecto da Coroa de imediato.
- “Diz acreditar que Pacheco não foi estranho à elaboração do mapa-múndi de Lopo Homem, de 1519, mas só revelado no século XX. Esse mapa apresenta uma reconhecível costa brasileira, mas desenha-a como excrescência de uma terra que circunda os velhos três continentes e os oceanos, ao arrepio de quase toda a cartografia da época. Como crer que Pacheco Pereira tenha colaborado nessa visão depois, por exemplo, do famoso mapa de Waldseemiiller, em que surge o nome América, em 1507?”
A influência de Pacheco Pereira pode ter existido na construção de um mapa que reflecte exactamente aquilo que ele pensava, mas em rigor não é necessária; havia várias pessoas a pensar a mesma coisa. A coincidência no tempo e no espaço da redacção do Esmeraldo e da elaboração do mapa de Waldseemiiller também não deve espantar-nos: como já disse, visões do mundo opostas são perfeitamente coexistentes. Os europeus ainda não têm o quadro do conhecimento geográfico global. Compreender essa coexistência, insisto, é a dificuldade do historiador actual.
- “A frase mais citada do Esmeraldo é "a experiência, que é madre das cousas, nos desengana e de todas as dúvidas nos tira". Na sua análise mostra como o autor invoca a experiência para dar força à descrição errada do mundo. E distingue esta experiência prática da experimentação-base da revolução científica do séc. XVII, como construída por Galileu, Bacon ou Newton.”
Está perfeitamente claro que a experiência de Pacheco Pereira é a experiência empírica e não a científica. O que é interessante é que a experiência é o terceiro argumento que ele invoca, por ordem de importância, para justificar a sua visão da forma do mundo, depois dos textos bíblicos e dos autores da Igreja medieval. A experiência dele certifica um erro.
- “Concluindo: afinal tanto Colombo, que morreu acreditando ter chegado perto da China ou da índia, como Pacheco Pereira, pelo que sabemos o primeiro a atingir a costa do Brasil, estavam os dois fundamentalmente errados?”
Penso que Colombo, no final da vida, sabia aonde tinha chegado. Era melhor navegador do que aquilo que a historiografia portuguesa gosta de admitir, e não tão excelente como muitos historiadores italianos e castelhanos gostam de dizer. O engano que cometeu na primeira viagem não era sustentável por muito tempo. Julgo que a persistência na afirmação de que chegara ao destino original tinha a ver com a necessidade de manter a sua posição perante os patronos, os Reis Católicos -mas ninguém podia adivinhar na época que existia aquele quarto continente. Quanto a Pacheco Pereira, haveria de perceber ainda em vida, com a circum-navegação de Fernão de Magalhães, que o mundo não era como ele pensava.
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Cumprimentos
Ricardo Charters d’Azevedo
Direct link:
RE: Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
Esta não percebi
Repete a minha mensagem...
Direct link:
RE: ERRATA: Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
Caros confrades,
Gostaria de realçar as seguintes passagens da entrevista collocada pello confrade Ricardo Charters d'Azevedo, cuja leitura se recommenda:
Uma pergunta que illustra bem importantes differenças entre o universo academico e o mundo fora das universidades: “Escreve no seu livro: "Discutir quem foi o primeiro a chegar a uma terra até então desconhecida podia fazer sentido há 50 anos, mas hoje não é assim". A maioria das pessoas que se interessam pelos Descobrimentos fora do mundo académico diria o contrário. Quer explicar?"
O inicio de uma resposta a outra questão: "Essa é a parte difícil de entender, apenas porque para nós hoje não é fácil compreender que haja duas maneiras radicalmente distintas e coexistentes de ver o mundo. A questão é essa: há."
E uma resposta simplesmente magnifica em toda a sua humildade: "É muito possível que [...]. Mas eu não tenho resposta para tudo, e ninguém tem."
Assim fala um historiador, quando não existem provas. Obrigado confrade Ricardo Charters d'Azevedo pello texto, que reproduzo na integra, apenas dividido em paragraphos para facilitar a leitura.
Cumprimentos,
Anachronico
Autor: chartri [responder para o fórum]
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In “Publico” de 14 Out. 2012 por Frederico Carvalho
Afinal quem chegou primeiro ao Brasil, Pedro Álvares Cabral ou Duarte Pacheco Pereira? Uma nova resposta é dada por Francisco Contente Domingues, da Universidade de Lisboa: Duarte Pacheco Pereira foi lá em 1498, mas não percebeu onde estava, por ter uma imagem errada do mundo
Duarte Pacheco Pereira, um dos grandes navegadores dos séculos XV-XVI e capitão de guerra na índia, primeiro grande herói da Expansão recebido em Lisboa com um desfile triunfal e a quem Camões chamou "Aquiles lusitano", deixou na obra Esmeraldo de Situ Orbis frases que têm sido tomadas como prova do descobrimento do Brasil antes de 1500, a data oficial. O debate mantém-se aceso desde que o escrito foi revelado em 1892. Francisco Contente Domingues, professor de História dos Descobrimentos na Universidade de Lisboa, propõe-se romper o círculo vicioso com uma interpretação inovadora, num livro lançado esta semana em Lisboa: A Travessia do Mar Oceano. A viagem ao Brasil de Duarte Pacheco Pereira em 1498 (ed. Tribuna da História).
- “Porquê voltar a debater hoje as incógnitas da exploração de Duarte Pacheco Pereira em 1498, depois de mais de um século de polémicas? “
Porque é um problema que está mal resolvido.
- “Decidiu pôr perguntas novas à passagem do Esmeraldo de Situ Orbis onde é mencionada a travessia do Atlântico. Pode sintetizar a sua proposta?”
Acho que nunca foi colocada a questão de se saber o resultado da viagem em função da visão do mundo do próprio navegador. Os historiadores pensaram sempre em função da imagem do mundo que temos hoje. Assim sendo, discutiram resultados que não eram compatíveis com aquilo que o navegador encontrou. Depois, a visão do mundo que está plasmada no Esmeraldo tem uma expressão cartográfica. Há um mapa de 1519 que ilustra bem o que é a concepção de Duarte Pacheco Pereira - coisa que já foi notada desde Armando Cortesão, mas nunca tinha sido feita a articulação entre o texto e o mapa para chegar à conclusão devida sobre o alcance da viagem.
- “Ponto capital da sua interpretação: Pacheco Pereira passou para a outra margem e chegou a uma terra desconhecida que, para ele, não era continental nem insular. Era o quê, então?”
Uma das duas concepções do mundo dominantes na época pretendia que todo o mundo conhecido e todos os oceanos eram rodeados por terra. No texto de Pacheco Pereira, aquilo que ele está verdadeiramente a discutir quando fala desta viagem é qual a proporção entre terra e água. Ele conclui que a terra ocupa a maior parte do espaço e que a água se situa no centro. É, em termos gerais, a concepção ptolomaica do mundo [de Cláudio Ptolomeu, séc. II d.C.]. Duarte Pacheco pensa que chegou a essa terra que tudo envolve - como ele diz, "que vai em cercoito per toda a redondeza". A ideia de continente ou de ilha não se aplica a este conceito.
- “Mas concorda com Jorge Couto, que diz em A Construção do Brasil (ed. Cosmos, 1995) que o Esmeraldo mostra uma "observação directa" da orla marítima da região amazónica?”
Concordo genericamente. Pacheco Pereira deve ter estado naquilo a que nós hoje chamamos Brasil, e a descrição que faz pode significar que andou também pelo mar das Caraíbas. Creio que foi uma viagem longa, ligada à necessidade de identificar os territórios que pertenciam a Portugal ou a Castela de acordo com o Tratado de Tordesilhas, de 1494.
- “Escreve no seu livro: "Discutir quem foi o primeiro a chegar a uma terra até então desconhecida podia fazer sentido há 50 anos, mas hoje não é assim". A maioria das pessoas que se interessam pelos Descobrimentos fora do mundo académico diria o contrário. Quer explicar? “
Quando pensamos em descobrimentos em História, pensamos num universo cultural que detém um conhecimento geográfico e vê esse conhecimento ser acrescido. Saber quem foi o primeiro a chegar a um sítio é impossível. Quando muito, podemos saber quem foi o primeiro que deixou notícia de ter chegado. A segunda distinção tem a ver com o impacto dessa viagem. Uma viagem fortuita que não tem consequências não cabe na noção de descobrimento como nós a usamos. A questão não é ir pela primeira vez: é ir, dar conhecimento dessa nova realidade e haver capacidade para lá voltar sucessivamente, integrando esse território no conhecimento colectivo. Normalmente a forma como isso ocorre é através da representação cartográfica.
- “A questão da primazia perde então toda a relevância?”
Pode ter alguma relevância quando há viagens praticamente simultâneas e se põem questões de natureza política quanto à ocupação de territórios.
- “Mas a viagem de Pacheco Pereira não foi fortuita. Eie diz que a fez a mando do rei”.
Não foi fortuita, foi de certeza muito intencional. Mas julgo, porque certezas absolutas não há, que não foi feita com o objectivo de descobrir terras novas.
- “A carta de Pêro Vaz de Caminha a D. Manuel I, em 1500, deve assim continuar a ser considerada a "certidão de nascimento" do Brasil?”
Sim, é um dos três documentos que elucidam uma viagem [a de Pedro Álvares Cabral] e pode ser considerada o primeiro testemunho real e duradouro da chegada dos portugueses ao Brasil, a par das cartas de Mestre João e do chamado Piloto Anónimo. A carta de Pêro Vaz é a mais importante das três.
- “Como explicar que Duarte Pacheco tenha mantido uma ideia próxima da Geografia de Ptolomeu, vendo o Atlântico como "uma muito grande alagoa metida dentro na concavidade da terra", sendo ele um perito da navegação, tendo participado nas negociações do Tratado de Tordesilhas e viajado até à índia duas vezes, e quando em Portugal já se produziam mapas como o Planisfério de Cantino, em 1502?”
Essa é a parte difícil de entender, apenas porque para nós hoje não é fácil compreender que haja duas maneiras radicalmente distintas e coexistentes de ver o mundo. A questão é essa: há. Na época, muita gente acreditava que o mundo era como disse Ptolomeu, enquanto outros acreditavam exactamente no contrário, que a água rodeia toda a terra. Isto tem a ver com o facto de a representação de Ptolomeu não ser conflituante com as viagens feitas até então. Por outro lado, joga-se em cima da mesa quer todo o prestígio da cultura clássica, quer o facto de a imagem de Ptolomeu ser aquela que mais se aproxima dos textos sagrados, e da Bíblia em primeiro lugar. Digamos que seria mais lógico as pessoas estarem de acordo com Ptolomeu do que com a perspectiva contrária.
- “Mas quando foi escrito o Esmeraldo as navegações não tinham já mostrado erros de Ptolomeu?”
O Esmeraldo terá sido escrito entre 1505 e 1508, e em 1507 saiu uma edição extremamente interessante da Geografia de Ptolomeu. Até então, as cartas acrescentadas a Ptolomeu mostravam que não havia ligação entre o Atlântico e o Índico. Na nova edição, as chamadas "tábuas novas" já mostram a ligação dos oceanos, mas ao mesmo tempo continuam a incluir-se as cartas antigas em que a ligação não existe. É a melhor prova de que esta é uma matéria conflitual.
- “O facto de o Esmeraldo se ter mantido impublicado pode explicar-se por ter sido contraditado pela circum-navegação de Magalhães e Elcano, em 1519-22?”
Penso que a razão é exactamente essa. Tem havido discussão sobre isso, e alguns autores pretenderam que havia sobre a obra uma espécie de segredo devido à sua importância. Mas na verdade o Esmeraldo circulava em cópias manuscritas. Foi utilizado por João de Barros e foi levado para Espanha por um espião ao serviço de Filipe II chamado João Baptista Gésio.
- “Em que medida a exploração de Pacheco Pereira está ligada à terceira viagem de Colombo, que ia reconhecer a parte Sul das novas descobertas? Os reinos ibéricos, mesmo depois de Tordesilhas, estavam numa corrida de marcação de território?”
A demarcação interessava mais a Castela do que a Portugal, porque Portugal estava voltado para o Oriente. Mas julgo que havia interesse em tentar perceber o que havia ali, porque em 1498 ninguém tinha a certeza. Creio, por isso, não ser coincidência que
Colombo tenha feito uma viagem para explorar parte da costa sul-americana ao mesmo tempo que Duarte Pacheco fala da sua viagem.
- “Vários autores dizem que D. Manuel não divulgou a viagem de Duarte Pacheco porque percebeu que boa parte do litoral percorrido estava na esfera castelhana. Concorda? “
É muito possível que ele tenha viajado por regiões que pertenceriam a Castela. Mas eu não tenho resposta para tudo, e ninguém tem.
- “Noutros escritos seus, refuta a ideia de que houve uma política de sigilo dos monarcas portugueses relativa às navegações. Então o silêncio sobre a exploração de Pacheco Pereira e a retenção durante um ano da informação da descoberta de Cabral são meramente circunstanciais? “
Refuto a existência da política de sigilo no exacto seguimento do que foi escrito por Damião Peres há uns 80 anos: o sigilo é um contra-senso, porque na ausência de regulação político-diplomática, como a que decorre de tratados, o principal critério que permite reclamar a soberania de uma terra é dizer que se chegou lá primeiro. O que faz sentido é publicitar. Em relação ao que nós hoje chamamos Brasil, penso que era um destino secundário para as navegações portuguesas, que estavam completamente voltadas para o Oriente. No final do século XV e primeiras décadas do século XVI, o rei via a costa brasileira como ponto de apoio da rota da índia e não um destino em si mesma. A exploração do território não se tornou um projecto da Coroa de imediato.
- “Diz acreditar que Pacheco não foi estranho à elaboração do mapa-múndi de Lopo Homem, de 1519, mas só revelado no século XX. Esse mapa apresenta uma reconhecível costa brasileira, mas desenha-a como excrescência de uma terra que circunda os velhos três continentes e os oceanos, ao arrepio de quase toda a cartografia da época. Como crer que Pacheco Pereira tenha colaborado nessa visão depois, por exemplo, do famoso mapa de Waldseemiiller, em que surge o nome América, em 1507?”
A influência de Pacheco Pereira pode ter existido na construção de um mapa que reflecte exactamente aquilo que ele pensava, mas em rigor não é necessária; havia várias pessoas a pensar a mesma coisa. A coincidência no tempo e no espaço da redacção do Esmeraldo e da elaboração do mapa de Waldseemiiller também não deve espantar-nos: como já disse, visões do mundo opostas são perfeitamente coexistentes. Os europeus ainda não têm o quadro do conhecimento geográfico global. Compreender essa coexistência, insisto, é a dificuldade do historiador actual.
- “A frase mais citada do Esmeraldo é "a experiência, que é madre das cousas, nos desengana e de todas as dúvidas nos tira". Na sua análise mostra como o autor invoca a experiência para dar força à descrição errada do mundo. E distingue esta experiência prática da experimentação-base da revolução científica do séc. XVII, como construída por Galileu, Bacon ou Newton.”
Está perfeitamente claro que a experiência de Pacheco Pereira é a experiência empírica e não a científica. O que é interessante é que a experiência é o terceiro argumento que ele invoca, por ordem de importância, para justificar a sua visão da forma do mundo, depois dos textos bíblicos e dos autores da Igreja medieval. A experiência dele certifica um erro.
- “Concluindo: afinal tanto Colombo, que morreu acreditando ter chegado perto da China ou da índia, como Pacheco Pereira, pelo que sabemos o primeiro a atingir a costa do Brasil, estavam os dois fundamentalmente errados?”
Penso que Colombo, no final da vida, sabia aonde tinha chegado. Era melhor navegador do que aquilo que a historiografia portuguesa gosta de admitir, e não tão excelente como muitos historiadores italianos e castelhanos gostam de dizer. O engano que cometeu na primeira viagem não era sustentável por muito tempo. Julgo que a persistência na afirmação de que chegara ao destino original tinha a ver com a necessidade de manter a sua posição perante os patronos, os Reis Católicos -mas ninguém podia adivinhar na época que existia aquele quarto continente. Quanto a Pacheco Pereira, haveria de perceber ainda em vida, com a circum-navegação de Fernão de Magalhães, que o mundo não era como ele pensava.
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Cumprimentos
Ricardo Charters d’Azevedo
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caiem os pilares RE: ERRATA: Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
Caros Confrades,
Assim começam a cair os pilares de 500 anos da nossa história dos descobrimentos.
Já não foi Cabral que descobriu o Brasil,
já "Colombo" sabia não estar na "Índia"
já se mostrou como a Islândia era já habitada por europeus no século IX.
Já os Açores eram local de paragem para aventureiros séculos antes dos Portugueses lá chegarem.
Em breve vamos começar a aceitar como os Portugueses já tinham navegado as terras das Antilhas (Canadá) antes de 1424...
.. e aceitar as palavras de Cristóvão Colon de como o Rei D. João II já tinha conhecimento de um grande continente a Sudoeste das Ilhas de Cabo Verde antes de Março de 1493....
Aplaudo a chegada da Nove Era dos Descobrimentos.
Cumprimentos,
Manuel Rosa
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RE: ERRATA: Duarte Pacheco Pereira / Esmeraldo de Situ Orbis
Caro confrade Manuel Rosa,
Voltamos a cruzar-nos. E vejo que ainda não sabe ler.
Tristemente, não entendeu absolutamente nada da entrevista.
Leia novamente o que o historiador diz. E pondere. Realmente considere as consequencias, confrade.
Porque o que escreve Manuel Rosa não é o opposto. Simplesmente passa totalmente ao lado. Não entendeu nada.
Se soubesse ler, teria visto que o que Francisco Contente Domingues escreve vai contra a sua theoria, Manuel Rosa. Mas na entrevista fala-se de questões bem mais importantes. E dilettante como é infelizmente não o sabe ver.
Leia bem o que escrevi.
Porque pensa o confrade que eu sempre affirmei estar-me completamente nas tintas para a nacionalidade de Colombo? Permitta-me dar-lhe uma ajuda, mutatis mutandis: ""Discutir a nacionalidade de Colombo podia fazer sentido há 50 anos, mas hoje não é assim". A maioria das pessoas que se interessam pelos Descobrimentos fora do mundo académico diria o contrário. Quer explicar?" E a entrevista explica-o. Apenas o Manuel Rosa não o sabe ver.
Homens como eu, que sou totalmente neutral na questão de Colombo, ou o nosso confrade António Taveira, genovista assumido mas lucido, apenas queremos conhecer a verdade. Mas, ao contrario do que Manuel Rosa sempre evidencia, nunca nos esquecemos de um dos mais importantes aspectos da Historia. Permitta-me novamente dar-lhe uma ajuda: "Essa é a parte difícil de entender, apenas porque para nós hoje não é fácil compreender que haja duas maneiras radicalmente distintas e coexistentes de ver o mundo. A questão é essa: há." Mas o Manuel Rosa apenas sabe ver uma: a sua.
O que applaudo eu em Francisco Contente Domingues? Deixe-me ajudá-lo uma ultima vez: "[u]ma resposta simplesmente magnifica em toda a sua humildade: "É muito possível que [...]. Mas eu não tenho resposta para tudo, e ninguém tem." Repare bem, Manuel Rosa, como esta phrase contrasta com a sua ultima mensagem. E com tudo o que escreve.
Não tente responder, Manuel Rosa, sem uma igual humildade. Não seja pueril.
Estamos perante um exemplo typico de como o mundo fora das universidades não entende os academicos. O historiador na entrevista é absolutamente claro quanto a questões muito importantes. E o amador n'este forum não o sabe ver. E, como sempre, faz uma leitura completamente errada. Mas estou farto de tudo isto.
Aceite os meus cumprimentos,
Anachronico
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Mas estou farto de tudo isto. RE: ERRATA: Duarte Pacheco Pereira
Caro Anachronico,
Acho que quem não entendeu foi o confrade.
O que eu disse foi que JÁ as CERTEZAS que eram ensinadas pelo mundo inteiro, como aquela que «Pedro Álvares Cabral foi o primeiro português a chegar ao Brasil» começam a ser questionadas por haver provas, ou melhor bons indícios que assim não foi.
O que eu tentei dizer na minha prévia mensagem, é que muito daquilo que tinha-se aceite nas universidades e ensinado aos rebanhos não era a verdade da história mas apenas aquilo que se decidiu ser uma "história da verdade."
O que eu tentei dizer na minha prévia mensagem é que muitas das "verdades" que se dizia serem sobre os descobrimentos, estão hoje em causa porque pessoas como Francisco Contente Domingues estão a olhar de novo para as coisas com um olhar critico ao que se tinha aceite como verdade e questionando como poderíamos ter duas verdades contrárias...
E ainda mais, o que eu tentei dizer é que das verdades contrárias, acontece que aquelas que metemos fora no passado, eram aquelas que deveríamos ter mantido.
Que o mapa das Antilhas dando ao mundo as novidades das descobertas do Canadá pelos portugueses antes de 1424, que as viagens dos Portugueses às Canárias em 1340, que a descoberta do Mar dos Sargaços pelos portugueses antes de 1436, a descoberta das Caraíbas antes de 1473, até mesmo a descoberta da Austrália pelos portugueses em 1522... têm mais provas para as aceitar do que há para as negar.
O que se tem feito até aqui foi negar estas coisas, sem mais nem menos, e que já é tempo das universidades em Portugal se darem ao trabalho de NÃO negar antes de irem investigar... já é tempo.
E se eu aproveito todas as mensagens para falar do nobre português Cristóvão Colon, é porque esse tema é uma chave essencial para abrir a porta aos outros.
Não passo o meu tempo aqui em missão de busca de amigos mas da verdade, e se não sei ser humilde perante tantas pessoas crentes naquelas "verdades" -que aparentam já não ser verdades- e indignadas por eu tentar que essas pessoas abram os olhos aos factos e questionem - como fazem agora of Porf. Francisco Contente Domingues, a Profª Manuela Mendonça, e dezenas de outros- é porque não vejo essa humildade do outro lado que sempre tentaram que NÃO se discutisse o tema, que não se "sujasse" os nomes daqueles "grandes Velhos do Restelo" que já tinham escrito a "história verdadeira"... e reputação era mais importante que a correcção.
Eu posso não ser humilde quando tento expor coisas tão claras mas que recusam a ver, mas ao mesmo tempo, sei aceitar provas quando elas são provas e pedir que mostrem provas quando se ensina uma coisa como verdade e as provas dessas verdades não existem.
E se eu continuamente trago aqui o Cristóvão Colon como o melhor apóstolo das descobertas portuguesas, é porque ele estava dentro dos segredos de D. João II e quando ele próprio diz que:
"D. João II lhe disse em Março de 1493 que já tinha conhecimento de "terra firme" do outro lado do mar a Sudoeste das Ilhas de Cabo Verde" (o Brasil de hoje) que nós devemos de aceitar que assim era... porque, da mesma forma que Colon recebeu de D. João II a informação da descoberta do Cabo da Boa Esperança em 1488 antes de mais ninguém no mundo a receber, da mesma forma que Colon recebeu de D. João II as medidas da Altura do Sol na Guiné em 1485 antes de mais ninguém, da mesma forma que D. João II recebeu de Colon a informação da sua "descoberta" do Novo Mundo antes de mais ninguém... devemos de aceitar que aquilo que nos ensinaram nas universidades mundiais sobre Colon e D. João II não era a verdade, mas sim uma conspiração de encobrir a verdade.
Aquilo que o confrade Anachronico quer que eu faça, é deixar de contestar, ou pedir "com licença" para escrever e eu não vejo forma humilde de pedir que abram os olhos às verdades que são óbvias mas que não estamos acostumados a ver.
Eu nunca vi as minhas intervenções neste fórum como uma busca de amigos, mas sim como uma busca da verdade. Por isso eu sempre continuo a ler a sempre peço que vaiam ler.
Não sou pessoa que é facilmente magoada com palavras, não sou pessoa de cerimónias ou de escrever politicamente correcto, por isso entendo que muitos me acham áspero ou malcriado... peço desculpa se assim parece, mas o meu intento sempre foi de chegar às verdades porque existe muita coisa escrita nos livros de história no mundo que é contrário aos factos e ao mesmo tempo existem muitos neste Fórum que querem que eu não me foque nos factos mas naquilo que fora escrito nesses livros.
Cumprimentos,
Manuel Rosa
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