Austrália ou Java le Grande....

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Austrália ou Java le Grande....

#152051 | Augustus_o | 11 abr 2007 15:52

Caros confrades, o Dr.Luciano da Silva afinal não é assim tão bruto como querem fazer crer...
Encontrei este texto no seu site, e como me parece demasiado útil para demonstrar o sigilo que a Coroa Portuguesa usava para iludir os Castelhanos e demais povos Europeus...
Mas neste texto há algo que me fascinou. A exemplo do que se passou em Malaca, tb na actual Austrália, ficaram vestigios que só a morte pode apagar, registos fonográficos, palavras de povos que o tempo não apagou! palavras de povos que são nossos primos...

DESCOBERTA DA AUSTRÁLIA PELOS PORTUGUESES
Por J. Chrys Chrystello

The Yawuji Barra and the Yawuji Baía
(Os Avós de Barra e os Avós de Baía)

INTRODUÇÃO - O CONTINENTE-ILHA

A Austrália caracteriza-se basicamente por ser um vasto continente de 8 000000 km quadrados de baixo-relevo orográfico, isolada, com suas terras áridas, bem diversa doutros locais do globo. O seu isolamento de outras massas de terra, explica até certo ponto a sua fauna e flora, enquanto o relevo pouco pronunciado se poderá atribuir à erosão do vento, das chuvas, e do calor durante as épocas geológicas em que a massa continental esteve acima do nível médio das águas. Para muitos, a Austrália foi a última fronteira, a última das terras, por ter sido das últimas que foram "descobertas" pela civilização ocidental… Dezenas de milhar de anos antes das viagens de Abel Tasman e James Cook ao Pacífico Sul, já os aborígenes haviam coberto a distância que separa a Ásia da Austrália, tendo-se disseminado pelo continente e pela Tasmânia, enquanto não falarmos das digressões portuguesas pela área...

O início daquilo a que muitos chamam a nova era civilizacional, poderá situar-se em 1788, aquando da chegada do Capitão Arthur Phillip, da Real Marinha Britânica (e comandante supremo do Almirantado Português na América do Sul), à frente da 1ª Armada, quando na época existiam cerca de 300 mil aborígenes mas não foi Cook quem deu o nome a esta terra.

FLINDERS DEU NOME À AUSTRÁLIA

Quem baptizou este continente? Decerto não foram os Portugueses pois que nos seus mapas aparece ainda a designação de Java a Grande (Jave, la Grande), essa Terra Australis que eles negavam veementemente conhecer e ainda hoje se recusam a reconhecer.

Durante mais de 30 anos após o histórico dia 26 de Janeiro de 1788, data do desembarque da 1ª Armada, ela foi conhecida pelo seu nome em Latim, de "Terra Australis" com o cognome de Incognita, mas também era denominada como Nova Holanda em honra dos navegantes holandeses que durante o século XVII arribaram à inóspita e árida costa do noroeste; ou ainda Nova Gales do Sul, tal como a baptizara o Capitão Cook para toda a metade oriental, ou ainda Terra de Van Diemen (Van Diemen's Land) nome dada à Tasmânia pelo navegador holandês daquele nome ouve porém um homem que lhe acabaria por dar um nome único a fim de terminar com a confusão de todas estas terminologias, um oficial da armada, navegador e explorador e hidrógrafo extraordinário com o nome de Matthew Flinders. Ele e o seu colega George Bass, um cirurgião naval com quem partilhava um amor ao mar e um interesse apaixonado na exploração de lugares distantes, exploraram e mapearam em conjunto e separadamente uma grande parte da costa australiana durante os finais do século XVIII e início do século XIX. Eles estavam de tal forma embrenhados no amor ao mar, a crer num dos seus biógrafos (Robert Osbiston), que deixaram as suas noivas de três meses para partirem em mais uma viagem. Flinders não tornaria a ver a sua mulher durante nove anos, dos quais sete passados numa prisão nas Maurícias. Bass nunca mais viu a sua mulher, pois que juntamente com a sua tripulação desapareceu na vastidão do Pacífico Sul, para nunca mais serem vistos nem ouvidos.

Flinders nasceu em Lincolnshire, na Inglaterra em 1774, e não acedeu aos desejos da família para ser cirurgião, tal como seu pai, avô e bisavô. Inspirado pela obra Robinson Crusoe já sabia que rumo ia dar à sua vida e aos 15 anos (1789) embarca como aspirante da marinha real, tendo maravilhado os seus superiores a bordo HMS Scipio com os seus conhecimentos de geometria e de navegação, dado ser muito novo e evidentemente autodidacta. Nos finais de 1790, Flinders juntou-se ao célebre Capitão Bligh (da famigerada Bounty e mais tarde Governador de Nova Gales do Sul) na sua segunda viagem ao Pacífico Sul, com o fim de transplantar fruta-pão das Índias Ocidentais.

Regressou a Inglaterra em 1793 e no ano seguinte alistou-se no HMS Reliance, então a aprestar-se em Portsmouth, para embarcar como passageiro sob o comando de John Hunter, recentemente nomeado governador da nova colónia. Foi nesse navio que conheceu George Bass. Pouco depois de chegarem, em Setembro de 1795, os dois amigos fizeram-se ao mar com um miúdo como tripulante do barco Tom Thumb, um barquito com uma quilha de 8 pés (aprox 2,4 metros) e um mastro de 5 pés (1,5 metros), para fazerem descobertas ao longo da costa sul de Port Jackson. Exploraram a baía de Botany e o rio Georges, depois numa segunda viagem no "Reliance" passaram pela ilha Norfolk e mais para sul na costa pelo Lago Illawarra e Port Hacking.

FRANCESES NA AUSTRÁLIA

Não é só a descoberta portuguesa da Austrália, ou o nome de quem a baptizou que são desconhecidos. Ignorado também é o facto de em 1772, o navegador francês François Saint-Allouarn ter ancorado o seu barco "Gros Ventre (Barriga Grande) " em Shark Bay (A Baía dos Tubarões), mesmo a meio da costa ocidental australiana (Nova Holanda ou Gonnevilleland como os Franceses lhe chamaram), e plantando a bandeira emitiu uma "prise de possession (título de posse) " para o seu soberano rei Luís XV, enterrando uma garrafa na ilha Dirk Hartog. A reivindicação era válida. Saint-Allouarn morreu no regresso a França e Luís XV demasiado ocupado com a guerra pelas possessões Franco-Canadianas, pode não ter dado conta da reivindicação.

Os Franceses planeavam ocupar as ilhas Rottnest e Garden (ao largo de Perth), também designadas como as Ilhas Napoleão, mas decidiram não manter uma fronteira comum com a Inglaterra. Napoleão apoiou uma expedição científica aos antípodas em 1800 liderada por Nicolas Baudin e a Austrália Ocidental voltou à posse de Inglaterra em 1829, assim como Les Malouines (Falkland ou Malvinas) o tinham sido 65 anos antes. A Terra Australis tornou-se assim em mais um acidente da História Anglo-Saxónica que latina.

A ligação da França e da Austrália (apesar das divergências quanto às explosões nucleares em Mururoa) persiste ainda nos nossos dias. Metade das mortes australianas nas duas Grandes Guerras foi em terras francesas, especialmente no Somme. Em 1918, o Exército Australiano (que não era parte do ANZAC) ganharam uma batalha decisiva contra os alemães em Villers-Bretonneux em 25 de Abril, dia que se tornou Feriado Nacional como Dia dos ANZAC's. Existem peregrinações regulares às campas de mais de 35 mil australianos na Picardia. A cidade de Mazamet, perto de Toulouse é "mais australiana que francesa, e as suas companhias têm mais funcionários em Melbourne ou Geelong do que em Mazamet. As ruas chamam-se Melbourne, Yarra, Victoria, etc." segundo declarava Alain Serieyx que foi delegado geral da França para as celebrações do Bicentenário em 1988.

Austrália Ocidental evoca aquilo que o país poderia ter sido com os seus nomes franceses: Esperance, Bonaparte, Bossu, Naturaliste e Vasse. O livro "France Australe" de Leslie Marchant (Artlook Books, Perth, 1982) dá o crédito a Binot Paulmier de Gonneville como o primeiro europeu a andar em terras austrais, em 1504.

O navio Esperance, sob o comando de D'Entrecasteaux, fez uma viagem em 1791 da França até à Baía Botany em busca do desaparecido La Perouse. Numa curiosa ironia do destino, La Perouse tinha-se feito à Baía de Botany em 26 de Janeiro de 1788. O Governador Arthur Phillip tinha acabado de chegar com os degredados e colonos ingleses e ao vê-lo, mal teve tempo de hastear a bandeira inglesa. La Perouse é um nome importante na história australiana, pois enviou despachos e mapas das suas expedições do Pacífico, feitas a partir da Baía de Botany (na Sydney actual). O seu desaparecimento foi um mistério por mais de 39 anos.

Ainda hoje existe um monumento à sua memória numa área concedida aos franceses perpetuamente em 1825 (não era bem o que Napoleão queria, mas de qualquer modo era território legitimamente francês em Gonnevilleland). Aquele subúrbio, hoje território aborígene em grande parte, manteve o nome de La Perouse, nome também dado a um Museu na Baía de Botany, inaugurado aquando do Bicentenário (1988), e partilhando um edifício onde existe um controverso Museu Aborígene. Os franceses têm registos históricos dos seus múltiplos contactos com os aborígenes australianos, e os relatórios de François Peron e do artista Charles Leuseur evocam vívidas pinturas dos Tasmanianos que eventualmente pereceram sob o genocídio "europeu".

Conde de La Perouse, Almirante Jean François de Galaup, e as suas duas fragatas "La Boussoule" e "Astrolabe" ao chegarem ao porto da Baía Botany depararam com os 11 navios da 1ª Armada do Capitão Arthur Phillip. Estabeleceram contacto e viram Phillip partir para Port Jackson. Enquanto os britânicos faziam os preparativos para a sua instalação em Sydney Cove, os cientistas e marinheiros franceses descansaram por seis semanas na Baía Botany donde partiriam, de regresso a França em 10 de Março. Pouco depois as duas fragatas e os seus 230 homens desapareceram, sem deixarem rasto.

O mistério permaneceu até 1827, quando o navegador irlandês Peter Dillon encontrou a naufragada "Boussole" a dez metros de profundidade em Vanikoro, nas ilhas Salomão. Uns anos mais tarde também ali foi descoberto o "Astrolabe", que soçobrou no mesmo ciclone. Alguns relatos compilados por Dillon, dão conta que a maior parte dos náufragos foi comida por tubarões e alguns sobreviventes foram-no, mas pelos nativos que temiam que eles fossem espíritos malignos. Alguns sobreviventes demoraram entre 6 a 9 meses a construírem um barco de dois mastros, nos quais apenas dois sobreviventes terão embarcado. Os restos de uma embarcação como a descrita pelos nativos foram encontrados em 1861, perto de Mackay, no norte da Queenslândia.

Hoje, no museu de nove salas, que ostenta o nome de La Perouse, podem observar-se reproduções do primeiro encontro com os aborígenes, do encontro com o capitão Phillip; vendo-se ainda a exploração geral do pacífico depois da viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães e a história de La Perouse, desde o seu nascimento em Albi ao seu envolvimento na Guerra da Independência da América e a libertação dos portos de Hudson Bay das mãos dos ingleses. O Museu tem ainda relíquias da época que atestam os contactos amigáveis entre Sir Joseph Banks e La Perouse, e reproduções diversas da época.

Quando em 1984 se publicou o livro de Colin Wallace "The Lost Australia of (A Austrália Perdida de) François Peron", imaginava-se que se iria reacender a controvérsia do século XIX sobre a nomenclatura da costa australiana: naquela época a costa meridional ostentava nomes como Terre Napoleon, Golfe Bonaparte, Golfe Josephine. A própria Ilha Kangaroo (Canguru) foi baptizada por Nicholas Baudin como "Iles Decres" e a Baía Encounter (Encontro) ficou denominada assim por ter sido o ponto de encontro acordado por entre François Peron e Matthew Flinders. O interesse da França por estas paragens, de acordo com aquele livro de Colin Wallace, cresceu a partir da

expedição no século XVIII de Louis de Bougainville, antes da Revolução Francesa e da Era de Terror que se lhe seguiu. Napoleão nutria um fascínio secreto pela Austrália, notável, pois enquanto preparava as guerras no continente ainda teve tempo para se dedicar a montar uma expedição científica aos antípodas. Peron tinha qualidades de liderança notáveis, demonstradas durante a Revolução Francesa e as guerras Prussianas, tendo sido promovido a sargento antes dos 20 anos. Gravemente ferido ficou incapacitado, o que não o impediu de frequentar a escola médica da Sorbonne onde estudou ciências médicas, tendo-se oferecido para a expedição como cientista. Quando Baudin faleceu nas Maurícias, foi ele que assumiu o comando da expedição que durava há já quatro anos. Peron, em Paris, conseguiu classificar as colecções de botânica e zoologia, para além de publicar o relato da expedição, mas morreu de tuberculose aos 36 anos de idade. Uma das curiosidades deste livro é que ali Peron aparece como o primeiro ecologista, alertando para o perigo de extinção de plantas e animais que então considerava raros e em vias de extinção.

Outra curiosidade, aparte as considerações sobre a incompetência de Baudin como comandante de uma missão desta importância, é a de Peron ter sido o "pai da antropologia" e o seu estudo dos aborígenes em diversas partes da Austrália, assim o atesta. Ele dava-se bem e gostava deles e, muito do que hoje se sabe sobre os desaparecidos aborígenes da Tasmânia, a ele se deve. Peron é também o primeiro a ter comido carne de "wallaby (pequeno canguru) " que estava confiante poderia ser criado como animal doméstico, descrevendo a sua carne como semelhante à dos coelhos da sua terra natal. Peron morreu demasiado cedo (1810) para que a sua valiosa obra científica tivesse a consideração merecida e, em vez de termos hoje alguns nomes franceses na costa australiana, decerto teríamos muitos mais.

O PRIMEIRO GOVERNADOR DA AUSTRÁLIA LUTOU PELA MARINHA PORTUGUESA

Finalmente, a História começa a repor no seu lugar os factos reais, desimbuídos de conotações patrioteiras, e, neste caso devemos considerar, uma publicação vinda a lume em 1984 do historiador australiano Kenneth Gordon McIntyre, sob o título "The Rebello Transcripts, Governor Phillip’s Portuguese Prelude"1

Para os mais desconhecedores das primeiras páginas da história da colonização europeia da Austrália, diremos que o Capitão Arthur Phillip foi o comandante da Primeira Armada que chegou à Austrália em 1788 (8 anos depois da alegada descoberta do Capitão Cook), após 257 dias de tormentosa viagem, com 11 barcos, dos quais 6 de transporte, com 730 degredados (570 condenados e 160 mulheres condenadas), 250 marinheiros e outros homens livres, para constituírem a primeira colónia britânica no continente. Ao contrário do que se encontra escrito, a nomeação de Phillip não correspondeu ao clímax de uma brilhante carreira na Real Marinha Britânica, mas sim aos relevantes serviços, por ele, prestados à Marinha Portuguesa e, da qual fez parte como mercenário.

O livro de McIntyre2 "The Rebello Transcripts" baseia-se num estudo efectuado, em finais do século passado pelo General Jacinto Rebelo (Jacintho Ignácio de Brito Rebello), arquivista da Torre do Tombo, que, a pedido.

Nota de rodapé:

1 Edição da Souvenir Press Ltd, Adelaide, South Australia, com este título, que se poderia traduzir como "A Transcrição (dos

Arquivos Nacionais pelo General Jacintho Ignácio de Brito) Rebello, Um Prelúdio Português para o Governador (Capitão de Mar e Guerra Arthur) Phillip."

2 Nota do Autor: Kenneth Gordon McIntyre, OBE, MA, LL. B (Melb), Comendador da Ordem do Infante, nasceu em Geelong,, nos arredores de Melbourne, estado de Vitória, sendo Leitor de Literatura Inglesa na Universidade de Melbourne, entre 1931 e 1945, tendo-se dedicado, a partir daí, a uma bem-sucedida prática de advocacia, sendo Assessor do Governo em assuntos legais, e Presidente da Câmara Municipal de Box Hill. Sempre interessado na Língua e Literatura Portuguesas, dedicou a sua reforma ao estudo de antigos documentos portugueses. O primeiro resultado deste labor foi o livro "A Descoberta Secreta da Austrália" publicado pela Souvenir Press, em 1977, no qual prova que os primeiros europeus a descobrirem a Austrália haviam sido os Portugueses no século XVI e não o Capitão Cook que apenas atracou em 1770. Foi graças a este livro que o General Ramalho Eanes, em nome do Governo Português lhe concedeu a Comenda da Ordem do Infante (D. Henrique, o navegador).

3 Publicado em Sydney em 1937.

4 O autor usa a grafia portuguesa Colónia, em vez do brasileiro Colônia, que é, além da cidade uruguaia, também, o nome dado à cidade alemã de Köln.

5 1756-1763, guerra pela supremacia nas colónias sul americanas opondo a Espanha, apoiada pela França, contra Portugal e Inglaterra., e da qual estas sairiam vencedoras, com a excepção da perda de Rio Grande, que acabou por ficar em mãos espanholas. Ao contrário do que acontecera na guerra, durante a qual a Inglaterra ganhou Cuba aos Espanhóis e Manila (Filipinas), os ministros plenipotenciários que assinaram o Tratado de Paz, desconheciam esse facto. Se um Tratado devolveu Cuba a Espanha, e mais tarde foi acrescentada a devolução de Manila, no caso vertente o Rio Grande ficou na posse espanhola e não foi devolvido aos portugueses, quando estes finalmente obtiveram a devolução de Colónia do Sacramento, com o Tratado de Paris de 1763. de historiadores australianos dedicou toda a sua vida a estudar a carreira do Capitão Phillip ao serviço dos portugueses.

Embora os dados, então, recolhidos tenham estado à disposição dos historiadores, o seu desconhecimento da história portuguesa não permitiu o seu anterior aproveitamento. Refira-se, a propósito, que historiadores, tão consagrados, como George MacKaness ao publicar em 1937 a Biografia do Almirante Arthur Phillip3 referem a sua participação na defesa de "colónia", supostamente considerado como o Brasil, em vez de Colónia (Colónia del Sacramento), cidade sul-americana, hoje em território uruguaio.4

Nascido em 1738, o capitão Phillip frequentou uma obscura escola em Greenwich, tendo praticado como marinheiro na Grônelândia, sem qualquer acto digno de menção, durante a Guerra dos Sete Anos5. Quando esta guerra terminou, a Real Marinha Britânica dispensou os serviços de Phillip, pelo que este teve de recorrer à agricultura para sobreviver durante os dez anos seguintes.

Em 1773 os Portugueses estavam a recrutar oficiais de Marinha estrangeiros, quando Phillip, um mero Tenente Naval, obtém uma posição de Capitão na marinha lusa. Três anos mais tarde, estava já a comandar uma fragata portuguesa encarregue da protecção de Colónia (do Sacramento), uma praça penal na América do Sul, permanentemente ameaçada pela Espanha, de tal forma, que os seus habitantes se viram obrigados a comer ratos, cães e gatos para sobreviverem ao cerco espanhol.

O profissionalismo de Phillip granjeou-lhe a admiração das autoridades portuguesas. Em 1777, uma larga Armada espanhola tentando provocar um confronto com as forças portuguesas passeava-se ao largo da costa sul-americana. À data, estava encarregue da defesa da área um comodoro irlandês, de seu nome MacDoual, que depois de consultar Phillip, lhe disse ser de evitar qualquer confronto directo entre as duas nações.

Phillip tentando convencer o irlandês a atacar o inimigo, sabia de antemão o provável resultado de um confronto, demonstrando assim a sua impulsividade e o seu sentimento de dever. Mais tarde, em 1778, de regresso à Inglaterra, motivado por um sentimento de fidelidade ao país que enfrentava a difícil situação da Guerra da Independência (da América), Phillip coloca-se à disposição da Inglaterra. Este exemplo, foi, durante muitos anos, considerado como um exemplo de patriotismo, mas deve-se considerar mais como uma resposta à recusa dos portugueses de manterem os seus notáveis serviços.

Depois de ter sido colocado na Reserva durante 16 meses, a Armada Britânica deu-lhe o comando de uma nave de 64 canhões, a "Europa". Nesta data, tinha Phillip, 43 anos de idade. Cinco anos mais tarde (1786) era-lhe confiada a missão de conduzir a Primeira Armada até ao porto de Botany Bay, em Sydney.

Uma das razões citadas para esta promoção de Phillip foi a de que mais ninguém estaria interessado na ‘honra’ de assumir tal posição. Na realidade, a razão por que Phillip foi chamado e recomendado para este lugar, deve-se ao facto de a sua acção ter sido meritória ao serviço da Armada Portuguesa.

Tal como Colónia, na América do Sul, debaixo de uma difícil e morosa linha de abastecimentos, também Botany Bay (aqui onde hoje é Sydney) representava uma situação difícil, tal como acontecera à possessão portuguesa.

Assim, nasceu a importância do Capitão Phillip para a moderna história da Austrália. Se bem que sendo de descendência germânica e tenha estado ao serviço dos portugueses 6, Phillip pode ser considerado o primeiro membro "étnico" de uma Austrália multicultural.

QUADRO I

A LUTA PELA COLÓNIA DE SACRAMENTO

DATA ACONTECIMENTO DOMÍNIO NACIONAL

1494 TRATADO DE TORDESILHAS Espanhol n7

1679 Fundação de Colónia pelo Príncipe Pedro Português

1680 Destruição de Colónia pelos Espanhóis Espanhol

1683 Devolução de Colónia após negociações Português

1705 Captura. Guerra da Sucessão em Espanha Espanhol

1713 Devolução. Tratado de Utreque (Utrecht) Português

1750 Renegação do Acordo. Tratado de Madrid Espanhol

1761 Revogação do Acordo. Tratado do Pardo Português

1762 Captura. Guerra dos Sete Anos Espanhol

1763 Devolução. Tratado de Paris Português

1777 Destruição pelos espanhóis Espanhol

1821 Anexação por Portugal Português

1822 Independência do Brasil Brasileiro

1828 Fundação do Uruguai Uruguaio

QUADRO II

A CARREIRA DO CAPITÃO PHILLIP NA MARINHA PORTUGUESA

1774 25 DE AGOSTO Solicita autorização para admissão na Marinha Portuguesa

22 DE DEZEMBRO Parte de Londres para Lisboa

1775 14 DE JANEIRO É nomeado Capitão da Marinha Portuguesa

09 DE FEVEREIRO Parte de Lisboa ao comando da "Belém"

? MAIO Chega ao Rio de Janeiro

28 DE SETEMBRO Ao comando da "Pilar" ruma com destino a Colónia

22 DE OUTUBRO A "Pilar" parte do Desterro

? NOVEMBRO Regressa ao Rio, partindo logo a seguir

1776 27 DE JANEIRO Ao comando da "Pilar" ruma a Colónia

18 DE AGOSTO A "Pilar" intervém na defesa de Colónia

29 DE DEZEMBRO Parte de Colónia

1777 20 DE FEVEREIRO Fica baseado na Ilha de Santa Catarina

? MARÇO Fica integrado num Esquadrão Naval no Rio de Janeiro

01 DE ABRIL Parte ao comando da "Pilar" numa missão de defesa a sul

26 DE ABRIL Regressa triunfante com um barco inimigo aprisionado

29 DE MAIO Nova partida em patrulha às águas do sul

23 DE OUTUBRO Nomeado capitão do "Santo Agostinho"

1778 10 DE MAIO Parte do Brasil com destino a Lisboa

04 DE AGOSTO Chegada a Lisboa

24 DE AGOSTO Pagamento e exoneração da Marinha Portuguesa

6 Ver Quadro II.

7 n Denota apenas mudança teórica do domínio legal, já que na prática (fisicamente) nada se alterou.

A DESCOBERTA DA AUSTRÁLIA PELOS PORTUGUESES

Desconhecida para a maioria das pessoas é a história deste país, que nas últimas décadas sofreu várias alterações conceptuais. É agora aceite, pela maioria dos historiadores, que os primeiros europeus a navegarem e a traçarem cartograficamente a costa australiana não foram, ao contrário do que tem sido ensinado ao longo dos 200 anos da nação, o capitão Cook e seus correligionários, mas marinheiros portugueses que o fizeram mais de 250 anos antes daqueles. A teoria de os portugueses terem sido os primeiros, não é de agora nem sequer é nova. Com efeito, celebrou-se em 1984 o centésimo aniversário de tal teoria, defendida então pelo historiador George Collingridge, o qual, infelizmente, jamais a conseguiu provar.

Depois dele, vários outros tentaram sem sucesso demonstrar a viabilidade de tal interpretação, jamais se quedando para além da especulação. Em 1977, um advogado, Kenneth Gordon McIntyre, publicou um livro intitulado "A Descoberta Secreta da Austrália" que veio alterar totalmente este estado de coisas, passando a partir daí, a ser o ónus dos cépticos de desmentirem as suas alegações.

Embora McIntyre (ver Anexo VIII) não seja um historiador na acepção académica do termo, certo é que os seus estudos passaram a ser aceites pela maioria dos académicos de todo o mundo. E, embora o autor confesse que tal publicação, umas décadas antes, era impensável, nem teria qualquer probabilidade de ser tomada em consideração, devido à questão de honra que constituía para qualquer historiador britânico assumir a descoberta da Austrália como inegavelmente devida a Cook, certo é que esse xenofobismo se esfumou desde os tempos de Collingridge. Para um dedicado estudante de Cook, conselheiro da Real Sociedade Australiana de História, também o problema da religião influiu na refutação das teorias de Collingridge. Como católico era visto como oponente das correntes maioritárias protestantes a que o próprio Cook pertencera.

A versão de McIntyre tem consideráveis implicações na história europeia da Austrália, colocando toda a temática da primeira colonização numa perspectiva e diferente escala temporal. Significa que os portugueses atingiram Botany Bay e Sydney Heads (pontos costeiros da actual Sidney) cerca de 1524, ou seja, 40 anos antes do nascimento de Shakespeare e sete anos antes das teorias de Martinho Lutero terem atingido a luz do dia.!!! Tal versão dá-nos também uma diferente leitura da viagem de Cook, mais próxima dos tempos actuais do que da inicial viagem dos marinheiros portugueses.

O interesse de McIntyre por Portugal deve-se a fortuito acontecimento associado à sua posição de Leitor de Literatura Inglesa na Universidade de Melbourne, quando tomando conhecimento da obra de Elizabeth Barrett Browning "Sonetos Portugueses", um imenso interesse o despertou para a língua e história portuguesas. Assim, em 1966, realiza a sua primeira viagem a Timor Português, que então celebrava o seu 450º aniversário de colonização lusa.

Duas coisas o impressionaram sobremodo nessa visita: primeiro, a distância relativamente curta a que Timor se encontra da Austrália (416 km por mar ou ½ hora de viagem aérea), segundo, que uma potência marítima como Portugal tivesse uma colónia tão perto do continente australiano, 254 anos antes da chegada de Cook. Poderia, então, ser possível que os experientes marinheiros portugueses, capazes de saberem lidar com todos os segredos das velas e dos barcos, que lhes permitira chegar a Timor em 1516, durante séculos nunca tivessem chegado à vasta massa continental da Austrália? (ver Anexo V)

Não havia dúvidas de que a história da exploração necessitava de ser reexaminada. Assim, sem querer, estava a aproximar-se da tese de Collingridge datada de 1880. Tal como o seu antepassado, McIntyre descobriu que um antigo mapa (ver Anexo II) provava não apenas que os portugueses tinham atingido a Austrália, mas que haviam traçado 2/3 da sua costa. A sua interpretação do referido mapa provaria ser, no entanto, irrefutável, ao contrário dos esforços do seu compatriota. O mapa em questão, denominado o mapa Delfim (ver Anexo VII) por ter sido elaborado para o delfim do trono francês, data de 1536, e é o mais antigo de todos os mapas da antiga escola (e maior centro cartográfico da época) de Dieppe.

É um mapa do mundo, tal como era conhecido na época, que incluía já as ilhas do arquipélago indonésio e uma vasta massa continental, que se estendia a sul da Indonésia e a que se chamava, então, Java a Grande (Jave la Grande). Este era aliás, o nome que lhe havia sido dado antes por Marco Pólo, designando uma vasta área de terra que se sabia existir na região. Java, a Grande, tal como aparece no mapa em questão, tem uma vaga semelhança com a forma da Austrália actual e encontra-se a cerca de 1 500 km a oeste da real posição do continente. O mapa mostra, assim, uma distorção da verdadeira imagem do continente, devida ao facto de os portugueses da época não saberem calcular, com exactidão, a curvatura do globo e os desvios provocados pelo campo magnético terrestre. (ver Anexo I)

McIntyre não foi o primeiro a descobrir este facto, mas os outros haviam-no feito sem qualquer credibilidade, enquanto ele resolveu dedicar-se a estudar com precisão o método cartográfico português utilizado há mais de 450 anos, servindo-se de um tratado da autoria do célebre matemático Pedro Nunes. Assim, habilitado com os erros da técnica utilizada, à data, pelosportugueses, foi capaz de estabelecer os desvios existentes e, eliminá-los. Para isto, serviu-se de elaborados cálculos matemáticos capazes de desafiar qualquer outra possível explicação. Os resultados eram, de facto, surpreendentes.

Depois de corrigidos os desvios, provenientes dos cálculos dos cartógrafos portugueses, o mapa Delfim (Ver Anexo XI) aparecia com uma imagem, deveras detalhada, e perfeita da costa australiana, a norte, leste e oeste. Até a larga península triangular na extremidade sudeste se encaixa perfeitamente na versão reconstruída do mapa, devendo-se isto ao efeito de preparar mapas bidimensionais, através de cortes ou segmentos do globo terrestre, os quais eram posicionados ao lado uns dos outros para se obter o efeito final, deste modo, exagerando o Cabo Howe e as suas dimensões (ver mapas reproduzidos nos Anexo I).

A versão de McIntyre para os mapas de Dieppe, baseada nos originais ali arquivados, pareceu-lhe prova suficiente de que os portugueses haviam, de facto, traçado uma larga parte da costa australiana, antes de 1536, data do mapa Delfim (ver Anexo VII). A partir daqui, começou a tentar, porém, descobrir quem teria sido o marinheiro português capaz de tal feito.

Neste campo hipotético, tudo parece apontar, como responsável único, para Cristóvão de Mendonça, capitão da Marinha Portuguesa, que partiu de Malaca, em 1521, com três naus, em busca das ilhas do Ouro, então, supostamente localizadas a sul das Índias Orientais. O mapa Delfim comprova que Mendonça (ou outro) passou pelo Estreito de Torres, virando a sul na zona do Cabo Iorque e percorreu parte da costa oriental. Dentre os locais possíveis de identificar naquele mapa aparecem o Cabo Melville, a Grande Barreira de Corais, o porto de Cooktown, a ilha Fraser e a baía de Botany. Depois de dobrar o Cabo Howe, e dirigindo-se para ocidente, Mendonça terá acompanhado o que é hoje a costa do estado de Vitória, até ao Cabo Ottway e à Baía de Phillip, quedando-se em Warrnambool, a partir de onde terá decidido não prosseguir mais além.

Existe aqui uma intrigante coincidência, pois é neste ponto onde Mendonça decidiu regressar, que mais tarde haveria de aparecer o célebre e misterioso "Mahogany Ship" (Nau de Mogno, ou madeira de caju ver Anexo IX)), do qual existem cerca de 27 relatos diferentes, entre 1836 e 1880, e que depois desta data, parece ter desaparecido, de vez, das dunas de Warrnambool. De acordo com as descrições existentes tratava-se de um barco extremamente antigo e com um estilo de construção semelhante ao das caravelas portuguesas da época quinhentista. A tratar-se de uma das naus de Mendonça, poderia estar assim explicada a razão pela qual ele não prosseguiu na sua exploração da costa australiana em 1524.

A lista dos historiadores que, finalmente, se decidiram a aceitar a teoria de que os portugueses descobriram a Austrália (antes de outros europeus) vem a aumentar desde que, em 1977, McIntyre publicou o seu livro. O Prof. Geoffrey Blainey (célebre historiador) admite-o no seu livro "A Land Half Won" ("Uma Terra Meia Conquistada"). T. M. Perry, leitor de geografia da Universidade de Melbourne, no seu livro "A Descoberta da Austrália", e o Prof. Russel Ward, na sua obra "A Austrália Desde a Chegada do Homem (Australia since the coming of man) " admitem igualmente esta "descoberta" da Austrália, aceitando a tese de que a descoberta da Austrália pelos portugueses, antes de 1536, foi, "uma possibilidade, uma probabilidade, uma verdade conclusiva". Na prática, porém, o Capitão James Cook continua ainda a ser tema da descoberta da Austrália em muitos livros escolares.

Não há dúvida de que uma teoria tão radical como a de McIntyre vai demorar mais de uma geração a impor-se à burocracia educacional. Curiosamente porém, foi o estado de Vitória, de onde é natural e onde trabalhou sempre McIntyre, o primeiro a incorporar tal teoria nos livros de história oficialmente utilizados. (ver mapas 1-4 Anexo 1). Quando os portugueses aqui estiveram

(Austrália) na primeira metade do século XVI, os aborígenes viviam contentes e nalgumas regiões do país haviam-se habituado a mercadejar com estrangeiros. Há provas evidentes disso com os pescadores e mercadores de Macassar, na altura uma possessão dominada pelos Portugueses, na qual havia sido adoptado um dialecto crioulo derivado do Português.

O próprio Capitão Cook regista na passagem por Savu com a data de 19 de Setembro de 1770, ter-se servido de Manuel Pereira, o português embarcado na "Endeavour" no Rio de Janeiro para se entender com os locais. A presença de aborígenes brancos está assinalada, assim como a presença de mestiços aborígenes com traços timorenses ou malaios, nas costas ocidental e norte da Austrália.

Para a presença dos portugueses como a História pela mão de Kenneth McIntyre parece provar, curioso será recordar uma "descoberta" em 1967: uma construção em Bittaganbee (ver Anexo III), perto de Eden, na costa sul de Nova Gales do Sul. As ruínas ainda hoje existentes atestam a presença de uma casa de pedra, com uma plataforma de 30 por 30 metros, rodeada por largos pedaços de rocha irregularmente cortadas, que em tempos serviram de paredes a tal construção, com existência de alicerces. A construção, sem tecto, é feita de pedra local, e pedaços de conchas marinhas servindo de estuque. (McIntyre interroga-se "Seria isto o quartel general de Inverno de Mendonça?"

Dentre as possibilidades de analisar essa construção, uma é a do enorme esforço e trabalho que a mesma terá envolvido para transportar, trabalhar e erigir a mesma, em especial dado o tamanho de algumas daquelas pedras. Esse tipo de construção só pode ter sido efectuado por uma tripulação completa de um navio da época, não podendo ser obra de um pequeno grupo de degredados ingleses ou pessoas isoladas.

O primitivismo da construção, semelhante a uma fortificação, é único na Austrália, e decerto antecede em séculos a formação da vila que só foi fundada em 1842 com materiais e fundos londrinos.

Mas, curiosamente se aquela construção aqui está fora de lugar, esta construção é semelhante a outra descoberta nas Novas Hébridas, também em 1967: a célebre "Nova Jerusalém" criada em 1606 por Pedro Fernandes Queirós, que juntamente com Luís Vaz de Torres eram portugueses, ao comando de naus espanholas navegou por estas paragens austrais.

Um outro facto perturbador é o de existir uma data inscrita numa das pedras que 15(?)4, embora o terceiro dígito não pareça um 2, o que a localizaria na época de Mendonça. Cristóvão de Mendonça teve uma presença marcante nestas costas australianas e neozelandesas que importa desvendar. Uma das suas caravelas perdeu-se nas dunas de Warrnambool na Austrália do Sul, a segunda, provavelmente na costa neozelandesa, mas decerto a terceira conseguiu regressar a Malaca, Goa e Lisboa. Faria e Sousa regista que Mendonça efectuou uns anos mais tarde nova viagem a Goa, antes de ser nomeado Governador de Ormuz, quiçá por serviços prestados na descoberta da Austrália.

Em 1817, quando o governo da coroa britânica se mostrou interessado na Nova Zelândia, que em breve se tornaria sua colónia, o almirantado em Londres estudou os mapas ingleses da época comparando-os com a versão de La Rochette (1807). Neles existe uma anotação dessa data (1817) afirmando que embora a Nova Zelândia tenha sido descoberta por Abel Tasman em 1642, a sua costa era conhecida dos portugueses desde 1550.

Este documento ainda hoje existe nos Reais arquivos públicos de Londres. No Museu de Wellington (Nova Zelândia) existe um sino de bronze (ver Anexo IV), descoberto pelo Bispo William Colenso em 1836 e o qual estava na posse dos Maoris (aborígenes locais) que declararam tê-lo há muitas gerações. No sino existe uma inscrição em Tamil (língua indiana, o idioma da Goa de então, que era a capital oriental do Império Português. Idênticos sinos foram descobertos em Java datados do início do século XVI e todos os barcos portugueses da época transportavam consigo goeses e outros indianos, os "Lascaria" como ajudantes da tripulação.

Relativamente a este assunto, outro semelhante tem surgido nalgumas páginas da imprensa local (australiana), ou seja, o estudo da presumível descoberta da Nova Zelândia pelos portugueses, face a recentes descobertas ali efectuadas de restos de naus quinhentistas e utensílios tipicamente portugueses.

Na altura (1984), o Consulado Geral de Portugal em Sydney recebeu pedidos de colaboração para o estudo em causa, por parte de historiadores neozelandeses. Será que algo foi feito? Mais de vinte anos mais tarde sabemos que nada se concretizou. Terão de ser sempre os estrangeiros a dizerem-nos o que descobrimos, como e quando? Haverá, em Portugal, alguém interessado em ajudar a desvendar este e outros factos gloriosos da epopeia lusa?

O interesse existe neste continente australiano para se estabelecer a verdade histórica dos factos: será que os homens de hoje têm a vontade e capacidade de reporem Portugal no lugar a que tem direito, como país pequeno que deu novos mundos ao mundo, tal como aprendi nas cábulas de ensino oficial anteriores ao 25 de Abril? Ou será, que na pressa de escrevermos a história presente olvidaremos os grandes homens do passado, a quem devemos hoje esta cultura miscigenada que nos distingue? A resposta, a quem competir responder. Chegamos aqui primeiro e aqui estou eu a repetir um trajecto de antanho, projectando uma imagem do país que fomos e que gostaríamos de voltar a ser. Quando nos aproximamos dos 500 anos passados, quem chegou primeiro a estas plagas?

Depois dos aborígenes, tudo parece confirmar que foram os portugueses os primeiros europeus.

Quando, como, e em que condições? Para quando a verdadeira história dos descobrimentos, agora que a celebração dos seus 500 anos já passou à história?

Dês que passar a via mais que meia

Que ao Antárctico Pólo vai da Linha,

Duma estatura quási giganteia

Homens verá, da terra ali vizinha;

E mais àvante o Estreito que se arreia

Co’o nome dêle agora, o qual caminha

Para outro mar e terra que fica onde,

Com suas frias asas, o Austro a esconde.

In Luís Vaz de Camões. Canto X, 141, Lusíadas 1572



OS AVÓS DE BARRA E OS AVÓS DE BAÍA

Os Avós de Barra e os Avós de Baía (em crioulo os Yawujibarra e os Yawuji Baía) eram tribos aborígenes quiçá descendentes de Portugueses, e linguisticamente a eles identificados. Trata-se de dois grupos de inter-relacionamento matrimonial duma tribo afro-australiana, falando Português e Crioulo de 1520 a 1580.

A costa do noroeste australiano (ver Anexo VI) de há muito ignorada pode ter sido a base da colonização portuguesa deste continente, de acordo com as teorias circuladas pelo filólogo e historiador Dr. Carl Georg von Brandenstein. O acesso a esta obra só foi formalmente conseguido em Junho 1992, e apesar de ter sido deste autor a tradução do filólogo, a relação entre o autor e o filólogo, nem foi pacífica, acabando o autor por ser responsável pela divulgação da sua obra (ver Anexo X.)

Note-se que Brandenstein discordou sempre e não quis autorizar o autor a juntar as suas teorias às de McIntyre num documentário histórico para o canal de televisão australiano SBS, como aqui se vê: IMAGEM 2

Conteúdo da Carta

Respondi-lhe que também a minha fidelidade linguística e cultural a Portugal me levavam a divulgar as suas teorias.... Voltemos pois a estas.

No século XVI, a acreditar na teoria, os portugueses ter-se-iam estabelecido na região dos montes Kimberley tendo inclusive trazido escravos africanos, os quais mantinham até 1930 um dialecto mescla de aborígene e de português crioulo. A importação de escravos teve início em 1444 pelo Infante D. Henrique e cresceu rapidamente a partir daí, mas nada há escrito ou conhecido que prove que escravos africanos terão vindo para Timor durante a primeira centena de anos de ocupação portuguesa.

Segundo von Brandenstein (um excêntrico personagem octogenário em 1990, de trato difícil e desconfiado, mas categorizado linguista e historiador) existem mais de 80 nomes de lugares que são portugueses, para além de um total de 260 palavras de origem portuguesa. Esta revelação, que inicialmente data da década de 60 mereceu em 1992, a atenção dos principais meios de comunicação social australianos, que postulavam sobre a necessidade de reescrever a história do país e datá-la em termos quinhentistas

1) As descobertas em 1967, e 1989, de material linguístico Português na zona das tribos aborígenes Kariyarra (Karriera) e Ngarluma, que residem na região de Pilbara foram alargadas pela descoberta de uma vasta colónia portuguesa na região dos montes Kimberley. Esta abarcava uma área Leste-Oeste do arquipélago Buccaneer até ao vale de Fitzroy, e pelo menos, até à passagem ou travessia de Fitzroy. Crê-se que a Terra de Dampier (Dampierland), a Angra do Rei (King Sound) e a sua costa leste, desde aproximadamente Derby até à foz do rio Fitzroy, em Yeeda, foram exploradas e parcialmente colonizadas. O mesmo se diria da estrada de Broome até Yeeda, com uma vasta base de exploração "Jaula-enga" e uma aldeia ou povoação "Recém Vila", no rio Logue ambas rodeadas de florestas de baobás.

2) A colónia durou sessenta anos, entre 1520 e 1580, podendo inclusive ter sobrevivido muitomais tempo com proprietários portugueses, de direito próprio à posse daquela estação. A preocupação principal aqui é relativa ao impacto da ocupação durante sessenta anos em relação à população aborígene. De acordo com os estudos existentes, eles não só lançam novas pistas sobre a situação linguística na região, mas revelam igualmente aspectos inesperados e híbridos numa tribo aborígene, que tem sido descrita com diferentes nomes, tais como: Jaudjibara, Jawdjibara, Yawidjibaya, que se supõe ter habitado as ilhas Montgomery.

2.1. Descrever ou dar provas de hibridismo observado por diversas vezes na região do

arquipélago Buccaneer, não é solução para todos os problemas daí advenientes, dado que tal só poderia ser feito com o auxílio da antropologia, da física ou genética. Embora aquela tribo tenha deixado de existir desde 1987, pode não ser demasiado tarde para que os peritos com conhecimentos relevantes possam estudar o assunto, falando com descendentes da tribo, estudando fotografias e relatórios, tais como aqueles efectuados pelo professor J. Birdsell em meados da década de 50. Tal esforço concertado poderia atingir o veredicto há muito necessário para explicar a natureza híbrida daquela tribo. No que concerne à parte linguística descobriram-se, sob detalhado estudo de nomes e outras referências, a existência de dois grupos tribais miscigenados através de laços matrimoniais: os Yawuji Bara (em crioulo português) ou os Avós de Barra (em Português) e, os Yawuji Baia (em crioulo português) ou os Avós de Baía. O primeiro nome significa Antepassados da Barra, sendo esta a existente na região envolvente das ilhas Montgomery. O segundo nome significa Antepassados de Baía, que pode ser a baía de Collier sendo Collier um anglicismo da palavra Colher, significando (re)colher velas para aportar.

2.2. Adiante se descrevem de forma breve todos os actores envolvidos nesta ocupação clandestina dos australianos montes Kimberley:

-- Um número indeterminado de pessoal náutico da Armada Portuguesa,

-- Um número indeterminado de civis, dentre eles membros do clero, cientistas, artesãos e potenciais residentes ilegais,

-- Mais de um milhar de negros africanos, calculados pelo número de cabanas de pedra para albergar trabalhadores e escravos, ainda existente na ilha High Cliff (Altas Escarpas). Eles eram provavelmente utilizados pelos portugueses como escravos das galés, para trabalhos forçados a processar peixe e dugongo fumado e a cortar pedra duma mina de pedras semipreciosas de Calcedónia e duma mina à superfície de minério de ferro na ilha Koolan.

A importação de escravos e as primeiras expedições portuguesas à costa noroeste africana datam de 1434. A partir de 1450, a maior parte dos seus escravos veio das regiões ribeirinhas do centro e sul da costa africana ocidental, agora Guiné-Bissau. Por volta de 1500, Angola, o Cabo da Boa Esperança e Moçambique haviam sido anexados e Madagáscar descoberto, e havia também escravos retirados desta parte de África. Rapidamente, a maior parte das nações coloniais se apercebeu de que os escravos africanos eram os melhores. Os Portugueses tentaram utilizar escravos malaios em Java, naquilo que se provou ser um grave erro, jamais repetido. Os escravos malaios tinham uma reputação de serem bastante autoritários e mandões e até mesmo de gerirem os negócios dos seus donos. Os índios americanos (ameríndios), quer do Norte, quer do Sul, tinham uma reputação de serem inúteis e perigosos. Não havia ninguém melhor do que os Negros da África Ocidental para trabalhar nas plantações de cana do açúcar no Brasil.

Em poucas décadas, mais de quatro milhões de escravos africanos foram vendidos e enviados para as Américas. Tudo parece apontar para que os escravos portugueses na Austrália fossem originários da África Ocidental, em vez da África Oriental ou Madagáscar, e existe outra pista que apoia esta versão: a existência de árvores baobá nos montes Kimberley (ver 2.8). A maior parte destes escravos africanos terá ficado quando os portugueses abandonaram a região dos Kimberley, cerca de 1580, na esperança de poderem regressar um dia. É altamente provável que, antes e depois do período de ocupação, eles se tenham miscigenado com os aborígenes das ilhas da baía Collier, e a norte desta. Durante 470 anos, as duas metades, miscigenadas através do casamento, desenvolveram-se num grupo étnico híbrido, transportando consigo os nomes de origem portuguesa, como Avós de Barra e Avós de Baía, os quais sobreviveram até aos nossos dias.

Os escravos na Austrália falavam a língua portuguesa. Os portugueses começaram as suas expedições em busca de escravos, cerca de noventa anos antes de se estabelecerem na Austrália. Por volta de 1520, os seus escravos falavam Português há duas ou três gerações.

Até 1520, os subsequentes Yawuji Baía não existiram, mas os seus antepassados eram aborígenes puros, talvez relacionados por sangue e língua aos Worrora, vivendo lado a lado na baía de Collier e suas ilhas adjacentes, nunca a mais de vinte quilómetros da costa, que era o limite máximo das suas embarcações. Quando a armada invasora portuguesa aportou à costa dos Kimberley, ao largo da ilha Champagny (vd. 7), de acordo com planos prévios e bem organizados, acostou primeiro na ilha das Altas Escarpas (High Cliff) no grupo das ilhas Montgomery, a seguir na ponta sul da Baía, a que então deram o nome de Baía Colher ("Baía de recolher velas para aportar"). Os portugueses amigaram-se com os aborígenes locais e para ganhar a confiança destes para fins tão distintos como a pesca, a guarda costeira e expedições, forneceram-lhes canoas feitas de madeira, até então deles desconhecidas. Os portugueses chamavam a estas canoas "nau mendi" ou "barcos de mendigo (beggar ship)". Este termo permaneceu em toda a região costeira dos Kimberley como namandi (Crioulo) ou namindi. A maior mobilidade e velocidade deste tipo de embarcação e o seu mais amplo limite de acção, permitiu aos aborígenes adquirirem com este meio de navegação acesso a ilhas mais afastadas. Eles também se miscigenaram com a mão-de-obra africana inicialmente estacionada na ilha MacLeay (em português Galés irá, em crioulo Galij irra, ou seja o local para onde os escravos irão). Os seus locais de trabalho eram em High Cliff (Altas Escarpas) e a ilha Koolan (vd. 6.6)

Outra tribo aborígene a ter tido contacto com os portugueses terá sido a dos Nyikina, que vivia a sul da Angra do Rei (King Sound) e na baía de Fitzroy, até à zona de Passagem ou Travessia de Fitzroy. Para além da existência de membros destas tribos com uma aparência física diferente da raça miscigenada, parece existir pouca evidência física deste contacto. Contudo, há alguns termos importados e um deles é extremamente importante pois dá-nos a saber como a árvore baobá originária de África chegou aos Kimberley: o termo em Nyikina largari (baobá) dificilmente pode ser dissociado do seu étimo português [árvore] larga. Da mesma forma conspícua é a presença do termo langurr (marsupial roedor, de cauda anelar ou Ringtail Possum), conhecido pela facilidade com que é capturado, apático e lento, quando se compara tal termo com o étimo português langor, definido como lento ou preguiçoso. Espero que mais termos adoptados por empréstimo venham a ser descobertos.

Um grupo de tribos aborígenes da Angra do Rei (King Sound) e a oeste da mesma, cujos nomes se perderam desde o impacto da invasão portuguesa, adoptaram o nome global de Jaui, Jawi ou Chowie, todos eles sendo uma deturpação do étimo chave, nome bem apropriado para o novo quartel-general nas ilhas Sunday. Provavelmente, os aborígenes ali residentes foram forçados a abandonar as ilhas durante o período de ocupação, tendo regressado depois da partida da Armada. É igualmente provável que os membros do clero tentassem disseminar a fé entre os infiéis. Pelo menos sobreviveu a implantação de inferno, enfaticamente substituída por um padre pela exclamação Dor quê!, como seu sinónimo. Este étimo é ainda utilizado pelos Jaui e noutros idiomas da região da Angra do Rei (King Sound) e no dialecto Ngarinyin como dorge, significando inferno.

A vasta topologia e toponímia deixada pelos portugueses na região dos Kimberley provam para além de qualquer dúvida, a existência de uma vasta colónia portuguesa. Para o afirmar, as muitas instâncias em que a análise linguística dos étimos é consistente com a realidade geográfica e a possibilidade histórica. Até ao momento, apuraram-se 101 étimos de Português ou Crioulo Português. Adicionaram-se igualmente palavras isoladas, na sua maioria importadas para dialectos locais, dentre um vocabulário português que se cifra, à data, em 260 palavras. A densidade populacional portuguesa na área de colonização europeia teria de ser reduzida e isso prova, de forma evidente, que a presença portuguesa terá sido maior do que qualquer descoberta arqueológica – sem proporcionar nomes – poderia provar. Contudo, em ambos os casos, auxiliam a identificar o enigmático caso das cabanas de pedra em High Cliff (Ilha das Altas Escarpas).

Foi apenas depois da descoberta toponímica portuguesa do professor Brandenstein que houve a possibilidade de fazer pesquisas arqueológicas onde estas jamais haviam sido feitas. Refiro-me à área de Derby a Yeeda e Willare, dado que o leito do rio Fitzroy de há 470 anos é agora o rio Yeeda.

Não surpreenderá assim saber que o termo português Ida, equivale ao termo crioulo Yida (significando porto de embarque ou destino, cais) e que a feitoria Jaula-enga, ou estação rural de Yeeda, teria sido um ponto de transbordo durante a época dos portugueses, onde as naus poderiam carregar ou descarregar no mesmo cais - consoante as marés - em simultâneo com as barcaças fluviais. Estas, transportavam produtos agrícolas, rio abaixo e rio acima até Bruten Hill (a colina Bruten) no ribeiro Christmas, para a estação de Cherrabun e até Noonkanbah, na parte mais meridional que se podia atingir no rio Fitzroy.

A evidência para este tráfego fluvial é proporcionada, uma vez mais, pelos nomes acabados de mencionar. No português brotem [podem flutuar (o barco numa curva depois da colina)], é a terceira pessoa plural do conjuntivo de brotar. Cherrabun é o equivalente português de Cheira a bom. Noonkanbah era uma estação pastoril cujo passado se desconhece, mas que em 1880 era gerida pelos (irmãos) portugueses Emanuel, de acordo com E. Kolig [1987: 19]:

"Surpreendentemente as histórias aborígenes falam numa fase anterior de paz e de harmonia racial. A origem desta tradição oral é algo misteriosa, carecendo ao que parece, de substanciação histórica."

Será mesmo assim? A palavra Noonkanbah soa bem ao português Nunca pá, como grito de alívio ou desalento. Será que alguém se fartou de remar rio acima e rio abaixo? Ou todos os remos de uma barcaça se foram numa manobra errada? Escusado será acrescentar que a estação de Noonkanbah se localiza no rio Fitzroy, e a 12 quilómetros para leste fica a estação pastoril de Kalyeeda. Sete quilómetros a noroeste e sete a nordeste daquela o rio Fitzroy forma duas largas curvas, em cuja margem ou flanco existe uma pista de gado onde este tem acesso à água. Este tipo de pista para o gado beber corresponde totalmente ao significado português de Calheta, cuja ortografia actual é Kalyeeda. Obtiveram-se, até ao momento, mais 22 nomes de locais habitados na região do rio Fitzroy.

Existe ainda, um último étimo, dado ser extremamente comum e ter uma importante relação geográfica para o que foi, em tempos, o proeminente porto de Yeeda. Actualmente, trata-se de importante ponto de paragem ou abastecimento à margem da estrada, mas Willare é claramente o mesmo que em Português Vila à Ré tal como era vista de Yeeda lá atrás, ou vista de cima.

3) A análise de acontecimentos históricos e condições no auge do poder colonial português, quer nas Índias Orientais ou fora delas, não pode ser tomada como sendo infalível e final. Em especial no que concerne à retirada da armada da região dos Kimberley cerca de 1580, as conjecturas podem ser reduzidas a uma pergunta alternativa: "Terão os colonos portugueses e a sua comitiva partido com a armada, ou ficaram amigavelmente com os aborígenes locais, desenvolvendo as estações pastoris cujos nomes ainda hoje se mantêm, e quiçá talvez tenham vivido felizes para sempre, até que Alexander Forrest e os padres, Sir John e Matthew exploraram e adquiriram vastos interesses na área dos Kimberley a partir de 1879?"

Como foi dado a entender no capítulo anterior, as tradições locais aborígenes apoiam a teoria da estadia pacífica dos primeiros colonos europeus (ou seja, os Portugueses).

O cuidadoso planeamento de uma estrita invasão clandestina dos Kimberley necessitou de uma palavra de código para todos os que, como parte das suas obrigações de serviço, participaram sob promessa e juramento de não divulgação. Será importante recordar que havia um profundo relacionamento entre causa e efeito de obrigações e deveres por parte das autoridades portuguesas, e pela lealdade e obediência por parte dos seus escravos negros, fundadores da única tribo afro-australiana na História. A sua fidelidade ininterrupta durou 407 anos, entre 1580 e 1987. Esta história contém algumas deduções, as quais demonstram de forma importante os meios de que as autoridades portuguesas da época se serviram para evitar um estado declarado de guerra com os seus competidores espanhóis nas Filipinas, enquanto simultaneamente distendiam o seu vasto Império pelos quatro cantos do mundo. A operação nos montes Kimberley deve ter sido fruto da brilhante mente de Francisco Rodrigues, o melhor estratega e planeador que à data os Portugueses tinham em Malaca. Foi ele aliás que mais tarde preparou a conquista de Macau, na China, em 1557. Para ele, era uma absoluta necessidade a invasão clandestina dos montes Kimberley. Ele estava cônscio de que se os espanhóis descobrissem que os portugueses estavam a fazer um esforço de descoberta e avanço para sul ou para leste, a guerra era um facto inevitável. Isto tinha de ser evitado a todo o custo pois resultaria na perda das Malucas e do lucrativo comércio das especiarias obtido em Ternate em 1512, para além de pôr em perigo a conquista de Timor em 1516. A paz aparente e periclitante assinada em 1529 entre Portugal e Espanha dá-nos uma indicação de que a operação clandestinamente engendrada por Rodrigues surtiu efeito entre 1516 e 1529. A minha convicção e melhor aposta são que "tal aconteceu na década de 20".

4) A fim de desencorajar explorações de descobrimento no mar de Timor e potenciais informadores aborígenes, todo o pessoal, incluindo escravos e colonos livres a bordo da armada, tiveram de jurar segredo sobre a sua identidade nacional, ou seja, as palavras Portugal e Português foram banidas do vocabulário por uma palavra de código que fosse idêntica em todos os vocabulários dos poderes coloniais que então lutavam pela supremacia. Numa mistura de orgulho e prudência a escolha recaiu em Eufonia, do grego clássico Euphonia, significando com boa e forte voz. Recorde-se que naquela época, a pena capital era o castigo imposto a todos os participantes na operação que violassem o juramento sagrado. Assim, a língua portuguesa oficialmente falada nos novos quartéis-generais da armada em Chave (actualmente a ilha Sunday) era denominada "Eufonia". Quando os poucos aborígenes autorizados a entrar no local fizessem perguntas ficavam a saber que aquela palavra era o nome dos recém-chegados e do seu idioma. Para os aborígenes porém era difícil aprender este étimo estrangeiro Eufonia. Dada a diferente fonologia eles pronunciavam Eufuni'a mantendo apenas E, n, a, e substituíam o estrangeiro som uf por w, o segundo u, por F, deixando de fora a intonação forte de i' a, transferindo-a para o E' inicial. Isto produzia Ewnya, ou transcrito por nós como Ewanya, a versão crioula do português Eufonia, sobrevivendo os últimos 470 anos, ainda no seu habitat temporário de antanho na ilha Sunday. Por um erro, perfeitamente compreensível dos sucessores dos portugueses da ilha Chave, o seu nome e o do seu idioma derivou para Jaui, do étimo português chave. Alguns Jaui admitiram considerar Ewanya como o nome da sua língua, mas os Jaui deixaram Chave (ilha Sunday) como os portugueses o haviam feito e vivem agora numa região designada "One Arm Point (Ponto de um Braço) " na região continental mais próxima. Foi desta forma que o código secreto Eufonia e o crioulo Ewanya sobreviveram, guardando o seu segredo até aos dias de hoje.

O que aconteceu aos escravos negros quando os portugueses deixaram a Austrália em 1580, por ordem do seu novo rei e inimigo, Filipe II de Espanha ficará para já no limbo das conjecturas. Existem boas razões para acreditar que os escravos foram deixados na terra onde viviam e trabalhavam há já sessenta anos. Provavelmente foi-lhes dito que tinham ainda certas obrigações para com os seus donos e ameaçados com punições e nova escravatura, se alguns deles ou seus descendentes falassem com pessoas de outros grupos étnicos, ou divulgasse o nome da sua língua e nacionalidade. Os aborígenes que não fossem de descendência afro-australiana, em especial, eram para ser tratados com desconfiança. Será lógico e realístico admitir que depois da partida dos portugueses do arquipélago Buccaneer tenha havido uma familiarização mais relaxada entre os afro-australianos, resultando numa hibridação nos seus novos locais de residência insular.

5) Um desenvolvimento importante das preferências linguísticas dos parceiros na nova tribo é significativo, derivando do facto de os machos africanos estabelecerem a tradição de manter o

Português Puro como sua língua em todas as ocasiões. As suas parceiras aborígenes tinham apenas a lei da inércia a seu favor, contribuindo para um lento crescimento do Português Crioulo, dada a falta de habilidade dos seus parceiros aborígenes dentro da tribo em reproduzirem de forma correcta a fonologia portuguesa. Isto era aceite, ou tolerado, pelos africanos dado que eles eram capazes de compreenderem, e é provável, que as crianças – em especial os varões – aprendessem Português através dos seus pais, que nem estariam interessados em aprender as línguas puras aborígenes. Assim, sob a influência africana durante um certo decurso de tempo, toda a tribo – sem mais estrangeiros com quem comunicar – se torna monolingue, numa mescla de Português Puro e de Português Crioulo. Na parte ocidental do arquipélago Buccaneer a escolha de transmitir às gerações vindouras os nomes Portugueses em Crioulo foi mais ditada pela necessidade de ocultar a sua origem não Yawuji, tais como os Jaui, ou de europeus, como N. B. Tindale. Desta forma mantiveram os seus nomes mas não o significado dos mesmos.

6) Gostaria de poder discutir aqui dois casos individuais que podem explicar o comportamento dos

Afro-australianos Yawuji sob pressão para não revelarem a sua verdadeira identidade: No primeiro caso temos uma pessoa cujo Português é o seu idioma nativo e que utilizou este idioma quando, pessoas estranhas tais como antropólogos australianos, missionários ou linguistas começavam a fazer perguntas para as quais não estava preparado/a a dar uma resposta.

J. Birdsell, um antropólogo norte-americano, perguntou a esta pessoa, em 1954, pelo nome real do seu dialecto e tomou nota daquilo que pensou ser um só étimo, obviamente o nome que havia utilizado para perguntar. Tal "nome" que apontou no seu livro de notas era "Bergalgu".Este nome foi mencionado por N. B. Tindale em "As tribos aborígenes da Austrália [1974, 242, 268 Aboriginal Tribes of Australia] ". Entretanto em Português coloquial puro: "Perca Algo", uma mescla que significa "perca" (1: pode perder ou, 2: peixe perca), e "algo" (alguma coisa) significando "uma perda qualquer" ou "uma perca pequena" ou seja, uma forma expressiva de comunicar uma meia verdade de forma evasiva. Este homem estava determinado a não deixar que Birdsell soubesse a verdade sobre a sua língua "aborígene". De qualquer modo, manteve-se calmo, arrependido, inconspícuo e bem comportado.

Embora menos diplomática, mas de igual forma não menos determinada é a declaração espontânea que outro informador deu a H. H. J. Coate (data imprecisa), tal como citado no livro de W. McGregor "Handbook of Kimberley Languages (1988:97) ". Após ter declarado que o nome da tribo era Yawuji Bara acrescentou mais duas palavras, que Coate assumiu tratar-se de um nome alternativo da ilha de Montgomery. Tratava-se de um excesso temperamental da pessoa em questão. Embora a princípio parecesse e soasse tipicamente aborígene, trata-se de uma forma crioula de Português: Winjawindjagu (de acordo com Coate) em vez daquilo que devia ser wynia, winjwegui! Isto é de facto Português vinha, vindico, uma forma causal consecutiva dos verbos vir e vindicar. A nasalação frequente do n antes do d em Português não pode ser repetida pelos aborígenes que falam Crioulo. Em vez disso, em Português ngd passa em Crioulo a ser nyj. A tradução deste segmento é clara: " [Como] eu vim dali e quero-o de volta". A súbita raiva do informador aborígene ressalva da sua lembrança de ter sido detido pelos brancos em 1931 e forçado a viver no seio dos Worrora num campo fechado e sobrepovoado numa terra estranha.

Durante toda a sua vida ele tinha aproveitado as delícias da vida, do dugongo à tartaruga, ao peixe e ao caranguejo em abundância, mas agora a sua dieta além de lhe ser estranha era monótona. A mudança de vida, do estilo de vida marinha saudável das suas ilhas para a situação presente, das gentes da sua tribo numa reserva asquerosa em Derby ou na missão lamacenta de Mowanjum deve ter sido profunda: "Quero voltar para donde vim!" Quem seria incapaz de sentir o mesmo? Mas quer aquela personagem quer a sua tribo não teriam hipóteses de escolha, a não ser manterem-se firmes na sua decisão firme de 1580 de jamais revelarem o segredo da sua origem, frustrando tanto quanto possível os esforços e perguntas inquisitórias de estrangeiros. Estas são as virtudes imprevistas e não recompensadas de uma tribo independente e híbrida afro-australiana, descendente dos Avós de Barra e dos Avós de Baía, de língua e nacionalidade portuguesas, incapazes de respeitarem passivamente as reivindicações britânicas de duzentos anos mais tarde.

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