Genealogia e demografia (artigo no Jornal de Notícias).

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Genealogia e demografia (artigo no Jornal de Notícias).

#341726 | PP | 29 jan 2014 15:52

Caros confrades,

Deixo-vos aqui um artigo, muito simples, que foi publicado no dia 27 de Janeiro, no Jornal de Notícias.

Ainda que muito singelo, traz algumas revelações interessantes, fruto do trabalho de investigação meritório da historiadora e demógrafa Prof.ª Dr.ª Norberta Amorim.

Para quem não leu, aqui fica:

«Viajando no tempo, a partir da análise de registos paroquiais, desde que existem, finais do século XVI, descobre-se um país de contrastes. No Minho, os filhos ilegítimos atingiam níveis bastante elevados.

A comparação entre comunidades de Guimarães e Évora provam a diferença abissal. No Norte, a esperança de vida superava os 40 anos, raridade na Europa. Nas freguesias estudadas no Norte, sobressaía ainda uma idade média para o primeiro casamento das mulheres a rondar os 27 anos. Afinal, não se casava tão cedo quanto foi contando a literatura, diz Norberta Amorim, mentora de um projeto ambicioso chamado "Repositório Genealógico Nacional", nascido na Universidade do Minho, que procura alcançar o máximo de freguesias.

"A diferença no que toca a filhos ilegítimos é surpreendente", sublinha. "No Norte, havia um volume de filhos fora do casamento espantoso, à volta dos 15%, às vezes e em certas zonas atingia os 20% e mesmo os 25%. No Sul, a não ser os filhos das escravas, chegava a haver só 1%". A tendência não se manteve a caminho do século XX, embora continuasse o Norte a liderar.

"A ilegitimidade aumentou em Trás-os-Montes e diminuiu no Minho".

A conclusão parte do registo de dezenas de paróquias, não é balanço nacional, ressalva a historiadora demógrafa, que se debruça há 40 anos sobre a matéria e que esta semana reuniu com o edil de Caminha, tendo em vista nova parceria para ali fazer igual levantamento.

A "pujança demográfica" do Norte, aliada aos poucos recursos, gerou mobilidade, principalmente dos homens, que saíram para procurar trabalho noutros lados, o que justifica, simultaneamente, a emigração para o Brasil e a ida para cidades: Lisboa e Porto. "Em Vila Nova de Cerveira, a chegada de galegos vai mudar o panorama da comunidade", por exemplo. No Norte, a relação entre homens e mulheres – 60 para 100 – será outro fator explicativo. "No Sul, não era assim, havia menos mulheres. Aliás, captava homens. É o caso de Évora". Mas fazer comparações com a atualidade não faz sentido. "Tudo mudou. O contraste é agora entre cidades e campo, que também se vai urbanizando. Vai ficando tudo mais ou menos igual". Desde 1977, a lei deixou de considerar a designação de pai incógnito.

Nos séculos XVIII e XIX, a esperança de vida no Norte ia além dos 40 anos, enquanto na Europa rondava os 30. Nas ilhas do Pico e Faial, aproximava-se dos 50 anos; e detetaram-se nonagenários, "provavelmente devido à alimentação rica em peixe, escassa em carne, e à prática de caminhadas". No Sul, a média copiava a Europa.
No Alentejo, casava-se mais cedo, por volta dos 22 anos. No Norte, e sobretudo no Alto Minho, as mulheres casavam quando tinham 27, 28 anos, ano ou ano e meio acima dos homens.


AUTOESTRADA DO PASSADO

Foram estudados registos de batismo, casamento e óbito do Pico, de onde é natural Norberta Amorim, e do Faial. No continente, dezenas de freguesias do Minho, várias de Fafe, Fafe incluída - o protocolo com a autarquia tem dado frutos -, Guimarães.

Existem pesquisas de Aveiro, Santa Comba Dão, Viseu, Ericeira, Évora e alguma coisa de Lisboa. Os primeiros dados do "Repositório Genealógico" partem de teses de doutoramento já concluídas. "O 'Repositório' é como se fosse uma autoestrada, uma estrutura base para ligar tudo isto". O objetivo é
reunir a informação dos primórdios, de 1910,1911 (criação do registo civil), de todo o país. O INE iniciou levantamentos em 1864.


3 PERGUNTAS A NORBERTA AMORIM

"Não havendo gente jovem, a procriar, não há respostas (para as dificuldades)". Norberta Amorim. Historiadora, 70 anos, está preocupada com a falta de renovação das gerações.

1. Estamos a falar dos séculos XVI a XIX. Que lições tirar disto?

Podemos aprender muito sobre a complexidade do ser humano. A riqueza da complexidade, as adaptações, as respostas que vão mudando ao longo do tempo. Como sejam estas da emigração, do regresso. Como é que uma geração se adaptou às condições da economia.

2. Apesar da evolução, continuamos na mesma?

Acho que sim. Estudamos é as respostas dadas aos diferentes desafios. No caso de São João, Pico, houve um vulcão em 1718 e 1720, que arrasou e engoliu a terra, levando a comunidade a deslocar-se. Parecia que aquele lugar ia desaparecer, mas não. Vieram de todas as partes jovens casais, que ficaram ali e a ergueram. Porquê? Porque havia gente jovem, a procriar, e daí a resposta. Por isso, estou extremamente preocupada com o que se está a passar. Não há gente nova e depois não há respostas.

3. Devido à queda da natalidade?

Efeito da contraceção exagerada. A falta de renovação das gerações vai sentir-se a curto e médio prazo. São estas gerações que se adaptam e fazem alterar o rumo dos acontecimentos. São elas que podem dar a volta. Este é o grande drama do nosso tempo.»

Cumprimentos, PP.

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RE: Genealogia e demografia (artigo no Jornal de Notícias).

#341736 | Anachronico | 29 jan 2014 17:12 | Em resposta a: #341726

Caro confrade PP,


Obrigado pello artigo, que não lera, e que comprova mais uma vez a extraordinaria diversidade de costumes e peacticas pella nossa Europa fora ― mesmo, como aqui, dentro d'os proprios paises.

Apenas um pequeno commentario, para quem não estiver lembrado. Julgo quasi não ser necessario n'um forum de genealogia, mas ainda assim:

"...a esperança de vida no Norte ia além dos 40 anos, enquanto na Europa rondava os 30. Nas ilhas do Pico e Faial, aproximava-se dos 50 anos..."

Tudo isto obviamente devido à mortalidade infantil. Não se morria na Europa aos 30 annos, nem no Norte aos 40. Apenas immensos morriam na infancia ― e quantos mais morriam na infancia, mais baixa seria a esperança de vida, que é uma media apenas. Julgo ser isto mais ou menos de conhecimento geral, mas se algum d'os confrades não soubesse, fica esclarecido.

Permitta-me por fim um ligeiro desabafo: este accordo orthographico tem resultados extraordinarios. Detetar um nonagenario é um d'elles...


Cumprimentos, e mais uma vez obrigado,
Anachronico

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RE: Genealogia e demografia (artigo no Jornal de Notícias).

#341739 | joham_mac | 29 jan 2014 18:53 | Em resposta a: #341726

Os meus avós paternos nasceram no concelho do Marco de Canaveses.
Desse ramo, quando tinha cerca de 1000 antepassados, fiz uma estatística, relativa às idades que eles tinham quando casaram e faleceram. Foi possível obter um universo de cerca de 200 homens e 200 mulheres.
Separei esse universo em 2 grupos: os que casaram antes de 1700 e os que casaram depois desse ano. E tive uma surpresa:
Antes de 1700, cerca de 40% dos homens e cerca de 45% das mulheres faleceram com 70 ou mais anos; depois de 1700 essas percentagens foram 37% e 44%, respectivamente.
Quanto aos casamentos: embora tenha antepassadas qua casaram com 12 anos, as idades mais frequentes para os casamentos eram: antes de 1700, entre os 20 e 24 anos (32% dos homens e 37% das mulheres); depois de 1700, manteve-se o intervalo nas mulheres (cerca de 49% casaram entre os 20 e 24 anos), mas para os homens o intervalo passou a ser entre os 25 e 29 anos (cerca de 40%).
Esclareço que esses meus antepassados, viveram principalmente nos actuais concelhos de Marco de Canaveses e Penafiel, havendo ramificações relevantes nos concelhos de Amarante, Baião, Felgueiras e Lousada.

João Machado

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RE: Genealogia e demografia (artigo no Jornal de Notícias).

#341742 | PP | 29 jan 2014 19:58 | Em resposta a: #341739

Caros confrades,

Embora não tenha ainda feito um levantamento estatístico rigoroso, tal como muito bem apresenta o confrade João Machado, também fiquei algo surpreendido com alguns factos que fui constatando à medida que fiz a minha investigação.

Por isso, destaco as seguintes afirmações do artigo: "Afinal, não se casava tão cedo (....)" e "(...) a esperança de vida superava os 40 anos, raridade na Europa."

Estas afirmações são provavelmente surpreendentes, mas precisamente há muito pouco tempo atrás, tinha conversado sobre este assunto pertinente com outros interessados. À medida que fui investigando também achei que não seria tudo tão claro e assente como julgava...

Tinha a ideia de que a esperança de vida era bem menor da que acabei por constatar e que os nubentes casariam muito cedo... Mas, também, fui ficando com a ideia contrária.

A título de exemplo, na minha base de dados, a esperança média de vida é de 56,3 anos, facto que já me tinha chamado particular atenção. E, curiosamente, encontrei um caso raro: «Faleceu de doença que Deus lhe deu, sendo da idade de cem anos».

O mais curioso é que o individuo em causa faleceu em 1621.

Cumprimentos, PP.

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RE: Genealogia e demografia - artigo na "Análise Social"

#341743 | Anachronico | 29 jan 2014 20:07 | Em resposta a: #341739

Caro João Machado,
[e aos demais confrades]


Obrigado pellos seus dados, sempre interessantes. Como os seus exemplos mostram, o termo "esperança de vida" de facto é frequentemente mal entendido pello publico geral: muitos chegavam a idades avançadas, e os seus 40-45% com mais de 70 annos é boa prova d'isso.


Quanto aos casamentos, mas para a nobreza, existe um estudo interessantissimo de Nuno Gonçalo Monteiro que talvez lhe interesse, com idades medias de casamentos, numeros medios de filhos, percentagens de filhas enviadas a conventos, &c, &c ao longo de seculos:

"Casamento, celibato e reprodução social: a aristocracia portuguesa nos séculos XVII e XVIII"

Accessivel em http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1223292919Z6zJO8jj4Ms26LT5.pdf [29 paginas, 1,73 MB]


Cumprimentos,
Anachronico

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RE: Genealogia e demografia - artigo na "Análise Social"

#341947 | PP | 03 fev 2014 00:37 | Em resposta a: #341743

Caros confrades,

Nem de propósito... acabo de encontrar (ao fim de 2 anos!) o assento de óbito (1756) de um ascendente meu, onde consta:

«(...) e não se deu Sacramento algum por falecer de morte apressada que andava de pé e indo para podar suas filhas o acharam morto em uma horta ao pé das suas casas e foi sepultado nesta igreja»; «teria de idade noventa anos pouco mais ou menos, não fez testamento».

Cumprimentos, PP.

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#347233 | PP | 13 jun 2014 21:28 | Em resposta a: #341726

Caros confrades,

Ainda a propósito do tema.

Acabo de descobrir mais uma ascendente que, segundo consta no seu assento de óbito, faleceu, em 1726, com 105 anos.

Cumprimentos, PP.

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Genealogia e demografia (artigo no Jornal de Notícias).

#347242 | MariaDavid | 14 jun 2014 00:39 | Em resposta a: #341726

Caros confrades

A propósito deste tema tão interessante, gostaria de vos transmitir algumas constatações que fiz a propósito.

Para quem não saiba, a minha família passou, "em bloco", pelos tribunais do SO. Com o passar dos anos e do volume acentuado de processos que consultei, fiz, igualmente, algumas descobertas que arrasaram com ideias feitas e que os confrades já transmitiram, que foram sistematicamente passando ao longo dos tempos. O caso da longevidade ou dos casamentos precoces, a título de exemplos.

Como ainda me encontro em fase de investigação, não vou apresentar estatísticas, o que tenciono fazer quando colocar tudo em livro. Contudo, para deixar algo mais para o debate sobre este assunto, falando em termos de médias, posso adiantar que na minha família as mulheres casam depois dos 25/28 anos, são mais velhas que os seus maridos, os homens chegam a atingir os quatro matrimónios, os casamentos são frequentes entre tios/as e sobrinhas/os, cunhados com cunhados, primos direitos com primos direitos; muitas ligações matrimoniais são combinadas desde a infância. Apanhei antepassados com mais de cem anos e a grande maioria tem mais de sessenta anos (à data dos óbitos). Consultei processos em que mulheres idosas, com mais de 80 anos, foram submetidas a tormento. Um delas, com mais de cem anos, nem se lembrava já do nome dos pais...e porque não confessou o que os inquisidores queriam, foi levada a tormento!

Quanto às descendências, têm autênticas pencas de filhos! As médias oscilam entre 8/10 mas com os vários casamentos, os "pacotes" de filhos chegam a números assustadores.

Os meus ramos familiares distribuem-se entre as seguintes localidades:
Guarda, Celorico da Beira, Pinhel, Almeida, Vila Nova Foz Côa, Sabugal, Belmonte, Covilhã, Teixoso, Fundão, Penamacor, Monsanto, Proença a Nova, Idanha a Nova, S.Vicente da Beira, Castelo Branco, Crato, Sousel, Veiros, Monforte. Em síntese, a faixa raiana que permite uma mobilidade fácil e eficaz. Isto permite fazer um estudo muito interessante sobre judeus/cristãos novos das beiras.

Quanto às profissões, no mesmo agregado familiar coexistem médicos, ferreiros, mercadores, sapateiros, barbeiros, homens de letras... No conjunto, as profissões que mais se destacam são mercadores, tratantes, marchantes, homens de negócios. Todos sabem ler e escrever e encontrei mulheres, nos séculos XVI e XVII a saberem ler e escrever!

Isto foi, apenas, um "petit rien" para dar mais vida ao desenvolvimento do tema, sem quaisquer objectivos extra.

Uma boa noite para todos e os meus cumprimentos
Maria

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#347244 | rfmc | 14 jun 2014 01:19 | Em resposta a: #347242

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Maria David;
... Diz muito bem... todos sabiam ler e escrever, [ séculos XVI e XVII ]
http://www.youtube.com/watch?v=gg7-ffqsC2E&feature=relmfu
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Cumprimentos
Rfmc

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