Títulos concedidos por D. Manuel II
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Títulos concedidos por D. Manuel II
Procuro informações sobre a renovação de títulos por D. Manuel II no exílio bem como outras notícias a respeitantes à posição deste Soberano relativa a estas matérias.
Alguém conhece, publicadas ou inéditas, cartas de títulos ou sobre títulos? Há algum escrito do Rei onde afirme a postura a seguir quanto a este assunto?
Obrigado
Lourenço Correia de Matos
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Renovo o pedido de infomações de dia 28 de Maio.
Estou a reunir toda a documentação possível sobre os títulos renovados por D. Manuel II no exílio.
Seria importante ter acesso a cartas do Rei - ou dos nomeados por Ele para esse efeito - a reconhecer o direito ao uso de títulos. É fundamental saber de que forma eram redigidos estes textos.
Apelo por isto a todos os que tenham documentos sobre este tema ou que conheçam quem os tenha.
Muito obrigado.
Lourenço Correia de Matos
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço
Como especialista na questão “titular”, gostava de saber se já ouviu falar do titulo de Conde de Cassuz.
O bisavô da minha mulher, Miguel Nuno Alvares Pereira Sarmento Forjaz de Lacerda, falecido em 1931, filho de Miguel Pereira Forjaz Sarmento de Lacerda e de sua mulher Maria Augusta Guiod, usou este titulo, mas por muito que procure não encontro referencia dele em lado nenhum. Será um daqueles títulos inventados, ou foram prometidos e não chegaram a ser atribuídos, ou foram dados e não se encontra o documento?
Sei que o senhor em questão era vaidoso pois usava o tratamento de “Dom” antes do nome nos cartões de visita, mas apesar de ter sido o “chefe” da família Forjaz de Lacerda, dos Açores e continente, e descender da melhor nobreza açoriana, não tinha o direito a usar deste tratamento, pois seu pai não o tinha.
O mistério continua no jazigo desta família na cemitério dos Prazeres, nº 370, tem as armas da família com uma coroa de conde. Sei que os seus antepassados ainda tentaram reclamar o titulo de Conde da Feira, quando vagou, mas sem resultado, então de onde vem a coroa de conde?
Na sua linha ascendente não existe nenhum titulo, apenas os primos de linhas colaterais tiveram ( Barões e Viscondes de Nossa Senhora das Mercês, no A. N. P., III, tomo I, pag.719)
A família de sua mulher, Adélia Augusta Gonçalves de Morais e Castro nascida em Chaves parece que tinha uma Quinta chamada de Cassuz, situada na região de Braga .
O que acha deste mistério do conde de Cassuz ?
Abraços
Óscar Caeiro Pinto
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço,
Infelizmente não te posso ajudar, mas não deverá haver quem possa pois ao que sei o Sr D. Manuel foi pródigo a renovar titulos no exilio.
Sei que estiveste aqui ontem e só tenho pena que não tenham interrompidoa minha reunião para te dar um abraço.
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Zé Tomáz
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Salve!
Aqui no Brasil existem casos semelhantes, vigorando hoje ainda. No Estado onde moro, Mato-Grosso, uma subdivisão do Brasil, existe um homem que se intitulado Dom, e usa o título de Barão de Viegas. Mas nunca encontrei referências brasileiras ou portuguesas ao título.
Também houve um homem chamado Brás Cubas, a usar o tratamento de Dom. Viveu no século XIX, e Machado de Assis contou a vida d'ele em "Memórias Póstumas de Brás Cubas". Era uma família de ferreiros, mas o pai de Brás enriqueceu, e garantia a todos descender de porutugeses que derrubaram "cem cubas mouras, e por isso receberam o sobrenome junto a armas e o tratamento de Dom". Vai lá saber?
Giancarlo Marques Zeni
J. Sanguinis Conde Lucchesi
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço:
O título de conde de Margaride foi renovado no exílio por D. Manuel II a favor do fº varão do 1º conde.
A carta de renovação está com o meu tio João, que como sabes vive Lisboa - Av. Ilha da Madeira.
Um abraço
José Couceiro da Costa
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Zé,
Muito obrigado pela informação. Conheci um dia o seu tio João num jantar em casa de amigos comuns e estou muitas vezes com o seu tio Ipa no Tauromáquico. Penso que será fácil obter cópia desta carta.
Um abraço
Lourenço
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Óscar,
Antes de tudo deixe-me dizer-lhe que não sou especialista em matéria nenhuma, muito menos sobre titulares. De facto é um assunto que me interessa mas daí até ser um especialista...
Nunca ouvi ou li nada sobre este título. A família é conhecida mas não sei de nenhum título. É perfeitamente possível que seja assumido por vaidade ou que corresponda realmente a uma intenção não concretizada de um monarca. Conhece as notícias necrológicas do "Conde de Cassuz"? Talvez ajudem a elucidar a questão.
A família vem tratada nos "Livros de Linhagens" da autoria de um Pereira Forjaz de Sampaio, certo? Alguns elementos desta família Pereira Forjaz de Sampaio também usaram o tratamento de "Dom" como vem no "Anuário" de 1964, p.841.
O livro "Pereiras titulares e titulares Pereiras" do Marquês de Abrantes não nos ajuda nesta matéria pois apenas desenvolve a linha dos Viscondes de N.ª Sr.ª das Mercês.
Quanto ao Jazigo, o Coronel de Conde pode ser uma fantasia heráldica sem qualquer outra pretensão. O desconhecimento das regras básicas da Heráldica levava a que se cometessem abusos. Como descendentes dos Condes da Feira poderiam achar que tinham direito ao coronel desse título...
Sugiro-lhe que contacte o Dr. Jorge Forjaz (Rua da Sé, n.º 26 9700-191 Angra do Heroísmo - Terceira - Açores) descendente por varonia dos Viscondes de N.ª Sr.ª das Mercês e emérito genealogista açoreano. Pode ser que o possa ajudar.
Mudando de assunto. Pinas Taves Osórios, nada de novo? Tenho o título mais desenvolvido. Quando lhe der uma arrumação mais definitiva envio-lhe.
Um abraço
Lourenço Correia de Matos
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Giancarlo Seni,
Desculpe antes de mais a curiosidade e a indiscrição, mas assina "Jure Sanguinis Conde Lucchesi". É um título nobiliárquico Italiano? Porquê o "Jure Sanguinis" antes do título?
Desculpe a minha pergunta ignorante mas o meu conhecimento sobre famílias e nobiliarquia estangeira é pouco, para não dizer nulo.
Cumprimentos,
Lourenço Correia de Matos
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Zé Tomaz
Passei por aí na Quarta e o Tuntas também ía aparecer para conversarmos. Como estava numa reunião, combina-se esta semana.
Quanto aos títulos de D. Manuel II apenas uma curiosidade: o seu bisavô Tomaz de Mello Breyner, Conde de Mafra, "concedeu" muitos títulos, pois era uma das pessoas encarregues pelo Monarca de comunicar às pessoas a Sua autorização para os usar.
Um grande abraço
Lourenço
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Salve, Sr. Correia de Matos!
Não no que se desculpar. Uso (usamos) no Brasil o Jure Sanguinis porque quando nossos nonni chegaram ao Brasil, tiveram os título confiscados. Mas na Itália, o Concelho da Casa Real dos Savoya, antes da proclamação da Rep., concedeu direito de uso, mas porém, o Brasil ñ reconheceu com legitimidade. Por isso o juris Sanguinis, seria como "Por Direito, Conde Lucchesi". Espero que tenha entendido!
Abraços,
Giancarlo Zeni
(com z :-)
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço
O Jorge Forjaz já nos contactou, pois o meu sogro além de ter a varonia da família Forjaz de Lacerda é também o "chefe" ou representante de todos os Forjaz de Lacerda, dos Açores e continente.
Também ele não sabe explicar o mistério do conde de Cassuz.
Um abraço
Óscar Caeiro Pinto
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Lourenço, estive alguns dias em Trancoso mas não tive tempo de consultar o Arquivo Histórico, julgo que quando o fizer talvez tenha notícias para si.
Óscar
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Oscar
Peço-lhe o favor de me dar novamente o seu mail para lhe enviar o título de Pinas. O que actualmente tenho é resultado da "fusão" dos meus apontamentos com os do Pedro Quadros Saldanha, que tem investigado as famílias de Trancoso.
Um abraço
Lourenço Correia de Matos
correiadematos@mail.telepac.pt
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço
aqui vai 2910@sapo.pt
abraços
Óscar Caeiro Pinto
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caros confrades,
Volto a trazer este tópico à "superfície" pois encontro-me neste momento a finalizar o trabalho para publicação.
Se alguém conhecer alguma carta inédita do Rei D. Manuel autorizando o uso de títulos, muito agradeço.
Obrigado.
Lourenço
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço,
O Tema deste tópico levanta uma questão jurídica. Como saberá, os títulos, a partir de 1834, eram atribuídos pelos monarcas sob proposta do governo, mais concretamente do Ministro do Reino, penso eu. O mesmo, julgo, se passaria com as verificações de vida e as renovações. Assim sendo, tendo a Monarquia sido derrubada e a República não atribuír nem renovar títulos nobliárquicos, em que ordenamento legal se poderia basear S.M. o Senhor D. Manuel II, que Deus guarde, para proceder à renovação de títulos?
Deixo a questão à sua consideraçãoe de outros confrades, mais entendidos que eu nestas matérias.
Um abraço
Alexandre
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Alexandre
Do meu ponto de vista (de Engº que não de Jurista) o direito manteve-se já que o Sr. D. Manuel não reconheceu a república. Assim poder-se-ia dizer que, junto dele, existiu um "governo no exílio" constituido, quanto mais não fosse, pelos Homens da sua casa. Estaria, pois, garantido o cumprimento do que refere.
Por outro lado, ao que me consta, a Carta Constitucional não previa a forma republicana de governo pelo que etsa seria (será ainda hoje) inconstitucional. :-)
Relembro a todos, principalmente oas mais esquecidos, que, até hoje, a república nunca foi referendada e, antes pelo contrário, o que fez logo no seu início foi retirar o direito de voto a quem seria, sabe-se hoje com segurança, forte pilar de suporte da monarquia.
Cumprimentos
João Cordovil Cardoso
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Alexandre,
Em relação aos títulos de D. Manuel II no exílio tem havido duas interpretações: uma que lhes chama "mercês" e outra que os denomina
"autorizações".
É evidente que na Monarquia Constitucional todo e qualquer título ou mercê era referendado pelo Presidente do Conselho, agindo o Monarca de acordo com este. É
importante não esquecer também que era o Governo e não o Rei quem concedia a
maioria dos títulos, recompensando actos diversos na sua maioria desconhecidos
do Rei.
Por outro lado, e embora tendo em atenção o que acabo de escrever, não devemos esquecer que D. Manuel II foi Rei até ao dia 2 de Julho de 1932. Nunca adbicou ou renunciou aos seus direitos. Na minha opinião, de ignorante total em matéria Juridica, esta situação coloca o Rei exilado acima de um simples pretendente.
Uma vez Rei, Rei para sempre, como Humberto de Itália, Simeão da Bulgária, etc.
De qualquer forma no meu trabalho optei sempre por lhes chamar "autorizações", pois o que acontecia de facto era o pedido ao Rei, e consequente autorização, de filhos de titulares entretanto falecidos (depois de 1910) para usarem os títulos dos pais. Se de modo geral era isto que acontecia, existiram, claro está, algumas excepções, como "autorizações" em linhas ilegitimas, em ramos segundos, etc.
Penso que o trabalho final resultou interessante, mas se não tiver outros méritos terá apenas o de me ter obrigado a investigar muito e aprender :-)
Abraço,
Lourenço
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Óscar Caeiro Pinto
Desculpe a intromissão, mas a leitura destes apelidos trouxe-me à memória o meu antigo colega Victor Hugo Le Cock (?) Lacerda Forjaz, açoreano. Pertence à Familia que cita?
Cumprimentos
Vasco Briteiros
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro João,
Engenheiro poderá ser, mas a sua argumentação acerca da inconstitucionalidade da República face à Carta Constitucional e à ausência de referendo faria a inveja de muito jurista. É caso para dizer que pegou o touro pelos cornos e virou o feitiço contra o feiticeiro - sendo o feitiço neste caso o famigerado artigo 288 e o feiticeiro os constituintes de 1976.
Quanto ao tema central deste tópico, já não me parece que a sua argumentação seja tão sólida. D. Manuel II não reconheceu efectivamente a República, em nenhuma das formas que ela revestiu até à data da sua morte em 1932. Mas ela existia de facto, enquanto a Monarquia, quando muito, existiria apenas de direito. E parece-me difícil classificar de governo no exílio, mesmo entre aspas, aqueles que refere como os "Homens da sua casa", por muito respeito que nos possam merecer. Quem se exilou em 1910 foi a Família Real e não o governo, e nenhum outro foi formalmente constituído no exílio.
Quanto à lei eleitoral de 1911, já aqui discutimos o assunto e estou plenamente de acordo consigo.
Enfim, pano para mangas...
Um abraço
Alexandre
PS Os meus tekels, pisteiros de apurado faro, desejam-lhe boa batida ao javali, e lamentam não o poderem acompanhar.
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Lourenço,
Aquilo que me parece ser a questão nevrálgica, já marginal para o seu trabalho, é precisamente a natureza e origem dos títulos na Monarquia Constitucional quando comparada com a vigente no Antigo Regime. É esse o busilis da questão, e daí talvez a distinção que o Lourenço aponta entre mercês e autorizações. Mas mesmo estas últimas poderiam ser questionadas na ausência de um governo constitucional monárquico.
Quanto aos reis depostos, é claro que são sempre mais que simples pretendentes. Mas, por exemplo, Constantino da Grécia é referido como o ex-Rei Constantino. Bem sei que na Grécia houve um referendo após a queda da ditadura dos coronéis, mas também em Itália a república substituiu a Monarquia pelo referendo de 1946, pelo que Humberto seria um ex-Rei. Quanto a Simeão da Bulgária, hoje em dia é conhecido muito prosaicamente por Sr. Saxe-Coburg, Primeiro-Ministro. Entendo contudo o diferente estatuto de D. Manuel II, pois por cá não houve referendo, nem tão-pouco D. Manuel II se tornou Primeiro-Ministro.:) Mas penso que, como Rei no exílio, era tratado por D. Manuel de Bragança e não como D. Manuel II.
Fico a aguardar com expectativa a edição do seu livro.
Um abraço
Alexandre
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Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caros Interessados nesta Matéria
Penso que há por aqui grandes confusões... pois não é preciso ser formado em Direito para entender que os títulos nobiliárquicos, uma entre várias mercês, eram e são conferidas pelos Chefes de Estado nos vários países, sob proposta governamental. Por vezes coincidia que esses Chefes de Estado eram reis. Caso o Governo se opusesse, não havia mercês para ninguém... pois os Chefes de Estado reinam, mas não governam.
Antes de 1834, em Portugal, havia limitações várias ao exercício do poder régio, pelo menos em teoria. Mas isso seria uma outra, longa, conversa. Depois dessa data, senão antes, como disseram aqui muito bem, as mercês honoríficas eram assunto do Governo, e rubricadas pelo soberano enquanto Chefe de Estado. Quanto a ex-Chefes de Estado, não possuiam qualquer direito para conceder ou reconhecer mercês, nobiliárquicas ou outra, excepto a título pessoal, o que era muito pouco. Quando falo de ex-Chefes de Estado, refiro-me tanto a Presidentes como a Reis, pois que nobiliarquia e títulos podem existir sob a forma republicana de Governo, e monarquias podem proibir ou ignorar nobiliarquias e títulos. A existência de uma classe nobre, ou de cidadãos receptores de títulos de nobreza, é pois independente do ideal monárquico, e da existência ou não de pretendentes ao trono. Pode-se ser monárquico sem reconhecer um pretendente, pode-se ser republicano e reconhecer uma nobreza e seus títulos nobiliárquicoos. Um rei destronado mantinha-se rei, sim (depois houve o caso da Rainha Juliana que ao abdicar voltou a princesa) mas não se mantinha Chefe de Estado. Em França, por exemplo, os anteriores PR's são tratados oficialmente como Mr le Président, e também um Ambassadeur de France guarda o título para sempre, mas apenas em termos sociais, que não jurídicos. Com direito embora a certas honras próprias previstas na lei francesa.
Só o Estado e as suas leis contam para a ordem jurídica interna e externa, pelo que o reconhecimento das cartas de D. Manuel II, escritas no exílio, reconhecimento feito a título meramente pessoal, releva apenas da sua própria opinião, mas sem consequências jurídicas vinculativas quaisquer. O mesmo para mercês do dito D. Miguel "II" aqui no GP (II de quê? do ducado de Bragança que não teve, ou do trono a que não subiu?), ou mesmo do rei D. Miguel I depois de destronado. A legitimidade do Conselho de Nobreza, criado nos anos quarenta sob a mentalidade salazarista e, desculparão alguns, de miguelismo legitimístico reacendido durante o Estado Novo, com o regresso a Portugal do ramo miguelista da Casa de Bragança, tem a meus olhos o mesmo valor. Sublinho a propósito que a exigência feita aos candidatos à "renovação" dos títulos das suas famílias pelo mesmo CN, de reconhecimento e fidelidade ao Senhor D. Duarte Nuno, correspondia sob os olhos de um isento juizo histórico a um paralelo com a exigência aos candidatos a funcinários públicos da IIª República de não serem filiados em organizações secretas, e fidelidade ao regime então vigente. Ou seja, tornava e torna partidário um CN que não parece ter homólogos em mais parte nenhuma do Mundo. Destinava-se isto, evidentemente, a fidelizar os monárquicos do ramo liberal Saxe-Coburgo. Mas que os nossos olhos sejam claros.
Resta-nos pois apenas o bom senso no reconhecimento pessoal, em liberdade de cada qual, do valor da manutenção das tradições, nobiliárquicas e outras, escolha feita por cada um de nós em espírito de boa educação e respeito pelas várias famílias que desempenharam ou desempenham um papel social de relevo no nosso país. Genealogicamente, i.é., historicamente, devemos referir para estes casos "usou o título" de, visto não haver fonte jurídica válida para esse tratamento que nao seja a tradição, e a realidade histórica da vivência social. Não referir, a meu ver, seria também falsear essa mesma realidade histórica. Aproveito para aqui referir, e não me parece de somenos, que a genealogia, parte da História da Família, não é nem pode ser monárquica ou republicana, mas sòmente historicista.
Finalmente, é minha convicção que em Portugal o ideal monárquico muito tem sofrido ao longo do último meio século pela suposta atribuição e manutenção de poderes "absolutistico-legitimistas" em matéria nobiliárquica aos duques de Bragança, reduzindo-os na opinião popular ao papel inócuo e incorrecto de "fonte" todo-poderosa de títulos e honras, e não à representação mais adequada de Portugal, como deveriam ser considerados.
Abraço para os três
Alexandre
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro João
É verdade que a república não foi referendada (nem podia... perdia logo, claro) mas também o não foram nem o actual regime, nem a adeasão á CEE, nem o constitucionalismo monárquico, em 1834... Curiosamente, o único novo regime referendado em Portugal (veja isto como uma boutade sff...) foi o Estado Novo/IIª República. Será que isto lhe confere mais legitimidade para os diplomas legais publicados em meio século, mais do que aos exarados sob outras formas de Governo? :)))
Abç
Alexandre
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caros amigos,
Desculpem-me a pergunta, mas onde foram buscar que a República é inconstitucional?
Um abraço,
Jacinto
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RE: Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caro Alexandre Tavares Festas,
Peço desculpa por corrigi-lo, mas existe, hoje, em 2002 e em Portugal, fonte jurídica válida para o uso e protecção de direitos nobiliárquicos, independente da tradição e do príncipe.
Com os melhores cumprimentos,
Jacinto Bettencourt
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RE: Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caro Jacinto Bettencourt
Agradeço a correcção, por parte de quem se ocupa destes assuntos e está a organizar um encontro de Direito Nobiliárquico, melhor informado do que eu, portanto; e gostei de ficar a sabê-lo. Mas não percebi, no quadro jurídico reconhecido pelo Estado Português, a que entidade se refere.
Melhores cumprimentos
Alexandre Tavares Festas
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Jacinto,
Se ler com atenção, tratou-se de uma referência irónica do João Cordovil ao facto de a actual Constituição impor a forma republicana de governo, deduzindo daí que, dado a Carta Constitucional, em vigor até 1910, não prever essa forma de governo e ter a República sido imposta por meios não constitucionais, o regime republicano é insconstitucional. Concordará que não deixa de ser um bom argumento?
Um abraço
Alexandre
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Alexandre,
Como é evidente, qualquer mudança de regime desse tipo implica uma ruptura constitucional. Nessa perspectiva, também a II e a III República, ou a revogação da Carta Constitucional por D. Miguel I e próxima constituição de 1838, são inconstitucionais.
Trata-se de um argumento ad absurdo ad infinito, uma vez que a legitimidade do regime foi consagrada na constituição seguinte, e atendendo a que nenhuma constituição que eu conheça prevê as condições de substituição da forma de estado e de governo mediante "golpe".
Acho que o problema não passa por aí:-)
Um abraço,
Jacinto
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RE: Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caro Alexandre Tavares Festas,
Dois acórdãos e um parecer da PGR são unânimes em reconhecer que os títulos nobiliárquicos são reconhecidos hoje desde que os mesmos tenham existido validamente em 1910.
A questão já foi levantada em tribunal, como vê, e os nossos tribunais decidiram que o uso e representação de um título merece tutela jurídica.
Por outro lado, reconheceu-se já, e em sentença também, os pareceres do CN como pareceres técnicos relevantes para a apreciação do direito.
Provando-se o direito em questão, poderá o possuidor, ainda, registar o seu direito como nome (dom) e marca (armas), nos termos do CRC e do Cód. Propriedade Industrial.
Infelizmente (e felizmente por outro lado), não existe um entidade reguladora. Tal como não existe para o pseudónimo, por exemplo. Até para a atribuição de armas às autarquias se esqueceram de criar o Gabinete de Heráldica, pelo que continua a ser a Assoc. dos Arqueólogos a tratar do assunto.
Temo que um dia se venha a atribuir ao PR o direito de concessão e verificação de títulos, atendendo ao regime de atribuição de ordens honoríficas (que não é incompatível) e ao facto de se tratar de uma atribuição do Chefe de Estado. E todos sabemos a opinião deste PR...
Um abraço,
Jacinto
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Caro Alexandre,
Como é evidente, qualquer mudança de regime desse tipo implica uma ruptura constitucional. Nessa perspectiva, também a II e a III República, ou a revogação da Carta Constitucional por D. Miguel I e próxima constituição de 1838, são inconstitucionais.
Trata-se de um argumento ad absurdo ad infinito, uma vez que a legitimidade do regime foi consagrada na constituição seguinte, e atendendo a que nenhuma constituição que eu conheça prevê as condições de substituição da forma de estado e de governo mediante "golpe".
Acho que o problema não passa por aí:-)
Um abraço,
Jacinto
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RE: Títulos concedidos por D. Manuel II
Giancarlo,
Desculpe, mas ninguém no Brasil reconhece títulos; aqui sequer existem Conselho de Nobreza ou Associação de Nobreza. Se você quiser, pode juntar seus papéis e ir a um cartório de registro civil e colocar o título como sobrenome(s) extra(s). Mas isso é o que faz, por exemplo, jogador de futebol, que prove o uso de uma alcunha e a junta ao nome. Ou o caso do Lula, agora.
Se vc tem o reconhecimento dos pretendentes Savóia, basta isso, que eu saiba. Ninguém vai negar a você o direito ao título.
Gdes abcs, fa
(Francisco Antonio Doria)
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RE: Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Jacinto,
Só para registrar o que já disse acima: no caso do Brasil, pode-se se quiser - em tese - incorporar o título ao nome. Basta apresentar documentação plausível do direito. Que eu saiba - soube de ouvir dizer - alguns príncipes teriam feito isso.
Gdes abcs do amigo, fa
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RE: Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caro Jacinto
Esperemos, então, pela nova "Comissão de Heráldica", e por uma entidade reguladora capaz!
Um abraço
Artur
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caros Interessados e Amigos,
Na sequência das mensagens anteriores, e neste contexto, reuni algumas notas que me parecem oportunas e que passo a referir.
A primeira prende-se com a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma norma ou conjunto de normas.
Estes termos referem conceitos de relação, concretamente entre a Constituição e uma norma ou comportamento, mais especificamente o que está em juízo é o cumprimento ou incumprimento de determinado comando jurídico previsto naquela.
Assim, fala-se de inconstitucionalidade sempre que uma norma, complexo de normas, ou comportamento...de órgãos ou agentes estaduais, não é conforme ao comando jurídico consagrado no texto constitucional, quer por acção, quer por omissão.
Do exposto resulta que o tipo de relação estabelecida é o fulcro de toda a inconstitucionalidade.
Vão no sentido exposto, por exemplo, os actuais artigos 3º, n.º 3, 207º, 266º, n.º 2, 277º, n.º 1 da Constituição.
Ora só faz sentido falar de inconstitucionalidade por referência a uma Constituição em vigor, democráticamente elaborada e aceite, como expressão última de valores actuais e actuantes no seio de uma certa comunidade que se pretende politicamente organizada.
Por ela se há de aferir da axiologia preponderante, da formação, da geografia, da cultura, das condições económicas de uma sociedade, emergindo como princípio de organização, em que os direitos fundamentais das pessoas e dos grupos hão de estar plasmados, bem como a arquitectura ou estruturação do poder político se há de revelar.
Nestes termos, há de ser expressão, históricamente situada, do sentir e da vontade maioritária de um povo.
Claro que no quadro democrático terá sempre de caber o direito de expressão das minorias, o que na actual Constituição é assegurado, por exemplo, pelos artigos 2.º, 117º, n.º 2º, 179º,n.º 3, 281º, n.º 2, f ) g ).
A exigência de maiorias qualificadas, em muitas e variadas matérias, é uma das garantias efectivas do respeito da vontade das minorias, no sentido de que o seu voto torna-se fundamental para se alcançar aquelas.
E aqui, um parêntesis para umas breves notas às abordagens levadas a cabo por outros “confrades”, no sentido da eliminação da alínea b ) do artigo 288º da actual Constituição, que estabelece, como um dos limites materiais de revisão da Constituição, o respeito pela forma republicana de governo.
Antes de mais, porquê os limites materiais à revisão ?
Pretendem estes salvaguardar a identidade constitucional, ou seja, o acervo de princípios fundamentais, sem os quais aquela identidade se perderia.
Limites de revisão que por seu turno acabam por fazer emergir ou tornam explícitos os princípios essenciais vertidos na Constituição, traduzindo-se num tipo de « interpretação autêntica», levada a efeito pelo poder constituinte, e que por isso se revelam como limites imanentes ou implícitos da revisão.
Pelo que a eliminação do dito preceituado, em caso de admissibilidade da « revisibilidade dos limites materiais de revisão », em conformidade com a tese de dupla revisão, ou seja, com a faculdade para, numa primeira fase, eliminar o respectivo limite de revisão, seguindo-se a revisão da matéria agora posta à disposição do poder de revisão, verter-se-ia num absurdo por contraditório ou conflituante com aquela identidade, ou então significaria a desnaturalização de todo o corpo da constituição, revelando-se afinal como uma nova constituição.
Não obstante, ressalvam-se os casos excepcionais em que os limites elencados possam, de forma inequívoca, revelar como não essenciais para a identidade da Constituição.
Neste contexto, há quem convoque um outro elemento qual seja o da natureza do poder de revisão.
Ora este é tido por aqueles como um poder derivado do poder constituinte e a ele subordinado.
Sendo assim, as regras de revisão atinentes aos limites materiais de revisão apresentar-se-iam como limite externo e prevalente ao poder de revisão, insusceptíveis de por ele serem alteradas.
Aqui, segundo aqueles, não deverá funcionar o principio é “proibido proibir”, isto é, ao destinatário de uma proibição, que lhe é exterior, impor-se-ia uma outra proibição qual seja a de afastar a dita proibição.
Temos esta tese por duvidosa pelo simples facto de se pretender atribuir ao poder constituinte toda a “omnisciência” e “omnipotência”, ou uma natureza de dogma infalível, para além de não vislumbrarmos grandes diferenças entre a legitimidade dos constituintes e a dos actuais deputados.
Essencial, para nós, é que os ditos deputados cumpram com a vontade daqueles que os sufragaram.
A própria história e prática constitucional nos apoia ao revelar que em 1989 se procederam a alterações significativas aos limites materiais iniciais.
Assim, o então artigo 290º, actual 288º, viu reduzido o seu âmbito, concretamente foram retirados:
A al. f ) que consagrava « O princípio da apropriação colectiva dos principais meios de produção e solos, bem como dos recursos naturais, e a eliminação dos monopólios e dos latifúndios;»
A al. g ) relativa « A planificação democrática da economia; »
A al. j ) referente « A participação das organizações populares de base no exercício do poder local;»
E foram introduzidas as seguintes limitações:
Al. f ) « A coexistência do sector público, do sector privado e do sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção;»
Al. g ) « A existência de planos económicos no âmbito de uma economia mista;»
Não obstante, uma coisa é certa, as alterações a introduzir, para que houvesse uma outra identidade seriam tantas, que o que resultaria seria uma nova constituição.
Por isso, em nosso modesto entender, para uma outra forma de governo que não a republicana, ou para além da forma republicana, exigir-se-ia uma outra constituição com uma nova identidade.
O actual preceituado al. b ), do artigo 288º, visa precisamente obstar à restauração de qualquer tipo de governo monárquico, impedir alterações à designação e denominação do Chefe de Estado, concretamente relegar as formas vitalícias ou hereditárias, postergar os privilégios de nascimento, proibir a concessão ou reconhecimento de títulos nobiliárquicos na sua função de honrar.
Faz-se notar que o ordenamento jurídico actual reconhece os títulos referidos, mas apenas e exclusivamente na sua função de identificação, e não na dita de honrar.
Assim o refere o artigo 40º do Código do Registo Civil a propósito, e, sublinho, da identificação.
Nestes termos,
« são permitidas referências honoríficas ou nobiliárquicas, antecedidas do nome civil dos intervenientes nos actos de registo, desde que provem, por documento bastante, que deve ficar arquivado, o direito ao seu uso.»
Contudo:
« A referência a títulos nobiliárquicos portugueses só é permitida quando os interessados provem que têm direito à posse e uso de título existente antes de 5 de Outubro de 1910 e que as taxas foram pagas. »
Mais, e para efeito da prova:
« São documentos suficientes para prova das circunstâncias previstas no número anterior as
CERTIDÕES EXTRAÍDAS DE
DOCUMENTOS OU REGISTOS DAS SECRETARIAS DE ESTADO, DO ANTIGO MINISTÉRIO DO REINO, DO ARQUIVO NACIONAL,
DE OUTROS ARQUIVOS OU CARTÓRIOS PÚBLICOS
OU A PORTARIA A QUE SE REFERE O DECRETO N.º 10 537, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1925.»
A este propósito, da concessão dos títulos nobiliárquicos, encontra-se consagrado na Constituição de 1822, com vigências até 2 de junho de 1823 e posteriormente de 10 de Setembro de 1836 a 4 de Abril de 1838.
Assim, o Titulo IV, referente ao poder executivo ou do Rei, Capitulo I, artigo 123º, vem dizer:
« Especialmente competem ao Rei as atribuições seguintes:
....X. Conceder títulos, honras, e distinções em recompensa de serviços, na conformidade das leis. Quanto a remunerações pecuniárias, que pela mesma causa entender se devam conferir, somente o fará com anterior aprovação das Cortes; fazendo-lhes para esse fim apresentar na primeira sessão de cada ano uma lista motivada;»
Depois a Carta Constitucional de 1826, com vigências de Julho de 1826 a Maio de 1828, de Agosto de 1834 a Setembro de 1838, e de Janeiro de 1842 a 1910 com sucessivas revisões respectivamente de 1852, 1885 e 1896,
No Título V, Do Rei, Capítulo II, artigo 75º, refere:
« O Rei é o Chefe do Poder Executivo, e o exercita pelos seus Ministros de Estado. São suas principais Atribuições:
....§ 11º.- Conceder Títulos, Honras, Ordens Militares, e Distinções em recompensa de serviços feitos ao estado, dependendo as mercês pecuniárias da aprovação da Assembleia, quando não estiverem já designadas, e taxadas por lei. »
Por sua vez a Constituição de 4 de Abril de 1838, no Título VI Do poder executivo, Capítulo I, Do Rei, artigo 82º, diz-nos:
« Compete também ao Rei:
...IX- Conceder títulos, honras e distinções em recompensa de serviços feitos ao Estado, e propor às Cortes mercês pecuniárias que não estiverem determinadas por Lei;»
Finalmente a Constituição de 1911, no Título II, Dos Direitos e Garantias Individuais, artigo 3.º, n.º 3 vem proclamar:
« A Republica Portuguesa não admite privilégio de nascimento, nem foros de nobreza, extingue os títulos nobiliárquicos e de conselho e bem assim as ordens honoríficas, com todas as suas prerrogativas e regalias.»
Porém, como já supra referimos, este inscrito veio a sofrer restrições fundamentadas em direitos adquiridos.
Assim, veio a ser permitido o uso do título, precedido do nome civil, a todos os titulares que tivessem pago os devidos direitos de mercê e cujo título tivesse sido concedido durante o regime monárquico.
E por já ir longo este arrazoado aqui termino.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caríssimo Eduardo Albuquerque,
É como gosto que leio as suas avisadas considerações em matéria jurídica.
Tenho como adquirido, está publicado em -n- obras, que os titulares que em 1910 tinham "em dia" os pagamentos de direitos de mercê, registo e emolumentos poderiam fazer uso dos seus títulos. Destes nenhum deve sobreviver, passados que são 102 anos.
A CRP reconhece aos herdeiros destes a mesma honraria? de que forma?
Hoje poucas são as pessoas que fazem uso do honorífico, no BI, recordo-me do caso do Conde de Cascais, Dom Vasco Telles da Gama, que durante anos não usou este doc. de identificação por pirraça dos registos centrais, que não lho reconheciam, quando ele foi registado (assento de nascimento) com esse título, que outros querem que seja nome, como João. Ou seja, ou seu 1.º nome próprio seria Dom, o 2.º Vasco.
Assim sendo pergunto: - qualquer cidadão pode usar este "nome"?
Fica-se por vezes aqui com a ideia que a CRP é "benévola" nesta matéria e tudo permite, a minha opinião é diferente e está a mesma pejada de habilidades jurídicas que não dá nem tira, antes pelo contrário (parafraseando um comentador desportivo).
Os melhores cumprimentos
NB
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caríssimo Eduardo
Belíssima, com tem sido seu hábito, explanação.
Julgo, no entanto, que a "forma republicana de governo" tem sido "álibi" para muita coisa!
Muito honestamente, não aceito que uma "Constituição" não acompanhe a evolução da sociedade. Qualquer "Constituição" tem que acompanhar a evolução do pensamento dos cidadãos. É no "povo" (em sentido próprio, alargado) que reside o poder!
Gostaria de colocar 3 questões:
1) Será ou não prejudicial a existência de um Presidente da U.E. eleito pelos Estados mais poderosos?
2) Considerando a modificação da alínea b) do artigo 288.º, no caso de "dupla revisão",honestamente também me parece que bastantes preceitos teriam que ser expurgados. Admitindo que surgisse uma nova Constituição, de cariz democrático, que problemas existiriam em termos de legitimação?
Se a nova "Constituição", depois de devidamente votada e implementada, fosse de matriz monárquico-constitucional como é que poderia afectar o "princípio democrático"?
3) Será que "uma tremenda" perda de soberania não é pior que uma mudança de "forma de governo"?
Melhores cumprimentos
Artur Camisão Soares
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RE: Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caro Jacinto,
Não se trata aqui, creio eu, do reconhecimento actual dos títulos nobiliárquicos. Trata-se sim da sua origem e natureza. O que o nosso confrade Alexandre Tavares Festas questionou foi a legitimidade de Reis no exílio, pretendentes no exílio e orgãos como o CN reconhecerem o direito ao uso dessas mercês.
Também me quer parecer que o reconhecimento em sentença dos pareceres do CN "como pareceres técnicos relevantes para a apreciação do direito", não é o mesmo que o reconhecimento da legitimidade desse orgão na atribuição do direito ao uso de títulos, prática essa que é exercida a título meramente privado, e a cuja disciplina apenas os requerentes se sujeitam. Ou será que os tribunais só reconhecem o direito ao uso de títulos confirmados pelo CN?
Um abraço
Alexandre
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caro Nuno Borrego,
Começo por agradecer as Suas amáveis palavras referentes às notas recolhidas e aqui apresentadas, bem como as interrogações adrede formuladas.
Sobre estas últimas, aqui ficam mais uns breves apontamentos.
Principiemos pela primeira interrogação, qual seja:
« A CRP reconhece aos herdeiros destes a mesma honraria? De que forma ? »
Como já foi dito, o actual ordenamento jurídico, relativamente aos títulos nobiliárquicos, apenas os reconhece na sua função de identificação e não na função de honrar.
Isto resulta da natureza republicana da Constituição com expressão no seu título « Constituição da República Portuguesa » e nos artigos 1º ao dizer « Portugal é uma República...» e 288º, al. b ) ao impor o respeito pela « forma republicana de governo ».
Relevo que tais inscritos resultaram de uma vontade maioritária qualificada com legitimidade democrática
Neste contexto, os títulos, como elemento de identificação, gozam da mesma tutela constitucional concedida ao nome e prevista no artigo 26º da C. R. P. onde se diz:
« A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal...»
à qual os artigos 72º, 73º e 74ºdo actual Código Civil dão maior expressão.
Parece pacífica a doutrina que relativamente à escolha do nome a imputa a ambos os pais ou àquele que exerce o poder paternal.
Assim, no actual quadro jurídico, os nomes não se adquirem pela forma de aquisição da propriedade, mas resultam de um acto jurídico.(Cfr. ª Varela, RLJ, 115.º-38 )
Sobre a sua formação, conferir o artigo 103º do Código do Registo Civil e as nossas mensagens a propósito para aqui enviadas.
Este, ressalvada melhor opinião, é o actual regime corrente.
Mas ao lado da situação jurídica, pode correr e corre uma situação fáctica, com relevo e expressão na sociedade que a acolhe e que não será despiciendo considerar.
São todos aqueles casos que não obstante se afastarem do preceituado legal, refiro-me concretamente ao uso dos títulos nobiliárquicos por descendentes, as entidades públicas e privadas os acolhem e dão expressão ao mencionarem os respectivos portadores pelo seu título.
Contudo, parece-me, que tal tratamento deve ser encarado no quadro da identificação e da cortesia, mas sem qualquer expressão honorífica.
Pelo que toca à sua segunda interrogação sobre o “Dom”:
« qualquer cidadão pode usar este "nome"? »
Genericamente responderei que não, já que não me parece que conste da onomástica nacional ou dos casos a ela adaptados, como preceitua o n.º 2, al. a ) do art.º 103º do C.R.C.
Contudo há pessoas que, juridicamente, o podem usar desde que provem o direito ao seu uso nos termos do n.º 4 do artigo 40º do Código do Registo Civil.
Também aqui se aplica o que supra referimos sobre a situação fáctica.
E sobre este assunto é o que, de momento, me ocorre dizer.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caro Artur Camisão Soares,
Agradecendo a sua precedente mensagem a ela me reporto, para, respondendo às suas interrogações, aqui deixar algumas breves notas.
A Constituição é e deverá ser sempre expressão actualizada e actuante da vontade maioritária de uma certa sociedade que escolhe as formas pelas quais se pretende reger.
Esta vontade maioritária não impede a existência de outras vontades que possam almejar a outras formas de organização desde que se compaginem com o espírito democrático, e por isso o inscrito no n.º 4 do artigo 46º da C.R.P.
Parece-me fazer pouco sentido, querer alterar a vontade desta maioria quanto à forma porque esta se quer e consagrou reger.
Não é sem razão que o título consagrado da Constituição é:
« Constituição da República Portuguesa »
que o artigo 1º declara:
«Portugal é uma República..»
e que a al. b) do artigo 288.º impõe que:
« as leis de revisão terão de respeitar:
...
b ) A forma republicana de governo.»
Estes são princípios fundamentais, constituem o núcleo essencial da identidade constitucional.
Se, hipoteticamente, fosse possível alterá-los, mediante a alteração dos limites materiais de revisão, anulando-os, o que teríamos não era uma alteração da Constituição mas sim uma mudança de Constituição, contrária à actual vontade maioritária democraticamente sufragada.
Isto não quer dizer que a Constituição seja um “monolito petrificado” e que não deva acompanhar os “ventos” da história.
E confesso que vão surgindo “ventos” com outra direcção...mas necessário é que estes “ventos” tenham força suficiente para o efeito desejado.
Ora a força mede-se, nos regimes democráticos, pelos votos e pelo que estes representam e estes só se conseguem com a conquista do apoio popular...
Pelo que concerne aos problemas colocados no âmbito da U.E. devo relevar, desde já, a aproximação verificada entre monarquias e republicas deixando ambas de estar de costas voltadas para dar as mãos na construção da Europa, como espaço de liberdade, de democracia, de paz, de bem estar social...
Dos actuais quinze membros, sete são monarquias.
Assim:
A Bélgica, a Dinamarca, a Espanha, o Luxemburgo, a Holanda, a Suécia e o Reino Unido.
E estas não me parecem muito preocupadas com as questões da futura representação da União ou com a eventual diminuição de soberania, nomeadamente com a adopção da moeda única, ou com a instituição de uma cidadania da União.
No fundo o que todos procuram e determinam como fundamental é o bem estar social dos seus, com paz, com democracia e com liberdade.
No quadro desta União que eu considere a monarquia mais representativa das tradições de um povo, enquanto registo de séculos de vivências sociais, e elemento culturalmente limitador de uniformidades existenciais, ou dito de outra forma, de “globalizações” culturais, com relevo particular na defesa da família, base de todo o social, e o preterir de individualismos exacerbados, que no limite acabam por colocar mulheres e homens uns contra os outros, movidos por uma lógica de performances de duvidoso resultado existencial, que no seu dinamismo levam a degradar e anular todos os referenciais éticos, finalizando-se por uma “libertinagem” sem limites que anula a pessoa na sua reciproca relação de reconhecimento e respeito, e consequente co-responsabilidade e solidariedade, para afinal apenas relevar o “eu”, não se me suscitam muitas dúvidas.
O fim intelectual dos mitos, tais como o progresso, a razão..., com o consequente emergir de um politeísmo de valores, veio determinar a procura de novas formas de racionalidade como meio para superar a crise.
E no vazio deixado busca-se, infelizmente, um novo sentido na mística, na superstição, no fundamentalismo...
Contra a “época de crise” dos valores, contra a ausência de “alma” caracteristica da sociedade super-racionalizada, dominada pela ciência , e pela racionalidade que lhe é própria, meramente finalística de um logicismo atroz , com o acentuar de intenções pragmáticas, utilitaristas, desligadas de qualquer apelo a valores e princípios, ou essas próprias intenções convertidas elas mesmas em “valores”, negando toda a racionalidade axiológica e fundamentante, sou em absoluto um lutador.
Mas caro Amigo isto de genealogia pouco ou nada tem.
E o meu propósito neste espaço é aprender alguma coisa sobre esta matéria.
Por isso encerro este discurso, já sobejamente convolado, para focalizar o meu espírito na dita genealogia.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Meu caro Eduardo Albuquerque
Na realidade o artigo 1.º declara:
"Portugal é uma república..."
No entanto, como não sou pela imutabilidade "imposta", considerando-a até "anti-democrática" , devo, em consciência, salientar que o "óbstáculo" levantado pela alínea b) do artigo 288.º se revela de um espírito revolucionário "bacoco"!
Com os meus melhores cumprimentos,
Artur Camisão Soares
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caríssimo Eduardo Albuqueque,
Muito lhe agradeço mais estas explicações que, com as anteriores, me deram outras visão diferente daquela que tinha.
Com os melhores cumprimentos
NB
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Errata:
Onde se lê "república", deve-se ler "República".
Onde se lê "óbstáculo", deve-se ler "obstáculo".
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Mestre Mui Ilustre
Caro Eduardo Albuquerque
Tal como o nosso Nuno Borrego, e muitos outros bem por certo, gosto imenso de o ler e sempre aprendo, ainda que velho burro que não toma nova andadura...
Vou cpiar esta sua intervenção e entrgá-la a Alguém no proximo dia 7, que por certo muito a apreciará.
Grande abraço!
Manuel Maria
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caro Eduardo Albuquerque,
É sempre com grande prazer que leio as suas eruditas linhas, prazer esse que não é de modo algum atenuado pelo facto natural de nem sempre concordar com as suas asserções, embora as partilhe naquilo que considero fundamental.
Estando eu longe de ser um europeísta convicto, nos termos em que actualmente se coloca a chamada "construção europeia" e seu devir, estou talvez sempre "de antenas apuradas" para qualquer manifestação de quebra de monolitismo e unanimismo nesse fenómeno tão pouco debatido entre nós e quase que cegamente aceite.
Vem isto a propósito da sua opinião segundo a qual lhe não parecem as sete monarquias que integram a UE muito preocupadas com diminuições de soberania, como, por exemplo, no caso da moeda única. Coincidência ou talvez não, todos os três estados que não aderiram a esta última - Suécia, Reino Unido e Dinamarca -são monarquias. Os casos escandinavos - a que haveria a juntar os galhardos e nobres noruegueses que até hoje sempre têm recusado, em referendo, a entrada na União - são entre nós menos conhecidos, mas o mesmo já não se pode dizer do Reino Unido, onde a questão da soberania se tem colocado de forma aguda, especialmente desde a aprovação do Tratado de Maastricht. O actual governo britânico - confortavelmente eleito para dois mandatos consecutivos (inédito na história do Partido Trabalhista)- goza de amplo mandato popular para o essencial da sua política, com essa importantíssima excepção. Tendo um pendor fortemente pró-europeu, não conseguiu, em cinco anos e meio no poder, persuadir o eleitorado das supostas vantagens de ceder a definição da política monetária nacional ao Banco Central Europeu, e não arrisca um referendo - eternamente adiado, "et pour cause" - que poderia causar a sua queda. Não sendo com certeza todos os britânicos versados em matéria económica, dir-se-ia contudo que apreenderam a máxima de John Maynard Keynes: "Quem controla a moeda, controla a soberania".
Aceite um abraço e os cumprimentos deste seu muito atento leitor
Alexandre Burmester
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caro Artur Camisão Soares,
Registo com natural serenidade o seu comentário, não deixando, contudo, de lhe deixar um sinal de esperança, pois que aquilo que parece ser um “obstáculo” inultrapassável, com o confluir de novas e crescentes vontades, evidentemente expressas através dos votos, naturalmente cairá qual fruto maduro...
Por isso não se deixe obcecar ou deprimir pelo dito inscrito...tudo na vida tem o seu tempo...
O que não me parece razoável é subverter uma regra básica da democracia qual seja o respeito pela vontade da maioria.
Que, para alguns, no caminho de Stuart Mill, este princípio fundamental seja visto como que uma « tirania da maioria », não desconhecemos, só que esta tese é contraditada pela clara expressão e protecção que o texto constitucional dá às minorias...
Nos “mecanismos” democráticos previsto são possíveis quase todas as soluções, claro está, desde que apoiadas pelos imprescindíveis votos, com ressalva óbvia para aquelas que acabam por destruir ou negar a própria democracia.
Que na esteira de Winston Churchill, a democracia seja o pior dos sistemas excluindo todos os outros, não temos dúvidas...
Finalmente, pelo que toca à sua referência ao espírito “bacoco” , isto é, ingénuo, devo dizer que de ingénuo nada terá, muito pelo contrário...
Por isso caro Amigo, paciência, trabalho e persistência...
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Meu Caro Manuel Maria Magalhães,
É sempre com especial prazer que leio as suas gostosas mensagens, mas a precedente, confesso que me “empacha” um pouco.
Na verdade de mestre nada tenho!
As notas aqui deixadas, mais não são que breves apontamentos colhidos da legislação que correu ou corre, bem como da doutrina maioritária a ela inerente e consabida nos meios jurídicos...
Por isso, Caro Amigo, não me eleve a um estatuto que não possuo e que por demasiado desfasado me assentaria mal.
Retribuindo o seu muito estimado abraço,
Eduardo Albuquerque
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caro Alexandre Burmester,
Começo por agradecer a sua precedente mensagem, e, de igual modo, lhe expressar o meu particular interesse na leitura das suas estimadas, participadas e partilhadas intervenções.
As razões invocadas no preâmbulo do Tratado de Roma, subscrito em 25 de Março de 1957, pela Bélgica, Alemanha, França, Itália, Luxemburgo e Holanda – note-se três monarquias e três repúblicas – quais sejam:
- a defesa da paz;
- a defesa da liberdade;
- o progresso económico e social;
- a melhoria das condições de vida e de trabalho dos seus povos;
- a redução das desigualdades entre regiões e do atraso das menos favorecidas;
- a união entre os povos europeus,
reforçadas em Maastricht, a 7 de Fevereiro de 1992, pelo Tratado da União, este subscrito pelos plenipotenciários de:
- Sua Majestade o Rei dos Belgas;
- Sua Majestade Rainha da Dinamarca;
- O Presidente da República Federal da Alemanha;
- O Presidente da República Helénica;
- Sua Majestade o Rei de Espanha;
- O Presidente da República Francesa;
- O Presidente da Irlanda;
- O Presidente da República Italiana;
- Sua Alteza Real O Grão-Duque do Luxemburgo;
- Sua Majestade a Rainha dos Países Baixos;
- O Presidente da República Portuguesa;
- Sua Majestade a Rainha do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte,
Em que, no respectivo preâmbulo, se confirma o apego aos princípios:
- da liberdade;
- da democracia;
- do respeito pelos direitos do Homem,
- e das liberdades fundamentais;
- e do Estado de direito;
- da solidariedade entre seus povos;
com RESPEITO pela:
- sua História;
- cultura;
- e tradições,
Se afirma a determinação de:
- promover o progresso económico e social;
- conseguir o reforço e a convergência das suas economias;
- instituir uma União Económica e Monetária;
- instituir uma moeda única e estável;
- instituir uma cidadania comum;
- executar uma política externa, de segurança e de defesa comum;
- facilitar a livre circulação de pessoas;
- criar uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa,
Acabando por instituírem uma União Europeia,
como fervoroso subscritor dos valores supra referenciados, nomeadamente, da paz, da liberdade, da democracia, do bem estar social... não posso deixar de aderir a eles e às supra ditas razões e de sufragar os tratados mencionados.
É facto que o Reino Unido, a Suécia e a Dinamarca, ainda não adoptaram a moeda única, mas não é menos verdade que subscreveram o tratado da União no qual se anunciou a sua criação.
E não é menos verdade, que da parte governamental dos referidos Estados tem havido esforços e toda uma preocupação de ir formando a opinião pública no sentido da adopção.
Se é certo que John Maynard Keynes disse: "Quem controla a moeda, controla a soberania", não é menos certo que todos os estados da união têm representantes próprios nos órgãos desta, onde podem fazer ouvir a sua voz e fazer prevalecer o seus interesses, pelo que começa a despontar uma espécie de nova soberania, uma “soberania” partilhada.
Pelo que o termo soberania dado ao vulgo na “ De La République”, por Jean Bodin não irá ser menos consagrado.
Retribuindo o seu estimado abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caríssimo Eduardo
Não pretendo subverter "a vontade da maioria": pelo contrário, quero que ela seja devidamente esclarecida.
Quanto ao termo "bacoco", ele como significante tem vários significados: entre os quais, o de "pacóvio". Era este último significado que eu pretendia atribuir!
Winston Churchill, de facto, teve uma "frase feliz". Resta saber se ela ainda de se aplica: quer-me parecer que estamos a cair muma enorme "oligarquia", na qual o "cidadão" (é?)será um "simples número".
Um abraço
Artur João
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RE: Constitucionalidade, Revisão e Títulos
Caro Eduardo Albuquerque,
Procurarei não me alongar demasiado, para não enfastiar os nossos leitores, que ao "clicarem" num tópico relativo a títulos confirmados por D. Manuel II, me encontram a "rezingar" sobre outros assuntos.
Também eu sou subscritor dos valores da paz, da liberdade, da democracia e do bem estar social. Não estou é tão seguro que a UE seja necessariamente o caminho até eles. O meu prezado amigo terá a felicidade de ver mitigado o seu pessimismo com a actual crise de valores - que partilho - com um optimismo na realização dos mesmos ou de outros através da UE. Olhando de relance a História, dificilmente os estados supra-naciomais - e é disso que se trata - conseguiram ser garantes desses valores, tendo muitos deles, alguns até bem recentemente, explodido fragorosamente e com funestas consequências.
Quanto aos princípios dos Tratados de Roma e de Maastricht, encaro alguns deles como meros votos piedosos sem tradução na realidade.
Termino com uma referência àquilo que designa como "soberania partilhada". No meu entender, uma soberania partilhada é exercida por dois estados sobre um terceiro (estado, ou simples território). Quando dois ou mais estados cedem partes da sua soberania para uma terceira entidade - como um super-estado embrionário - não estão a partilhar soberania, mas pura e simplesmente a perdê-la. E depois, como tudo nesta vida, "manda quem pode e obedece quem deve", e pese embora todos os estados-membros estarem representados nos orgãos decisórios da UE, é por demais evidente que o seu peso relativo não é igual. Que nos teria sucedido, pergunto eu, se não tivessemos tão boa "companhia" neste caso do deficit orçamental como alemães e franceses (os próprios pais da criança)?
Um abraço e os meus cumprimentos
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Caro Alexandre Burmester,
Acolho com particular atenção as suas dúvidas, que se me oferecem como legitimas e pertinentes, mas que, por pessoal optimismo, não partilho.
Assim vejamos:
A realização da paz, da liberdade, da democracia, do bem estar social...que para os nossos filhos, são dados quase como adquiridos, e que parecem não lhes suscitar preocupações de maior, foram bens escassos, muitas e muitas vezes almejados por nossos avós, pais e por nós próprios durante o correr do século passado, para não ir mais longe...
As guerras na Europa e os regimes totalitários foram o exemplo acabado do supra referido. E os protagonistas foram estados independentes e soberanos.
A condição “sine qua non”, imposta pela U.E. aos estados membros e futuros candidatos, da verificação dos supra ditos princípios, sob pena de exclusão ou de preterição da candidatura, parece-me constituir uma forte motivação para a consolidação, prossecução e defesa dos valores visados e não “piedosos votos”.
Caso paradigmático e actual é o da candidatura da Turquia...
É certo que nesta matéria não há “caminho” já definido, e daí as hesitações, e os naturais receios...mas aqui , como em tudo na vida, o “caminho” será feito caminhando...Quanto a este, podem surgir dúvidas...mas do já caminhado, não temos nós dúvidas mas certezas...
Depois, pelo que toca aos estados supranacionais a história é espelho que nos mostra na verdade autênticas barbaridades e “infernos”, mas também nos mostra alguns “paraísos” como uma Confederação Helvética ou uns Estados Unidos da América...
Com “soberania” partilhada, e a seguir, pretendo referir uma comum e genérica dessoberania-soberania, ou seja, todos perdem soberania, mas também todos ganham soberania, pois a referida terceira entidade mais não é que a expressão de todos os estados membros enquanto por eles constituída e por eles representada.
É consensual que "manda quem pode e obedece quem deve" e que o peso dos estados não é igual, mas há mecanismos que visam minimizar e compensar os desequilíbrios existentes, como o sistema de votação por unanimidade ou o direito de veto.
As invasões napoleónicas ou o Ultimatum inglês, ou a anexação de Goa, Damão e Dio, ou a anexação de Macau foram porventura expressão da pujança da nossa soberania e do apoio precioso dos nossos históricos aliados?
Nesta matéria como em muitas outras o principio “ um por todos, todos por um” parece-me mais eficaz e vantajoso.
Finalmente, uma simples interrogação:
Estaria hoje construída a tão desejada auto-estrada Porto – Lisboa sem a participação das contribuições dos nossos parceiros comunitários?
Mas de títulos de D. Manuel II nada tem este arrazoado... e parece-me que já convolei mais do que devia...
Retribuindo o seu estimado abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Eduardo Albuquerque,
Enfim, poderíamos estar aqui indefinidamente neste agradável ping-pong. Para mim a vida e o mundo são mais feitos de cinzento que de preto e branco, o que significa que em tudo (ou quase) há um lado positivo e um lado negativo.
Mas vamos por partes:
1) Não estou totalmente de acordo quando diz que as guerras na Europa tiveram como protagonistas estados independentes e soberanos. O Império Austro-Húngaro, principal causador da I Guerra Mundial, era um estado supra-nacional e não um estado-nação, o mesmo se aplicando ao seu congénere Otomano;
2)Os EUA não são um estado supra-nacional, mas sim um estado federal, tal como, por exemplo, a Alemanha. Todos são americanos ou alemães, conforme o caso. A Suíça será a excepção que comprova a regra;
3) O sistema de votação por unanimidade e o direito de veto na UE ficaram comprometidos com o Tratado de Nice, embora as alterações aí introduzidas no funcionamento da UE sejam compreensíveis, pois foram-no com o intuito de tornar mais funcional uma já pesada máquina que se apresta a tornar-se ainda mais pesada com o alargamento que se avizinha;
4)Não estou a afirmar ser a nossa soberania pujante. Nos casos que refere (invasões francesas, Ultimato, etc) prevaleceu a razão da força, mas quanto aos "nossos históricos aliados" (presumo que se refira à Grã-Bretanha) a eles ficámos a dever a derrota dos exércitos napoleónicos e, no ainda hoje polémico caso do Ultimatum, acabámos por ser por eles compensados com vastos territórios onde positivamente nunca tínhamos posto o pé, o que duvido tivesse acontecido se não existisse a aliança.
Hoje, já não é Goa e a Matabelelândia que estão em causa. Hoje, é a nossa frota pesqueira que é desmantelada por ordem da benfazeja entidade da "soberania partilhada", são as nossas árvores de fruto e os nossos vinhedos que são arrancados para que outros possam produzir à vontade e sem a concorrência de quem tem de estar calado, pois não passa de um estado-mendigo que, como Fausto, vendeu a alma ao Diabo;
5) E pegando na minha referência a Goethe, respondo à questão da auto-estrada com outra questão: não estaríamos economicamente mais desenvolvidos sem a revolta de 1 de Dezembro de 1640? "Nem só de pão vive o homem"...
6) E para terminar, quando me referi aos "votos piedosos" tinha em mente a organização e estrura não-democráticos da UE, onde um exército de burocratas instalado em Bruxelas e que quase não presta contas a ninguém, se entretem a congeminar directivas, algumas das quais roçam o absurdo, como as relativas à curvatura do pepino e ao diâmetro da maçã, sem duvida que em nome da felicidade humana, num verdadeiro quadro Orwelliano. O mesmo se passa com o Tribunal de "Justiça" das Comunidades, onde a Comissão Europeia não perdeu até hoje uma só questão!
Como também já comnvolei demasiado, termino com um grande abraço
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Caro Alexandre Burmester,
Agradecendo, registo com especial ponderação e interesse a sua precedente mensagem, a qual, por imperativos de clareza de espírito, me motiva e impõe que aduza mais umas pequenas e breves notas.
Neste contexto, falar em guerras na Europa, sem limites temporais traçados, não significa ter de falar forçosa e necessariamente no conflito aparentemente causado com o assassinato do arquiduque Francisco Fernando da Áustria em Serajevo; mas também aqui, como em tudo na vida, há duas faces, e a segunda é que do outro lado foram também estados-nação que estiveram no terreno e Portugal não faltou. Na verdade S.A.R. o Rei D. Manuel II no exílio, então exortava:
« em minha opinião é indispensável que todos os oficiais ofereçam incondicionalmente os seus serviços ao governo Português (...) sou contra todo e qualquer movimento antes do fim desta tremenda guerra. – O germanofilismo dos monárquicos ser-nos-á fatal!»
Depois, é óbvio que os EUA não são um estado supranacional, sendo consabida a sua natureza de estado federal, nem se pretendeu inculcar ou defender tal coisa...mas podem servir de exemplo de associação de estados sem as aludidas consequências funestas e a criação dos EUA em 1776 foram modelo apontado, conjuntamente com os arquétipos resultantes da unificação alcançada pela Suíça em 1848 e da fundação do império Alemão de 1871, pelo conde Coudenhove Kalergi, da Áustria, e pelo Movimento Pan-Europeu em 1923 para os « Estados Unidos da Europa», ideia que haveria de ser retomada por Winston Churchill no célebre discurso de Zurique, de 19 de Setembro de 1946 e que teria o seu principio de concretização em 9 de Maio de 1950 dado à luz por Robert Schuman e Jean Monnet a propósito da C.E.C.A.
Ademais e por outro lado, o Tratado de Nice, de 26 de Fevereiro de 2001, mais não faz que ir afeiçoando as instituições aos novos tempos dentro do que é possível e querido... nomeadamente o Parlamento, o Conselho, a Comissão, o Sistema Jurisdicional, o Banco Central Europeu, o Banco Europeu de Investimentos, o Comité Económico e Social e o Comité das Regiões, continuando-se, sublinho, a requerer em muitas matérias ao Conselho a deliberação por unanimidade.
Acresce referir que os deputados ao Parlamento Europeu são eleitos directamente pelos cidadãos dos estados membros, nos termos do artigo 137º do Tratado da União e que de acordo com o n.º 2 do artigo 8º B, qualquer cidadão da União residente num Estado-membro que não seja da sua nacionalidade goza do direito de eleger e de ser eleito nas eleições para o Parlamento Europeu no Estado-membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado.
Mais, o Conselho e a Comissão mais não são do que a expressão ou reflexo dos governos democráticos dos ditos estados que para eles indigita os respectivos titulares, nos termos do artigo 146º, 157º e 158º do respectivo Tratado;
Que a burocracia seja um mal “necessário” dificilmente ultrapassável, não duvido...mas todas as rosas têm espinhos...
Reportando-me às aludidas perdas nas pescas, na agricultura..., aqui, também, tem funcionado o sistema de contrapartidas, e se perdemos numas, ganhamos noutras...
Relativamente aos nossos históricos aliados, se é certo que contribuíram para a derrota dos exércitos do “Corso” , facto é que William Carr Beresford ficou tão bem quisto dos portugueses que em 1820 o governo revolucionário nem o deixou desembarcar em Lisboa...e passadas algumas décadas, em 1890, deles diria o nosso Antero de Quental:
« O protesto contra o insulto e a vilania da Inglaterra, e o propósito de nos libertarmos da sua aviltante dependência, implica um esforço viril e persistente para sermos de facto independentes, o que hoje não somos nem política, nem economicamente.»
Soberba soberania...
E sobre a interrogação por último formulada, e na sequência do dito: “ nem só de pão vive o homem” questiono:
Será que os portugueses quererão viver de “tanga”?
Será ou não por viverem de “tanga” que os portugueses emigraram para os nossos parceiros europeus?
Será que a instituição de uma cidadania europeia tornou os nossos emigrantes mais desiguais?
Será que Portugal foi forçado à adesão?
Será que os partidos majoritários portugueses contestaram ou impugnaram a adesão?
Será que os luxemburgueses, os belgas, os holandeses ou outros pretendem sair da União?
Será por défice democrático da União, por perdas de soberania, ou por perdas pontuais nas produções que 10, repito, 10 novos países pretendem ansiosamente entrar para a União e outros a ela aspiram?
Será que Portugal ou outro qualquer estado foi formado em “meia dúzia” de anos e sem dificuldades?
Finalmente, falando de Johann Wolfgang von Goethe não resisto a transcrever uma curta passagem do Fausto, quadro V, cena II, trasladado a português por José Feliciano de Castilho, dando a palavra a Mefistófeles:
« Descarta-te do siso e da ciência,
máximas forças do homem! Crê somente
nas ficções dos espíritos falazes,
e és meu sem redenção!»
Retribuindo o seu estimado e grande abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Eduardo Albuquerque,
Agradecendo a amabilidade da sua precedente resposta, prossigamos então, com licença do Senhor D. Manuel II, que Deus haja (e mais particularmente do Lourenço Correia de Matos, iniciador do tópico).
Julgo que podemos dar de barato que as guerras tanto são causadas por estados-nação como por estados supra-nacionais. Os exemplos que citámos ilustram-no bem. Essa questão é, portanto, pacífica.
A exortação de D. Manuel II é também naturalíssima e a ela nada há a opor: o lógico é que Portugal, a entrar na guerra, o fizesse ao lado dos seus aliados, e não ao lado do imperialismo continental germano-austríaco.
É evidente que a Comissão Europeia não se nomeia a si própria e que o Parlamento Europeu - pouco mais que mera caixa de ressonância, e ainda bem - é democraticamente eleito pelos cidadãos dos países membros. Não é aí que reside o busílis da questão. Sem querer fazer comparações desajustadas, também Adolf Hitler foi eleito, e isso não fazia dele um democrata. O problema é a atitude intolerante e o desprezo das elites políticas euro-entusiastas para com a vontade popular. Fojem como o Diabo da cruz dos referendos sobre questões europeias, e quando o povo de algum país se atreve a votar "Não" a mais um avanço da "construção europeia", logo se há-de repetir o referendo tantas vezes quanto as necessárias até que se obtenha o almejado "Sim". (vide Dinamarca e Irlanda). Faz lembrar os derrotados no referendo sobre o aborto em Portugal, que teimam em pedir novo referendo.
Quanto às pescas e a agricultura, claro que houve compensações (era o que mais faltava que não houvesse), mas que sistema é este que paga para se não produzir?
Quanto a William Beresford, é natural que a oficialidade portuguesa - e foi disso que se tratou - estivesse farta de ser comandada por um estrangeiro, mas este fazia-o em nome do Rei de Portugal, na altura mais Rei do Brasil diga-se de passagem. A natureza tem horror ao vácuo e alguém haveria de mandar. Se os ingleses, ou até SM El-Rei D. João VI, nos consideravam incapazes de nos governarmos a nós próprios, lá teriam, porventura, as suas razões.
Quanto aos brados de Antero, temos que compreender o ambiente de histeria gerado pelo Ultimatum e não o devemos levar demasiado à letra. Também alguns por alturas do PREC bradavam contra os nossos aliados na NATO e contra a sujeição ao "imperialismo ianque" - e com isto não quero dizer que estou de acordo com a atitude britânica. Mas, embora não seja esse o tema da nossa conversa, considero a aliança anglo-lusa um importantíssimo factor da manutenção da independência nacional ao longo de séculos. Como todas as alianças teve os seus altos e baixos, mas o saldo, a meu ver, e já referi isto noutro tópico, foi largamente positivo.
Tentando agora responder às suas inúmeras perguntas:
- A verdade é que os portugueses, a crer no PM, estão de tanga, mesmo integrados na UE;
- Era realmente por estarem de tanga que muitos portugueses emigraram, mas não apenas para "os nossos parceiros europeus". Alguns até emigraram para países mais pobres, como o Brasil, a Venezuela e as nossas antigas colónias;
- A instituição de uma cidadania europeia não tornou nem os nossos emigrantes, nem os ingleses do concelho de Loulé, mais desiguais;
- Portugal não foi forçado à adesão, mas aderiu sem qualquer tipo de consulta popular, nem realizou nenhuma quando foram dados passos bem graves no caminho da perda da soberania nacional;
- Os principais partidos portugueses são os responsáveis pela falta de debate do assunto. Mas não é essa a questâo. Os principais partidos dinamarqueses eram a favor da adesão ao Euro e o eleitorado, mesmo assim, disse "Não";
- Nenhum dos estados ou pseudo-estados do Benelux deseja saír da União. Desde o início que fazem o papel de figurantes e idiotas úteis nesta tragi-comédia;
- Os 10 novos países aderentes (ou, mais propriamente, os seus governos) pretendem aderir pelo mesmo motivo que nós o fizemos: faltam-lhes umas auto-estradas, uns hospitais e outras coisas, mas desta vez nós também vamos pagar.
Excelente a citação de Mefistófeles, que a meu ver se aplica na perfeição à elite política euro-entusiasta e isto porque, a meu ver, o grande problema tem sido a velocidade a que se pretende construir a dita "Europa". E aqui remeto-o para a sua interrogação sobre se Portugal terá sido formado em "meia-dúzia" de anos: essa é uma das mais importantes questões da "construção europeia". Ainda uma fase não está consolidada e já se avança para outra, em assomos de puro voluntarismo, para que ninguém tenha tempo de parar para pensar e reflectir.
Termino frizando que os grandes entusiastas da criação de uns "Estados Unidos da Europa" raramente se assumem como tal. Vêm-nos sempre com eufemismos como o "princípio da subsidariedade" e outras pérolas quejandas. A soberania nacional é agora tratada com semelhantes epítetos! E não está definido que a UE tenha de desembocar numa federação de estados. Assim os povos tenham direito a pronunciar-se antes da consumação daquilo que eu consideraria como um grave perigo porque, note, não sou partidário de nenhuma espécie de isolacionismo e era até adepto quase que incondicional da falecida CEE.
Com um estimado abraço e pedindo desculpa pela "catilinária", cumprimenta-o
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Meu Caro Alexandre Burmester,
No natural enquadramento da sua anterior mensagem que agradeço e muito prezo, e na menção assaz oportuna e final da “ catalinária”, para a qual de forma alguma tem de apresentar desculpas, pois, “quod abundat non nocet”, ou seja, o que se apresenta copiosamente não prejudica, não posso deixar de projectar o meu pensamento até Marci Tulii Ciceronis, Marco Túlio Cícero, ilustríssimo advogado romano do século I a.C., natural de Arpino, no Lácio, “homo novus”, isto é, não contando nos seus ascendentes pessoas ligadas às altas magistraturas, que se auto-elevara sem o contributo de avoengos, e cujo apelido Cícero teria tido origem, diz-se, numa verruga em forma de grão de bico (Cicer) que um dos seus antepassados traria no nariz, e da Oratio Prima In Catilinam, do exórdio, cap. I, 1, aqui trazer a sua primeira frase que tal é:
« Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra? »
traduzindo,
« Até quando abusarás tu Catilina da nossa paciência? »
Isto, porventura dirá o nosso Caro “Confrade”, Lourenço Correia de Matos, e os nossos estimados leitores de todo este arrazoado em volta da U.E.
E, têm razão, pois motivos para isso não faltarão.
Prefaciando o nosso Almeida Garrett, no discurso do Porto Pireu:
« A discussão vai larga »,
embora aqui não degenerada...
E porque o que sobre o convolado tema da U.E. o meu discurso, entendido como enunciado do meu pensamento, já revelou o essencial, resta-me concluir começando por lhes apresentar as minhas desculpas pelo desaforo, e a promessa solene de a ele não voltar sem expressa solicitação.
Assim termino com mais uma pequena intervenção de Mefistófeles, no Fausto:
« Meu caro amigo,
toda a teoria é névoas; auriverde
só a árvore da vida »
Com um grande abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Eduardo Albuquerque,
"Let's then agree to disagree", como dizem os súbditos de S.M. Britânica, quando se não conseguem pôr de acordo sobre algum assunto sem que isso fira a cordialidade do seu relacionamento.
Mais uma vez acho oportuna a citação de Mefistófeles. E a esse propósito ocorre-me outra, já não me recordo de quem, sobre o falhanço de determinada ideologia totalitária do século XX: "A teoria estava certa; a realidade é que se enganou".
E como também já revelei o essencial do que penso sobre a questão europeia, despeço-me até à próxima oportunidade, que decerto nos não faltará, com um cordial e respeitoso abraço
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Qual quê?
Ainda há muito para discutir!
E eu quero ler. Não só eu m,as muitos e muitos de nós q. vos seguem. Até um Diplomata credenciado vos está ler com o maior interesse!
Falta um comentário ao presente e às prespectivas de futuro.
Ficamos à espera.
Grande abraço aos dois!
Manuel Maria
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RE: União Europeia
Caros colegas
1) É curioso, vejo a defesa do federalismo. Mas pergunto eu: que tipo de federalismo?
2) Federação ou Confederação?
É preciso notar que a Europa é constituida, em grande parte, por nações muito antigas onde as assimetrias são muitas e variadas. Até que ponto, é que os países mais poderosos estarão verdadeiramente interessados em "partilhar a sua soberania", ou enveredar por "uma dupla soberania"?
3) E que "Europa das Regiões" se deseja?
Melhores cumprimentos
Artur João
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RE: União Europeia
Manuel,
Mas não achas que já cobrimos bastante o passado, o presente, e até o futuro? Se pretendes a minha opinião sobre este último, acho que muito vai depender dos resultados da Convenção actualmente em curso. Esta é, contudo, presidida por um euro-lunático - o Giscard dos diamantes oferecidos pelo canibal Bokassa I, Imperador Centro-Africano - e como tal não augura nada de bom. Como já tive oportunidade de escrever, nada obriga a que se criem uns "Estados Unidos da Europa", mas estas coisas são-nos apresentadas por alguns (como os nossos Dupont & Dupond - refiro-me a um ex-Presidente da República e a um candidato ao mesmo cargo por ele derrotado) como uma inevitabilidade, e quem se lhes opõe amiúde recebe o rótulo de nacionalista exacerbado, pró-americano encapotado (grande crime!), quando não de xenófobo, não sendo obviamente nada disso que está em causa.
Em última análise, penso que tudo vai depender do grau de integração suplementar que saír da Convenção: se pretenderem criar uma Constituição Europeia e eleger um Presidente Europeu, aí acho que até o euro-entusiasta Blair vai achar demais, e se não o achar, jamais conseguirá convencer os seus patrícios, que nem Constituição têm, a submeterem-se a uma vinda da Europa, e muito menos a aceitarem um Presidente numa posição hierarquicamente superior à do Monarca britânico. E sendo o Reino Unido o segundo contribuinte líquido deste circo, também não será fácil, como já ouvi alguns delirantemente afirmarem, mostrar-lhe a porta da rua.
Enfim, aguardemos.
Agradecendo o interesse e a paciência
Um abraço
Alexandre
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RE: União Europeia
Meus Caros Artur João e Manuel Maria,
Convocado pelas Vossas legítimas interrogações, aqui deposito mais umas sucintas notas emergentes do meu pensar.
A primeira, é que, também aqui, não há qualquer modelo previamente prescrito, apoiado em qualquer dogma doutrinal ou teorético.
O modelo final, se lá chegarmos, há de ser fruto das vontades dos estados-membros, espelho dos interesses de todos e para todos, na prossecução primeira dos ditos princípios já referidos, mas que por demais relevantes aqui volto a reproduzir: a paz, a liberdade, a democracia, os direitos do homem, o bem estar social...
São estes princípios, é este acervo axiológico que me motiva e obriga a aderir a este projecto em construção.
Construção que, porventura, levará gerações a elevar, e será o resultado apurado decorrente do espírito crítico-reflexivo na dialéctica dos diversos condicionantes históricos do evoluir da humanidade.
Não tenho a pretensão de depositário da verdade, muito pelo contrário...e por isso não lanço libelos a quem quer que seja, já que para mim o importante não é o sujeito, mas a pessoa...
Por isso os arquétipos referidos e já historicamente realizados, de federalismo ou confederalismo, eventualmente, poderão servir de inspiração, mas nada obsta o emergir de um outro modelo que adequadamente se conforme com os ditos princípios e as ditas vontades.
A Europa e o mundo, antes da queda do muro de Berlim eram uns, e hoje, após a queda das torres de Mannhattan, outros são...
É esta precariedade e transitividade o grande mistério do ser e do saber...
Neste contexto, como expressão de meu pensar, deixo o célebre verso de Machado:
« Caminante no hay camino, se hace camino al andar »
Com um abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Artur,
Tocou no cerne da questão. Esta história do feederalismo tem que se lhe diga. Até há pouco, os federalistas nunca se assumiam, chegando mesmo alguns a negarem tal objectivo para melhor conseguirem fazer aprovar o Tratado de Maastricht.
São movidos por frios racionalismos, utlitarismos e logicismos, com um completo desprezo ou ignorância da História. Mesmo olhando a questão apenas do ponto de vista material, são de questionar as vantagens de uma ainda maior integração. Veja-se, por exemplo, a quase estagnação da economia da maioria dos membros da UE desde a criação da moeda única, que, como sabe, antecedeu a respectiva circulação fiduciária. E isto deve-se ao simples facto de não haver uma economia europeia, mas sim várias economias nacionais. Como tal, essas economias dificilmente podem ser geridas centralmente,com a mesma medida para todas. Aqui claro se torna que a moeda única foi criada com um mero objectivo político, qual seja o de acelerar a integração política dos aderentes. Todos estes voluntarismos e saltos no escuro têm contribuído para o alienar de muitos apoios à causa europeia. De uma simples e saudável união aduaneira, que infelizmente já padecia de vários vícios e aberrações, como a Política Agrícola Comum, pretendem meter-nos numa utópica construção política, que, a ler os seus apologistas, será o verdadeiro Eden, o fim dos ódios, paixões e egoísmos, a radical alteração da natureza humana, quase que, hélas!, mais uma vez, a criação do "Homem Novo". Mas o pior é a atitude hostil das elites políticas euro-entusiastas perante as críticas aos seus mais dogmáticos impulsos integracionistas. Imagine que até já há casos de funcionários da Comissão Europeia sujeitos a sanções disciplinares por terem a ousadia de revelar irregularidades no funcionamento da mesma, isto porque há que defender acima de tudo o bom nome da vaca sagrada europeia. Pelo caminho que as coisas levam, ainda veremos os opositores do "consenso" integracionista, que já são vistos como seres exóticos e excêntricos, a serem considerados como mentalmente perturbados, e correrão o risco de serem internados em asilos psiquiátricos, à boa maneira soviética, pois se a criação de um super-estado europeu é uma coisa cuja bondade está "cientificamente" estabelecida, como tratar os que se recusam a ver as evidências da ciência?
Mas estudemos um pouco da história deste "polvo":
a) Em 1957, já na sequência da criação da CECA, seis humildes estados europeus, todos eles derrotados ou ocupados durante a Guerra, e cuja reconstrução estava a ser feita à custa do agora tão vilipendiado Tio Sam, resolveram criar uma união aduaneira, com longínquos e vagos propósitos de união política que ninguém na altura levava a sério. Movia-os essencialmente o medo dos soviéticos e o medo que tinham uns dos outros. A este propósito, deixe-me referir o célebre discurso de Churchill em Zurique. Nele, o grande estadista britânico explanou uma visão de uma Europa unida, que ultrapassasse as suas querelas históricas e se unisse pelo comércio. Mas note-se que Churchill nesta sua visão não incluía a Grâ-Bretanha. Pretendia era que os europeus deixassem de se engalfinhar uns contra os outros a espaços, poupando assim à Grâ-Bretanha tanto sacrifício e tanta despesa.
b) Seguiu-se uma primeira fase de alargamento, sistematicamente adiada pelos vetos do Sr. De Gaulle à entrada britânica. Quando esta finalmente se verificou, em 1973, entrarm também a Dinamarca e a Irlanda, ficando de fora a Noruega, cujos eleitores rejeitaram a adesão em referendo;
c) Nos anos 80, com o intuito de ajudar a consolidar a democracia nos estados mendicantes do sul da Europa, foram admitidos a Grécia, Portugal e a Espanha;
d) Ao longo de todos estes 30 anos poucas alterções se verificaram no funcionamento e na estrutura da criatura, que permanecia esencialmente benfazeja e consensual. Ms no final dos anos 80 e princípios de 90 dá-se a queda não só do Muro de Berlim, mas principalmente do Império Soviético;
e) Aqui as coisas mudaram radicalmente de figura. Uma Alemanha reunificada e novamente confiante em si própria, começou de novo a lançar os seus cobiçosos olhares para leste (isto explica a expansão nessa direcção da UE a que asssitiremos em breve);
f) De novo os franceses começaram a sentir receio do seu poderoso vizinho e procuraram descobrir o modo de o amararrem e desarmarem. Aliás, o próprio Chanceler Kohl, num deslize pleno de candura, informou os seus parceiros de que uma Alemanha não politicamente integrada na Europa poderia voltar aos seus antigos hábitos. Subtil maneira esta de forçar a "conquista" sem disparar um tiro;
g) Mas os franceses tambémnão são desprovidos de imaginação, e depois de três "sovas" recebidas dos germânicoa em 70 anos já aprenderam alguma coisa. Vai daí, engoliram o seu orgulho e chauvinismo essenciais, e concordaram em "darem o nó" com os herdeiros de Bismark, desde que estes cedessem a sua mais potente arma, hoje já não os panzers de Guderian ou as bombas V2, mas, nada mais nada menos que o Deutsch Mark;
h) Agora, perante o gigantismo que a União se apresta a adquirir, só lhes resta tentar centralizá-la ainda mais, para esta lhes não escapar ao controle.
E aqui tem, de uma penada, aquilo que penso. Alguns traços caricaturais que introduzi visaram apenas enfatizar os meus pontos de vista.
Um abraço
Alexandre
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RE: União Europeia
Caros Amigos e Estimados Leitores,
Compreendendo, já as naturais interrogações que sobre esta matéria se levantam, já o desejo declarado em saber mais, e por considerar demasiado “curto”, tudo aquilo que aqui tem sido produzido, aqui Vos deixo umas breves referências bibliográficas:
- EUROPA ( O que é), Francisco Lucas Pires, 1992;
- A Construção Europeia de 1945 aos Nossos Dias, Pascal Fontaine, 1998;
- A Unificação Europeia, Dr. Klaus-Dieter Borchardt, 1995;
- Publicações Oficiais das Comunidades Europeias;
Para maiores desenvolvimentos:
- Das Comunidades à União Europeia, Rui Manuel Moura Ramos, Coimbra, 1994;
- João Mota de Campos, Direito Comunitário, Lisboa, 1989;
Perdoem-me os autores omissos, mas estes são aqueles por onde “bebi”.
Em acréscimo, reportando-me ao “papão” do gigantismo da União, referido pelo nosso Caro “Confrade” Alexandre Burmester, questiono:
Será que os actuais EUA formados por 48 estados e não apenas 15 ou 25; com uma superfície de 9373 Km 2, contra os actuais 3191 Km 2, ou futuros 5053,3 Km 2 com mais 13 países Turquia inclusa; com um produto interno bruto per capita de 34800 € contra 22 500 dos actuais Estados-Membros Europeus, o são menos...?
E que dizer de outros colossos como a Rússia ou a China...?
E que protagonismo e futuro terão os estados isolados perante estes gigantes? Passivos “escravos”...? Dóceis e forçados “aliados”...?
E como foi a soberania dos recém libertados países de leste?
E porque querem estes entrar para a U.E.?
E as estruturas daqueles colossos, não os permitem funcionar?
E porque entrou Portugal para C. E.?
E que papel teve para Portugal a perda das colónias?
E que dificuldades de política interna se lhe deparavam?
E que recuperação económica se lhe impunha?
E que possibilidades para o investimento estrangeiro trouxe a adesão de Portugal à C.E. e subsequente estabilidade política ?
E como eram as infra-estruturas em Portugal em 1 de Janeiro de 1986 e como são hoje em 2002?
E qual foi o montante recebido de fundos comunitários?
E qual a dimensão do actual mercado comunitário e que importância tem ele para Portugal?
E que papel desempenhou a C. E. para quebrar o isolamento político de Portugal?
E que lugar ocupou ontem e ocupa hoje Portugal na cena internacional?
E que influência teve ontem e tem hoje a voz de Portugal?
E como foi possível a libertação de Timor Leste?
E que papel teve a dita adesão de Portugal no relacionamento com as ex-colónias e com o Brasil?
Estas algumas das interrogações lançadas ao acaso, mas muitas mais se poderiam adiantar quer relativamente a Portugal quer a outros Estados-Membros, de per si, desde a primeira Comunidade Europeia, a CECA, emergida em 1952, até à U.E. de hoje.
A Europa « comunidade de origem » de Portugal acaba por se tornar, também, a sua « comunidade de destino »
É que, quer queiramos quer não, a nossa cultura é predominantemente europeia, em que o legado greco-romano, no pensar, no dizer e no fazer, modelado com o correr da história, se nos impõe.
Também não nos parece que seja por exclusivas intenções “filantrópicas” que a construção Europeia se vai fazendo... e muito menos que com ela se almeje o “nirvana”...o que se pretenderá será sim, e tão somente, um viver melhor para os vindouros... e quiçá um outro equilíbrio mundial...
E se não há dogmas prescritivos e teoréticos para a construção deste projecto, porém há métodos assumidos no seu caminhar qual sejam os acordos, os tratados e os compromissos...
Quanto ao “visualizar” “intenções” políticas nas sucessivas adesões e seus episódios, tudo é possível, depende tão só da imaginação ou do espírito criador...e é também assim que a história se vai rejuvenescendo, uns, agora, dizendo sim..., outros, amanhã, talvez...porque à verdade, a essa, muito dificilmente se chega...
Reafirmo a minha peremptória posição de não fiel depositário da verdade... e por isso o meu absoluto respeito pelas posições opostas..., somente assumindo o que se me parece adequado e o figurino de um mero “cavaleiro” da justiça e de felicidade...
Para quebrar este insípido arrazoado, deixo-Vos com um pequeno verso do Fausto, dando a palavra a Mefistófeles:
« Foge a vida
more fluentis aquae. Necessário
se faz logo com regra aproveitá-la.
Siga, amiguinho, siga o meu conselho,
que não se há-de dar mal.
E antes de tudo
muito collegium logicum; por ele
é que um novato aprende a enfiar justinho
os pés da mente em botas à espanhola,
que assim é que é seguir, sereno e cauto,
pé ante pé, a via das ciências,
em vez de andar pulando a um lado e a outro,
qual fogo-fátuo em chão de cemitério.»
Com um abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Eduardo Albuqerque,
Agradeço a bibliografia recomendada, na qual descortino contudo um pendor demasiado acentuado para um dos pratos da balança, pois do falecido Lucas Pires são bem conhecidas as posições europeístas, e quanto às Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, perdoar-me-á, mas lê-las com o objectivo de formar uma opinião seria o mesmo que ler o Pravda ou o Izvestia para saber da justeza das posições do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética (qDh). Posso também recomendar-lhe:
- "Contra o Centralismo Europeu" de João Ferreira do Amaral (recentemente publicado);
- "The Rotten Heart of Europe" de David Marsh
(darei posteriormente mais pormenores destas e de outras edições que não tenho aqui à mão).
Dirigindo-me agora às questões que levanta com referência à minha mais recente intervenção sobre a matéria, quer-me parecer que não tenho sido suficientemente claro na exposição das minhas ideias, pois nunca aqui defendi que Portugal não deveria ter aderido à então Comunidade Económica Europeia. Isso seria uma caricatura daquilo que penso. O que eu tenho questionado e criticado é o caminho que as coisas têm levado nos últimos dez anos e isso mantenho e enfatizo, pois não me parece essencial -antes pelo contrário - para o progresso dos povos dos respectivos estados, que se avance cegamente em direcção a uma união política.
Não agitei nenhum papão do gigantismo europeu, nem é isso que me impressiona. Sou até defensor do alargamento o mais amplo possível, pois isso permitirá talvez diluir a força do centro e impedir os esforços concentracionários em curso e quiçá até os sonhos de união política. Não se justificam portanto os argumentos relativos ao tamanho de Estados Unidos ou China, pois não levantei essa questão.
A problemática dos estados "isolados" deixa também de ter razão de ser, pois não defendi numa única linha do que escrevi qualquer tipo de isolacionismo. O que me parece é que as alternativas não são apenas um isolacionismo à albanesa e uma integração pura e dura ao arrepio de séculos de História e tradições diversas, a qual, insisto, constituiria um explosivo cocktail do qual não entendo porque os apaixonados da Europa não fogem a sete pés, em vez de para ela caminharem alegremente, plenos de racionalismo, logicismo e frio utilitarismo, pois se há algo que não tem funcionado nem imperado é a prudência, o bom-senso e a "política dos pequenos passos", por muitos defendida, mas infelizmente sem sucesso.
Mas também não vejo em outras partes do mundo semelhante afã de união política por parte de "estados isolados". Zonas de comércio livre e amplos acordos comerciais a nivel mundial, sim, para , maior harmonia e riqueza dos povos, mas construções utópicas e voluntaristas não as enxergo alhures. Posso dar como exemplos a NAFTA e o Mercosul, que nem de longe nem de perto têm objectivos de união monetária ou política.A primeira, constituída pelos Estados Unidos, Canadá e México, foi especialmente aclamada pelos mexicanos, pois abre-lhes as portas do rico mercado dos EUA, com todas as consequências positivas para o seu comércio externo e para a sua prosperidade interna. Mas repare que os EUA não amarraram o México a uma moeda única que teria como efeito a perda de parte da competitividade da economia mexicana face ao seu poderoso vizinho.
Ficam assim automaticamente respondidas parte das questões pelo meu caro confrade colocadas, embora entenda serem as mesmas essencialmente de carácter retórico e não carecerem, portanto, necessariamente de resposta. Mas sempre lhe direi que quanto aos fundos comunitários, que não questionei, pois volto a frizar nunca ter posto em causa a nossa adesão a CEE, não tarda, passaremos a contribuintes líquidos, o que equivale a dizer que vamos pagar o que já recebemos, e nem de outra forma isso se entenderia. Tmabém quanto ao mercado comunitário, já ele era o principal destino das nossas exportações antes da adesão. Aliás, já desde o tempo de Marcelo Caetano que vigorava entre nós e a CEE um acordo comercial. Devo no entanto a este propósito frizar que, após o Tratado do Porto, de poucos pelos vistos conhecido, ficou estabelecida uma ampla zona de comércio livre entre os membros da EFTA e a UE, zona essa conhecida por Espaço Económico Europeu. Significa isto que os países da EFTA que não aderiram à UE, como a Noruega e a Islândia, nem por isso deixam de com ela comerciar livremente, e vice-versa, caindo assim pela base o argumento da não-acessibilidade dos mercados comunitários se não tivessemos aderido à CEE.
Qutno ao lugar de Portugal na cena internacional, não vislumbro grande destaque hoje para o nosso país, como já antes não vislumbrava. E no que a Timor se refere, esse era um problema dos timorenses e não um problema essencialmente português, mas já que o levanta, deixe-me dizer-lhe que para a sua solução muito mais contribuiu a mudança da atitude americana do que qualquer especial empenho ou importância da UE no quadro internacional, onde aliás raramente consegue falar a uma só voz, o que é naturalíssimo, pois por mais que se queira ver a Europa como um bloco homogéneo, a verdade é que os interesses e as políticas dos respectivos membros muito dificilmente poderiam ser sempre coincidentes. Basta aliás ver a diferente postura de franceses, alemães e britânicos na questão do Iraque.
Que a nossa cultura é predominantemente europeia não merece contestação, mas se há muitas semelhanças culturais, há imúmeras diferenças linguísticas, étnicas e históricas, e não podemos invocar umas e esquecer as outras, conforme elas favoreçam ou prejudiquem os nossos argumentos.
Permita-me também referir que não "visualizei" "intenções" políticas menos claras nas diversas fases de crescimento da agora chamada União Europeia, nem dei livre curso à minha imaginação. Procurei dar uma interpretação histórica do fenómeno, sem pretender atribuir intuitos conspirativos a nenhum dos actores, pois acho perfeitamente natural que as suas acções tenham sido essencialmente determinadas pelos seus interesses particulares em cada momento. Poderia efectivamente ter exposto a interpretação oficial e politicamente correcta do crescimento harmonioso e idílico de uma família irmanada pelos mais puros e desinteressados motivos, mas, embora aprecie o lirismo, não me parece ser este o contexto ideal para nele me deleitar. Estranho seria pensar-se que os estados, mesmo associados, possam ter como determinante da sua acção o interesse alheio e não o interesse próprio.
Não haverá dogmas prescritivos e teoréticos para a "construção deste projecto" (este termo "construção", perdoar-me-á, cada vez me lembra mais outra "construção", a famigerada "construção do socialismo") mas não faltam espíritos dogmáticos e deterministas, que já aplicaram o seu pensamento nos tais tradados e compromissos e não ficarão certamente por aqui. Ainda hoje de manhã escutei na rádio notícias sobre a pretensão franco-germânica de estabelecer aquilo a que eufemisticamente chamam "harmonização fiscal", ou seja, dada a elevada carga fiscal que impõem aos seus cidadãos e retira competitividade à suas economias, pretendem que estados mais poupados e menos taxadores, deixem de fazer batota, a seguir o distorcido raciocínio dos proponentes de mais esta maravilha, para todos alegremente se tornarem menos competitivos face ao mundo exterior, que, não nos esqueçamos, não está sujeito a este tipo de amarras e diletantismos.
Tmabém eu me não considero - longe disso - fiel depositário da verdade. Sempre foi ínvio e tortuoso o caminho até ela, e mais difícil ele se torna quando só com muito esforço se consegue apresentar uma visão alternativa da realidade envolvente.
Deixe-me também referir, a terminar esta já longa e, estou certo, cansativa para quem me lê, exposição, que tenho procurado analisar a questão europeia de um ponto de vista global europeu, e não de um estreito ponto de vista contabilístico nacional, com uma coluna de "Deve" e outra de "Haver", estilo P.O.C., para, somadas as duas colunas, se retirar uma fácil conclusão aritmética dos méritos de cada posição.
Não encontrando no meu baú citação mefistofélica à altura da do meu caro confrade, ocorre-me uma citação de Winston Churchill, com a qual pretendo terminar esta missiva em tom ligeiro e humorístico que, estou certo, partilhará:
"Um livro de citações é um instrumento extremamente útil para um homem pouco cultivado".
Foi com grande prazer que tive oportunidade de mais uma vez consigo poder partilhar estas minhas ideias.
Um grande abraço
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Caro Eduardo
Sendo um eurocéptico não deixo de ter as minha ideias, e reticências, face à U.E.!
Antes de mais, permita-me que lhe diga que, na minha opinião, não se deve apontar os E.U.A. como exemplo a seguir, por estes factores:
1) É um país novo.
2) É um país que se formou de maneira revolucionária.
3) É um país com uma especificidade geográfica muito distinta.
4) É um país que se fundou com base numa determinada ideia de fé.
5) É um país que se formou essencialmente à conta de habitantes do Reino Unido (o Prof. Dr. João Carlos Espada referiu a predominância de ingleses: nas "Jornadas Séc. XXI" organizadas pela Gulbenkian, há dias atrás).
6) É um país que se rege pelo "costume" e pelos "precedentes"; não pelo "primado da lei".
7) É um país que sociologicamente sempre teve a tendência a se reunir em "grupos específicos": inicialmente protagonizada pelos "pioneiros".
No que diz respeito à Federação Russa ( e não apenas à Rússsia) é de facto um colosso: em área geográfica; em habitantes. Tem no entanto, com bem sabe, graves assimetrias económicas. Para além do mais duvido que seja uma democracia: será antes um regime pseudo-democrático, de partido único (ou quase) fortemente musculado, e de forte pendor russo: nacionalista; imperialista.
Quanto à China considero-a um caso único. Propagandeia a ideia "dum país, dois regimes", mas na prática continua sem admitir a "liberdade de expressão", e a "liberdade de associação". Só não é sujeita a represálias (sanções económicas) porque tem o maior exército do mundo; porque tem um conjunto de armas de destruição maciça dificilmente igualável (convencional; nuclear; atómica; biológico).
Parece-me evidente que a Europa terá que adoptar o seu próprio caminho. Talvez adoptando uma forma de semi-federalismo. O que é certo é que a U.E. anda aos "avanços e arrecuos"", e quando é preciso ter-se "uma posição comum" aparecem as questiuncúlas: nenhum país quer abdicar dos "seus interesses económicos".
Meu caro Eduardo, o que envenena a ideia de uma verdadeira U.E. é a "plutocracia" dos países mais poderosos.
Portugal obviamente que não pode estar isolado. Para isso deveria valorizar a sua "vocação atlântica": tendo uma relação privilegiada com os E.U.A; constituindo-se em "testa de ferro" da C.P.L.P.!
Se o conseguíssemos estariamos numa posição mais forte para negociar.
O grande drama é que não temos recursos económicos para seguir uma "coerente" política externa.
Evidentemente que se "desbaratou" muita massa monetária, que a U.E. nos atribuíu: subsídios mal concedidos; empresas-fantasma; maus investimentos. Apesar de tudo, temos mais estradas, mais hospitais, mais habitação.
Mas sem ser o "turismo" o que é que capitalizamos? O que é que Portugal produz??
"Aquilo que se pensa raramente se traduz no objectivo proposto."
Um abraço
Artur João
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RE: União Europeia
Caro Alexandre Burmester,
De novo aqui me tem para, em primeiro lugar agradecer a sua estimada mensagem, e seguidamente, a ela me reportando, deixar mais umas breves notas.
Na verdade é curioso que se possa falar daquilo que não se lê por se considerar tendencioso...! Então como julgar?
Registando com satisfação, as palavras iniciais do seu primeiro parágrafo, adito que as referências bibliográficas, como ficou dito, foram fonte por onde “bebi” e mais não...até porque é matéria que não é da minha particular devoção ou estima...a ela destinando apenas o necessário para cumprir com a minha obrigação...
Depois, pelo que concerne às interrogações formuladas, estas não tinham necessariamente um destinatário específico, eram essencialmente genéricas e abertas, e aqui cada um interpreta consoante o seu referencial histórico...
Mas fiquei grato por saber do seu pensar nesta matéria, e acolho com particular agrado a sua posição quanto aos fundos comunitários e muito especialmente, relevo, quanto à Comunidade Económica Europeia.
E, também, aqui deixo mais algumas interrogações?
Será que a livre circulação de mercadorias, pessoas e capitais, favorece o tráfico comercial?
Será que os países exteriores à U.E. beneficiam destes direitos?
Será que a moeda única prejudicou o tráfico comercial interno na U.E.?
Será que a dita análise de ponderação económica, o tal dito “Deve” ou “Haver”, está fora das determinantes do interesse próprio na acção ou actuação dos Estados?
Será que os acordos ou tratados, não serão expressão do mútuo consenso derivado de vontades opostas em sentidos diversos mas convergentes?
Será que nesses tratados tem acolhimento prescrições dogmáticas que não foram aceites por todos os intervenientes?
Será que foi por terem interesses opostos ou antagónicos e conflituantes que os actuais Estados-Membros subscreveram o tratado da União, aqui relevando o Reino Unido?
Será que a história apenas configura visões unipessoais?
Muitas mais interrogações se poderiam inventariar...mas confesso que prefiro outra “ementa”...esta, por repetitiva, começa a enfadar...
Finalmente, tenho pena de não o poder congratular pela novidade da sua citação, é que há muita que a conheço, mas reconheço que terá pleno cabimento para aqueles que tem baús de citações. Infelizmente, baús, não os possuo eu...
Mas uma coisa é certa, é pela linguagem que o homem vem à epifania, e é pela reciproca referência que se reconhece...
Com um grande e estimado abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Artur João,
Anoto com especial atenção a Sua pertinente mensagem que desde já agradeço.
Quando se falou e fala de “construção” Europeia, “rectius”, “edificação” para não ferir susceptibilidades ou outras sensibilidades, tem sido mediante referência a arquétipos historicamente realizados que se procurou e procura prefigurar como hipotético o modelo final a alcançar.
Que sejam estes já realizados ou outros, que dos mútuos consensos dos Estados intervenientes possam emergir, para mim pouco peso tem. O essencial é que cumpram com o acervo axiológico fundamentante dessa edificação.
É essa axiologia plasmada no preâmbulo de diversos tratados, originária não necessariamente da inspiração divina ou do direito natural, mas da consciência da comunidade europeia a que todos nós pertencemos, que me “conquista” e determina!
Se o modelo dos EUA deva ser preterido, por demasiado novo no seu existir, que dizer de um novo modelo a emergir sem qualquer experiência histórica?
E depois:
Será que muitos dos países europeus se formaram de maneira menos revolucionária?
Será que a Europa configura menos diversidade geográfica?
Será que na Europa não existe uma ideia majoritária de fé?
Será que os nossos parceiros ingleses são menos bem-vindos?
Será que os Assentos e o Costume, quando a lei o determina, não têm valor equivalente?
Será que na Europa não existiram as tribos ou os clãs?
Será que hoje não existem na Europa grupos ou “famílias” com afinidades de pensamento ideológico-político?
Será que a federação Russa ou a China foram convocadas como modelo paradigmático?
Que a Europa tenha de adoptar o seu próprio caminho, também, me parece ser a posição mais adequada mercê das suas próprias especificidades. E aqui necessário se torna convocar o raciocínio analógico que atende às específicas diferenças e não o meramente lógico...
Quanto às dificuldades resultantes dos "avanços e recuos"", e da afirmação individualizada de “interesses económicos”, são os escolhos próprios de todo o processo negocial, que como se sabe determina o edificar Europeu. É pelos acordos, compromissos e tratados que a U.E. tem vindo a emergir.
Quando a "uma posição comum" generalizada a todas as matérias, parece-me que a “criança” é ainda muito nova para essas aventuras. Demos tempo ao tempo...
Pelo que cabe à “plutocracia” caberá interrogar:
Será que essa “plutocracia” não será melhor travada no seio da U.E. pela união de todos os países menos poderosos?
Pela que concerne à “vocação atlântica” de Portugal, é mais valia a ter em mente, mas no contexto europeu.
Quanto a admitir “testas de ferro” na C.P.L.P. pergunto:
Que papel se haveria de atribuir, por exemplo, ao Brasil?
E como veriam os outros parceiros essa hegemonia?
Reportando-me aos recursos económicos de Portugal, aqui invoco a célebre frase da Eneida de Públio Virgílio Marão:
“hoc opus, hic labor est”!
traduzindo:
« Aí é que está a dificuldade!»
Portuga, temos nós conscientemente de assumi-lo, é um país, sublinho, pobre!
Foi esta pobreza que motivou ao longo dos séculos a busca de outras terras e foi a geradora de diáspora portuguesa.
E, paradoxo, são esses milhares de emigrantes, a quem a terra mãe recusou o natural sustento, que, agora, vão contribuindo, inconscientemente, com as suas remessas para o equilíbrio do “barco” português.
Triste realidade...
Mas, também, aqui há que assumir o que somos, e viver de harmonia com o que temos..., apesar de o volver dos olhos para outras paragens, por vezes, nos levar ao descontrolo...
Mas há que sair deste fado. E a aposta, muita gente já o tem dito, é na qualificação do povo português.
Quanto aos naturais receios da possível União, fundados numa:
« integração pura e dura ao arrepio de séculos de História e tradições diversas »,
para parafrasear o nosso muito ilustre “confrade” Alexandre Burmester,
interrogo:
Será que o uso generalizado de “jeans”, iniciado na década de sessenta do século passado, é sinal da preservação do nosso tradicional vestir?
Será que ao Mac Donald e os “fast food” corresponde às nossas tradições mais verdadeiras?
Será que os filmes projectados na televisão, que nos entram portas dentro sem pedir licença a quem quer que seja, de conteúdos “quentes” ou “apimentados”, para ficarmos pela moldura mínima, ou de cenas de violência repulsante estão de acordo com a nossa História ou tradição?
Será que este meio através do qual comunicamos neste Fórum, a internet, vai deixar incólume a identidade cultural dos povos?
Será que os aduzidos exemplos vieram maioritariamente da Europa?
Será que a formação ao nível da família e da escola não será o elemento determinante na preservação da identidade cultural e da História?
Será que os cantões da Confederação Helvética perderam a sua identidade linguística ou cultural?
Bem, Meu Caro Amigo, a mensagem vai já longa e outras tarefas me aguardam, por isso termino sem qualquer tipo de invocação, não vão outros espíritos deixarem-me sem redenção...
Com um grande e estimado abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caro Eduardo Albuquerque,
Agradecendo a sua mensagem, sobre ela afigura-se-me oportuno tecer as considerações que seguem, muito embora esteja de acordo consigo que já começamos a ser redundantes. Mas enfim, não é todos os dias que se nos depara a oportunidade de trocar correspondência com tão estimulante, paciente e erudito espírito, e a ela não ouso escapar.
Começando pela sua referência ao facto de eu estar porventura a julgar o que não li, nada me faz crer que o Dr. Francisco Lucas Pires, perante cuja memória me curvo respeitosamente, haja dado à estampa algo diferente daquilo que oralmente expunha em matéria europeia. E tratando-se dum consabido entusiasta da "construção europeia" - embora tardio, pois também teve uma fase de fervoroso "luso-africanismo" - decerto me não traria nada de novo, pois os conceitos e objectivos dessa escola são-nos diariamente apresentados de forma exaustiva. E como não me lembraria de recorrer aos Evangelhos para confirmar a veracidade do milagre das bodas de Canaan, passo adiante.
A propósito de leituras, deixe-me cumprir o prometido e complementar e corrigir a lista de leituras que ousei por minha parte sugerir-lhe:
"The Rotten Heart of Europe, The Dirty War for Europe's Money", Faber & Faber, Londres 1995 - o autor deste livro é Bernard Connolly e não David Marsh, como por lapso referi. Este último é autor de um interessante livro sobre o Bundesbank. Bernard Connolly foi funcionário da Comissão Europeia, responsável pelo grupo de acompanahmento do Sistema Monetário Europeu. A propósito da obra escreveu Anatole Kaletsky no "Times": "The Rotten Heart of Europe" could change the course of history. No politician should say another word about the single currency or the future of Europe without reading this book". Escusado será dizer que Bernard Connolly teve problemas judiciais com a Comissão após a publicação do livro. É que isto de desafiar a "Vontade Geral" tem que se lhe diga;
"The Eurosceptical Reader", compilação de Martin Holmes, profesor de Política no St. Hugh's College de Oxford, MacMillan Press, Basingstoke 1996. Aqui se reunem depoimentos sobre a matéria em apreço, alguns escritos já há décadas, ainda a "construção europeia" não passara dos alicerces, e entre os contribuintes destacam-se Max Beloff, Tony Benn, Hugh Gaitskell, Norman Lamont, Noel Malcolm, Kenneth Minogue, Enoch Powell, Peter Shore e Margaret Thatcher. Trata-se de um ecléctico elenco, cobrindo o espectro político britânico.
Mas também entre nós, para além do já por mim citado trabalho do Dr. João Ferreira do Amaral, têm vários comentadores discorrido sobre o assunto nas páginas dos jornais, entre os quais devo salientar os Drs. António Barreto, Vasco Graça Moura, Vasco Pulido Valente e José Pacheco Pereira, projectando este último, um euro-deputado, a edição de uma compilação de artigos seus sobre a matéria. Enfim, começa a quebrar-se o "consenso" nacional sobre a matéria, consenso esse essencialmente devido à falta de informação e debate sobre o assunto, e também, não o esqueçamos, aos famosos fundos comunitários, aparentemente tão do agrado do meu ilustre confrade e que eu, se não enjeito, também não apoio entusiasticamente, dado o agravamento que causaram na doença nacional da subsídio-dependência, isto já para não falar dos descaminhos vários que alguns desses dinheiros levaram, como muito bem referiu o nosso prezado confrade Artur Camisão Soares.
E, posto este, porventura entediante, intróito bibliográfico, tentarei responder a algumas das novas questões retóricas que sugere, e digo algumas pois há-as de tão evidente resposta que me não parece necessário confirmar-lhe que dois mais dois são quatro.
Se por paísis exteriores à UE se refer aos membros da EFTA a resposta é afirmativa. O Espaço Económico Europeu, que abrange a EFTA e a UE, garante a livre circulação de pessoas, mercadorias e capitais entre todos os seus membros. Digamos que os membros da EFTA que aderiram ao EEE têm as vantagens da UE sem dela terem os inconvenientes, pois não têm de contribuir para o orçamento comunitário, a terça parte do qual, note-se, se destina a financiar esse elefante branco e verdadeira aberração económica que dá pelo nome de Política Agrícola Comum, não aderiram por conseguinte à moeda única, mantendo assim a sua autonomia (para não usar a palavra soberania) em matéria de política monetária e cambial, autonomia essa a que a Dra. Manuela Ferreira Leite decerto chamaria um figo nesta apertada conjuntura nacional, se tivesse tido a sorte de dela dispor.
"Será que nesses tratados têm acolhimento prescrições dogmáticas que não foram aceites por todos os intervenientes?", questiona o caro confrade. Sim, é verdade, respondo-lhe eu. O Reino Unido, por exemplo, conseguiu isentar-se da parte respeitante à Carta Social Europeia, largamente responsável pela estagnação económica prevalecente em quase toda a União de há anos para cá (o desemprego no Reino Unido, a título de exemplo, é há vários anos, metade do da média europeia, e não estamos a falar de ciclos económicos). E há ainda o caso da moeda única, a que também suecos e dinamarqueses não aderiram.
Claro que os subscritores dos vários tratados europeus têm mais em comum do que de divergente, caso contrário não os teriam assinado. O mesmo se poderia dizer da aliança anglo-lusa, pelo ilustre confrade já aqui referida. O que nos unia era mais que o que nos separava. Mas a corda começa a esticar e cada vez se tornará mais difícil gerar os consensos necessários à aprovação de tratados ou acordos que visem a união política a curto ou médio prazo. No longo prazo, e estou a pensar em largas décadas, se não mesmo séculos, tudo poderá ser diferente, mas a História, quando feita à base de meros voluntarismos e da aplicação coerciva de fachada democrática da "Vontade Geral", tem-nos reservado desagradáveis surpresas, e "surpresas" é, neste caso, uma mera força de expressão.
Como não procurava louros quando citei Churchill, apenas o tendo feito com sentido de humor, porventura frustrado, e sem jactância alguma, não fico desiludido por o meu caro confrade me não poder felicitar. Perdoar-me-á a tentação de citar outro personagem a propósito de livros e autores, embora se trate de uma citação fora deste contexto:
"Desde que peguei no seu livro até que o pousei, ri-me convulsivamente. Um destes dias tenciono lê-lo." W.C. Fields
E assim prosseguirei na minha esforçada tentativa de chegar à epifania.
Com o prazer e respeito de sempre, cumprimenta-o
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Caro Alexandre Burmester,
Por imperativos de normal urbanidade e cortesia, não posso deixar de vir agradecer a sua precedente mensagem, e, também, sobre ela dizer o que me vai no espirito.
E começo pelo fim, pela sua muito humorada citação. É que, também eu deste lado, não posso estar mais de acordo com o W.C. Fields, e não teria qualquer espécie de pudor em inseri-la como fecho da minha precedente mensagem.
E aqui tem o meu caro confrade um sinal de mútuo consenso, apesar das naturais divergências e diferenças inerentes às nossas próprias identidades.
Depois, permita-me a confidência, não estou obcecado pela temática da edificação europeia. E digo-lhe porquê. Porque deposito confiança no escol de pessoas, manifestamente muito mais qualificadas que eu próprio, indigitadas para o desempenho da missão.
E depois, caro e ilustre confrade, o importante para mim, não me canso de o proferir, é a realização da paz, da liberdade, da democracia, dos direitos do homem, do bem estar social...isto é que é o fundamental, não estando muito preocupado quanto ao “modus operandi”, aos instrumentos, ou processos de o alcançar.
E, da matéria europeia, já o disse, por natural apetência e inclinação, procuro apenas cumprir com os mínimos exigidos, e de âmbito essencialmente jurídico.
Não me leve a mal, cada um é, como cada qual...
Depois, devo também confessar que me causa alguma perplexidade na verdade avançar com juízos prévios de valor sobre o que quer que seja, deformação da minha formação profissional admito-o, mas sempre me dei bem com a regra. E em matéria de livros não abro excepções.
E, também aqui, reportando-me às publicações comunitárias não vislumbro onde possa estar o seu carácter tendencioso quando se fala das estruturas, dos seus órgãos, composição, personalidades indigitadas, funcionamento, competências, regras de decisão, dados estatísticos, políticas a adoptar em diversos domínios...
Ou será que estes assuntos se conhecem melhor pelo filtro da comunicação social ou pelo ouvir dizer?
Quanto ao estimulo que se lhe oferece nas minhas mensagens, apraz-me a nota e registo, mas repudio qualquer qualificativo de erudição. As referências produzidas nas minhas mensagens anteriores, não têm por escopo a jactância da ipseidade, ou tão pouco a busca de louros, mas apenas deixar ou dar aos nossos mais jovens leitores algumas sementes, na esperança que estas germinem, daquilo que no meu tempo era elementar, normal e vulgar num estudante do ensino liceal. Na verdade, nesse tempo, aprendia-se a matemática, o português, o francês, o inglês, também, o latim e o alemão...E como elementar, normal e vulgar que era, repudio qualquer qualificativo de erudição.
Já o disse a outros nossos ilustres confrades e aqui de novo fica o registo!
Pelo que toca às suas notas bibliográficas, agradeço a menção e delas me ocuparei em momento oportuno.
Reportando-me agora às interrogações por mim formuladas, anoto o seu pensar, e pena tenho que outros registos de outros confrades não tenham emergido, contudo relevo o seguinte:
Sendo óbvio que qualquer acordo implica vontades opostas ou divergentes, que acabam por convergir no mútuo consenso, sobe pena de não estarmos perante um acordo, a não total aderência, nas escassas matérias em que tal foi possível, recebeu o consenso geral, o que, para mim, configura de forma clara e firme o desejo de se caminhar em frente.
Quanto ao futuro e possíveis prognoses, não tenho o espirito de advinho ou feiticeiro, e por isso não especulo. O futuro a Deus pertence!
Dito isto, deixo-o, com um verso do poema dramático o Fausto que espero seja do seu especial agrado, já que o meu ilustre confrade, numa das suas primeiras mensagens, a este se referiu e a Goethe, na esperança que os mais novos dele falem porque leram e não por ouvir dizer.
Dêmos, então, a palavra a Mefistófeles:
« É...? o que é... e acabou-se. Erga o toitiço
emperrucado com milhões de crespos,
ponha salto em tacões maior que vara,
que não cresce uma aresta. »
Com um estimado abraço, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caríssimo Eduardo Albuquerque,
Agradecendo a sua amável resposta, noto com prazer mas sem pasmo que há muita coisa em que estamos de acordo, e natural é que não estejamos de acordo em tudo.
Também eu não estou obcecado pela questão europeia, embora seja assunto ao qual dedico grande atenção, mas mais numa perspectiva do desenvolvimento da História do que numa postura meramente política. Mas não deposito tanta confiança como o meu caro confrade no escol que refere.
Só duas ou três breves alusões, não à laia de contradita, mas mais de esclarecimento. Já tenho lido vária documentação emanada da Comissão Europeia - como vê nem sempre julgarei sem conhecimento de causa - mas tal documentação é mais uma descrição da estrutura e modo de funcionamento da UE, do que propriamente um acervo doutrinário, como é lógico, e portanto daí se não poderá retirar grandes conclusões que favoreçam ou prejudiquem a nossa posição face à temática em questão.
Também para mim o mais importante é a garantia da democracia, liberdade, paz e direitos humanos, e é também nessa preocupação que baseio muito das posições que tem tido a paciência de ler.
Partilho também do seu desencanto com o nosso sistema de ensino, e falo por experiência própria, pois tenho dois filhos no ensino secundário. À laia de ilustração daquilo que penso sobre a matéria, imagine que à minha filha já foi em tempos indicada, como leitura obrigatória na disciplina de Português, uma obra de autor estrangeiro traduzida na nossa língua!
Finalmente, quanto aos consensos a que os políticos europeus vão chegando, tem sido notório em várias sondagens realizadas acerca da questão europeia, pois referendos tem havido poucos por razões óbvias, o desfazamento entre aqueles e os seus eleitores em termos de entusiasmo pela construção europeia (e, por uma vez, abandono as aspas). Curiosamente, é entre os portugueses que essas sondagens indicam maior entusiasmo, mas logo as mesmas revelam também que tal se deve em boa parte à fraca conta em que os nossos concidadãos têm a nossa classe política, preferindo aparentemente serem governados a partir do exterior. Pergunto a mim próprio como é que esta gente conseguiu aderir ao clube!
E por falar em clube, termino com mais uma citação do impagável W.C. Fields:
"Jamais aceitaria fazer parte de um clube que aceitasse alguém como eu para sócio".
Com estima e consideração, cumprimenta-o
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Caríssimo Alexandre Burmester,
Venho agradecer a gentileza da sua precedente mensagem que deveras me sensibilizou.
Como tudo na vida, este suceder de mensagens está a chegar ao seu final.
Chama-me a família, e quando esta me chama não há nada que me detenha...
É o Natal que está à porta..., com ele o frenesi que lhe é próprio... e a minha neta não dá tréguas.
Ficam-me os ensinamentos colhidos de todos os ilustres e caros confrades e a grata recordação de ter dialogado com um brilhante espírito.
Perdoará o eventual “convolar”..., e as inevitáveis “caturrices” da idade...mas a emenda já se vai tornando difícil...
A todos os nossos ilustres leitores e confrades, os meus sinceros votos de um Santo Natal e de um Ano Novo pleno de Paz e bem estar.
Para fecho desta mensagem e como expressão do nosso genérico e mútuo consenso, nada melhor do que dar aqui por reproduzida a sua feliz citação.
Com um estimado e grande abraço, os meus melhores cumprimentos
Eduardo Albuquerque
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RE: União Europeia
Caríssimo Amigo,
Agradecendo a sua mensagem, deixe-me dizer-lhe que, podendo este assunto estar esgotado (para já, diria eu) outros poderão surgir em que a sua estimada contribuição possa abrilhantar as conversas, debates e discussões que por aqui se vão travando. E eu fico particularmente na expectativa de que essa oportunidade surja em breve, e que dessa vez possamos terçar armas do mesmo lado do despique!
Não tem nada de que se desculpar, pois nunca nas suas palavras detectei qualquer caturrice: apenas a legítima exposição daquilo em que de boa fé acredita.
E embora ainda o espere ver por aqui antes do período festivo, desejo-lhe também um Feliz Natal e um Bom Ano Novo, bem como à sua família, não esquecendo, claro, a sua neta!
Um grande abraço
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Caro Eduardo Albuquerque,
Tendo seguido, com grande interesse, a troca de opiniões, entre o senhor e o Alexandre, felicito desde já os dois, pela elevação do debate, e manifesto desde já a minha simpatia pela excelente contribuição que deram, para um esclarecimento de certas questões pertinentes, de que afinal todos somos, ou devíamos ser parte interessada.
Aceite, deste "ilustre" desconhecido, os meus votos de Santo Natal, e de Feliz Ano de 2003.
Os melhores cumprimentos
Luís Camizão
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RE: União Europeia
Caro Alexandre,
A mensagem enviada ao Sr. Eduardo Albuquerque, é também dirigida a si, renovando os votos de um Santo e Feliz Natal, e de um ano de 2003 feliz.
Os melhores cumprimentos
Luís Camizão
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RE: União Europeia
Caro Eduardo
Para si e todos os seus entes queridos, um Santo Natal!!
Se me permite, gostaria apenas de responder, sucintamente, às suas questões:
1) Países como a Itália e a Alemanha formaram-se de maneira revolucionária.
2) A diversidade geográfica na Europa é grande. Mas pergunto-lhe: quantas "fronteiras" têm os E.U.A?
3) Na Europa existe uma ideia majoritária de fé. É preciso ter em conta, contudo, o crescente "agnosticismo".
4) Claro que os nossos parceiros Ingleses são bem vindos. Repare, eu tenho sangue inglês!
5) Os assentos e os costumes quando a lei determina têm valor equivalente.
6) Evidentemente que na Europa existiram tribos e clâs.
Temos até, ainda hoje, a questão do "povo cigano"!
7) Claro que existem grupos ou "famílias" com afinidades de pensamento ideológico-político: p.e. os vários agrupamentos políticos existentes no Parlamento Europeu!
8) A Federação Russa ou a China são modelos paradigmáticos daquilo que "não se deve fazer".
9) Quanto ao combate à "plutocracia" vejo, com enorme dificuldade, a "união dos países menos poderosos": exemplos muito recentes têm-me vindo a dar razão.
10) A vocação atlântica está ligada a um fenómeno geral: a vocação marítima. Ou será que a "Língua Portuguesa" não está espalhada por vários continentes?
11) O Brasil pode, e deve complementar, a acção de Portugal. Têm que se criar sinergias com base no "princípio da igualdade". Não advogo "hegemonias"!!
12) Não havendo "hegemonia", os outros parceiros verão "com bons olhos".
13) O uso de jeans foi uma aculturação bem vinda. Veio complementar a nossa "forma de vestir".
Inclusive, Portugal fabrica artigos "de ganga".
14) O "Mac" (maior símbolo da "fastfood") é um fenómeno típico de globalização. Lembro-lhe, no entanto, que uma "associação de comerciantes de restauração" de Viana do
Castelo há anos que impede a instalação dum "Mac" na cidade do "Lima"!
15) Para além de filmes (de grande violência física e psíquica, acrescentaria alguns programas, documentários, e novelas.
16) Relativamente à internet, ela só terá efeitos negativos se for utilizada para fins ilícitos. De resto é um belíssimo meio de comunicação, que aproxima "pesssoas" e "povos".
17) Os elementos aduzidos vieram da América do Norte, principalmente dos E.U.A.
18) A família e a escola têm um papel importantíssimo na preservação da identidade cultural e da História. Não devemos, quanto a mim, ignorar a papel do "Estado" e de certas "organizações privadas".
19) Os cantões da Confederação Helvética não perderam as suas identidades. Importa dizer que a Suiça situa-se no "centro da Europa", e Portugal na "periferia"!
Grande e estimado abraço
Artur João
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RE: União Europeia
Caro Eduardo
Quanto a um novo modelo a emergir, proponho-lhe, assim como a outros colegas, a abertura de um tópico específico.
Renovado abraço
Artur João
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RE: União Europeia
Caro Artur,
Embora já tenha amplamente debatido a questão apoio a sua proposta, não só quanto ao novo modelo a emergir, como quanto a tudo o que à UE diga respeito. Em relação ao "novo modelo", ao que hoje ouvi nas notícias parece terem por agora ficado frustradas as pretensões de Giscard d'Estaing de criar o posto de Presidente da Europa. Nem sempre "eles" ganham!
Cumprimentos
Alexandre Burmester
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RE: União Europeia
Primo,
Perfeitamente de acordo com a abertura desse tópico, e amanhã, podemos discutir este assunto, saborando um belo bife `"marrare", e degustando uma bela pomada nacional.
Um abraço fraterno
Luís
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RE: União Europeia
Caro Alexandre
O cargo de "Presidente da Europa" será sempre uma tentação. Precisamos de combatê-la.
Forte abraço
Artur
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RE: União Europeia
Primo,
Ora vamos então ao bife "marrare" e a uma bela "pomada" nacional!
Um abraço fraterno
Artur
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Títulos e Conselho de Nobreza em Portugal
Caro Primo Alexandre e Caro Jacinto Bettencourt
Exactamente. Embora o tema nobiliárquico nunca me tenha interessado senão sob o seu aspecto histórico e cultural, em perspectiva meramente historicista, única que me parece adequada, confesso, à Genealogia e à História da Família de que a primeira depende, penso que só a generalização da aceitação do poder decisório e de registo de títulos atribuido a uma entidade reguladora com legitimidade inteiramente democrática, legitimidade essa assente nos seus órgãos eleitos pela base associativa, como por exemplo a ANHP, poderia resolver o problema. Esses órgãos, ao serem eleitos, teriam a vantagem da transparência e a da verificação dos seus actos pelo conjunto dos interessados, o que nunca aconteceu nem poderá acontecer com qualquer "CN", mesmo que remodelado, se o mesmo não for democratizado.
A informação que tenho, porém, é que nem isso acontece no estrangeiro, aonde a liberdade sobre o assunto é total nas antigas monarquias europeias republicanizadas. A vantagem a meu ver de se adoptar este novo sistema seria o de libertar a Causa Monárquica e a imagem do Senhor Dom Duarte da nociva correlação entre Monarquia e vaidades nobiliárquicas que há muito subsiste no espírito da maioria dos Portugueses, esvaziando redutoramente de conteudo o ideal monárquico no nosso país.
Saudações Portuguesas
Alexandre Tavares Festas
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