Prova de Paternidade
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Prova de Paternidade
Caros Confrades:
Encontrando-me a estudar alguns ramos da minha família até agora pouco investigados, deparei-me com este problema:
Tenho um antepassado, filho bastardo, nunca legitimado, de um titular, Fidalgo da Casa Real, em finais do Séc. XVII e o assento de baptismo reza assim: "(...) baptizei a Afonso, filho de Maria de Jesus, solteira, que deu por pai a Gonçalo de Castro, do lugar de (...)" e, a final, após identificar os padrinhos,
o Padre faz mençao "por ser verdade, assino".
Considerando ainda que no assento de baptismo de Martinho, filho do referido Afonso (26 anos mais tarde), se indica ser neto paterno de Gonçalo, pergunto a todos os nossos confrades se estes elementos dos paroquiais constituem prova bastante bastante de paternidade, nomeadamene para efeitos de instruir eventual processo para reconhecimento de direitos nobiliárquicos junto do Conselho de Nobreza, logo que este retome as suas actividades.
Muito Obrigada
Amélia Mello e Castro
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RE: Prova de Paternidade
Cara Amélia de Mello e Castro,
Não sou especialista em direito das sucesões nobiliárquicas mas, à primeira vista, o caso que apresenta parece-me insuficientemente fundamentado.
1 - O que o padre dá fé é das declarações da mãe e não da sua veracidade;
2 - Gonçalo de Castro do lugar de..., parece indiciar que o baptismo ocorreu em diferente localidade da morada do alegado pai; assim não se poderá inferir que este teria naturalmente conhecimento de tais declarações para as infirmar ou confirmar, ainda que tacitamente.
3 - O seu silêncio sobre os padrinhos, leva-me a concluir que não encontra relação com o alegado pai, nem de parentesco nem de vizinhança; isto é, se os padrinhos fossem parentes, criados ou, pelo menos moradores na localidade de residência do alegado pai, sempre emprestariam alguma verosimilhança às declarações da mãe.
4 - O mesmo se aplica ao registo do neto, acrescendo que as identificações de avós em registos são por si pouco fiáveis, pelos frequentes erros que contém.
Assim, salvo qualquer menção documental, testamentária ou epistolar, ou prova de que o filho usou o apelido do presumível pai em contactos com familiares deste, não me parece que o caso tenha força probatória bastante.
No entanto, já houve casos menos sustentados e aprovados pelo Conselho de Nobreza - não faço citações - pelo que o reconhecimento não é de todo de excluir.
Resumindo a minha opinião, se o reconhecimento vier ferir direitos de terceiros, não me parece que possa obter provimento. Se for indiferente a terceiros, depende de outro tipo de argumentos - por exemplo, estatuto e percurso social do próprio e sua descendência - e das eventuais relações da actual descendência com o futuro orgão que suceder ao Conselho.
Certamente irá obter opiniões mais abalizadas do que a minha.
Com os melhores cumprimentos,
Francisco Tavares de Almeida.
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RE: Prova de Paternidade
Meu Caro Francisco Tavares de Almeida:
Obrigada pelo contributo. Ainda terei efectivamente de investigar eventual relacionamento dos padrinhos com o Pai deste antepassado.
O baptizado ocorre em freguesia limítrofe com a da morada do Pai, distante uns 2,5/3 Km.
O filho usou o apelido do Pai.
Melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Caros Confrades:
Peço novamente ajuda sobre o vertente tópico.
Cumprimentos.
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RE: Prova de Paternidade
Cara Amélia de Mello e Castro,
Não sou especialista no assunto, mas arrisco uma opinião.
Segundo os dados referidos por si, o primeiro assento de baptismo atesta apenas aquilo que a mãe AFIRMOU sobre a paternidade de Afonso. Ora, a declaração de uma mulher solteira quanto à identidade do pai da criança não constitui, por si só, prova da filiação. Tal assento carece, assim, de força legal para sustentar a reivindicação de quaisquer direitos sucessórios (nobiliárquicos ou outros) relativamente a Gonçalo de Castro. Terá, apenas, algum valor indicativo no plano da história e da genenalogia.
O segundo assento já estabelece de modo formalmente inequívoco a paternidade de Afonso, declarando Martinho neto de Gonçalo de Castro, sem qualquer ressalva. Porém, tudo leva a crer que agora o padre simplesmente registou como FACTOS as anteriores declarações de Maria de Jesus (unilaterais e não provadas).
Se o primeiro assento fosse desconhecido, o último poderia sustentar direitos relativamente a Gonçalo de Castro. Mas, em face do que conhecemos, parece ter havido apenas negligência ou abuso de poder por parte do padre que lavrou o documento.
Não existindo outros elementos relevantes para a ponderação daquela filiação, nem inquirições de testemunhas e sentenças judiciais em que a mesma tenha sido dada como provada, creio que os descendentes de Afonso não devem ser considerados sucessores de Gonçalo de Castro em matéria de direitos nobiliárquicos.
Com os melhores cumprimentos
Nuno Maria
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RE: Prova de Paternidade
Estimada Amélia,
Não estando em condições de lhe ajudar, limito-me a perguntar-lhe, este Gonçalo de Castro está na base do Genea? Qual a localidade onde ele residiu? Antecipadamente agradeço pela atenção. Um abraço.
Samuel de Castro - Olímpia - SP - Brasil
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RE: Prova de Paternidade
Caro Nuno Maria:
Agradecendo o ter vindo opinar sobre a matéria, perguntar-lhe-ia se teria a sugerir pistas de pesquisa a que se poderia recorrer para esclarecimento deste ponto controverso.
Melhores cumprimemtos
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Meu Caro Samuel de Castro:
Tenho a comunicar-lhe que este antepassado é omisso na base de dados do Genea por pertencer a uma linha que agora comecei a investigar e que
o meu antepassado residiu em Évora, finais do Séc XVII, princípios do Séc XVIII, mais informando que desconheço eventuais descendentes no Brasil.
Melhores cumprimentos.
Amélia Mello e Castro
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RE: Prova de Paternidade
Caros Confrades:
Independentemente do meu caso concreto, para o qual continuo a solicitar a ajuda de todos, lanço, para o debate, a problemática de saber quais os meios de prova a que se pode recorrer, em tese geral, para demonstrar cabalmente a paternidade de filhos ilegítimos (bastardos).
Melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Caro Nuno Maria e demais Confrades do Genea Portugal:
Em aditamento aos anteriores dados, acrescentaria que a paternidade igualmente se encontra inequivocamente consagrada no assento de casamento, com a idade de 25 anos.
Não vou jurar neste momento, mas diria, falando de memória, que me parece ser o mesmo sacerdote.
Acresce que, em meios pequenos, na época, me parece que o uso do apelido "de Castro" (que surge nos paroquiais do casamento e baptizado do neto) deveria ser por demais público e evidente. qual a vossa opinião?
Melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Cara Confreira
Primeiro que tudo há que saber a que data os factos se reportam para saber qual a lei aplicável á data do evento.A partir do Código de Seabra o reconhecimento faz-se por perfilhação ou decisão judicial em acção de perfilhação.Os meios de prova na acção são os comuns,documentais,testemunhais e posse de facto do estado.
Anteriormente ao Código de Seabra creio que as provas a exigir seriam do mesmo teor:como era tratado na família do pai,alguma herança que indique esse tratamento,á pessoa ou aos filhos, tratamento dado no sítio onde vivia que seja indicativo de...Passados muitos anos tudo isto é extremamente difícil,mas ás vezes acontece.Conheço um caso em que o pai nunca revelou o nome da mãe da filha, que criou com ele, e depois de os dois morrerem os herdeiros encontaram uma agenda com apontamentos bastante pessoais do senhor dos quais se concluia que a mãe da criança era a costureira que fazia as cuecas do Sr (Doutor Juiz Conselheiro).
Desejando boas e comprovativas descobertas
Maria Benedita
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RE: Prova de Paternidade
Caros Confrades:
Em primeiro lugar, obrigada pelo contributo da nossa Confrade Benedita Vasconcelos.
Para além das perguntas que já tive oportunidade de colocar e para as quais continuo a solicitar a ajuda de todos, gostaria de saber se algum dos confrades tem conhecimento de eventual jurisprudencia do Conselho de Nobreza sobre problema análogo.
A propósito, gostaria de saber onde se encontram compilados e podem ser consultados os casos julgados pelo Conselho de Nobreza.
Melhores cumprimentos
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Caros Confrades do Genea:
Retomando o problema que coloquei, e sintetizando, trata-se conforme refiro na minha 1ª mensagem, de um antepassado cuja paternidade consta do assento de baptismo respectivo como "filho de Maria de Jesus, solteira, que deu por pai a Gonçalo..."
No entanto, este filho usou o apelido do pai, como se alcança do seu assento de casameno, 23 anos mais tarde, em que casa usando o apelido paterno e sendo este um assento em que a paternidade é consignada pelo padre sem reservas e do assento de baptismo de seu filho, neto de Gonçalo, 3 anos após o casamento, em que novamente se consagra sem ressalvas a paternidade (filho de Martinho, neto paterno de Gonçalo).
O problema localiza-se temporalmente em meados do Séc XVII, em Évora, distando a morada de Maria de Jesus da de Gonçalo uns 3 Km.
Pessoalmente penso que seria de expender parecer de que os 2º e 3º assentos acabam por consagrar inequivocamente o que já seria público e notório, ou seja, o que seria duvidoso ao momento do baptismo de Martinho, ou seja, o facto de ser filho de Gonçalo, tornou-se do domínio público, pelo que os assentos posteriores acabam por consagrar sem ressalvas a dita paternidade e consequentemente por sanar a dúvida do 1º.
Parece-me, igualmente que pertencendo o pai a família distinta no meio, seria impossível decerto encontrar-se alheio ao facto de seu filho bastardo se arrogar o apelido e usá-lo no seu casamento e baptizado do seu neto, sem impugnar esta pretensao.
Agradeço o contributo de todos para esta problemática e perguntaria ainda a todos seé do conhecimento de algum Confrade caso análogo decidido pelo Conselho de Nobreza.
Apelo, sobretudo, aos ilustres especialistas em direito nobiliárquico que aqui se encontram.
Melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Caros Confrades do Genea:
Apenas para rectificar ligeiramente a minha última mensagem...de facto o filho de Gonçalo é Afonso, Martinho o neto, tratou-se de mero lapsus calami, as minhas desculpas, aguardo o contributo de todos.
Melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Cara Amélia,
Embora não seja um especialista em direito nobiliarquico (e muito menos ilustre), gostava de dizer que acho o seu raciocínio bastante convincente (sobretudo no 4º paragrafo).
Apenas discordo de si quanto ao valor que atribui ao uso do apelido Castro como forte indício da filiação: é que no século XVII, a adopção de apelidos alheios era pratica corrente e processava-se sem constrangimentos de maior...Até por parte de escravos, às vezes!
Um abraço,
Nuno Maria
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RE: Lei Mental-Prova de Paternidade
Cara Confrade, Amélia Mello e Castro,
Em aditamento às resposta já aqui obtidas e procurando dar alguma satisfação, em termos perfunctórios, abstractos e gerais às suas dúvidas, aqui lhe deixo algumas notas como referência.
Assim,
Sobre a interrogação de saber se:
« os elementos dos paroquiais constituem prova bastante...»?
Convirá, desde logo, situar cronologicamente, os factos.
Ora estes reportam-se ao fim do século XVII, princípios do século XVIII, pelo que o substrato jurídico corporizado serão
as Ordenações Filipinas,
confirmadas por D. João IV por lei de 29 de Janeiro de 1643, - não obstante os inúmeros “filipismos” que incorpora, ou seja, as inúmeras imperfeições decorrentes de contradições internas pela ausência de saneamento das disposições contraditórias há muito revogadas, -
e respectivas “leis extravagantes”,
isto é, todo e qualquer modo pelo qual a vontade do Rei se manifestava, - cartas de lei, ou cartas patentes, alvarás, decretos, cartas régias, resoluções, provisões, portarias e avisos, - de que se faz relevar, para este período, a “colecção de José Justino de Andrade e Silva ( 1603-1700 ).
Ao acervo “legal” supra referido haverá que acrescer
os assentos das Relações,
nomeadamente da Casa da Suplicação, e a partir de 1582, da Casa do Cível e Relações Ultramarinas, em matéria de interpretação autêntica das leis ( cfr. Filipinas, L.1.Tit.V ), e devidamente compilados nos “ livro dos assentos”.
Mas, paralelamente a este corpo legislativo, “corria” o costume, enquanto havido pelos juristas coevos como « uma manifestação tácita da vontade do monarca », vontade tida como fonte última de todo o direito.
E, note-se, o costume corria ao lado da lei em pé de igualdade, o que significava que tanto podia revogar a lei como por esta ser revogado.
Donde, quer o costume contra-legem, quer o costume praeter-legem, eram fonte directa e imediata do direito, ressalvado o facto de não serem contraditórios com as leis de ordem pública.
Finalmente, não esquecer o direito subsidiário, para colmatar as lacunas da lei,
que de acordo com as Ordenações ( cfr. Filipinas L.3 Tit.LXIV ) era: o direito romano e canónico, a glosa de Acúrcio e opiniões de Bártolo, a “opinio communis” e o arbítrio do monarca.
Todo este arrazoada para dizer que reinava a mais absoluta anarquia, e não era raro aplicar-se o direito romano, ou o direito canónico, ou o direito castelhano, ou o direito feudal, em detrimento do direito nacional, situação esta, que só encontraria termo com a celebérrima lei de 18 de Agosto de 1769, dita da Boa Razão.
Nestes termos, o eventual recurso à lei Mental ( cfr. Filipinas, L.2 Tit. XXXV, §§ 12 e 13 ) para aferir um critério que nos permita encontrar uma solução adequada, terá apenas valor “muito aproximado”.
Dêmos, pois, a palavra aos supra referidos preceitos:
(Filipinas, Livro 2, Título XXXV, § 9 ,12 e 13 )
« Determinações del Rey D. Duarte sobre duvidas da Lei Mental.
9. Item, foram movidas ao dito Rey D. Duarte algumas duvidas, tocantes à dita Lei Mental, que per elle foram determinadas na maneira seguinte.
(...)
12. Terceira duvida.
Se a dita Lei haveria lugar no filho, ou neto natural, ou spurio legitimado per auctoridade Real, ou per nomeação feita pelo pai em seu testamento, nomeando-o por filho, ou no filho perfilhado, que se chama em direito adoptivo, ou arrogado ?
A qual duvida declarou, que NÃO era sua tenção, que o filho, ou neto assi legitimado, ou perfilhado podesse herdar tal terra, ou terras da Corôa do Reino.
Salvo se na LEGITIMAÇÃO per elle feita, ou no PERFILHAMENTO per elle CONFIRMADO, expressamente fosse declarado, que as podesse herdar e haver, ou na confirmação, sem embargo do defeito de seu nascimento, e sem embargo da dita Ordenação.
Porém, se tal filho fosse LEGITIMADO PER MATRIMONIO seguinte, celebrado entre seu pai e sua mãi depois de seu nascimento, per que este legitimado he em todo perfeitamente legitimo, havera lugar a dita Lei em elle, assi como se ao tempo de seu nascimento já o matrimonio fosse celebrado;
com tanto que este filho fosse tal, que com Direito podesse ser legitimado per seguinte matrimonio, sendo porém o dito casamento feito em face da Igreja, ou fora della per licença do Prelado.
E posto que até então fossem passadas muitas legitimações e confirmações de perfilhações, ou dahi por diante passassem, per que os legitimados, ou perfilhados podessem haver e herdar feudos e Morgados, e outras semelhantes heranças,
NÃO era sua tenção, que per taes palavras, ou outras equivalentes, de qualquer maneira que fossem ditas, assi acerca da restituição do nascimento, como da habilitação para poder haver, e herdar as cousas, que lhes fossem dadas, ou deixadas, tal legitimado ou perfilhado podesse haver, ou herdar terras da Corôa:
Salvo no caso, onde specialmente lhe fosse outorgado que as podessem hver ou herdar, sem embargo da dita Lei, e de outra maneira não.
13. E no caso, onde per morte daquelle, que a terra possuia, ficasse algum filho varão legítimo, nascido de legítimo matrimonio, não poderia herdar, nem haver em sua vida as ditas terras nenhum filho legitimado per sua Carta, ainda que specialmente se contenha em ella, que as possa haver e herdar.
E isto, posto que fosse legitimado, antes que nascesse o filho legitimamente nascido.
Porque sua tenção era, que tal legitimação nunca podesse em caso algum empecer ao filho legitimamente nascido, ainda que fosse vallada ( garantida) e corroborada com quaesquer clausulas derrogatorias, e vinculos de Direito, per qualquer maneira que fossem, ou podessem ser ditas e compostas. »
De tudo isto ressalta que para subingressar na posição jurídica do de cuius, isto é, para herdar, era necessário:
A LEGITAMAÇÃO ou PERFILHAÇÃO EXPRESSA como condição sine qua non.
Cientes já da necessidade da legitimação ou perfilhação, perguntar-se-á onde a encontrar.
Pois bem, ao lado dos registos paroquiais, - e não esquecer que os livros dos defuntos incorporam muitas vezes testamentos, - existem os registos notariais onde se inscreveram perfilhações e legitimações, nomeadamente em testamentos, pelo que haverá que averiguar se tais documentos são existentes nos respectivos ofícios notariais que normalmente se custodiam nos arquivos distritais.
Outras fontes a investigar são:
as habilitações para os lugares das letras;
para o Santo Ofício;
para o ingresso em ordens militares;
os livros de legitimações;
as inquirições de genere.
Todos estes ditos processos eram instruídos com muitas declarações testemunhais, em norma doze depoimentos por cada uma das freguesias de onde era natural o inquirido e seus pais.
Constituem, assim, estes processo um elemento probatório determinante, já que neles são investigados todos os supra citados.
E por eles se constata que não bastava a mera indicação do registo paroquial, requeria-se, ademais, a confirmação testemunhal.
As habilitações para o lugar das Letras, Santo Ofício, Ordens Militares e livro de legitimações encontram-se no arquivo da Torre do Tombo.
As inquirições de genere localizam-se nos arquivos distritais ou diocesanos.
Como quer que seja, toda a pretensão a um direito qualquer que ele seja requer a sua prova.
Assim, registos paroquiais idênticos ao referido na sua mensagem, não obstante os “fortes indícios” de que são reveladores, - pois convirá não esquecer o contexto histórico-social em que se realizaram, com um domínio quase “absoluto” da igreja na vida de cada um...e mentir não seria tarefa tão fácil... - requerem outrossim um complemento de prova a dar por outras vias, como as supra mencionadas.
Em suma, e a terminar, terá de encontra a tal legitimação ou perfilhação a obter por via directa, encontrando o dito documento, ou por via indirecta pelo depoimento de testemunhas.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Lei Mental-Prova de Paternidade
Caro confrade Eduardo Albuquerque
Os meus sinceros aplausos para a dissertação feita.
Melhor não podia ser.
cumprimentos
Maria Benedita
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RE: Lei Mental-Prova de Paternidade
Caríssimo Eduardo Albuquerque:
Deu-me uma opinião extremamente bem fundamentada, que aplaudo e agradeço, mais informando que não deixarei, naturalmente, de seguir as suas sugestões e pistas de pesquisa.
Em todo o caso, coloco-lhe (e a todos os membros deste fórum que entenderem dar o seu avisado contributo) diversas questões: Mas os filhos legitimados não passariam a ser considerados legítimos? ou continuavam a ser considerados "bastardos"?
Por outro lado, o assento legal que refere tem muito a ver com a herança de bens materiais que, modernamente, consideraríamos parte integrante do hemisfério patrimonial da esfera jurídica, ou seja, a legitimação ou prova de perfilhação para além da informação vertida nos paroquiais, parece-me ser imprescindível para herdar terras e demais bens.
Mas será que igualmente se torna indispensável no campo dos direitos nobiliárquicos, que, hoje em dia, são merecedores de tutela jurídica integrados nos chamados direitos de personalidade, nomeadamente pelo art. 70º do Código Civil?
Por exemplo para requerer, se tal fosse a vontade da descendência, uso de CBA?
Ou, o que me parece ser admitido pelo preceituado no regime processual de instrução de processos de apreciação de direitos nobiliárquicosdo CN (agora suspenso, ou extinto, tanto quanto julgo ter conhecimento), para requerer o foro de "Fidalgo da Casa Real"?
Muito agradecendo as suas informações e com os melhores cumprimentos,
Amélia
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RE: Lei Mental-Prova de Paternidade
Caríssimo Eduardo Albuquerque:
Em aditamento às perguntas que, na minha mensagem anterior de hoje, tomei a liberdade de lhe endereçar e para as quais teria todo o gosto em colher o seu parecer, gostava de lhe transmitir a seguinte informação:
A prova de que será um filho bastardo é a menção no assento de casamento "filho natural de Gonçalo...", ou seja, parece-me não ter sido legitimado...
Isto independentemente de continuar com a minha investigação e de seguir as suas sugestões, que agradeço.
Renovo é mais uma vez a minha questão de há pouco, ou seja, parece-me que os filhos bastardos, mesmo não legitimados, sucedem, v.g., em direito a uso de brasão de armas...ou estou errada?
Fico na expectativa do seu douto parecer.
Amélia
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RE: Prova de Paternidade
Caro Eduardo de Albuquerque e demais Confrades.
Saberão dizer-me se em Portugal, já se tenha feito alguma prova de legitimidade, utilizando os actuais e disponíveis métodos, de reconhecimento genético pelo DNA.
Pergunto também, se já existem pareceres jurídicos sobre este assunto.
Obrigado,
José de Azevedo Coutinho
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RE: Prova de Paternidade
Caro confrade
Já foram utilizados os métodos de reconhecimento genético pelo DNA, mas não conheço qualquer jurisprudência sobre o assunto.
melhores cumprimentos
Maria Benedita
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RE: Cartas Régias
Caro Eduardo Albuquerque e outros participantes no Forum,
Recorrendo aos seus evidentes conhecimentos de história do direito portugês (e à sua boa vontade), colocava-lhe a seguinte questão:
Um diploma emitido em nome do rei ("Dom Fulano, Rei de Portugal e dos Algarves, etc"), mas assinado por funcionários da sua confiança (segundo a fórmula "El Rei nossso senhor o mandou por X e Y" etc) é uma Carta Régia? Pode considerar-se que o autor do diploma é, em termos jurídicos, o próprio rei, ainda que não tenha tido intervenção pessoal na sua elaboração? Estão neste caso, por exemplo, as Provisões dos tribunais palatinos, as Cartas de Sentença do tribunal da corte, etc, etc...
Embora não tenha conhecimentos especializados na matéria, parece-me que sim: tratam-se de Cartas Régias, cujo autor é o Monarca pois os actos praticados em seu nome situam-se na sua esfera jurídica. Os funcionários que elaboram e subscrevem tais documentos serão meros executantes da vontade do soberano e não os autores juridicos dos actos. O que pensa sobre este assunto?
Antecipadamente agradecido pelas respostas que vier a obter,
Nuno Maria
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RE: Lei Mental-Prova de Paternidade
Caríssimo Vasco de Sousa Cyrne:
Vi com agrado a sua resposta, mas, mais exactamente gostava de obter o seu comentário sobre todo o teor do Boletim Oficial do Conselho de Nobreza-Legislação e Estatutos, que foi objecto de publicação em Lisboa, em 1998.
Ora, aqui se publicou justamente um instrumento jurídico designado Regulamento de Instrução de Processos de Direitos Nobiliárquicos.
Assim, o nº 3 do art. 1º, sob a epígrafe “Requerimento Inicial”, que regula o objecto do pedido, preceitua: “O pedido nobiliárquico poderá ser, designadamente, o reconhecimento à sucessão ou representação genealógica de Títulos, Donatarias, Tratamento de Dom, Brasões de Armas ou Foro de Fidalgo da Casa Real.”
Da praxis do Conselho de Nobreza, constata-se que este concedeu, no decurso de décadas, diversos títulos nobiliárquicos, direito a tratamento de Dom e cartas de brasão d'armas (CBA, i.e., os designados Fidalgos de Cota d’ Armas), parecendo-me ser de expender parecer no sentido de que igualmente e pela letra do Regulamento, ser, de igual sorte, possível pedir representações de senhorios e foros de fidalgo da Casa Real, representação de cargos hereditários da Corte, etc.
Efectivamente, se o C.N tem vindo a criar fidalgos de cota d'armas por sucessão, pode igualmente, S.M.J., a entidade que lhe venha a suceder vir a reconhecer fidalgos da C.R também por sucessão.
Mas, no caso em apreço que nos tem vindo a ocupar, parece, salvo melhor opinião, que, pelo menos o pedido de CBA será teoricamente possível, precedendo demonstração da linha de ascendência.
O que lhe parece? E, já agora, aos demais confrades?
Com os melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Agradecimento
Cara Confrade, Maria Benedita Vasconcelos,
Começo por lhe agradecer a sua gentil e precedente mensagem, e, reportando-me a ela, clarificar que, sobre a temática em apreço e neste âmbito, o da história do direito português, sou apenas um “mero curioso”, não obstante a minha formação jurídica adquirida na “escola” de Coimbra.
Por isso, o aqui relatado, não passa de meras notas, que mercê daquele dito espírito, vou colhendo das respectivas fontes.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Lei Mental-d.tos de personalidade
Cara Confrade, Amélia Mello e Castro,
Em resposta à sua anterior mensagem, cuja gentileza agradeço, convirá tornar claro, que, o aqui “depositado” por mim, são meras notas ou apontamentos, que por espírito de curiosidade vou coligindo, no âmbito da história do direito português e da genealogia.
Dito isto, passemos às suas dúvidas.
Antes, porém, não quero deixar de lhe fazer notar que, no quadro das pistas para as suas pesquisas, as deve estender a outros familiares próximos do investigando, possíveis irmãos, filhos, sobrinhos...pois muitas vezes acontece que se consegue reconstruir o elo ou nexo entre gerações pelas informações destes colhidas.
Voltando à sua pergunta:
« os filhos legitimados não passariam a ser considerados legítimos ? ou continuavam a ser considerados bastardos? »
Convirá, préviamente, dilucidar que:
Filhos legítimos são os filhos concebidos ou nascidos oriundos de pessoas unidas por matrimónio;
Filhos legitimados são todos aqueles que não nasceram na constância do casamento mas que o matrimónio subsequente dos pais legitimou;
Bastardos, são os filhos ilegítimos provenientes de uniões ilegítimas;
Filhos naturais são os que resultaram de uma união de pais solteiros;
Filhos espúrios são os ilegítimos que não podem ser perfilhados, como os incestuosos.
Perfilhados são todos os que foram reconhecidos como filhos, quer judicialmente, quer extra-judicialmente.
Tudo considerado, o que nos dizem as nossas Ordenações Filipinas ?
Regressemos à nossa Lei Mental, enquanto arquétipo sucessório conformador.
Ora o texto é expresso ao dizer, (Filipinas, Livro II, Título XXXV, § 12):
« Porém, se tal filho fosse LEGITIMADO PER MATRIMONIO seguinte, celebrado entre seu pai e sua mãi depois de seu nascimento, per que ESTE LEGITIMADO HE EM TODO PERFEITAMENTE LEGITIMO, havera lugar a dita Lei em elle, assi como se ao tempo de seu nascimento já o matrimonio fosse celebrado;
com tanto que este filho fosse tal, que com Direito podesse ser legitimado per seguinte matrimonio, sendo porém o dito casamento feito em face da Igreja, ou fora della per licença do Prelado...»
Já não assim os “legitimados” per carta, como resulta do § 13.
« E no CASO, onde per morte daquelle, que a terra possuia, FICASSE ALGUM FILHO VARÃO LEGÍTIMO, NASCIDO DE LEGÍTIMO MATRIMONIO,
NÃO PODERIA HERDAR, nem haver em sua vida as ditas terras NENHUM FILHO LEGITIMADO PER SUA CARTA, ainda que specialmente se contenha em ella, que as possa haver e herdar.
E isto, posto que fosse legitimado, antes que nascesse o filho legitimamente nascido. »
Com o que se dá por respondida a sua primeira interrogação, não deixando de lhe referenciar como fundamental o
“ TRACTATUS DE EXCLUSIONE, INCLUSIONE, SUCCESSIONE, & ERECTIONE MAIORATUS” de Manuel Álvares Pegas, Lisboa, 1687,
disponível na biblioteca da Faculdade de Direito de Coimbra, onde esta problemática sucessória é casuística e profusamente abordada.
Pelo que concerne à sua segunda questão, da necessidade de legitimação ou prova de perfilhação no quadro dos direitos nobiliárquicos, nomeadamente nos que alcançam tutela jurídica no âmbito dos direitos de personalidade,
há que diferenciar os direitos adquiridos ex novo, dos transmitidos por sucessão.
Ora sobre estes últimos, também, já nos pronunciamos.
Acrescerá referir que a tutela dada aos direitos nobiliárquicos pelo nosso ordenamento jurídica, como seja o uso de referências honorificas ou nobiliárquicas, consagrado no art.º 40.º do Código do Registo Civil, se restringe à sua função de identificação e não à sua função de honrar.
Tal asserção resulta do art.º 13.º da actual constituição e já resultava do inscrito no decreto do governo publicado em 18 de Outubro de 1910, em que se declarava no art.º 1.º:
« A Republica Portuguesa tem por abolidos e não reconhece quaesquer titulos nobiliarchicos, distincções honorificas ou direitos de nobreza.»
Não obstante, ressalvava-se no art.º 4.º:
« Os individuos que actualmente usam titulos que lhe foram conferidos, e de que pagaram os respectivos direitos, podem continuar a usá-los, mas nos actos e contratos que tenham de produzir direitos ou obrigações será necessário o emprego do nome civil para que tenham validade.»
Como também o art.º 3.º, n.º 3 da Constituição de 1911:
« A Republica Portuguesa não admite privilegio de nascimento, nem foros de nobreza, extingue os títulos nobiliárquicos e de conselho e bem assim as ordens honoríficas, com todas as prerrogativas e regalias.»
Finalmente, sobre matéria que ultrapassa o actual ordenamento jurídico português, não me pronuncio.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Lei Mental-d.tos de personalidade
Caríssimo Eduardo Albuquerque:
È com todo o prazer que vejo que tenho o grato prazer de esgrimir argumentos com um Ilustre Colega, muito embora eu represente os ensinamentos da Escola de Lisboa, onde, aliás, fiz a pós-graduação (em administrativo) e me encontro a concluir o Mestrado, na mesma área, sou, pois, especialista em Direito Público e uma diletante no ramo que poderíamos designar de Direito Nobiliárquico.
Ainda assim e sempre me reportando à factualidade apurada no meu caso concreto e que se encontra vertida mas minhas precedentes mensagens e à qual me reporto e com vista a uma correcta subsunção às normas aplicáveis, gostaria, se tiver a bondade de me acompanhar nesta viagem, do seu, pelo que já constatei, sempre douto comentário sobre este meu exercício intelectual:
Na página 227 do capítulo “das differentes especies que ha de Fidalgos neste Reino” do livro "Privilégios da Nobreza e Fidalguia de Portugal" da autoria de Luiz da Silva Pereira Oliveira retira-se o seguinte ensinamento: Fidalgos de linhagem são aqueles cuja Fidalguia já lhe provém de seus Avós.
Na mesma obra e a págs. 22 retira-se que: “VIII. Os filhos naturaes, ou bastardos, também gozão da Nobreza de seus pais, ainda mesmo que suas mãis sejão escravas, com tanto que o filho esteja livre ao tempo em que morrer o pai; o filho natural da mulher nobre, como não seja prostituta, está nas mesmas circunstancias, e goza da nobreza materna.”
Acresce ao exposto que, no próprio regimento das diferenças, é estabelecida a diferença para os bastardos (o filete).
No contexto assim delineado, parece-me, S.M.O., que, pelo menos no que concerne aos fidalgos de cota de armas, a bastardia não constituiria pois, como desde logo se alcança, impedimento para a fidalguia.
Acresce o facto de que, duas gerações passadas sobre a bastardia, o filete era suprimido, o que, parece-me, vem vivificar esta ideia.
Donde, e em síntese, se deduzirá que a bastardia não era impedimento para a transmissão de direitos nobiliárquicos.
O meu antepassado é, aliás referido nos paroquiais como “filho natural de [...].”
Surge-me aqui a dúvida de saber se estou, de resto, perante um bastardo ou um filho natural, a dúvida não se encontra integralmente esclarecida no meu espírito.
Parece, para mais, que o meu antepassado casou canonicamente por duas vezes e este filho terá nascido de uma relação que teve supostamente após falecimento da sua primeira mulher e antes de casar com a segunda.
Mas ainda não existem certezas absolutas.
Em todo o caso pedia-lhe, e, bem assim, a todos os demais confrades que se interessem por este debate de ideias, o seu ilustrado comentário sobre o meu raciocínio, bem como o que se lhe oferecer sobre a situação dos filhos naturais, pois poderá eventualmente ser o caso.
Apresento-lhe os meus melhores cumprimentos.
Amélia
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RE: Cartas Régias, Cartas de Lei e Alvarás
Caro Confrade, Nuno Maria,
Na sequência da sua precedente mensagem, que agradeço, a ela me reporto para aqui deixar mais umas breves notas.
Desde logo, o sentido de Carta Régia.
É doutrina corrente, que Carta Régia é uma verdadeira carta, ou seja, uma epístola, que se iniciava com a menção do nome da pessoa a que se destinava, cuja fórmula variava em consonância com o estatuto social do destinatário e que, no fim, era subscrita pelo soberano com a aposição singela da palavra Rei
Assim,
F...., Amigo Eu El-Rei vos envio muito saudar...
Ao lado das Cartas Régias existiam as Cartas de Lei e os Alvarás .
Estes últimos apresentavam caracteres semelhantes entre si, já que ambos eram assinados pelo rei e passavam pela chancelaria régia.
Iniciando-se com a nome do rei, nas Cartas de Lei usava-se o seu nome próprio, enquanto que nos Alvarás se empregava o termo Eu El-Rei.
As Cartas eram fechadas usando o título do soberano, assim, El Rei; os Alvarás o mesmo titulo sem artigo, isto é, apenas Rei.
Distinguiam-se quanto à sua duração, nos termos do Livro II, título XL das Ordenações Filipinas, onde se diz:
« Mandamos, que as cousas que passarem per Nós, cujo effeito haja de durar mais de hum anno, não passem per Alvarás, mas de todas se façam Cartas patentes, que comecem:
Dom Filippe etc. ...»
Por outro lado as Cartas de Lei apresentavam maior solenidade.
Assim, começavam:
« D. João por graça de Deus, rei de Portugal e dos Algarves,...»
Não obstante as diferenças apresentadas, a prática encarregou-se de gerar uma certa confusão entre os dois diplomas, acabando por se utilizar alvarás em matérias onde deveriam ser usadas carta de lei, dando origem aos ditos alvarás de lei ou com força de lei.
Consoante as matérias tratadas, adquiriam uma terminologia específica.
Eram os Regimentos atinentes à organização dos tribunais ou ao estatuto dos funcionários públicos;
Eram os Forais referentes à organização dos Municípios;
Eram as Pragmáticas conexas com a reforma dos “costumes”, repressão do luxo...
Do exposto julgo ter clarificado a sua primeira dúvida.
Quanto à sua segunda interrogação, deixo-o ficar com a seguinte transcrição, da
COMPILAÇÃO SYSTEMATICA DAS LEIS EXTRAVAGANTES DE PORTUGAL, de Vicente J. Ferreira Cardozo da Costa, Lisboa, 1799, fól.s 25-26 :
« A lei em huma Monarchia, como a nossa, na qual
o PODER LEGISLATIVO RESIDE INTEIRAMENTE NA PESSOA DO REI,
pode definir-se
A VONTADE DO PRINCIPE DECLARADA A SEUS VASSALLOS
para regularem por ella as suas acções. »
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Cartas Régias, Cartas de Lei e Alvarás
Caro Confrade Eduardo Albuquerque
Muito obrigado pelos esclarecimentos que prestou. Agradeço também a sua paciência e a rapidez da resposta!
Com os melhores cumprimentos,
Nuno Maria Côrte-Real
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RE: Agradecimento
Caro confrade Eduardo Albuquerque
A minha formação jurídica vem também da escola de Coimbra e, entre outros, do saudoso Professor Guilherme Braga da Cruz, mas os anos e a minha ligação a outros ramos do Direito fizeram-me, infelizmente, esquecer a História do Direito Português.
Julgo, contudo, que só uma grande modéstia o pode levar a considerar-se apenas um curioso na matéria depois das brilhantes intervenções que teve neste tópico.
Reitero, pois, o meu aplauso e agradeço ter-me feito recordar velhos tempos.
Com os melhores cumprimentos
Maria Benedita
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RE: Uso de Armas, Dom, Morgados, Lei Mental
Cara Confrade e Ilustre Colega, Amélia Mello e Castro,
Agradecendo a sua última mensagem, venho aditar mais uns apontamentos.
Assim,
Por certo que a bastardia não era impeditiva da transmissão de direitos nobiliárquicos, mas forçoso se tornava que o dito bastardo fosse reconhecido como tal pelos seus progenitores, quer por perfilhação, quer por legitimação.
Paradigmáticos, são os casos de bastardia real, a principiar em D. Teresa, mãe do nosso primeiro rei, passando por D. Dinis, D. Pedro, D. João I, D. João V...não esquecendo D. Pedro, conde de Barcelos a quem é atribuído o célebre “ Livro de Linhagens”.
No quadro do direito ao uso de armas,
referem-nos as Ordenações Filipinas, Livro V, Título XCII, § 4:
« E para que cada hum saiba a ordem, per que deve trazer as armas, que per Direito lhe pertencem, declaramos que o Chefe de Linhagem, ( i.e. Fidalgo que descende por sua familia, em linha recta, que gosa por sua ascendencia dos fóros de Nobreza, e he o primeiro na sua família ) será obrigado trazer as armas direitas, sem differença, nem mistura de outras algumas armas.
E sendo Chefe de mais que de huma Linhagem, será obrigado trazer as armas direitas de todas aquellas Linhagens, de quarteis
(quartel uma divisão do escudo em quatro, e extensivamente qualquer divisão, ainda que este se divida em mais porções ou quarteirões ),
segundo lhe será ordenado per Portugal Rey de Armas
(Rey d’ Armas he o official publico, que tem a seu cargo escrever as genealogias dos Nobres, e suas allianças; explicar o que toca aos brasões dellas; dar cartas de brasão, etc.
Em heraldica, chama-se armas, as insignias de que usão as famílias nobres nos seus escudos para se distinguirem umas das outras.
Da mesma sorte se nomeão as dos Reys, Reinos, Cidades, Ordens Religiosas, etc.
Também se dá este nome aos signaes que se pintão no escudo, ou se abrem sendo de materia tal, como pedra, metal, etc.
Provavelmente as chamou - Portugal, porque taes Funccionarios em outros paizes tinhão os respectivos nomes.)
E os outros irmãos, e todos os outros da Linhagem as hão de trazer com a differença ordenada no nobre Officio da Armaria.
E assi poderão trazer quatro armas. Se quizerem, daquelles, de quem descenderem, esquarteladas,
( Esquarteladas, i.e. feito em esquaques.
Em heraldica, esquaques significa xadrez de côres alternadas. )
E mais não.
E se quizerem tomar somente estremes
( Estremes
Em heraldica armas estremes no brazão, significa sem mistura das de outra família )
As armas da parte de suas mães, podel-o-hão fazer
E OS BASTARDOS hão de trazer as armas com sua quebra da bastardia, segundo ordem da Armaria.
( Quebra de bastardia.
Em heraldica, no brazão a quebra significa a differença que nelle traz quem não he chefe da família, a qual he uma cotica, que atravessa o escudo em banda:
Ha tambem quebra de bastardia, que os bastardos devem trazer nos escudos.
A cotica he uma peça como a banda, porém menos larga: lança-se ao través do escudo. ) »
Do excerto legal transcrito, resulta cristalino que os bastardos podiam usar armas.
Acrescenta o dito texto legal ( Filipinas, Livro V, Título XCII, pr.):
« Como os Blasões das armas e appelidos, que se dão
ÁQUELLES, QUE PER HONROSOS FEITOS OS GANHARÃO,
sejão certos sinaes e prova de sua Nobreza e honra,
e DOS QUE DELLES DESCENDEM,
he justo que essas insignias e appellidos andem em tanta certeza, que suas FAMILIAS e nomes se não confundão com as dos outros, que não tiverem iguaes merecimentos.
E que assi como elles per serviços feitos a seus Reys, ou Republicas se assinalarão e aventajarão dos outros, assi sua preeminencia e dignidade seja a todos notória.
Polo que ordenamos, que qualquer pessoa, de qualquer qualidade e condição que seja, que novamente tomar armas, que de Direito lhe não pertenção, perca sua fazenda, ametade para quem o accusar, e a outra para os Captivos.
E mais perderá toda sua honra e privilegio de Fidalguia e linhagem, e pessoa, que tiver, e seja havido por plebêo, assi nas penas, como nos tributos e peitas, e sem nunca poder gozar de privilegio algum, nem honra, que por razão de sua linhagem, ou pessoa, ou de Direito lhe pertença. »
Deste texto legal, parece poder inculcar-se que, não obstante a atribuição intuitu persona das armas, esta insígnia estendia-se aos familiares do armigerado e aos seus descendentes.
Mas se os bastardos podiam usar armas, o mesmo já não sucedia com o DOM.
De facto, diz-nos o §7, do Título XCII, do Livro V das Ordenações:
«... E os bastardos, postoque legitimados sejão, não se poderão chamar de dom, ainda que de direito lhes pôdera pertencer, se de legítimo Matrimonio forão nascidos...»
Esta disposição viria a ser revogada pelo Alvará de 3 de Janeiro de 1611 que expressamente vem dizer:
«...Hei por bem, e mando, que daqui em diante todos os Bispos e Condes, e as mulheres e filhos de Fidalgos em meus Livros, e dos Desembargadores, e assi os filhos de Titulares,
POSTO QUE BASTARDOS SEJÃO,
que até a publicação desta nova Lei forem nascidos, possão ter Dom e usar delle...»
Quanto aos morgadios e capelas, refere o Livro IV, Título C, § pr, das Ordenações Filipinas:
« Por tirarmos as duvidas, que se movem em alguns casos sobre a successão dos Morgados, ordenamos, que na successão delles e dos bens vinculados, posto que o filho mais velho morra em vida de seu pai, ou do possuidor do Morgado, se tal filho mais velho deixar filho, ou neto, ou
DESCENDENTES LEGÍTIMOS,
estes taes descendentes per sua ordem se preferirão ao filho segundo
( Daqui se vê que o filho illegítimo de qualquer especie era insuccessível no Morgado, e nelles não se dava o direito de representação – Silva Pereira, Rep. das Ords. to. 3 nota (c) à pag. 471.)
No que concerne à sucessão de terras e bens da Coroa, verificava-se que os bastardos podiam herdar essas terras ( Filipinas, Livro II, Título XXXV, §.12 )
desde que:
« no perfilhamento per elle confirmado, expressamente fosse declarado, que as podesse herdar e haver, ou na confirmação, sem embargo do defeito de seu nascimento, e sem embargo da dita ordenação...»
Como se vê cumpria-se a velha máxima “ não há regra que não tenha a sua excepção “, máxima válida para todos os domínios, já que a vontade do monarca era soberana e ela própria era lei.
Quanto âmbito probatório, convêm não esquecer o que diz o Livro III, Título LIX das Ordenações Filipinas, onde se consagram os casos sujeitos a prova documental, por escritura pública, e os casos em que é admitida a prova testemunhal.
E em acréscimo, o que diz o Título LX , do supra dito livro, relativo à fé que se deve dar aos instrumentos públicos e a outras escrituras.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Lei Mental-Prova de Paternidade
Olá Vasco
Gostei do teu contributo.
Um abraço
Nuno
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RE: Uso de Armas, Dom, Morgados, Lei Mental
Caríssimo Colega e Ilustre Confrade:
Gostei imenso de o ler.
Parabéns pelo rigor científico da sua mensagem.
Ainda uma palavra não exactamente para contestar, de todo, até porque estou a responder imediatamente após leitura dos seus apontamentos, não tive tempo de investigar, mas para colocar três questões adicionais, que gostaria imenso tivesse a bondade de responder:
1ª Do assento legal por si invocado não extraí, decerto por não ser uma estudiosa da história do Direito, a necessidade de perfilhação ou legitimação, pensando, porventura erradamente, que, de tais actos, resulta um filho legítimo e não bastardo, ou seja, ainda que se prove inequivocamente a linha de sangue, se não se encontrar, v.g., uma Carta de Legitimação, não haverá direito a uso de armas, ainda que com as respectivas diferenças?
2ª Aliás e fazendo apelo à sua própria noção de bastardo (e, para mais, aqui até estaremos porventura em presença de um filho natural e não bastardo) que numa sua mensagem anterior nos forneceu, parece que a mesma não tem como pressuposto necessário a perfilhação ou legitimação ou estou a laborar em erro?
3ª Tanto quanto julgo saber, a prática do Conselho de Nobreza foi, no decurso de décadas, reconhecer direito de uso de brasão de armas a quem simplesmente provasse a linha de sangue, o que me diz?
Isto é, conhecendo o meu caríssimo colega a factualidade deste caso, a qual facilmente apurará pelas minhas precedentes mensagens, o que aconselharia?
Fico na expectativa da sua sempre elevada explicação, porquanto, como já tive oportunidade de apontar, nunca estudei esta temática.
Com os melhores cumprimentos e a mais elevada consideração.
Amélia
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RE: Bastardos. Perfilhação
Cara Confrade, Amélia Mello e Castro,
Dando satisfação à sua pretensão, aqui ficam estas breves notas.
Como já foi dito, a Lei Mental, inscrita no Livro II, Título XXXV, das Ordenações Filipinas, servira de arquétipo jurídico regulador da sucessão, nomeadamente da sucessão dos títulos, modelo que se manteve até à sua revogação pelo Dec. de 13 de Agosto de 1832, art.º 10.º e , formalmente, pela Lei de 22 de Junho de 1846, art.º 24.º.
Mas convirá dizer que, na prática, só excepcionalmente era aquela Lei aplicada com verdadeiro rigor, mercê da discricionaridade e frequência com que os reis concediam as almejadas dispensas.
De todo o modo, por esta Lei se constata os princípios orientadores nesta matéria para os filhos bastardos, que por clareza reproduzo:
Filipinas, L.II Tit. XXXV, § 12
« Se a dita Lei haveria lugar no filho, ou neto natural, ou spurio legitimado per auctoridade Real, ou per nomeação feita pelo pai em seu testamento, nomeando-o por filho, ou no filho perfilhado, que se chama em direito adoptivo, ou arrogado ?
A qual duvida declarou, que NÃO era sua tenção, que o filho, ou neto assi legitimado, ou perfilhado podesse herdar tal terra, ou terras da Corôa do Reino.
Salvo se na LEGITIMAÇÃO per elle feita, ou no PERFILHAMENTO per elle CONFIRMADO, expressamente fosse declarado, que as podesse herdar e haver, ou na confirmação, sem embargo do defeito de seu nascimento, e sem embargo da dita Ordenação.»
Os conceitos referidos por mim sobre as variantes do estatuto de filhos, não serão exactamente coincidentes com os da época a que nos estamos a reportar.
Veja-se os espúrios, ditos que não podem ser legitimados, e que então eram legitimados por autoridade régia;
Veja-se os legitimados, que incluem não só os que o foram por casamento subsequente dos seus progenitores, como os declarados como tal pelo rei sem se ter verificado aquele pressuposto.
Como quer que seja, bastardos eram todos os ilegítimos, pelo que os naturais não tendo nascido de progenitores unidos pelo matrimónio, condição de legitimidade, acabavam; também, por serem ilegítimos, e por isso, inclusos no conceito jurídico genérico de bastardos.
Repare-se, também, que no âmbito do conceito de perfilhação, se incluía o mero reconhecimento informal, como o da mera referência em testamento como filho.
Conceito de perfilhação que, assim, se deverá estender ao mero reconhecimento factual decorrente do mero tratamento como filho pelo seu progenitor.
Ora este último tipo de reconhecimento, necessitava, para os mais diversos efeitos, de comprovação que era dada pelo depoimento de várias testemunhas, nas inquirições de genere era habitual, como já se disse, o depoimento de DOZE TESTEMUNHAS por cada uma das freguesias da naturalidade do inquirido e seus pais.
Neste contexto, não posso deixar de pôr as seguintes interrogações:
Será natural imputar a alguém uma paternidade não havendo por parte deste declaração nesse sentido, ou seja um acto inequívoco em que a assuma – como o tratamento ou consideração em público e privado de tal - e, ou, não havendo no meio social notícia coeva que possa provar essa factualidade?
Por outro lado, impondo as Ordenações Filipinas uma estrita regulação do uso de armas e apelidos, como se verifica no Livro V, título XCII, com pesadas sanções aos prevaricadores - que iam desde a perda do estatuto de fidalgo, com perca de sua fazenda, ao degredo para África, - poder-se-á considerar natural um reconhecimento de uso de armas baseado em meros indícios, sem no mínimo haver prova testemunhal adequada?
Finalmente, cumpre dizer, que por razões deontológicas decorrentes do meu estatuto, não posso pronunciar-me sobre casos concreto.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Prova de Paternidade
Caríssimo Nuno:
Este tópico é dos que vou copiar para os meus arquivos, com tanto contributo interessante!
Só te farei a seguinte observação: relativamente aos escravos, não se tratava de usurpação ou abuso mas um costume plenamente aceite e julgo que com base legal. Se não me engano trata-se de um direito genérico dos "conversos"; pelo menos no caso dos judeus que se tornaram cristãos-novos parece-me que houve uma Lei de D. Manuel I autorizando a adopção de quaisquer apelidos portugueses por mais ilustres que fossem. Na Índia portuguesa os convertidos ao Cristianismo adoptavam os apelidos dos padrinhos de baptismo e são ainda hoje esses apelidos que usam as famílias goesas Cristãs, muitas delas sem pinga de sangue europeu (o respeito pela casta, que sobreviveu a cinco séculos de Cristianismo, não o permitiria...) - caso totalmente distinto dos luso-descendentes da Índia portuguesa que usavam apelidos dos antepassados portugueses da metrópole.
Também em Timor havia esse costume (até há poucas décadas) de passar apelidos para os afilhados recém-convertidos; parece-me que o caso dos escravos se pode enquadrar nesta prática de fundo religioso uma vez que a adopção do apelido talvez se desse no momento da conversão e baptismo, passando depois para os descendentes. Daí a naturalidade com que se encontram assentos de baptismo como um de Belmonte (estou a citar de memória) "... casaram Pedro Cabral e Maria Cabral, escravos do Senhor Pedro Álvares Cabral...".
Acho que devemos distinguir bem estes casos dos que correspondem a verdadeiras usurpações; é um assunto que acho interessantíssimo e seria bom coligir sistematicamente dados para tentarmos perceber bem qual a extensão do fenómeno. Como todos sabemos o caso português é bastante complicado pela frequência com que se recorria a apelidos de avós por diversas linhas, mesmo ocorrendo diversas quebras de varonia, legitimidade, uso do apelido, etc., pelo que só uma extensa investigação permite identificar as usupações "puras".
Um abraço,
António
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RE: Prova de Paternidade
Olá António,
Estou completamente de acordo contigo. É verdade que a adopção de nomes e apelidos portugueses por parte de escravos e conversos era uma prática absolutamente corrente e legal.
Mas a minha questão não era bem essa: procurei salientar apenas que, nos séculos XVI e XVII, o uso de um apelido não constituia necessariamente um indício forte de filiação ou descendência, tantos eram os casos de adopção (legítima que fosse) e de usurpação.
Em todo o caso, o teu texto é (como sempre sucede quando aqui escreves) super interessante, bem fundamentado e definitivamente esclarecedor quanto ao tema que focas!
Um grande abraço
Nuno
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RE: Prova de Paternidade
Caro Nuno,
Percebo a sua questão. Em qualquer caso, o António Bivar fez uma bela explanação!
Tenho uma dúvida: será que neste tópico a "legitimação régia" já foi abordada?
Um abraço
Artur
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RE: Prova de Paternidade
Caro Artur,
A questão já foi abordada neste tópico, em intervenções dos participantes Eduardo Alburquerque e Amélia Melo e Castro, salvo erro.
Um abraço,
Nuno Côrte-Real
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RE: Prova de Paternidade
Caro Nuno,
Refiro-me ao caso concreto. Haverá, algures, "uma carta de legitimação" passada ao antepassado da nossa confreira Maria Amélia? Pode-se dar, eventualmente, o caso de ela existir e ainda não ter sido encontrada.
Um abraço
Artur
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RE: Prova de Paternidade
Caro Artur,
Custa um bocadinho a acreditar que a interessada (que tanta documentação compulsou) não tivesse dado uma espreitadela aos índices das Chancelarias Régias, para ver se o nome do antepassado lá figurava... Mas enfim, pode ser que tenha razão...
Um bom Domingo para si!
Nuno Côrte-Real
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RE: Prova de Paternidade
Meu Caro Nuno:
Muito obrigado pelas tuas simpáticas palavras que melhor se aplicam às tuas intevenções, bem como às de outros participantes; infelizmente tenho andado um bocado arredado destas lides, mas quando posso procuro "pôr-me em dia".
No caso concreto aqui em discussão, e deixando de lado a polémica questão do valor a atribuir às decisões do extinto Conselho de Nobreza, eu diria que os assentos invocados pela nossa "confreira" ("consoror"? esta discussão de nomenclatura já foi matéria de outro tópico mas não foi conclusiva...) atestam o reconhecimento "público e notório" da paternidade, pois não é concebível que o "pai putativo" e respectivos familiares legítimos ignorassem o que os párocos não temiam escrever nos ditos assentos e o uso público que o presumível filho ilegítimo fazia do apelido supostamente paterno.
Estou plenamente de acordo contigo em que o simples uso do apelido não prova nada quanto à filiação, mas neste caso nem me parece que a questão se ponha, uma vez que o reconhecimento de filiação por parte da autoridade religiosa é só por si indício muito mais forte que o próprio uso do nome, que pouco acrescenta, de facto, ao argumento favorável à filiação constituído pelos próprios assentos. Todos conhecemos casos de filhos ilegítimos, com a filiação indicada em assentos paroquiais, que nem sequer usavam o apelido paterno.
A propósito deste assunto encontrei algures num livro de assentos paroquiais uma ordem de um visitador que proibia o pároco de indicar a filiação dos filhos de mãe solteira quando aquela fosse apenas indicada pela mãe; fiquei convencido de que esta ordem teria correspondido a uma directiva superior baseada em legislação existente mas que seria sistematicamante desrespeitada. Tentava-se evitar concerteza dissabores aos párocos e à Igreja em geral pelos eventuais protestos dos visados pelas declarações maternas...
Em resumo, independente do valor probatório legal destes assentos (que segundo depreendo das interessantísimas intervenções deste tópico deve ser quase nulo), parecem-me indícios fortíssimos não exactamente de uma certeza biológica de filiação (essa só Deus Nosso Senhor está em condições de assegurar, já que mesmo os testes de ADN ficam aquém, ainda que nuito pouco, dos 100% de certeza), mas pelo menos de uma forte plausibilidade histórica (tanto quanto é possível) da aceitação pública da filiação por parte do Pai indicado e respectivos familiares legítimos.
O uso que o dito filho poderia fazer desse "reconhecimento" para efeitos nobiliárquicos é muito incerto, mas não me parece que tivesse grandes problemas se usasse das armas do seu presumido Pai; já ouvi opiniões abalizadas segundo as quais era legal o usos de armas (sem diferença pessoal), mesmo sem prévia obtenção de carta de armas, por qualquer pessoa que a elas tivesse direito por descender da família respectiva (incluindo, é claro, a hipótese de bastardia que estava prevista no regimento da armaria), desde que além disso tivesse nobreza pessoal e os demais requisitos que lhe permitissem o uso de armas. Estava era sujeita a ter de provar esse direito se para tal fosse instado pelas autoridades ou por motivo de qualquer acção que lhe fosse movida por alguém que o acusasse de uso indevido. Nesse caso teria de provar as ligações genealógicas que lhe dariam direito a esse uso, pesumo que pelos mesmos processos testemunhais que se usavam nas justificações de nobreza; um filho bastardo não legitimado deveria assim ter alguma confiança na possibilidade de obter essa prova (ou no laxismo das autoridades..) para usar das armas do que supunha seu Pai sem temer os rigores da justiça.
Um agrande abraço,
António
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RE: Conceito de Público
Meu Caro António Bivar,
Foi com o maior interesse que segui esta sua mensagem, interesse decorrente da sua habitual e sempre lúcida intervenção.
Não obstante, tinha e tenho como “ público e notório”, o facto de uma dada situação ser do conhecimento público, conhecimento imprescindível para certo tipo de casos que só são passíveis de definição com a PRESENÇA ou INTERVENÇÃO do público.
Entre essas situações estava a POSSE DE ESTADO que se impunha a um filho ilegítimo que pretendesse ser reconhecido, e que se traduzia no RECONHECIMENTO deste PELO PÚBLICO como filho de determinada pessoa.
Conceito de público que podia ser tomado em vários sentidos.
Desde logo, compreendendo todos os que não fossem os investigados pai e filho, ou elementos da sua família, por óbvias razões de suspeita.
Depois todos os residentes numa certa freguesia...
e no caso em apreço,
somente aquelas pessoas que , para além do conhecimento dos investigados, tiveram de forma directa conhecimento da factualidade circunstancial atinente à vida íntima destes, nomeadamente e a título de exemplo, das relações amorosas dos pais, da sua duração, do nascimento do filho, das revelações de paternidade feitas, considerando-se, para o efeito, os amigos íntimos, os criados, os vizinhos, parentes...
Como já foi realçado por outros ilustres intervenientes, neste tipo de registo, não é o pároco que declara que A é filho de B e C.
O que o pároco faz é declarar, sem mais, que X deu como pai do baptizado Y, e não que é seu filho, o que é totalmente diferente dos registos normais.
Ora, nestes casos de dúvida, - e digo de duvida porque senão o pároco era peremptório em dizer que Y é filho de Z, - os registos paroquiais não me parece que fossem tidos, por si só, como suficientes, como o atesta os diversos actos de inquirição em que se solicitava abundante depoimento testemunhal.
Se o fossem, então para quê o depoimento de tanta testemunha?
Não seria suficiente juntar os extractos de todas as certidões?
Acresce referir que os registos paroquiais não estariam ao alcance de qualquer um e que
o analfabetismo era reinante.
E muitas vezes sucedia que o pretenso pai era de freguesia diversa e bem distante da do suposto filho, relembre-se o caso dos militares...
E outros terá havido em que a própria mãe teria dificuldade em determinar o suposto pai, caso de violações sucessivas em tempo de guerra, ou de invasões...
Por certo, como já ficou dito, que a referida menção, na época em questão, é reveladora de indícios muito fortes, mas não passa disso mesmo meros indícios, pelo que, sem prova adequada, as suspeitas e duvidas persistem.
A título de curiosidade, e no quadro processual, note-se, transcrevo das Ordenações Filipinas, Livro V, Título LIV, o seguinte excerto:
« A pessoa que testemunhar falso, em qualquer caso que seja, morra por isso morte natural, e perca todos seus bens para a Corôa de nossos Reynos.
E essa mesma pena haverá o que induzir e corromper alguma testemunha, fazendo-lhe testemunhar falso em feito crime de morte, ora seja para absolver, ou para condenar.
Porém, se for para absolver, não se fará nelle execução, até nol-o fazerem saber, declarando-nos as causas por que foi movido a tal fazer.
E se for em outros crimes, que não sejão de morte, e assi nos civeis, será degradado pera sempre para o Brasil, e perderá sua fazenda, se descendentes, ou ascendentes legítimos não tiver.
E, em cada hum destes casos não poderá a parte haver perdão de Nós:
e se o houver, mandamos que lhe não seja guardado, porque o havemos por subrepticio.»
Por isso ter dito noutra mensagem, que não seria muito fácil mentir...
Finalmente, no contexto do uso do termo CONFRADE, por rejeitar nesta matéria uma certa ortodoxia dominante, por considerar que a linguagem como expressão do pensamento, não é estática, mas dinâmica, e daí a sua riqueza, pessoalmente prefiro o termo Confrade quer para os indivíduos do sexo feminino quer do masculino, pretendendo com isso realçar a ideia de fraternidade, de comunhão, de partilha, a que anteponho o artigo o ou a para marcar a diferença, do que usar o termo CONFRADA, dado como feminino de confrade já pelo Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da coordenação de José Pedro Machado, tomo III, pág. 375, já pela Grande Enciclopédia Portuguesa Brasileira, tomo 7, pág.419, não rejeitando, contudo, qualquer outra forma empregue por qualquer outro ilustre confrade.
Apresentando os meus melhores cumprimentos, subscrevo-me com a mais elevada estima e consideração pessoal,
Eduardo Albuquerque
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RE: Conceito de Público
Meu Caro Eduardo Albuquerque:
Muito obrigado pela sua intervenção que, como sempre, vem enriquecer ainda mais este tópico que já contém um manancial inestimável de dados históricos e jurídicos (em grande parte pela sua anterior participação).
Relativamente ao caso em apreço, quando eu referia o carácter "público e notório" da filiação não me atinha apenas ao assento de baptismo, mas sobretudo ao de casamento e baptismo dos filhos, em que a filiação, segundo fomos informados, é referida pelos párocos sem que atribuam a afirmação a outrém. Ficamos assim esclarecidos de que décadas depois do nascimento do filho ilegítimo os párocos não têm pejo em confirmar a filiação que tinha sido dada pela Mãe da criança, sendo o suposto Pai além disso pessoa influente no meio, e tendo residido a escassos quilómetros do local onde todos estes actos são registados.
Dito isto, qualquer justificação de nobreza, habilitação para ordens ou leitura de bacharéis, não dispensaria a audição de testemunhas que confirmassem as filiações, mas, em rigor, também estas não eram dispensadas nos casos de filiações perfeitamente legítimas... Parece que, portanto, os assentos paroquiais não constituiam só por si documentos suficientes para provar filiações, mesmo nos casos correntes, nunca dispensando a audição de testemunhas, ao contrário do que hoje sucede com o registo civil.
Quanto ao feminino do termo "confrade" confesso que nenhuma das soluções me agrada inteiramente. Segundo me informaram, "confreira" é utilizado na Ordem de Malta; fico agora a saber que "confrada" consta de obras de referência. Ambas me soam mal, talvez porque "freira" tem mais conotação estritamente religiosa que "frade" devido ao uso corrente de derivados de "frater" (palavras como "fraternal", "fraterno", etc. que não têm correspondentes próximos de "freira"); quanto a "confrada" parece-me excessivamente "bárbaro", uma vez que "frater" era exclusivamente masculino em latim, com feminino "soror". É por essa razão que prefiro "consoror" a qualquer das alternativas anteriores, mas estou de acordo consigo em que, num caso como este, é talvez preferível não introduzir neologismos pouco correntes e atermo-nos ao uso de "confrade" indistintamente para ambos os sexos; confesso, no entanto, que nunca o farei de consciência etimológica completamente tranquila...
Um abraço,
António Bivar
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RE: Conceito de Público
Meu Caro Eduardo Albuquerque:
Muito obrigado pela sua intervenção que, como sempre, vem enriquecer ainda mais este tópico que já contém um manancial inestimável de dados históricos e jurídicos (em grande parte pela sua anterior participação).
Relativamente ao caso em apreço, quando eu referia o carácter "público e notório" da filiação não me atinha apenas ao assento de baptismo, mas sobretudo ao de casamento e baptismo dos filhos, em que a filiação, segundo fomos informados, é referida pelos párocos sem que atribuam a afirmação a outrém. Ficamos assim esclarecidos de que décadas depois do nascimento do filho ilegítimo os párocos não têm pejo em confirmar a filiação que tinha sido dada pela Mãe da criança, sendo o suposto Pai além disso pessoa influente no meio, e tendo residido a escassos quilómetros do local onde todos estes actos são registados.
Dito isto, qualquer justificação de nobreza, habilitação para ordens ou leitura de bacharéis, não dispensaria a audição de testemunhas que confirmassem as filiações, mas, em rigor, também estas não eram dispensadas nos casos de filiações perfeitamente legítimas... Parece que, portanto, os assentos paroquiais não constituiam só por si documentos suficientes para provar filiações, mesmo nos casos correntes, nunca dispensando a audição de testemunhas, ao contrário do que hoje sucede com o registo civil.
Quanto ao feminino do termo "confrade" confesso que nenhuma das soluções me agrada inteiramente. Segundo me informaram, "confreira" é utilizado na Ordem de Malta; fico agora a saber que "confrada" consta de obras de referência. Ambas me soam mal, talvez porque "freira" tem mais conotação estritamente religiosa que "frade" devido ao uso corrente de derivados de "frater" (palavras como "fraternal", "fraterno", etc. que não têm correspondentes próximos de "freira"); quanto a "confrada" parece-me excessivamente "bárbaro", uma vez que "frater" era exclusivamente masculino em latim, com feminino "soror". É por essa razão que prefiro "consoror" a qualquer das alternativas anteriores, mas estou de acordo consigo em que, num caso como este, é talvez preferível não introduzir neologismos pouco correntes e atermo-nos ao uso de "confrade" indistintamente para ambos os sexos; confesso, no entanto, que nunca o farei de consciência etimológica completamente tranquila...
Um abraço,
António Bivar
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RE: Prova de Paternidade
Meu caro António,
A tua intervenção é bastante extensa e rica de problemas. Neste momento, porém, gostava de centrar-me apenas num aspecto.
A dado passo afirmas: "era legal o uso de armas (sem diferença pessoal), mesmo sem prévia obtenção de carta de armas, por qualquer pessoa que a elas tivesse direito por descender da respectiva família (...) desde que além disso tivesse NOBREZA PESSOAL e os demais requisitos que lhe permitissem o uso de armas".
Sublinhei a expresão "nobreza pessoal" porque, em minha opinião, não era só disso que se tratava. Não bastava ter nobreza civil (e descender vagamente dum tronco heráldico) para se poder usar armas. Segundo o Regimento de Armaria de D.Manuel e, sobretudo, as Ordenações Filipinas, em Portugal as armas e brasões eram insígnias, "prova e signais certos" da NOBREZA DE LINHAGEM (i.e. hereditária).
Por essa razão, os processos judiciais instruídos nos seculos XVII, XVIII e princípios do XIX para a confirmação do direito a armas de família estabeleciam a nobreza de pais e avós (com recurso a inúmeras testemunhas) e não meramente a nobreza pessoal do impetrante. Caso contrário, bastaria provar o exercício de algum cargo que conferisse nobreza pessoal, dispensando-se a mais complicada prova de nobreza pelos quatro avós.
Assim, quando o aspirante a armas de sucessão obtinha a Carta Régia de Sentença de Justificação de Nobreza, via confirmada pela Corôa a sua nobreza de linhagem, de que o escudo consignado na Carta de Brasão era a expressão visível e simbólica.
Em conclusão: sendo as armas de família insignias de nobreza de linhagem e de fidalguia, estavam vedadas a quem não possuísse notoriamente, ou demonstrasse possuir em juízo, tal estatuto. A nobreza pessoal não bastava, mesmo que se descendesse remotamente de algum tronco heráldico.
Por isso, as nossas Cartas de Armas de Sucessão devem ser consideradas o equivalente nacional das "Cartas Ejecutorias de Hidalguia espanholas" e das "Lettres de Maintenue de Noblesse" francesas, sendo todas elas confirmações régias de nobreza hereditária, muitas vezes com origem obscura e indeterminada, mas dada como provada a partir do momento da sua expedição.
Um abraço,
Nuno
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RE: Tutela jurídica do apelido
Meu Caro António Bivar,
Em testemunho do aduzido por si, a propósito do uso dos apelidos, e em complemento das transcrições já efectuadas, no âmbito da tutela do uso de armas e apelidos,
( cfr. Filipinas, Livro V, Título XCII, pr. )
aqui fica mais este excerto.
Assim, das Ordenações Filipinas, Livro V, Título XCII, § 9. transcrevo:
« E nenhuma pessoa tome appelido de Fidalgo de Solar conhecido, que tenha terras com jurisdição em nossos Reinos, não lhe pertencendo, nem vindo de tal Linhagem, postoque seus pais assi se chamassem, se na verdade lhes não pertencia.
E quem o fizer, perderá a fazenda, ametade para quem o accusar, e a outra para os Captivos, e perderá todo o privilegio, que per sua Linhagem e pessoa tiver, e ficará plebêo.
Porém os que novamente se converterem à nossa Sancta Fé, poderão tomar e ter em suas vidas, e traspassar a seus filhos sómente, os appellidos de quaesquer Linhagens, que quizerem, sem pena alguma.»
Deste texto legal ressalta claro que os cristãos novos podiam usar qualquer apelido.
É esta disposição, reprodução do § 13, Título XXXVII, do Livro II das Ordenações Manuelinas, de 31 de Março de 1520.
Retribuindo o seu estimado abraço,
Eduardo Albuquerque
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RE: Prova de Paternidade
Meu Caro Nuno,
Estou plenamente de acordo com o que dizes e fazes uma exposição claríssima do que se requeria para o uso legal de armas, mas repara que não é contraditório com a minha afirmação, uma vez que acrescentei "e os demais requisitos que lhe permitissem o uso de armas"; de facto, não estava a tentar ser exaustivo ao enumerar esses requisitos e "defendi-me" com esse acrescento genérico, porque queria acentuar sobretudo a questão da legalidade (ou não...) do uso de armas mesmo por quem não tivesse obtido previamente uma carta de armas.
Pensei durante muito tempo que o uso de armas em Portugal, mais ou menos desde a Idade Moderna, obrigasse legalmente à obtenção prévia de carta de armas de sucessão ou mercê nova, apesar de ter consciência plena de que a prática corrente não era essa, sobretudo na Alta Nobreza, onde as cartas de armas foram quase inexistentes e o uso de armas geral. No entanto, foi-me dito por heraldistas que muito considero, que a obrigação legal de requerer carta de armas só existiria para o uso de diferença heráldica pessoal; ou seja, o uso de armas sem diferença não constituiria infracção à Lei (mesmo sem existência de carta de armas) desde que se estivesse preparado para provar a posteriori (caso para tal se fosse instado) que se estava nas condições legais, no fundo como tinham de fazer a priori os que requeriam carta de armas de sucessão.
Omiti os restantes "requisitos" porque não estava bem seguro de quais bastassem, para além da nobreza pessoal, de ascendentes, e a "prova" de ligação genealógica aos troncos das linhagens de que se pretendia usar as armas; por exemplo: teoricamente não seria até necessário provar que a sucessão das armas pelas linha ou linhas invocadas nunca tinha sido interrompida por alguma derrogação de nobreza? Não estou a falar, é claro, do que sabemos ser a realidade dos processos de justificação de nobreza (conheço muitos exemplos concretos, mesmo em ascendentes meus, em que com facilidade se "provava" tudo o que era requerido, mesmo a nobreza de avós que noutros contextos tinham obrigado ou viriam a obrigar a dispensa de El Rei...). Estava só a tentar agora perceber quais seriam todos os requisitos legais teóricos, que eu omiti de propósito (em parte por pura ignorância!).
No que toca à questão da nobreza dos quatro avós também tenho a seguinte dúvida: se era admitido o uso de armas de sucessão a bastardos, seria indispensável provar a nobreza, por exemplo, da Mãe e avós maternos (presumindo que as armas vinham pelo Pai natural)? No caso das leituras de bacharéis e habilitações para as ordens conheço a legislação que explicita a necessidade da nobreza do próprio e de todos os ascendentes até avós (caso contrário seria necessário dispensa real), mas nas justificações de nobreza para obtenção de carta de armas e, mais geralmente, para o uso simples de armas de sucessão, confesso que não estou seguro de quais eram exacta e exaustivamente os requisitos e onde se encontra a legislação que os estabelece inequivocamente.
Um abraço,
António
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Representação genealógica
Meu Caro Vasco:
Estou de acordo com o Manuel Abranches de Soveral em que a "representação genealógica" (e também a "representação da varonia") são conceitos instrumentais cuja origem exacta talvez seja difícil de estabelecer mas que não me repugna atribuir "aos genealogistas"; em qualquer caso, só por si não têm, de facto, significado legal, uma vez que a sucessão dos diversos tipos de bens e mercês obedecia a regras diferenciadas, alguns só passando para descendentes por varonia legítima (como por exemplos os foros da Casa Real, os títulos de Dom dos homens e os bens da coroa que não tivessem dispensa da Lei Mental).
A noção de "representante genealógico" tem utilidade, por exemplo, para referir de maneira rápida a pessoa que se encontraria na posição de herdar um vínculo de sucessão regular, caso não perdesse esse direito por qualquer motivo impeditivo de natureza não-genealógica; o mesmo se pode dizer relativamente à própria sucessão da Corôa ou dos títulos de juro e herdade com dispensas da Lei mental, até se esgotarem essas dispensas. Todas essas sucessões passavam pelos "representantes genealógicos" sucessivos, com as ressalvas conhecidas em cada caso (na sucessão da coroa o casamento "adequado" da eventual herdeira, por exemplo, ou a nacionalidade do herdeiro, fosse ele homem ou mulher).
Sendo assim, tanto o conceito de "representante genealógico" como o de "varonia" podem ter utilidade na compreeensão de alguns regimes sucessórios tradicionais portugueses; o conceito de "representante da varonia" encontro-o pelo menos na sucessão do ducado de Aveiro, que em princípio não deveria ter saído da varonia legítima do senhor D. Jorge enquanto esta existisse, disposição que não foi cumprida, uma vez que saiu dela há muitos séculos, quando a varonia se manteve até hoje (ainda que esteja agora prestes a extinguir-se..).
Confesso que não conheço mais nenhum caso em Portugal em que alguma sucessão passasse exactamente pelos representantes da varonia (excluindo alguns eventuais vínculos de sucessão não regular, até à extinção promulgada no tempo do Marquês de Pombal); de facto, os casos atrás citados dos foros da Casa Real e dos bens da Coroa tinha um regime mais restrito, uma vez que não só excluiam as senhoras como também os colaterais mesmo que fossem varões e descendentes por varonia legítima do primeiro detentor (e portanto, mesmo que fossem representantes da respectiva varonia). Por outro lado o "Dom" dos homens tinha um regime mais alargado, uma vez que passava para todos os descendentes por varonia legítima, fossem ou não "representantes".
Já não consigo acompanhar M.A.S. quando aponta 1641 como o ano decisivo para a introdução do regime das sucessões não excluindo as senhoras. Com efeito encontro as senhoras a herdar preterindo os tios varões ao longo de toda a Idade Média Europeia em imensos países, mesmo, até certa altura, na sálica França, onde ironicamente o próprio apelido Bourbon hoje usado pelos primogénitos dos Capetos lhes veio por antiquíssima sucessão feminina...
Também concordo em reconhecer a estranheza das situações em que os representantes genealógicos determinados por puro "raciocínio matemático" nem sequer têm consciência do facto, mas há que concordar que o regime de sucessão dos vínculos, enquanto esteve em vigor, favoreceu a herança pelos "representantes genealógicos" dos tais "bens e direitos mais emblemáticos", em detrimento de parentes que mantinham a varonia eventualmente perdida na "chefia". Mesmo depois da extinção dos vínculos alguns bens simbólicos continuaram a ser transmitidos pelo anterior regime vincular mantendo em alguns casos a consciência de algumas destas "representações" desligadas da varonia.
Quanto à noção de "chefia do nome e armas" gostaria de saber com rigor que parte tem de fundamento legal; parece-me que a chefia das armas deve estar esclarecida algures, uma vez que tem consequências heráldicas "dramáticas". Se for o que geralmente se diz, também passaria basicamente pelos "representantes genealógicos", mas é assunto que gostaria de ver esclarecido com rigor. A chefia "do nome" siceramente, a menos que seja sinónimo da "das armas", não sei que relevância legal teria... É certo que em muitas famílias se manteve a tradição de identificar o respectivo "chefe do nome", mesmo quando tivesse perdido a varonia (conheço Almadas, mesmo Senhoras, que me disseram saber muito bem que o "chefe dos Almadas" era o Conde de Povolide, de apelido "da Silva Telo de Noronha", para citar só um dos muitos exemplos conhecidos).
Quanto à questão da legalidade do uso de armas, mesmo sem confirmação expressa e pessoal do Rei, tenho as dúvidas que deixei expressas nas respostas ao Nuno. Em contrapartida também tenho dúvidas de que o herdeiro (mesmo varão legítimo) de um FCA pudesse legalmente usar da diferença atribuída Pai em CA sem ter ele próprio carta que lha atribuísse...
Um abraço,
António
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RE: Tutela jurídica do apelido
Meu Caro Eduardo Albuquerque:
Muito obrigado por mais esta contribuição rigorosa para este tópico. Talvez possamos então deduzir que os casos dos cristãos-novos, escravos e famílias goesas católicas se podem todos fundamentar neste mesmo título das ordenações filipinas. O que fica por determinar é a extensão das infracções a esta Lei inequívoca e qual a influência real que estas infracções tiveram na onomástica portuguesa. Não deixa de ser indicativo de que apesar de tudo não seria de ânimo completamente leve que se usurpava um apelido qualquer... ou, por outro lado, o próprio texto da Lei deixa entrever uma realidade anterior de alguma anarquia a que se pretendia por cobro.
Mais um abraço,
António
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RE: Prova de Paternidade
Meu caro António,
Que o direito a brazão de armas era em Portugal, pelo menos a partir do sec. XVI, uma prerrogativa exclusiva da nobreza hereditária parece-me incontroverso. Este princípio está consagrado, desde logo, em dois textos jurídicos fundamentais:
ORDENAÇÕES MANUELINAS (1520)
Segundo Livro, Título XXXVII - "Da pena que averam os que trouxerem as armas, que lhe nam pertencem"
"Esguardando nós quanto com razam he e deve seer estimada a nobreza, fidalguia das pessoas (...) e assi como as armas dos Nobres e Fidalguos de Nossos Reynos devem andar em toda certidam, por serem sinaes de sua nobreza e linhagem..."
(Aqui está: as armas como insignias de nobreza da linhagem, i.e. de nobreza hereditária)
ORDENAÇÕES FILIPINAS (1603)
Quinto Livros, Título XCII - "Dos que tomam insignias de armas, e dom, ou appellidos que lhes não pertencem"
"Como os Blazões das armas e apelidos que se dão àqueles, que per honrosos feitos os ganharam, sejam certos sinais e prova de sua nobreza e honra e dos que delles descendem..."
(Ou seja:as armas como prova de nobreza transmissível)
Para além das Ordenações, muita outra documentação poderia ser citada para tornar claro que no nosso país as armas eram, pelo menos desde o século XVI, juridicamente indissociáveis da nobreza de sangue. Deste modo, a nobreza que tinha que se provar para sustentar direitos heráldicos era, necessáriamente, a nobreza hereditária.
Relativamente a outros assuntos bem interessantes que suscitas, proponho que continuemos a debatê-los por partes, para não me alongar mais nesta mensagem.
Um grande abraço!
Nuno
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RE: Abuso de poder paternal
Caros Confrades
Um pai ou uma mãe, ou ambos ( genro ou nora; filho ou filha) poderão, se assim o entenderem e quiserem, proibir a sogra ou o sogro ou ambos; ou o pai ou a mãe ou ambos, conforme se trate de avós paternos ou maternos que estes possam ver os netos ?
É uma informação sobre um direito familiar que penso poder enquadrar-se aqui no tópico.
Gostaria de saber se o nosso ordenamento jurídico contempla a obrigação dos pais ( aliàs, é um dever natural )permitirem que os avós possam conviver com os netos, como um direito que aos avós pertence; caso o proibissem por imbirração, ou viessem a proibir por outro motivo de incompatibilidade familiar,por exemplo.
Agradeço desde já, com os meus melhores cumprimentos.
Rafael Carvalho
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RE: Prova de Paternidade
ola Vasco
Hoje cheguei a casa tardíssimo e só então vi a tua mensagem. Amanhã tenho uma missa obrigatória, ao fim da tarde, com as Crianças.
De qualquer maneira, temos de combinar, num dos próximos dias, uma bela sessão de conversa sobre estes assuntos...
Um abraço,
Nuno
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RE: Abuso de poder paternal
Caro Rafael Carvalho,
Sobre a questão levantada, diz o artigo 1887.º - A, do actual Código Civil:
« Os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com irmãos e ascendentes »
Preceito aditado pelo art.º 1.º da Lei n.º 84 / 95, de 31 de Agosto.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Baptismo de escravos
Meu Caro António Bivar,
Em aditamento à minha mensagem anterior, aqui registo mais uma passagem das Ordenações, atinente ao baptismo de escravos, que fundamenta a sua asserção.
Ordenações Filipinas, Livro V, Título XCIX, - originário das Ordenações Manuelinas Livro V, Título XCIX:
« Mandamos que qualquer pessoa, de qualquer stado e condição que seja, que scravos de Guiné tiver, os faça baptizar, e fazer Christãos do dia, que a seu poder vierem, até seis mezes, sob pena de os perder para quem os demandar.
E se algum dos ditos scravos, que passe de idade de dez annos, se não quizer tornar Christão, sendo per seu senhor requerido, faça-o seu senhor saber ao Prior ou Cura da Igreja, em cuja Freguezia viver, perante o qual fará ir o dito scravo;
E se elle, sendo pelo Prior e Cura amoestado, e requerido per seu senhor perante testemunhas, não quizer ser baptizado, não incorrerá o Senhor em dita pena.
1. E sendo os scravos em idade de dez annos, ou de menos, em toda a maneira os fação baptizar até hum mez do dia, que stiverem em posse delles: porque nestes não he necessario sperar seu consentimento.
2. E as crianças, que em nossos Reinos e Senhorios nascerem das scravas, que das partes da Guiné vierem, seus senhores as fação baptizar aos tempos, que os filhos das Christãs naturaes do reino se devem e costumão baptizar, sob ditas penas. »
Como curiosidade, registo aqui a seguinte nota:
« O Alv. de 3 de Agosto de 1708 determinou que ninguem tirasse aos Ingleses seus filhos para baptisar contra sua vontade, salvo sendo de idade em que podessem escolher Religião, que era aos sete annos. »
Renovados cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Abuso de poder paternal
Caro Eduardo Albuquerque
O meu muito obrigado.
Com os meus melhores cumprimentos, digne-se aceitar a minha mais elevada consideração.
Rafael Carvalho
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RE: Prova de Paternidade
Meu caro Nuno:
O que dizes é indiscutível, mas na questão que pus pretendia que fossem esclarecidas as condições em que seria legal usar armas sem carta de armas. É claro que quem o pudesse fazer teria de ter a nobreza de linhagem requerida pelas ordenações mas a questão está em saber se essa “nobreza de linhagem” precisava de ser provada “a priori” ou não e em que condições.
A expressão “nobreza hereditária ” ou “transmissível” seria um bom tema de debate; escrevi alguns comentários a esse propósito num texto que escrevi para o Francisco Vasconcelos a propósito do livro dele e na altura pus-me a pensar acerca do assunto... Tenho visto usar a expressão de um modo que considero muito apropriado e feliz, não só nessa obra como, entre outros casos e sobretudo, nos belos trabalhos do teu irmão Miguel que considero pioneiros em imensas questões relacionadas com genealogia, nobiliarquia, etc. Tratando-se, nesse caso, de conceitos instrumentais e rigorosamente definidos nas obras em questão, o respectivo uso não deixa margem para dúvidas, sendo de grande utilidade para uma sistematização dos dados e uma análise histórica dos fenómenos abordados.
No entanto, as expressões como tal não aparecem na legislação; os modos legais de transmissão de mercês, características e direitos nobiliárquicos ou afins (títulos, tratamentos, armas, etc.) fazem apelo em cada caso a diferentes qualidades que tanto quanto me pude aperceber nunca se podem reduzir à “nobreza” sem mais. Acho que o Vasco pôs o dedo na ferida numa mensagem que me dirigiu neste tópico em que transcreveu uma frase do livro do Miguel que reconhecia a inexistência de um “corpus” de toda a legislação relevante, bem como de trabalhos suficientemente fundamentados para tornar indiscutíveis as teses acerca dos modos legais de transmissão da nobreza enquanto tal.
Apetecia-me parafrasear S. Tomás de Aquino que (se não me engano) começava a Summa Theologica de uma maneira “provocatória” com a pergunta e resposta: “Deus an sit? Videtur quod non!” (Será que existe Deus? parece que não!). Poderíamos começar o debate com “Será que existia nobreza hereditária? parece que não!”; da mesma maneira que S. Tomás não estava a tentar propagar o ateísmo, não seria minha intenção destruir as bases da nobiliarquia portuguesa, mas talvez fosse útil começar por alinhar os argumentos favoráveis à não transmissibilidade da nobreza enquanto tal (por oposição à transmissibilidade de características nobiliárquicas, com variados modos de transmissão conforme o caso). Para não tornar esta mensagem infinita e ainda mais maçadora fica só o argumento (contra o qual também tenho algumas respostas...) de que a nobreza em qualquer caso não dispensava o modo de vida nobre, o qual é por natureza intransmissível (ainda que, evidentemente, se possam transmitir condições favoráveis a esse modo de vida).
Mais um grande abraço,
António
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RE: Prova de Paternidade
Caro António,
Tentando responder sucintamente apenas a algumas das muitas e desafiantes questões que colocas:
1º - "Em que condições seria legal usar armas sem carta de armas?"
Quando se possuisse nobreza de linhagem ou fidalguia e, simultaneamente, se descendesse dum tronco heráldico oficial ou de alguém que tivesse tido carta de armas.
2º - "Será que existia nobreza hereditária?"
Bom, se nos colocarmos no terreno do puro exercício filósófico podemos duvidar de tudo. Mas instalados no terreno mais comezinho do direito e da história parece óbvio que sim: os conceitos de "fidalguia", de "nobreza de geração" e de "linhagem nobre", todos eles abundantemente patentes no "corpus" legislativo e na jurisprudência da antiga monarquia portuguesa, remetem para a noção de nobreza hereditária ou transmissível pelo sangue. A exigência do modo de vida nobre não anula essa transmissibilidade, apenas significa que esta não era incondicional. Daí a figura da derrogação.
Um abraço do teu velho amigo,
Nuno
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RE: Uso de Armas, Dom, Morgados, Lei Mental
Cara Amélia Mello e Castro
Perdoe a possível impertinência da pergunta.
Mas considerando o seu apelido, bem como o seu estilo de exposição, claro, directo, preciso, e revelador de fina educação, fez-me lembrar o Dr. José Guilherme de Mello e Castro, distintíssimo dirigente político no anterior regímen, antigo Presidente da Assembleia Nacional, verdadeiro “pai” da Ala Liberal, no princípio da chamada “Primavera Marcelista”.
Consultada a BD deste Genea, nada encontrei sobro Dr. José Guilherme, que sei pertencer a uma antiga e distinta família da Beira, de óptima formação nos mais elevados princípios.
Tem por acaso algum parentesco com a personalidade evocada?
Cumprimentos,
M. Magalhães
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RE: Prova de Paternidade
Caro Nuno:
Mais uma vez estou de acordo contigo, mas, para continuar a ser "chato", quanto ao primeiro problema continua de pé a questão de saber em que condições se podia dispensar a prova "a priori" da posse da nobreza de linhagem ou fidalguia (incluindo a ligação genealógica adequada). Essa prova, nos termos da Lei e pelos processos nela previstos (com todos os defeitos que se possam reconhecer à maneira como a Lei foi aplicada), era indispensável para a obtenção de carta de armas, mas, segundo alguns, dispensava-se como formalidade "a priori" para o uso simples de armas sem diferença, ficando-se embora sujeito a ter eventualmente de fazê-la "a posteriori". Seria mesmo assim?
Quanto à segunda (que acaba por se ligar à primeira...), era mesmo uma pergunta retórica "ao gosto escolástico", mas parece-me ser verdade que, enquanto o modo de transmissão de diversos atributos de índole nobiliárquica está explicitado na Lei, a transmissão da "nobreza sem mais" é difícil de localizar na legislação, o que explica a frase do Miguel que o Vasco citou e as controvérsias que o assunto ainda pode suscitar. Se não me engano, a questão deu trabalho à jusrisprudência do século XIX por causa da disposição legal que impedia os filhos bastardos dos "nobres" (e não os dos "plebeus") de se habilitarem a parte da herança paterna... Os ditos bastardos lutavam por provar o carácter plebeu dos pais ao contrário dos legítimos meios-irmãos. E neste caso a questão até poderia ser mais simples, uma vez que não se falava em nobreza transmissível ou hereditária, o que aliás levou os tribunais a optar muitas vezes pela simples interpretação que se ficava pela investigação da nobreza civil; a questão que nos ocupa só se terá posto quando se procurou interpretar a "nobreza", como sendo alguma forma de "fidalguia de linhagem" (acho que a Lei em questão vinha das antigas ordenações e se não me engano utilizaria originariamente a designação genérica de "fidalgo"; terão sido alguns tribunais a interpretar latamente - e sem dúvida abusivamente - este termo como sendo sinónimo de "nobre", pelo que a interpretação mais estrita e mais ligada ao "nosso problema" até talvez fosse a mais correcta).
Enfim, acho que ainda temos aqui "pano para mangas"... Ainda bem, porque aqui está um bom pretexto para continuarmos a conversar! temos de combinar qualquer dia uma tertúlia menos digital!
Um abraço,
António
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RE: Bastardos, sucessão de plebeus e nobres
Caros Confrades,
Em aditamento às minhas precedentes mensagens aqui ficam mais umas notas.
Sucessão de plebeus ilegítimos.
Diz o Livro IV, Título XCII, pr, com origem nas Manuelinas Livro IV, Tít. LXXI, pr:
« De como o filho do peão ( peão i.e., o homem a pé, plebeu, que não era nobre ou cavalleiro. ), succede a seu pai
Se algum homem houver ajuntamento com alguma mulher solteira, ou tiver huma só manceba ( concubina ), não havendo entre elles parentesco, ou impedimento, por que não possam ambos casar, havendo de cada huma dellas filhos, os taes filhos são havidos por naturaes.
E se o pai for peão, succeder-lhe-hão e virão à sua herança igualmente com os filhos legítimos, se os o pai tiver.
E não havendo filhos legítimos, herdarão os naturaes todos os bens e herança de seu pai, salvo a terça, se a o pai tomar, da qual poderá dispor, como lhe aprouver.
E isto mesmo havera lugar no filho, que o homem solteiro peão houver de alguma scrava sua, ou alheia, se por morte de seu pai ficar forro.»
Sucessão de nobres ilegítimos:
«1.E se ao tempo, que taes filhos nascerem, o pai, for Cavalleiro, ou Scudeiro ou de semelhante condição, que costume andar a cavallo, não sendo o que assi costuma andar a cavallo, Official mechanico, nem havido e tratado por peão,
não herdarão os taes filhos sua herança, nem entrarão à partilha com os filhos legítimos nem com outros legítimos ascendentes.
E não tendo o pai descendentes, nem ascendentes legítimos, poderá dispor de todos os seus bens, como quizer.
E fallecendo sem testamento, herdarão seus bens os parentes mais chegados, e não os filhos naturaes.
Por que os filhos naturaes não podem herdar abintestato seus pais, salvo se ao tempo, que nascerem, forem seus pais peães como dito he.
E postoque o pai tenha Ordens menores, não será por isso havido por Cavalleiro, quanto a este caso.
2. E se ao tempo que os filhos nascerem, o pai for peão, ainda que depois seja feito Cavalleiro, ou de outra maior condição, não perderão por isso os filhos naturaes a sua herança, ou a parte, que lhes della pertencer, mas havel-a-hão, assi como deviam haver, se o pai fosse ainda peão ao tempo do seu fallecimento.
3. Porém, se o Cavalleiro, que tiver filhos naturaes, não tiver filhos alguns, nem outros descendentes legítimos, e tiver pai, ou mãi, ou outros ascendentes legitimos, poderá em seu testamento deixar toda a sua terça, ou parte della aos filhos naturaes;
e não tendo descendentes, nem ascendentes legítimos, poderá em seu testamento deixar toda sua fazenda aos filhos naturaes, se quizer, ou dispor della em outra maneira, como lhe aprouver. »
Não obstante, diz-nos a nota (4) ao pr. Do Título XCIII do Livro IV das Filipinas:
« Os filhos illegitimos insucessíveis podião herdar ab intestato ( sem testamento ) se fossem LEGITIMADOS PER RESCRIPTUM PRINCIPIS, que outrora podia fazer o extincto Tribunal do Desembargo do Paço ( Ord. do liv. 1 t. 3 § 1, liv. 3 t.85 § 2 e Res de 17 de Janeiro de 1770 )
A L. De 22 de Setembro de 1828, no art.º 2, § 1, n.1 transferio essa atribuição para os Juizes de primeira instancia, que podem portanto conceder CARTAS DE LEGITIMAÇÃO a filhos illegitimos, e confirmar adopções, PRECEDENDO AS NECESSÁRIAS INFORMAÇÕES, E AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS. Esses Juizes são hoje os Municipaes em vista do D. N. 143 – de 15 de Março de 1842 art.º 2 § 5.»
E mais adiante, citando Furtado de Mendonça, diz :
« Logo o tribunal do Dezembargo do Paço quando concedia ao filho do pai nobre a sucessão abintestado, ou testamentaria concorrendo com legitimos; quando igualmente concedia a mesma successão aos filhos dos Clerigos ou de damnado e punivel coito, obrava como Poder Legislativo, e dispensatorio, suspendendo, como he manifesto as Ord.s liv.4, 92 §1 e t. 93, bem como a Ord. Liv.2, t. 35 § 12, quando concedia a successão nos bens da Corôa;
só não havia dispensa de lei quando habilitava pela carta de legitimação os filhos naturaes de qualquer especie, para succederem nas honras e armas; porque a Ord. Liv. 5 t. 92 § 4 as concedia sem distinção;
nem quando legitimava os filhos naturaes de peão para successão com os legitimos, porque a Ord. Liv.4 t.92 pr. a permitia ,
e para a successão ex-testamento dos illegitimos de qualquer especie, quando não houvessem herdeiros necessários, não era necessária dispensa como da Ord. Liv.4 t.92 3 Res. De 11 de Agosto de 1831. »
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Prova de Paternidade
Caro Vasco:
Mais um belo texto do nosso Amigo Miguel para enriquecer este tópico! a questão que me parece mais difícil centra-se na delimitação da “classe” dos fidalgos de linhagem. A lógica interna das cartas de armas de sucessão pressupõe que aquela classe tem existência independente quer do conjunto dos “filhados” quer, obviamente, dos que já tenham obtido cartas de armas; se assim não fosse, só se poderiam atribuir cartas de armas de sucessão a filhados ou, quando muito, descendentes de outros detentores de carta de armas (o que sabemos bem não ser verdade – muitos FCA não tinham qualquer foro e talvez mesmo a maioria nunca o viesse a ter...), uma vez que a atribuição de uma tal carta não consistia (oficialmente) na “criação” de uma nova linhagem nobre mas no reconhecimento oficial (precedido de “competente” inquirição) de que o armigerado era “nobre e fidalgo” com direito ao uso de determinadas armas dos seus ascendentes – era o reconhecimento de uma realidade pré-existente (a pedido do interessado) e não propriamente a alteração de um estatuto por vontade régia como ocorria nas cartas de armas de mercê nova (que podiam simplesmente atribuir armas novas ou acrescentos honrosos a uma linhagem nobre pré-existente ou, pelo contrário, complementar ou consistir numa nobilitação expressa, como no caso dos Castros do Rio, Mattas e Sobrais). Sabemos bem que, talvez na grande maioria dos casos, a realidade não era de facto essa, e uma análise socio-histórica pode concluir que o uso que era feito das cartas de armas de sucessão era em muitíssimos casos o de conduzir a uma nobilitação expressa, mas essa análise não deveria, na minha opinião, apagar completamente alguns aspectos mais formais da realidade jurídica e simbólica subjacente, nem as suas consequências lógicas.
De cada vez que, em nome do Rei, se passava uma carta de armas de sucessão a alguém desprovido de qualquer foro da casa real reafirmava-se a existência de uma classe de fidalgos de linhagem desprovidos de qualquer alvará, ao conjunto dos quais se reconhecia oficialmente pertencer o suplicante. Os critérios que a Lei estabelecia para que esse reconhecimento fosse efectuado (independentemente dos meios de prova aduzidos) parecem dever servir de guia para a caracterização dessa classe, se quisermos manter a lógica interna do sistema. Tais critérios constam do próprio texto das cartas de armas de sucessão; qualquer coisa como (por meados do século XVIII): “ser o suplicante de antiga nobreza, sangue limpo e legítimo descendente das sobreditas famílias [das quais queria usar as armas], e que os ditos seus pais e avós e mais antepassados [invocados na justificação?] foram pessoas muito nobres e legitimos descendentes das sobreditas famílias e como tais se trataram sempre à lei da nobreza com cavalos, armas, criados, servindo os cargos mais honrosos da República como também no militar”. Antes havia fórmulas mais simples (não invocavam a limpeza de sangue, por exemplo), mas sempre se referia obviamente a ligação genealógica aos troncos das linhagens invocadas e a nobreza dos antepassados referidos para justificar essa ligação. Temos assim alguns critérios objectivos para avaliar qual o entendimento oficial do que seria um “simples” fidalgo de linhagem; pode argumentar-se que, antes do reconhecimento oficial, essa “qualidade” poderia estar tão obscurecida (muitas vezes, sem dúvida, pela simples razão de ser fictícia...) que de pouco serviria ao suplicante, mas também seria excessivo afirmar que era sempre de todo inexistente em todos os casos, o que retiraria qualquer “interesse” às referidas cartas de armas. Mesmo as ficções mais divulgadas necessitam de algum suporte real para serem eficazes...
Sou levado a admitir que subsistiam portanto por esse país fora pessoas realmente consideradas fidalgos de linhagem, com fundamento razoável na respectiva genealogia e modo de vida dos próprios e antepassados relevantes para o efeito, mas exteriores ao círculo dos “fidalgos inscritos nos livros de El Rei” e dos que já tinham obtido eles próprios ou antepassados alguma carta de armas. As (eventualmente não muito numerosas) cartas de armas atribuídas a esses, ou o mero sentimento geral de que esses casos podiam existir e existiam de facto, não seriam em certa medida o suporte do prestígio das restantes cartas de armas de sucessão?
Um abraço,
António
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RE: Prova de Paternidade
Meu caro António,
Equacionaste o problema de uma forma claríssima. Concordo plenamente! Depois falamos com mais calma.
Abraço
Nuno
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RE: Prova de Paternidade
Caro António
Este tem sido um dos mais interessantes temas no Genea dos últimos tempos.
Mas deixa-me uma questão, para a qual não encontro resposta:
É um facto que muitos nobres usavam as armas familiares sem para tal obterem carta de armas. Este facto conduzia ao uso, por diversos indivíduos, das mesmas armas com o consequente desvirtuamento da sua função identificativa.
É também um dado adquirido que ninguém podia (devia) assumir diferenças. Para o uso da diferença é sempre necessária a carta de armas.
Por outro lado estavam estabelecidas penas para quem usasse armas que lhe não pertenciam.
Assim sendo o que aconteceria a um filho segundo que usasse as armas do chefe? E era esta, creio, a situação mais frequente (para já não falar dos primos...)
Um abraço
João
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RE: Confirmação de mercês, Chancelaria, Selo
Caros Confrades,
Em complemento das minhas precedentes mensagens, e no contexto da transmissão de direitos, e da necessidade da sua CONFIRMAÇÃO, aqui fica o respectivo texto legal.
Ordenações Filipinas, Livro II, título XXXVIII, § 1, com fonte nas Manuelinas Livro II, título XVIII, § 1.
« E porque algumas pessoas tem de Nós algumas DOAÇÕES e MERCÊS em suas vidas, e para seus filhos, ou de juro e herdade,
( Mercê de juro e herdade, i.é., mercês cujo titulo passa aos herdeiros daquelle a quem se deu, sem depencia de nova mercê, exigindo-se tão somente confirmação. Senhor de juro, o que não he de mercê, em vida do doado )
e per seus fallecimentos os ditos seus filhos, segundo nossa Ordenança, hão de tirar CARTA DE CONFIRMAÇÃO per sucessão dos ditos seus pais, e algumas vezes por starem em posse de terras, rendas e cousas, que tem por doação, o não querem fazer,
mandamos que as taes pessoas sejam OBRIGADAS A REQUERER CONFIRMAÇÃO, e a tirarem e passarem pela Chancellaria do dia, que seus pais fallecerem, até seis mezes primeiros seguintes.
E não o fazendo assi, queremos que per esse mesmo caso incorram em pena de, alem de PAGAREM A CHANCELLARIA, que conforme ao Regimento devem, pagarem mais para Nós, ou para os Rendeiros daquelle anno, em que seus pais falleceram, outro tanto, quanto montar na metade da dita Chancellaria:
e os Officiais della haverão todos seus Direitos, e mais a metade do que nelles montar, se passados os ditos seis mezes, dentro de outros seis os vierem tirar da Chancellaria.
E NÃO OS TIRANDO DENTRO DE HUM ANNO QUEREMOS, QUE EM SUA VIDA SEJA A MERCÊ NENHUMA. »
E acrescenta a dita disposição:
§ 3
« E para que a todo o tempo se possa saber, e ver se as ditas Cartas passaram na Ordenança sobredita, mandamos ao Scrivão da nossa Chancellaria, que ponha nas costas dellas, com o sinal da paga, os dias do mez, e o anno, em que forem despachadas na dicta Chancellaria. »
Os fundamentos para que as Cartas e Alvarás passassem pela Chancelaria encontram-se consagrados no respectivo princípio que passo a transcrever:
« Muitas vezes algumas pessoas, a que per Nós são feitas mercês e doações, ou concedidos privilegios e graças, ou dados Officios e outras cousas, assi per Alvarás, como per Cartas, depois de as terem assinadas, as levam sem pagarem nella os Direitos, que são obrigados pagar;
( Estes direitos equivalião a um sello, por isso chamavão-se – SELLO DAS MERCÊS, e neste sentido já erão contemplados nas Ordenações da Fazenda de 17 de Outubro de 1516 cap. 241 § 4, e aos mesmos referia-se a Ord. Manuelina do liv. 2 t.18 pr.
Reinando Philippe I promulgou-se para a Chancellaria um novo Regimento com data de 16 de Janeiro de 1589, creando-se os DIREITOS, que ao diante forão denominados velhos, para se distinguirem dos novos creados em 1643 e 1661.
No reinado de Philippe III creou-se a contribuição das MEIAS ANNATAS por Al. De 12 de Setembro de 1631, que se addicionarão às do Regimento de 1589.
Depois da restauração, promulgou-se o Al. de 29 de Janeiro de 1643, em que alterou-se a anterior Legislação sobre esta matéria, creando-se tão sómente por trez annos o imposto dos NOVOS DIREITOS, que ainda hoje durão, bem accrescentados;
mas esse mesmo Alvará foi de novo reformado, alargando-se mais o horizonte do Fisco com o Regimento de 11 de Abril de 1661: ... )
sendo defeso per nossas Ordenações, os Officiaes lhas guardam e cumprem por negligencia, ou favor, de que se segue perda e dano às partes, e prejuizo a nosso serviço, por não serem vistas pelo Chanceller Mór e Officiaes da nossa Chancellaria, onde devem ser examinadas e emendadas, as que com justiça não devem passar, para se escusarem duvidas e demandas, que sobre isso recrescem.
Mandamos que as pessoas, a que fizermos doações e mercês de algumas Villas, Castellos, Terras, Jurisdições, Rendas, Direitos, Reguengos, Tenças, Padroados de Igrejas, ou quaesquer outras cousas, que concedermos per nossas Cartas ou Alvarás, sejam obrigadas de as passar e tirar de nossa Chancellaria do dia, que as Cartas ou Alvarás forem feitos, até quatro mezes primeiros seguintes.
( O praso para a execução das Leis era de oito dias na Côrte, e de tres mezes nas Comarcas do Reino – Ord. Do liv. 1 t. 2 §10...
Pegas no respectivo com. diz que o prazo de quatro meses fixado nesta Ord. tinha sómente execução no Reino de Portugal e lugares de Africa, mas que quanto ao Brazil, Guiné e Ilhas o prazo estendia-se a um anno; e para as partes da India o espaço era de dous annos, de conformidade com o Al. De 23 de Maio de 1599; o qual não obstante ser anterior a publicação das Ordenações, era observado...)
E passando o dito tempo, não o cumprindo assi, mandamos ao Chanceller Mór e Officiaes da Chancellaria, que lhes não recebam taes Cartas ou Alvarás, nen os sellem, nem passem pella Chancellaria:
e as mercês que per elles tivermos feitas, sejam nemhumas. »
Acrescenta esta Ordenação:
« 2. E se Nós houvermos por bem, que sem embargo do dito tempo de quatro mezes, ou do anno acima declarado, toda via passem as Cartas e Alvarás, e se sellem, por fazermos nisso mercê a algumas pessoas, pagarão a Chancellaria dellas pela sobredita maneira.
E será a dita Chancellaria do anno, em que a Carta, ou Alvará for feito, e os Officiaes haverão dellas todos seus Direitos, e mais a metade da somma, que se nos Direitos montar, como acima dito he. »
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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Direito ao uso de Armas
Caro João:
Como sabes, não sou especialista em direito heráldico e portanto tenho muito mais interrogações que respostas... A questão do direito ao uso de armas sem carta de armas foi-me esclarecida por um nosso comum amigo heraldista mas ainda não inquiri qual a legislação em que se baseia.
Lendo o famoso artigo do Marquês de São Payo “Cartas de brasão de armas: um ensaio de diplomática” fica-se com a ideia de que o autor entendia que o uso de armas deveria, em princípio, sempre ser precedido de competente diploma, uma vez que afirma a dado passo:
“Quem descendesse de indivíduo a quem tivesse sido concedida uma Carta de Armas das que acabámos de analisar (Mercê Nova), ou de um chefe de linhagem cujo brasão de armas se encontrasse registado nos registos oficiais competentes (os armoriais oficiais), e vivesse à lei da nobreza, tinha na vigência das Ordenações (e quando estas foram abolidas, da Carta Constitucional) direito ao uso dessas armas, conforme fossem ordenadas pelos Reis de Armas, que para isso tinham competência exclusiva. Para regular o uso desse direito, devia-se munir porém de um diploma em que esse direito lhe fosse expressamente reconhecido e as armas ordenadas pelo funcionário competente.”
Também não é citada especificamente a legislação que a tal obrigaria e o texto das cartas de armas de mercê nova (que de certa maneira pode dar ideia de qual era o entendimento do direito geral ao uso das armas de antecessores, independentemente de terem sido concedidas por carta de armas ou antes por uso imemorial em determinada linhagem, com armas “registadas nos armoriais oficiais”) referia qualquer coisa como:
“...as quais armas... possa trazer e traga, e todos os seus filhos e descendentes”,
sem fazer menção da necessidade de novas cartas de armas. É talvez significativo que essa expressa menção já aparece no século XIX em que o “novo formulário”, não já de carta de armas, mas do simples Alvará que as substituiu (sempre de acordo com o Marquês de São Payo), assinado pelo Rei e referendado pelo Mordomo-mor, dizia expressamente:
“e as deixem gozar e possuir tão-somente ao dito F. ... e aos seus descendentes que para esse fim legalmente se habilitarem como cousa própria e a alguns outros não.”
Seria uma nova restrição (inspirada talvez na apetência do erário público...) ou uma explicitação de exigência legal sempre existente mas talvez descurada em épocas anteriores? Segundo ouvi defender não seria exigência legal (pelo menos em épocas anteriores) para o tal uso de armas sem diferença. Gostaria de ter mais informação concreta quanto à legislação relevante.
Quanto à questão que pões, salvo erro meu devido à minha ignorância nestes assuntos, admitindo que era de facto legal usar armas de ascendentes sem pévia obtenção de carta de armas, julgo que é realmente incontroverso que as armas plenas e sem diferença de determinada linhagem não poderiam ser legalmente usadas por outrém que o chefe da dita linhagem (fosse lá ele quem fosse, o que talvez também não seja tão incontroverso como poderíamos pensar...). Mas se as armas usadas por algum ascendente já não eram elas próprias “plenas”, nem consideradas como armas de nova linhagem, não vejo que houvesse atropelo a esse aspecto da Lei em serem usadas por quem não fosse o respectivo “representante genealógico” (desde que não usasse de diferença pessoal que não lhe fosse expressamente atribuída); há casos “subtis”, como as armas dos Sousas, Albuquerques, etc., que já eram elas próprias compostas, incluindo, nestes casos, quartéis com as armas reais, mas como já se encontravam inscritas nos armoriais oficiais como armas dessas “novas” linhagens, julgo que seriam entendidas como armas plenas e portanto sujeitas às restrições legais referidas. Quanto ao sistema das diferenças (e a distinção entre diferenças pessoais, de ramos familiares, etc.), deves concerteza conhecer o artigo do nosso amigo Pedro Sameiro “Das diferenças em heráldica”, publicado nas “Armas e Troféus” de 1998.
Cá ficamos à espera que algum confrade contribua para esclarecer as muitas dúvidas que continuam de pé!
Um abraço,
António
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro António,
Quanto à regulamentação pormenorizada dos brazões de armas, incluindo a estipulação da obrigatoriedade do uso de diferenças por parte de quem não fosse chefe de linhagem e da competência exclusiva dos Reis de Armas para a ordenação das ditas diferenças, é indispensável a leitura do Regimento da Armaria de D.Manuel I. Está lá tudo muito bem explicado. Junta-lhe as Ordenações Filipinas e tens a legislação fundamental que regulava o uso de armas durante a Monarquia, pelo menos até 1834.
Só não tive ainda tempo de fazer um resumo dos aspectos mais relevantes para este debate. Quando puder faço-o, prometo.
Um abraço
Nuno Maria
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RE: Direito ao uso de Armas
Meu Caro António,
Arranjei finalmente tempo para responder a uma questão importante que colocaste: se haveria direito ao uso de armas sem carta de brasão e qual o respectivo fundamento legal.
Para esclarecer este assunto, a peça de legislação fundamental é o Título XCII do Quinto Livro das Ordenações Filipinas, que incorpora os aspectos essenciais do Regimento da Armaria de D.Manuel e das Ordenações anteriores.
No referido Título das Ordenações Filipinas, encontramos duas questões principais:
I - Por um lado, estabeleciam-se penas pesadas (degredo e multas) contra quem usasse armas sem ter direito às mesmas (i.e. por assunção ou usurpação);
II - Por outro lado, no tocante ao uso das armas legítimas, estabelecia-se um sistema de diferenças regulado pelo Ofício de Armaria (excluindo os chefes da linhagem, todos restantes membros desta deviam solicitar ao Rei de Armas a atribuição de uma diferença pessoal);
Em suma: quem usasse armas sem direito, incorria num crime severamente punido. Porém, quem tinha direito a armas e não requeresse a carta de armas pessoal não estava sujeito a sanções penais.
Tinham direito a armas: I) Os fidalgos e nobres de linhagem que notoriamente descendessem dum tronco heráldico oficial; II) Os fidalgos e nobres de linhagem aos quais a Corôa tivesse oficialmente reconhecido tal direito por sucessão (e os respectivos descendentes); III) As pessoas a quem a Corôa tivesse concedido por mercê nova um brasão de armas (e sua descendência).
Para terminar, gostava de salientar que a concessão ou o reconhecimento do direito a armas era, em Portugal, uma prerrogativa do Rei (ou dos Tribunais Palatinos que decidiam em seu nome). O Rei de Armas apena tinha poderes para executar e ordenar os brasões cujo direito já tinha sido prévia e soberanamente estabelecido.
Um grande abraço,
Nuno
II -
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RE: Prova de linhagem e parentesco
Caros Confrades,
Hoje trago-vos uma lei de D. Afonso III, inclusa nas Ordenações de D. Duarte, capítulo xbj, reguladora da forma como se devia provar a linhagem ou parentesco.
« Quando alguum fezer demanda ao outro per rrazom de linhagem ou de parentesco da avuenga ou de padre ou madre ou de Jrmaão ou dhj a susso pella linha dereita
Ou per rrazom de filho ou de neto ou dhj a Jusso pella linha dereita em qualquer parentesco
E esta demanda pretençe ao Juiz da Jgreia se as partes quiserem
Mais se o demandador nom quiser nom conheçera o Juiz da Jgreia delle nem hiram perante elle
Salvo ss’a demanda tanger a casamento prinçipalmente ou a esposoiros ou sse alguem nega que o outro nom he seu filho ou Seu neto E desy a jusso pella linha dereita ou que o outro nom he seu padre ou seu avoo pella linha dereita.
E esto se entende asi come nos homeens E como nas molheres
Em estes Cassos os Juizes da Jgreia devem a conheçer delles sse perante elles veerem E devem costranger cada huum daquelles contra que esto for provado per seu Juizo
E se tall demanda veer perante os Juizes ssagraaes bem podem della conheçer E nom sse podem defender per nêhuum Costume que perante os Juizes sagraaes nom passe se perante elles for posta E perante elles se deve contestar E provar E seguir ataa que per elles seja finda de sy ou de nom
E sse alguum quiser provar cada hûa destas cousas susso ditas pode-as provar PELLA FAMA DA TERRA
E o que quisser provar pella Fama da terra em estes Cassos E em outros semelhaveiijs nom nomeara as testemunhas per que o entende a provar nem-nas dara per escripto sse nom quisser
MAIS DEVEM ENQUERER E SSABER A VERDADE PELLA VJZINHANÇA E PELLOS MORADORES DO LOGAR OU DA FREGUISSIA OU DA RRUA SEGUNDO A FFAMA E O COSTUME DA TERRA come doutras testemunhas quaesquer assy como diz desusso em-no Costume que sse começa des que as testemunhas E cetera
E pode provar esto per parentes ou per parentas E per outros homeens E molheres que nom sejam sseus parentes Se o per elles poder provar
E per custume he que os emqueredores Devem preguntar as testemunhas sse o ssabem por padre ou por avoo. Ou por madre ou por avoo daquell
OU SSE O AVJA OU LHO OUVJRAM CHEMAR POR FILHO OU SSE O CRIAVA E O TINHA POR FILHO OU SSE RROGOU OS COMPADRES QUE O FOSSEM BAUTIÇAR OU SSE O SSALVOU DESPOIS Esto sse entende dos filhos da barregaam
E em esta guissa mesma devem preguntar pello neto E pello yrmaão E por outro parentesco quallquer que sse aJa de provar como dito he
E as testemunhas em este caso devem dizer
que elles vjram foam E foam
E que sse chemavam parentes en tanto graao
E o que quer provar pella fama da terra nom deve de nomear as testemunhas per que o entende de provar sse nom quiser
Mais os enqueredores devem d’hjr E saber a verdade E enquerer avezindade E o logar pellos vezinhos E pellos moradores come doutras testemunhas quaeesquer como desusso dito he »
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Tutela jurídica do apelido
Prezado Senhor,
demais colegas e amigos,
Alguém poderia me ajudar com o seguinte caso?
Eis os dados de que disponho:
Luis do Rego Barreto Maciel ( ? - ? ). Fidalgo, residente em Viana do Castelo. Bisneto de Maria Barbosa Jacome; sobrinho materno de Josefa, Maria e Rosa; sua mãe, Vitória, era a caçula (as duas primeiras foram freiras no convento de São Bento, em Viana). Seu pai, Antonio do Rego Barreto, foi Chanceler-mor do Reino, foro que recebeu do tio, João Velho Barreto, que fora antes Ministro Desembargador na Relação do Porto. Casou-se com Joana Maciel de Lima, pessoa ordinária, natural da Bahia, Estado do Brasil. Seu irmão mais velho, Pedro do Rego Barreto da Gama e Castro, foi conselheiro de Estado na Índia. Um seu filho foi ajudante de ordens do 2º. Conde de Bobadela.
Bento Barbosa ( 1726 - ? ). Lavrador, residente em Palmeira de Faro (termo de Esposende), enjeitado de pais incógnitos; suas filhas se chamavam Maria, Rosa e Vitória. Cinco padres foram paraninfos de seu casamento. Seu filho primogênito, Luis Antonio ( 1748 - 1818 ), foi dado em batismo ao fidalgo Luis do Rego Barreto Maciel, cuja procuração apresentou ao padre. Palmeira de Faro fazia parte da Relação do Porto e era couto do Convento de Santa Clara da Vila do Conde. O filho de Bento Barbosa e afilhado de Luis do Rego Barreto morou em Viana do Castelo, em casa de seu padrinho, e passou às partes do Brasil, estabelecendo-se nas Minas Gerais. Chamando-se Luis Antonio Barbosa Viana, mudou o nome para Luis Antonio da Silva Rodarte quando da publicação dos editais de seu primeiro casamento. Foi investigado pela Igreja por haver sofrido impedimento (acusaram-no de já haver prometido casamento a duas mulheres, uma delas na cidade do Porto, acusação que se provou falsa, tendo ele dito jamais haver estado no Porto - anos depois um dos acusadores, já reconciliado com o acusado, apadrinharia um de seus filhos). As Ordenações eram explícitas quanto às penas a serem aplicadas aos que adotassem armas ou apelidos do qual não descendessem: “E nenhuma pessoa tome apelido de Fidalgo de Solar conhecido, que tenha terras com jurisdição em nossos Reinos, não lhes pertencendo, nem vindo de tal Linhagem, posto que seus pais assim se chamassem, se na verdade não lhes pertencia. E quem o fizer, perderá a fazenda, a metade para quem o acusar, e a outra para os cativos; e perderá todo o privilégio, que per sua Linhagem e pessoa tiver, e ficará plebeu.” (Livro V, Título XCII, § 13). Dois filhos de Luis Antonio tiveram suas vidas investigadas para se ordenarem padres. Fez Luis Antonio carreira como servidor da Justiça d’El Rei de Portugal, havendo inclusive atuado como solicitador de causas nos auditórios da comarca do Rio das Mortes. Desempenhou funções administrativas diversas nas várias Irmandades de que fazia parte, além de capitanear a cavalaria de milícias.
João da Silva Rodarte ( 1669 - 1739 ). Fidalgo, letrado, fez carreira como magistrado da Justiça d’El Rei de Portugal. Serviu como Desembargador na Relação do Porto (à qual pertenciam Viana do Castelo e Palmeira de Faro). Era, como seu pai, natural de Lisboa, mas sua mãe era da Vila do Conde, havendo sido vizinhos e compadres das freiras do Convento de Santa Clara. Era casado com D. Vicencia Maria de Sousa Azere, filha legítima do Tesoureiro-Mór do Estado do Brasil, Francisco da Costa Azere, os quais viveram na Bahia, onde também vivera o pai de João Rodarte, capitão Pedro da Silva Rodarte, época em que fora Alcáide-mor em Ilhéus. Um seu filho serviu armas na Índia e casou-se com gente da Bahia, pleiteando aparentemente sem sucesso o posto de tenente de campo-general nas Minas Gerais na época em que era capitão-general, interinamente, o futuro 2º. Conde de Bobadela (em nome do 1º. Conde), regressando a Portugal. João da Silva Rodarte terminou seus dias no Desembargo do Paço.
Que lhe parece?
C. Rodarte
P.S.: Há algum caso de punição de gente que usurpava sobrenome de fidalgos?
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Nuno:
Mais uma vez muito obrigado pelos teus esclarecimentos; só hoje consegui voltar ao "fórum" e ler mais estas tuas contribuições. Como achas que (em princípio, pelo menos) seria encarado o uso de armas plenas e sem diferença por quem não fosse chefe de linhagem? seria esse acto equiparado a uma simples usurpação, como quem usasse armas de uma linhagem de que não descendia?
Outra questão é saber se o uso de armas compostas sem diferença (e sem carta de armas), por quem não fosse chefe de linhagem caía na categoria dos actos tolerados pela Lei (não se infringiria o preceito legal de só o chefe da linhagem usar as armas plenas e sem diferença, uma vez que as armas usadas não eram "plenas").
Quando dizes que "quem tinha direito a armas e não requeresse carta de armas não estava sujeito a sanções penais" queres dizer simplesmente que o uso das armas (implicando sempre o respectivo encartamento) não era obrigatório (como o voto em certos países, ao contrário de outros...), ou que essas pessoas podiam mesmo legalmente usar armas sem requerer a referida carta? Quer-me parecer que estamos peranto um desses casos comuns em Portugal de ambiguidade da Lei, com a agravante de, neste caso, não haver talvez jurisprudência que ajude muito, dado o geral laxismo que me parece ter presidido à aplicação de algumas destas leis ligadas à heráldica e nobiliarquia.
Em Inglaterra, no tempo de Henrique VIII, houve pelo menos, que eu saiba, uma execução de um parente do Rei por uso considerado abusivo de um sinal heráldico ligado à Casa Real (de quem ele todavia descendia); em Portugal, alguém terá alguma vez sido condenado por uso indevido de armas de família? As duas normas legais que invocas, se interpretadas à letra, parecem implicar que "ter direito a armas", para quem não fosse chefe de linhagem, implicava ver-se atribuída oficialmente uma diferença (ou seja, parece que só se teria direito a essas armas já diferençadas oficialmente e não às armas do chefe ou chefes de linhagem de quem se descendia, ainda que "misturadas"...), mas, pelos vistos, a interpretação seria mais laxista, admitindo um direito teórico mesmo às armas não diferençadas dos ascendentes, não estando o uso destas, mesmo "irregular" (sem diferença atribuída) sujeito a sanções...
Grande abraço,
António
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RE: Tutela jurídica do apelido
Caro Confrade, Claus Rodarte,
Na sequência da sua precedente mensagem, que agradeço, comecemos por, abstractamente, situar a questão.
Em análise estará determinar:
- Quais as consequências práticas do uso indevido, ou do abuso, ou da usurpação de um apelido? Não é verdade?
Uma resposta adequada a esta interrogação careceria de uma investigação aprofundada, trabalho que, de momento, está fora do meu horizonte.
Não obstante, aqui lhe deixo algumas brevíssimas e perfunctórias notas.
E desde logo, uma indicação encontrará o caro confrade na própria família dos referenciados!
Tem notícia de que algum destes, dos que usaram apelido diverso do que lhes competia, fosse judicial ou extra-judicialmente molestado por tal?
Se não teve, é porque eventualmente não houve lesados, e, consequentemente, não houve queixa junto das respectivas autoridades.
Pois, se houvesse, não faltaria lei para ser aplicada.
Não só a referida Ordenação Filipina, do Livro V, Título XCII, § 9,
como também a Carta de Lei de 9 de Setembro de 1769 - que impunha o uso dos apelidos de família aos administradores de vínculos, sob a sanção de estes passarem aos seus directos sucessores.
Não esquecer que, nesta época, a lei é expressão da vontade do soberano e que:
« ELREY HE LEI ANIMADA NA TERRA, & PODE FAZER & DESFAZER LEIS »
( Cfr. Manuelinas, Livro III, Título LX, § 1 )
Não descurar, por outro lado, o costume, enquanto havido como expressão tácita da vontade do monarca, e que caminhava ao lado da lei e em pé de igualdade.
Mas para haver procedimento, seria necessário, no mínimo, haver uma participação, denúncia ou queixa de alguém que se sentisse prejudicado com o facto.
E a máxima revela:
« QUIT TACET CONSENTIRE VIDETUR», " quem cala, consente " !
O próprio silêncio de quem poderia ou deveria agir, acabaria por traduzir uma certa conformação ou aceitação daquela factualidade.
A tudo isto, haverá que acrescer a situação dos novos convertidos à fé cristã, que, segundo a supra dita ordenação, poderiam usar de qualquer apelido, pois não eram passíveis de sanção...
Do que pode resultar, a possibilidade de existência de um certo laxismo ou sentimento de impunidade generalizado.
Pois se os conversos podiam usar desses apelidos, porque não os outros...?
Eis o que, de momento, se me oferece dizer sobre o assunto.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Tutela jurídica do apelido
Caríssimo Eduardo Albuquerque,
Muito agradeço por suas interessantes reflexões e considerações.
Se me permite continuar o assunto, questão que me atormenta há alguns anos (tormentos assim só acabam quando resolvidos - se resolvidos), exponho aqui algumas dúvidas, compartilhando-as consigo, de modo que eu possa me enriquecer com seus conhecimentos (ou de quem mais puder ajudar), dados aqui tão generosamente.
1º Ponto: De onde vem o sobrenome de Bento? Enjeitados de pais incógnitos (que tendiam a ser filhos adulterinos) adotavam alcunhas religiosas, quase nunca sobrenomes... Por que Barbosa? Ele foi enjeitado à porta de Jacinto Álvares e apadrinhado por Justa Álvares frente às testemunhas Manoel Alves Roballo e Francisco da Costa: não aparece nenhum Barbosa em sua vida... Teria Bento sido enjeitado com alguma indicação de quem era sua mãe (em vista da inviabilidade de se adotar o sobrenome do pai, cuja reputação seria manchada pelo adultério tornado público com tal ato)? Por que Bento não teve padrinho? Ou será que teve algum benfeitor que o apadrinhou, mas cujo nome não pôde ser revelado?
2º Ponto: Por que cinco paraninfos padres quando do casamento do enjeitado Barbosa? O primeiro poderia ser da família que o acolheu (Padre João Álvares da Costa, filho de Custódia Álvares: pode ser sobrinho de Jacinto Álvares e de Justa Álvares)... Além do mais, Joana Francisca, mulher de um certo João Álvares, era madrinha de batismo de um irmão da noiva... Mas e os demais padres, muitos dos quais sequer eram de Palmeira de Faro? Qual a relação deles com Bento Barbosa? Por que Bento haveria de preferi-los a outros, seus conterrâneos, para paraninfos de seu casamento? Isto me parece um acontecimento atípico...
3º Ponto: Quanto ao nome do filho do enjeitado Barbosa, seria Luis por causa do padrinho e Antonio por causa do santo celebrado no dia do batizado? Vale lembrar que o enjeitado nunca mudou de nome: quem vai fazer isso é o filho primogênito, único varão, depois que passou ao Brasil...
4º Ponto: Por que um fidalgo de Viana apadrinharia um filho (e justamente o primogênito, normalmente dado aos avós paternos) de um “lavrador enjeitado” na Freguesia de Palmeira de Faro? De onde vem a relação entre os dois? E em que consistia a procuração apresentada por Bento Barbosa? Seria uma carta? Por que um fidalgo haveria de se corresponder com um “lavrador enjeitado”? Se Bento Barbosa teve um benfeitor anônimo na ausência de seu pai incógnito, teria sido ele o fidalgo Luis do Rego (teriam algum parentesco?)? A freguesia de Palmeira de Faro era sede de um couto que fora do fidalgo Pedro Carneiro Gaio e seus descendentes, havendo sido emprazado, quando da extinção da família, pelas freiras do Convento de Santa Clara da Vila do Conde... é, portanto, pouco provável que a relação entre Luis do Rego Barreto Maciel e Bento Barbosa fosse de “suserania e vassalagem”... Além do mais, curiosamente, houve pelo menos duas freiras do Convento de Santa Clara da Vila do Conde ligadas à família Rodarte pelos laços de compadrio (a família do Desembargador Rodarte, cujo sobrenome será adotado pelo filho do enjeitado Barbosa, era vizinha do convento)...
4º Ponto: Maria, Rosa e Vitória - nome das tias e da mãe do fidalgo e das filhas do enjeitado (seguindo a mesma ordem cronológica, ao que tudo indica). A Maria, tia do fidalgo, era freira no mosteiro de São Bento, bem como uma outra tia, de nome Josefa, único nome que não aparece na descendência do enjeitado.
5º Ponto: Mais importante do que questionar o que levou Luis Antonio a mudar de sobrenome é questionar por que “Silva Rodarte”? A adoção de sobrenome não era – senão legal, pelo menos tradicionalmente – condicionada ao de um dos quatros costados? Não teve a Igreja a condição de apurar a vida de Luis Antonio em pelo menos duas ocasiões (impedimento de casamento e ordenação sacerdotal de dois filhos)? Não foi detectada nenhuma irregularidade nesta mudança de sobrenome? Se a pretensão era deixar de ser um “sem-nome” para ser um “de família grave” e tal pretensão se desse por meio de uma usurpação, não seria mais adequado adotar, ao invés do nome “Silva Rodarte”, “Rego Barreto” ou “Gama e Castro”, com quem se tinha, em última instância, pelo menos um “parentesco espiritual”? (já vi casos em que isso aconteceu)
6º Ponto: O Desembargador João da Silva Rodarte, estando responsável pela relação do Porto, à qual pertenciam tanto a Vila de Viana quanto a Freguesia de Palmeira de Faro, pode ter tido uma aventura amorosa (ele ou um de seus filhos) – da qual haveria nascido Bento Barbosa. Daí o apadrinhamento de Luis Antonio por um fidalgo, bem como sua mudança de sobrenome, sem que a Igreja nada questionasse, quando da publicação dos proclamas de casamento. O Desembargador Rodarte tinha pelo menos um compadre relacionado a Viana: D. José de Menezes, Conde de Viana; tinha laços com gente do Brasil, especialmente da Bahia, tal qual o fidalgo Luis do Rego; e ambos estavam num mesmo estrato social. Teriam sido relacionados? Teria sido Luis do Rego quem, na ausência do desembargador Rodarte (ou um de seus filhos, talvez o homônimo e turbulento João, que fugiu de casa e se casou escondido, morrendo ainda jovem), arcou com a responsabilidade de olhar por Bento Barbosa, tratando de encaminhar um de seus filhos?
7º Ponto: O Porto aparece como residência do Desembargador Rodarte e como cenário de uma aventura amorosa... mas Luis Antonio afirma jamais haver estado no Porto... reminiscências de alguma história que ele pode haver contado a seus denunciantes?
8º Ponto: Se Luis Antonio vivesse uma farsa, o pior caminho a seguir seria o das letras: este, no entanto, foi o que ele escolheu... embora não fosse bacharel, atuou como solicitador de causas e serviu durante anos a Justiça Real (foi escrivão, meirinho, partidor e distribuidor etc)... Se sua mudança de sobrenome fosse uma fraude, ele não haveria de ser desmascarado?
9º Ponto: A história do defloramento das moças não foi negada, mas tão somente a da promessa de casamento. Terá ocorrido? É bem possível... A vinda para o Brasil poderia ter sido uma solução arrumada pelo fidalgo Luis do Rego para o jovem afilhado, a fim de livrá-lo da “honra a ser lavada com sangue” pelo pai da moça em Portugal. A ida para Minas poderia ter sido precipitada por semelhante motivo ou não (a falsidade da segunda história não implicaria na da primeira)...
10º Ponto: Pelo menos um dos acusadores se arrependeu e confessou a mentira (relativa à promessa de casamento), conforme se depreende da declaração do vigário interino. Provavelmente foi Domingos de Araújo Serqueira, pois este se reconciliou com Luis Antonio e apadrinhou-lhe um filho. Teria sido a noiva uma moça disputada por denunciado e denunciantes?
Há pontos coincidentes entre as trajetórias do filho do enjeitado Barbosa, o Desembargador Rodarte e o fidalgo Luís do Rego... não tenho nada de concreto ligando os três, mas o ponto 5 que menciono acima é o que me intriga mais e faz-me crer na viabilidade da "auto-perfilhação" feita pelo filho do enjeitado com relação à família do avô incógnito...
Que lhe parecem tais considerações? Há alguma coisa que me escapa?
Agradeço pela paciência e atenção.
Com meus melhores cumprimentos,
Claus R. Rodarte
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RE: Os documentos, os factos e a história
Meu Caro Claus Rodarte,
No seguimento de uma muito breve leitura à sua anterior mensagem, pois o tempo disponível mais não consente, cumprirá relevar que:
A HISTÓRIA FAZ-SE COM DOCUMENTOS.
Por isso, toda a hermenêutica, todas a valorizações ou juízos que eventualmente possamos construir terão de ter na sua base aquele suporte.
Ora do muito que carreou para a sua mensagem, e das interrogações formuladas e que o atormentam, parece poder concluir-se que, uma resposta adequada só poderá ser encontrada noutros documentos, nomeadamente, em inquirições, habilitações, registos notariais...que possam por fim às dúvidas levantadas.
O que, tudo ponderado, nos levará a ter de convocar INVESTIGAÇÃO aprofundada de toda esta problemática.
Pois, sem novos documentos, as hipóteses avançadas ou as deduções apresentadas não passarão de meras especulações que se poderão produzir em espiral, que quase tudo permitem ou consentem... pois, apenas dependentes do espírito criador de cada um..., e que, por sua vez, mais dúvidas levantam.
Metodologia esta que, em absoluto, de todo rejeito.
É nos DOCUMENTOS, nos FACTOS devidamente PROVADOS, que terá de alicerçar a sua construção histórica-genealógica.
Com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Os documentos, os factos e a história
Caro Confrade,
Bem sei a importância dos documentos - que não aprisionam a verdade histórica, pois há fraudes e silêncios por vezes intencionais. Mas a existência de mais de um documento testemunhando um dado acontecimento depõe sempre em seu favor, aumentando-lhe a probabilidade, embora não garantindo-lhe a veracidade. Genealogia, desamparada do estudo genético, é coisa sempre suspeita: maternidade é realidade, paternidade é suposição (e mesmo a genética não chega nunca aos 100% de certeza).
O que espero, no contato com outros pesquisadores, é a troca de informações, de experiências, pois, nesse jogo de probabilidades que é a reconstrução narrativa dos fatos pela História, há padrões sociais - e analogias se fazem úteis quando os documentos são insuficientes, como é o caso. Usos, costumes, normas e exemplos da aplicação das leis: tudo me é útil enquanto os documentos que procuro não me surgem. Por vezes terei indícios, mas não provas cabais de algo. Diante dos indícios que até agora tenho, muito me agrada tomar conhecimento das opiniões de outras pessoas, que carregam consigo uma bagagem de conhecimentos diferente dos meus.
Agradeço pela atenção e por suas tão sóbrias considerações e reflexões sobre o caso de meu estudo. Continuo por cá à procura de documentos e de analogias cabíveis.
Mui cordialmente,
Claus R. Rodarte
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RE: Direito ao uso de Armas
Meu caro António,
Acho que a melhor resposta às questões colocadas se encontra no próprio texto do Título XCII, Quinto Livro, das Odenações Filipinas, que passo a citar:
"...E para que cada um saiba a ordem, por que deve trazer as armas, que por direito lhe pertençem. declaramos que o Chefe de linhagem será obrigado trazer as armas direitas, sem diferença, nem mistura de outras armas algumas. E sendo chefe de mais que de uma linhagem, será obrigado trazer as armas direitas de todas aquelas linhagens, de que for Chefe, e sem mistura em seus quarteis, segundo lhe será ordenado por Portugal Rei d'Armas. E os outros irmãos e todos os outros da linhagem as hão de trazer com a diferença ordenada do nobre Ofício da armaria".
Em resumo:
- Apenas quem fosse chefe de uma única linhagem poderia usar o respectivo escudo pleno (constante dos Armoriais Oficiais), aparentemente sem necessidade de qualquer intervenção do Rei d'Armas;
- Todas as outras pessoas com direito a armas, incluindo os chefes de várias linhagens em simultâneo, tinham obrigação de pedir ao Rei d'Armas que lhe ordenasse o seu escudo individual;
Estamos situados, evidentemente, no universo das pessoas com direito a armas, não podendo por isso falar-se de usurpação. Quem não solicitasse o seu arranjo heráldico pessoal estaria, não propriamente a violar um direito, mas apenas a negligenciar o dever de registo para efectivação do mesmo. Algo de parecido, talvez, com a situação de quem não levanta a carta de curso depois de terminada a licenciatura!
Abraço
Nuno
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RE: Prova do casamento per fama
Caros Confrades,
No âmbito probatório, aqui fica um texto legal de D. Dinis, inserido nas Ordenações de D.Duarte, que regia a prova do casamento “per fama”.
« como se prova o casamento per fama
Costume he desy he dereito que se huum homem vivy com hûa molher E manteem casa anbos desuum per sete anos continoadamente chamando-se anbos marido E molher se fazem anbos conpras ou vendas ou enprazamentos.
E se poserem em elles nos stormentos ou cartas que fezerem marido E molher E em.na avizijndade os ouverem por marido E molher nom podem nêhuum delles negar o casamento E ave-llos-am por marido E molher aJnda que nom sejam casados em façe da egreja. »
Melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Prova do casamento per fama
Caro Eduardo Albuquerque
D.Dinis foi um grande Rei e soube rodear-se de bons legistas.
Assim,(hoje) os casamentos de facto e os chamados "ajuntamentos ", pois no meu Alentejo ( juntavam-se e faziam uma pequena festa, sem nenhuma cerimónia civil ou religiosa e ficavam assim reconhecidos como marido e mulher por toda a vizinhança e comunidade local) já eram reconhecidos como válidos em tão recuado tempo. Folgo muito por sabê-lo.
É uma grande satisfação ler este tópico com tão valiosas informações.
Com a maior consideração.
Rafael Carvalho
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RE: Direito ao uso de Armas
Meu Caro Nuno:
Mais um esclarecimento fundamental! Mas, sempre no plano dos princípios, continuo a não encontrar justificação, perante a letra das leis que tens vindo a trazer a este tópico, para a legalidade estrita do uso de armas sem carta de armas, excepto para os chefes de linhagem e, pelos vistos, apenas para os que o fossem apenas de uma...
A prática conhecida estava tão afastada deste rigorismo teórico que temos de admitir que o entendimento geral era mesmo no sentido mais tolerante que propões (não sujeitar os "negligentes" às sanções previstas na Lei para os "usurpadores"), mas a importância legal que as Ordenações parecem atribuir às diferenças pareceria apontar mais no sentido de uma protecção legal às Chefias, que tornaria "usurpação" o uso de armas sem essa diferença por outrém que não o Chefe (não nos esqueçamos do exemplo do Henrique VIII...).
A situação portuguesa complica-se pela possibilidade de "acumulação de Chefias"; se essa possibilidade não existisse (caso só se admitissem as sucessões masculinas, por exemplo), quaisquer armas compostas indicariam só por si que quem as usasse não pretendia passar por Chefe mas, de acordo com o texto da Lei que acabas de transcrever, mesmo um qualquer esquartelado sem diferença pessoal, por exemplo, poderia confundir-se com as armas do Chefe de quatro linhagens...
Esta questão das chefias remete-nos para outro dos problemas que eu punha algures neste tópico; aqui está uma disposição legal em que a noção de "representação genealógica" tem relevância. Seria interessante fazer um levantamento da legislação que permita esclarecer qual era de facto o entendimento relativo a esta questão da "Chefia do nome e armas". Em todo o caso esta lei parece reforçar o meu ponto de vista quanto à afirmação do Manuel Abranches de Soveral aqui transcrita pelo Vasco (se as sucessões femininas estivessem tão estreitamente ligadas à Restauração e a noção de representante genealógico tão dependente apenas da cabeça dos genealogistas, que sentido faria uma lei Filipina prever a hipótese de acumulação de chefias?).
Outra questão que se liga ao ordenamento das armas dos "Chefes" diz respeito aos casos (logicamente cada vez mais frequentes ao longo dos séculos) em que se acumulassem mais de quatro chefias numa só cabeça; parece que haveria uma contradição entre esta disposição legal, que obrigaria ao uso das armas de mais de quatro linhagens, e outra que, se não me engano, impediria a mistura de mais de quatro no mesmo escudo. É verdade que se conhecem casos (mesmo internacionalmente) em que ordenamentos heráldicos representam as armas de muito mais de quatro linhagens (usando diversas partições, "sobre-todos", etc.). Em Portugal tratar-se-ia de uma excepção para os "Chefes"?
Mais um abraço,
António
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RE: Direito ao uso de Armas
Caros Confrades
Na sequência dos comentários aqui apresentados, coloco a seguinte dúvida: Quando se ordenam armas, falando de escudos esquartelados, respeitam-se os seguintes campos, da esquerda para a direita 1º varonia, 2º avó materna, 3º avô paterno, 4º avó materna. OU 1º varonia, 2º avô materno, 3º avó paterna, 4º avó materna? Qual destas sequências está correcta? Seguia-se sempre uma ordem estabelecida? è que há armas que fojem destas sequ~encia. Apresentam a varonia, mas depois os 3 restantes quarteis vão buscar as armas aos avós ou bisavós maternos, etc.
Porque razão era alterada a ordem? Por exemplo, se um dos quarteis tivesse armas do reino, estas 'saltavam', por privilégio, para o 1º quartel?, ou só no caso de constituírem a varonia?
Outra dúvida: porque razão se ordenam armas, esquartejadas, repetindo no 4º campo o 1º campo? alguma razão específica? Implica a repetição de um campo menos grau de 'nobreza' que um brasão esquartelado com 4 campos diferentes?
Desde já grato pela atenção prestada,
com os melhores cumprimentos
Eduardo Domingues
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RE: Prova do casamento per fama
Caro Eduardo Albuquerque,
Desconhecia o teor dessa lei! É curiosa a obrigatoriedade dos "7 anos".
As "uniões de facto" não constituem, desta forma, novidade. Não é assim?
Melhores cumprimentos
Artur Camisão Soares
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RE: O casamento no direito romano
Meu Caro Rafael Carvalho,
É sempre com o maior prazer que leio as mensagens do meu caro e muito estimado Confrade.
De facto, aquilo que parece ser novidade nos tempos que correm... ou seja, a união de facto, usando uma expressão típica nortenha, “é mais velho que a Sé de Braga”...
Já no direito romano, no célebre Corpus Iuris Civilis, colectânea de ius e de leges do século VI, ( 533 a 565 ), ordenada por Justiniano, Ulpiano dizia:
« Nuptias non concubitus sed CONSENSUS facit »
( Digesto, livro 50º, título 17º, fragmento 30º )
e em,
( Digesto, livro 24, título 1º, fragmento 32º, parágrafo 13º ):
« Sed honorem matrimonii invicem matrimonii habeant... non enim coitus matrimonium facit sed MARITALIS AFFECTIO. »
E em Modestino,
( Digesto, livro 23º, título 2º, fragmento 1º) :
« NUPTIAE SUNT CONIUNCTIO MARIS ET FEMINAE ET CONSORTIUM OMNIS VITAE, DIVINE ET HUMANI IURIS COMMUNICATIO»
E nas Institutiones de Justiniano,
( Instituciones, livro 1º, título 9º, parágrafo 1º ) :
« NUPTIAE AUTEM SIVE MATRIMONIUM EST VIRI ET MULIERIS CONIUNCTIO, INDIVIDUAM CONSUETUDINEM VITAE CONTINENS. »
Fundamental era pois a convivência com uma específica intenção de se considerarem marido e mulher designada por affectio maritalis.
Temos pois dois elementos essenciais:
Um material, a convivência;
Outro espiritual, a affectio maritalis ou uxoris, ou seja, aquele supra dita intenção.
A ausência superveniente da affectio na relação matrimonial, determinava o divórcio sem necessidade de mais nenhum requisito.
Mas já estou a divagar demais, coisas da idade que o prezado confrade perdoará.
Com a maior estima e consideração pessoal, os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Uniões de facto
Meu Caro Artur Camisão Soares,
Agradecendo a sua precedente mensagem, tomo a liberdade de o remeter para a mensagem endereçada ao nosso estimado confrade Rafael Carvalho, sobre o casamento no direito romano, onde encontrará resposta para a sua dúvida.
Manifestamente penhorado pela atenção dispensada, subscrevo-me com os meus melhores cumprimentos,
Eduardo Albuquerque
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RE: Uniões de facto
Meu Caro Eduardo Albuquerque,
Em "boa hora" introduziu a temática, a qual é de manifesto interesse e actualidade. E o confrade Rafael Carvalho apresentou magnifícos exemplos!
Vou aproveitar para reler alguma coisa que aprendi na cadeira de "História das Instituições" na U.L. Esta cadeira contemplava, se bem me lembro: Direito Romano; Direito Peninsular; Direito Português.
Mais tarde, já na Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, tive "História do Direito".
Renovados cumprimentos
Artur Camisão Soares
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Eduardo Domingues
Mesmo havendo esse direito histórico, julgo que nada obriga a que se use armas vindas por via paterna. Cada um pode usar, entre as que lhe vêm dos antepassados, aquelas que prefere e ignorar as restantes. Talvez seja de seguir apenas a orientação manuelina do brasão ser composto apenas por 4 armas. Ao escolher essas 4 armas (as que se quiser entre todas as comprovadas documentalmente) é que é de seguir o critério da proximidade à varonia na sua colocação no escudo (mas se houver armas do reino elas passam para o 1º quartel).
Podia-se obter carta de armas apenas com as armas vindas pela avó materna, mesmo tendo direito a armas por vias bem mais próximas da varonia, isso pouco importava. O que interessava era o ramo mais prestigiado, ou aquele que permitia apresentar melhores provas documentais no processo de justificação de nobreza, ou aquele a que convinha ligar para efeitos de ordem jurídica num caso concreto, etc...
Se se provava apenas direito a 3 armas, ou só se queria usar 3 armas, é claro que uma família era repetida no escudo (1º e 4º, ou 2º e 3º), não significa mais nada... Quando só se queria usar 2 armas, ou se partia o escudo ou se repetiam no esquartelado. Era apenas uma questão estética (hoje prefere-se a repetição, noutros tempos usava-se muito o partido...), nada mais.
Julgo que esta orientação é até mais correcta na actualidade, até porque já não está em causa nobreza, mas apenas descendência e memória de nobreza, e portanto há lugar ao regresso a uma maior liberdade heráldica e ao gosto pessoal, talvez dentro de regras mínimas inspiradas no regimento de D. Manuel. Não faz sentido obrigar alguém a usar determinadas armas, quando demonstra ter direito a outras que prefere (parece que houve casos destes ao longo da história do ex-C.N.)
Os melhores cumprimentos
Sérgio Sodré
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RE: O casamento no direito romano
Caro Eduardo Albuquerque
Não sei como agradecer-lhe a paciência e atenção que tem tido comigo.
E creio que tb. será opinião generalizada e de inteira e boa justiça, e não apenas delicadeza de bom tom como agradecimento, considerar a sua colaboração das mais válidas neste Fórum. Felizmente, que temos ilustres confrades que pelo seu saber e respeitabilidade,cujas mensagens-informativas dignificam e tornam respeitado este Fórum.
No que me respeita, seria quase impossível consultar sobre algumas normas, preceitos, direito consuetudinário e toda a legislação de antanho sobre direitos nobiliárquicos, que tem tido a amabilidade de colocar aqui.
Bem haja!
Creia-me com consideração especial. Os meus melhores cumprimentos.
Rafael Carvalho
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Vasco Cyrne
Terei involuntariamente exagerado ao referir que se podia escolher as 4 armas dentre "todas" as comprovadas documentalmente, pois existia uma relação directa com os apelidos de família que eram usados pelo armigerado e seus antepassdos mais próximos. Por outro lado, as armas que se escolhiam ou os apelidos que se usavam não era o mais importante, mas sim o estatuto que se obtinha ou se confirmava através da obtenção de uma carta de armas.
As armas e os apelidos podiam vir por qualquer lado. Isso em nada altera a varonia de cada um... É verdade que, noutros tempos, as escolhas ligadas ao prestígio de certas linhas de ascendência podiam ser importante socialmente e trazer alguma vantagem ao próprio. Hoje é irrelevante, o que é mais uma razão para uma escolha livre, desde que dentro da lei em vigor claro está.
Já que mencionou o nosso primeiro Rei, lembro-lhe os primórdios, com D. Afonso Henriques e sucessores a valorizarem a ascendência feminina (Leão e Castela) de tal forma que, nos Lusíadas, Luís de Camões julga que a varonia do Conquistador era húngara!!!! Foi preciso a moderna investigação histórica para recuperar e relembrar os Capetos. Também nas armas nacionais a influência é castelhana (castelos de D. Afonso III) e nada é francês ou borguinhão... Isso nada teve a ver com "vaidades", julgo eu...
Cumprimentos
Sérgio Sodré
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Eduardo Domingos
Ordenação do Senhor Rei D. Manuel I de 31 de Março de 1520
2º livro, título XXXVII
2-(...) assi poderam trazer atee quatro armas, se quizerem, daquelles de quem descenderem, esquarteladas, e mais nam; e se quiserem tomar soomente estremas as armas da parte de suas mãys pode-lo-ham fazer.
Regimento e Ordenação de Armaria
2 Diferenças das linhagens populares
8-(...) trará sempre a geração mais chegada a machos no quartel da mão direita.
Se das 4 armas, duas vierem pelo pai e duas pela mãe, as do pai ocuparão o 1º e 2º quartel, as da mãe ocuparão o 3º e o 4º quartel.
Cumprimentos
Sérgio Sodré
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Sérgio
Começo por agradecer a sua pronta resposta que só agora pude ler.
Quando escreve ''Cada um pode usar, entre as que lhe vêm dos antepassados, aquelas que prefere e ignorar as restantes'' está a referir-se a armas assumidas, ou seja, armas que um determinado indivíduo começou a usar, sem colidirem com nenhumas já existentes. Essas, parece-me, não tem qualquer registo. Já agora, que valor lhe atribui? Também me parece pela sua afirmação que um determinado indivíduo poderia pesquisar a sua arvore genealogia, encontrar uns 10 ou 12 avôs/avós fidalgos, por exemplo, um 5 avô (que para lá chegar passou por 1 avó, um avô, uma avó, ou seja, em zigue-zague) Mesquita, uma setima avó Távora, um 10 avô Ferraz, uma 9º avó Castro, um 6 a`vô Pereira ilegítima, mas documentada, todos comprovadamente fidalgos, sendo um ilegítimo. Descende de todos eles e todos tiveram armas... Qual escolheria para usar o individuo interessado? Ou seria ele a elaborar um processo, como suplicante, e seria o Conselho da Nobreza a ordenar-lhe as armas (caso o processo fosse aceite)? Não em parece, contudo, que o individuo conseguisse registar tais armas.
Com os melhores cumprimentos
Eduardo Domingues
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Sérgio Sodré
2 Diferenças das linhagens populares ( ipsis verbis, como escreveu, na mensagem dirigida ao confrade Eduardo Domingues.
Fiquei curioso e interessado pelo que se deduz: populares que usaram armas, pelo menos no estrangeiro, tal sucedeu: Alemanha , Suiça e França, por ex.
Aliàs no regimento da criação de armas levado a efeito no reinado de D.Manuel, era proibido o uso de metais , pelos plebeus e este Rei teria enviado o rei de Armas ao estrangeiro para se instruir , nas cortes europeias sobre as regras de boa armaria. Cito de memória e poderá haver alguma confusão minha.
Também houve armas de burgueses portugueses,por ex: as do célebre Álvaro Pais e as do pai de Fernando de Bulhões (Santo António).A burguesia portuguesa pouco estudada ,que eu saiba, merecia aqui ser tratada por quem sabe destes assuntos, uma vez que se fala muito na nobreza, cujos filhos segundos na India e no Brasil encarreiram com bom proveito pela mercancia.( emburguesaram-se com bom proveito e também com aproveitamento ...)
Estou a lembrar-me de outros apelidos de grandes burgueses, mas o caro confrade sabe melhor do que eu sobre estes assuntos.Muitos burgueses fizeram fortuna também nos Paises Baixos e famílias de origem judaica célebres se enobreceram e obtiveram cartas de armas e também não nos esquecermos que em muitas embaixadas para casamentos e efeitos de guerra e paz muitos cá ficavam ou lá ficavam e dessas origens há ainda os respectivos apelidos, embora aportuguesados alguns. Falo em linhas gerais, competindo a quem sabe desta matéria elucidar-nos convenientemente, o que agradeço muito. Serão informações valiosas de genealogia ligada à burguesia e respectiva heráldica ,como contributo importante para um melhor conhecimento desta "classe" que em riqueza e cultura nada ficava a dever aos mais ilustres do Reino. Lembro-me dos Castros (do Rio ) dos Sobral,etc..
Mas gostava mais de saber é do período que abarca o séc.XIII aos alvores do Renascimento e não em tempos posteriores,já estudados.
Gostaria de saber mais sobre tais assuntos; aliàs, o que digo precisará certamente de correcção e ser complementado; mas penso, não ter passado além das chinelas e assim ficarei ressalvado.
Os meus melhores cumprimentos e um bom fim de semana..
Rafael Carvalho
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Rafael Carvalho
Do tempo de D. Manuel, o Regimento ou Ordenança de Armaria que referi apenas distingue entre diferença das "linhagens reaes" e diferenças das "linhagens populares". Assim, estas referem-se na realidade às linhagens nobres não reais.
Com os melhores cumprimentos
Sérgio Sodré
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Eduardo Domingues
Não me refiro a armas assumidas no sentido estrito de armas usadas sem "direito de sangue", mas a armas de sucessão em que se prova descendência de quem as usou legitimamente. Neste caso julgo que não existia legislação que obrigasse ao uso de umas em detrimento de outras. Havia liberdade na escolha, mas a sua organização concreta no escudo obedecia a regras, assim como a escolha do timbre.
Para a obtenção de armas pessoais oficiais (por sucessão) através das entidades competentes, a liberdade de escolha consiste em apresentar provas documentais ou testemunhais do direito a determinadas armas e solicitá-las, ao invés de apresentar provas de outras a que também se teria direito. Havia alguma margem para se fazer isto, pelo menos entre os apelidos de pais e avós, e julgo que nada há de objectivo que negue a legitimidade deste procedimento.
No caso concreto que apresenta, julgo que, em princípio, o Conselho de Nobreza decidiria reconhecer-lhe 4 das armas a que provasse ter direito por via documental e destas optaria por aquelas que mais se aproximassem da varonia.
com os melhores cumprimentos
Sérgio Sodré
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RE: Direito ao uso de Armas
Caro Sérgio Sodré
Ainda pensei nisso, por me parecer óbvio,mas valeu a pena perguntar-lhe, pois está dentro destes assuntos, ao lembrar-me que os metais nos brasões só eram permitidos aos nobres; portanto,por exclusão de partes, pensei nos plebeus,daí a minha confusão. Os meus agradecimentos.
Com os melhores cumprimentos.
Rafael Carvalho
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RE: Prova de Paternidade
Caro Nuno Maria,
a propósito desta sua intervenção, dirigi-lhe uma mensagem no tópico "Omissão/adopção de apelidos .....".
Um abraço,
Coelho
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RE: Cartas Régias, Cartas de Lei e Alvarás
Sou o proprietário do imóvel que podem ver em (...)
Estou a ser presionado e ameaçado pelos governantes para lhes vender. Como não vendo o antigo forte eles apenas fizeram uma coisa: alteraram a lei para eu não poder retirar proveito do im´vel. O que aqui refiro está no site do foret em Comunicação Social. É a democarcia do meu país.
Alguem pode me ajudar
Fico agradecido escrevam-se no site e este trabalho está excelente do Eduardo Albuquerque gostaria que ele me contacta-se
Um Bom Natal para todos
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RE: Lei Mental-d.tos de personalidade
Caro confrade Dr. Eduardo Albuquerque,
Tenho tido o prazer de ler as suas doutas mensagens, que me tem permitido aprender muitíssimo (neste e noutros tópicos), e muito lhe agradeço ter tido a amabilidade de as partilhar com todos os frequentadores deste fórum.
Sobre o assunto em questão, gostaria de saber a sua opinião, sobre a sucessão nobiliárquica, posterior a 1910 no caso de filhos bastardos, cujos pais casaram na Conservatória do Registo Civil, após setença de divórcio transitada em julgado. Considera que os mesmos são legitimados pelo casamento civil, ou só devem ser considerados legitimados se os pais tiverem celebrado o matrimónio pela Igreja? E no caso dos filhos nascidos após esse casamento civil, devem ser considerados legítimos, ou só assim devem ser considerados no caso dos pais terem contraído matrimónio pela Igreja? Na sucessão nobiliárquica devem ser considerados, ou devem ser preteridos para a linha seguinte?
Desde já grato pelas suas considerações sobre o exposto, queira aceitar os meus respeitosos cumprimentos,
João Magalhães
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RE: Prova de linhagem e parentesco
05/02/2011
Exmo Senhor
Como posso adquerir a prova de paternidade da familia do meu pai, que ando fazendo a sua genealogia depois de algum tempo!
Tenho a testemunhagem dos familiares, o carinho amor, mas falta aquilo a prova nos papéis!
tenho no meu assento de nascimento, como néto de fulano tal,,,,, que enmendado por digo avô incógnito!
Agradecia a vossa opinião.
Cumprimentos
Carlos Luiz
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RE: Prova de linhagem e parentesco
05/02/2011
Peço desculpa de não mencionar o nome do Senhor Dr Eduardo Albuquerque, na minha mensagem anterior!
Com os meus cumprimentos.
Carlos Luiz
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